De um hospital na cidade vizinha, lhe ligaram, informando que Lizandra havia batido o carro contra um poste. Estava em estado grave.
Ao ouvir isso, Lindolfo deixou o telefone escorregar de suas mãos.
Desesperado, avisou as empregadas para que informasse a quem ligasse, que Liza, já havia sido encontrada. Muito embora estivesse mal, estava viva. Lindolfo recomendou as duas ainda, que caso alguém perguntasse por ele, era para dizer que havia ido até o hospital municipal da cidade vizinha.
Passou estas recomendações e saiu.
Por não estar de carro, foi até a praça central da cidade e pegou um táxi. De lá, foi direto para o hospital.
Ao lá chegar, descobriu que o carro fora inteiramente destruído.
Para piorar, sua esposa estava agonizante. Os médicos não lhe davam mais do que alguns minutos de vida. Admirados, chegaram a comentar com Lindolfo, que era realmente espantoso, que a moça não tivesse morrido na hora. Preocupados, chegaram a pensar, que ela morreria a caminho do hospital.
Sobre seu estado físico, os médicos disseram que ela, havia se chocado contra um poste e, dada a violência da batida, estava seriamente machucada. Contudo, por ter se protegido, na hora da batida, não tinha muitos ferimentos no rosto. Mas o corpo, estava cheio de hematomas, escoriações, e fraturas.
Lindolfo, ouvindo atentamente todas as explicações do médico, ao constatar que os mesmos não tentariam salvá-la perguntou:
-- Mas vocês não podem nem ao menos tentar? Não tem como ajudá-la?
-- Não, infelizmente não tem jeito. Se nós mexermos nela, podemos complicar sua situação. Além do mais, ela está sentindo muitas dores. – disse dos médicos.
-- Mas, vocês não estão lhe ministrando analgésicos?
-- Sim, e também a examinamos. Mas infelizmente, não há nada a ser feito. A moça vai morrer em menos de uma hora. Lamentamos dizer isso. Um acidente desse porte é fatal. A única coisa que podemos fazer nesses casos, é tentar diminuir as dores do paciente, e tentar ajudar a família no que for possível.
Ao ouvir o diagnóstico do médico, Lindolfo se sentiu realmente culpado pelo acidente da esposa. Desesperado, não sabia o que pensar. Só lhe vinha a mente a idéia de culpa.
No entanto, num minuto de lucidez, chegou a perguntar:
-- Por acaso, minha mulher pediu alguma coisa?
-- Sim, pediu. Pediu para ver os filhos.
-- E nestes casos, como se procede?
-- Bem ... Diante deste caso, abriremos uma exceção. As crianças podem visitar a mãe. Não se preocupe com nada. Apesar do acidente, a moça pode perfeitamente conversar. Além do mais, ela não possuí nenhuma lesão grave, que esteja exposta. Como eu já disse, seu rosto não tem grandes ferimentos, apenas alguns cortes. Nada que impressionaria crianças.
-- Então eu as trarei. Por favor, tente mantê-la viva, o máximo possível. Eu vou fazer sua última vontade.
E disse e cumpriu sua palavra.
Lizandra, parecia realmente determinada a ver os filhos pela última vez.
Assim, as crianças, ao chegarem em seu leito, finalmente puderam ver a mãe.
Acompanhadas pelo pai, Lindolfo, e pelas empregadas, puderam visitar Lizandra.
No entanto, ao tentar adentrar o quarto da esposa moribunda, Lindolfo foi taxativamente, proibido de entrar. Os médicos, alegando que a moça não queria lhe ver, pediram educadamente para que esperasse do lado de fora do quarto.
Diante da insistência do rapaz, disseram que nestes casos, não era bom contrariar o paciente, afinal, em poucos minutos, ela não estaria mais ali.
Mas o rapaz insistia com os médicos. Precisava se desculpar com a esposa.
Entretanto, a despeito de sua insistência, mesmo penalizados com o desespero do rapaz, os médicos não autorizaram a visita. Cautelosos, levaram Lindolfo para fora da ala dos doentes internados e ficaram conversando com ele durante quase uma hora.
Enquanto isso, Lorena, Luís e Lara – os filhos de Lizandra –, sem conseguir entender muito bem o que se passava, procuraram se aninhar ao lado da mãe.
Lorena, que tinha quase três anos e Lara, que já sabiam falar, não paravam de fazer perguntas do tipo. Mamãe, por que você tá aqui? Por que não tá em casa? Você tá dodói? Vamos pra casa, mamãe. Aqui tá muito chato.
Ao ouvir tantas perguntas, Lizandra começou a rir. Em seguida comentou:
-- Mamãe está aqui, por que se machucou. Por isso, tenho que ficar deitada.
Nesse momento, Lorena então lhe perguntou quando sairia de lá.
Ao ouvir isso, Lizandra, já no limite de suas forças, começou a chorar.
Foi então que suas duas empregadas sinalizaram para que as crianças saíssem.
Mas Lizandra queria ficar mais um pouco com os filhos.
Como última mensagem, Lizandra pediu as empregadas que ficassem com eles, que cuidassem dos meninos. Pediu ainda para que se precisassem, contassem com a ajuda de Odete, sua mãe, e das amigas Adriane e Celeste. Angustiada, chegou a insistir com Bernadete – que trabalhava para ela desde quando se casou –, que não abandonasse os meninos. Sabia que não podia contar com o marido.
Aliás, nessa última conversa, deixou bem claro que não queria que elas deixassem as crianças sozinhas nas mãos dele. Lizandra afirmou ainda, que Lindolfo não saberia cuidar delas, por isso o cuidado.
Por último Lizandra pediu a Bernadete, que nunca deixasse de dizer que ela Lizandra Porto Real, amava muito Lorena, Lara e Luís, e que mesmo muito longe, não deixaria de olhar por eles.
Consciente de que estava morrendo, disse as empregadas, que só lamentava uma coisa, deixar seus filhos sozinhos.
Disse isso, e morreu logo em seguida, diante dos olhares espantados de Lara, que ficou realmente impressionada.
Ao constatar isso, Bernadete pediu então a Marlene, que avisasse os médicos.
Em seguida, pediu as crianças que se despedissem da mãe, pois esta estava dormindo.
No entanto, Lara, percebendo que a mãe estava estranha, começou a chorar e a assustar seus irmãos.
Bernadete então, pediu a menina que se acalmasse, já que estava assustando Lorena e Luís. Mas a menina, mal sabendo pronunciar as palavras, só conseguia dizer, que sua mãe havia dormido para sempre. Seguidas vezes repetiu isso.
No que Bernadete, perdendo a paciência puxou-a, e junto com os irmãos, todos saíram do quarto.
Ao sair do quarto, Lara voltou a chorar e desesperada, só conseguia repetir que sua mãe havia ido embora. Sabendo que ela nunca mais voltaria, tentou entrar no quarto. Mas Bernadete a impediu.
Tentando acalmá-la, a mulher disse que mais tarde voltariam a vê-la.
Ao ouvir isso, Lara se acalmou, mas Lorena e Luís, por estarem assustados, começaram a chorar.
Foi então que Lindolfo, percebendo a confusão, começou a se aproximar. Pressentindo que havia algo errado, quando finalmente conversou com Bernadete, descobriu que Lizandra, já estava morta.
Ao ouvir isso, caiu em desespero. Culpado, começou a chorar. E entre lágrimas e soluços, culpou os médicos por não ter podido vê-la pela última vez.
Por conta disso, carregaria pelo resto da vida, a culpa pelo mal que causou a esposa.
Em razão disso, com derradeira homenagem, cuidou de todos os detalhes do velório e do enterro. Como Lizandra sempre viveu em Arco Verde, Lindolfo decidiu que lá, é que seria seu enterro.
E assim, cuidou pessoalmente do traslado do corpo. Auxiliado por seus amigos, cuidou para fosse celebrada uma missa de corpo presente, para encomendar a alma da esposa.
Sentido com a morte da esposa, Lindolfo ficou perdido diante da responsabilidade em educar os filhos. Neste momento de dor, como deveria agir? Afinal, eles, que haviam visto a mãe morrer, deviam estar profundamente assustados. Seria conveniente que eles estivessem presentes no velório?
Em dúvida sobre como proceder, Lindolfo resolveu consultar Bernadete, a qual, nos últimos tempos, esteve cuidando de seus filhos. Além do mais, ela praticamente os vira nascer, e ao contrário dele, sempre esteve presente na vida deles. Por isso, era a pessoa indicada para sanar suas dúvidas.
Bernadete, então, ao ouvir a pergunta do patrão, recomendou-lhe que não levasse as crianças no velório. Mas se ele realmente fazia questão, que deixasse para ela e Marlene levar. Assim, veriam a mãe, e depois retornariam para casa.
Isso por que, Bernadete prometeu a Lara, que esta veria sua mãe pela última vez.
No entanto, Marlene e Bernadete precisariam explicar as crianças, o que sucedera a mãe delas.
E assim, incumbida desta obrigação, Bernadete então lhes explicou, o que havia ocorrido.
Inconsoláveis, tanto Lorena quanto Lara, choraram muito. Já Luís, por ser muito pequeno, não entendia ainda o por que de tudo aquilo. Mas ao ver as irmãs chorando, ficou assustado e acabou chorando também.
E assim, no final da tarde, Bernadete, Marlene e as crianças foram até a igreja, velar o corpo da mãe. Depois, acompanharam o cortejo fúnebre e jogaram flores em seu túmulo.
Apesar desta prática não ser comum na época, Lindolfo fez questão de ver os filhos no enterro.
Por isso, ao consentir que os filhos estivessem presentes no velório e no enterro, foi duramente criticado. Acusado de expor as crianças a uma situação dolorosa, foi taxado de irresponsável e considerado despreparado para cuidar das crianças.
Por conta disso, após a morte da esposa, passou a sofrer uma dura perseguição, por parte de seus sogros.
Revoltados com a morte da filha, tentaram seguidas vezes, tirar as crianças de sua casa. Contudo, amparado pelos amigos advogados, e visto ser pessoa influente no local, Lindolfo conseguia sempre, reverter a situação a seu favor.
Seus sogros, além do mais, não reuniam condições para cuidar de três crianças pequenas. Por já possuírem uma certa idade, já não tinham energia suficiente para cuidar de tantas crianças juntas.
Além disso, após alguns meses viúvo, Lindolfo acabou por encontrar uma nova companheira.
Andréia, que mais tarde se tornou sua esposa, era a pessoa ideal para cuidar de seus filhos. Dos filhos de seu casamento anterior.
Um pouco antes disso, Lindolfo, pesaroso com o falecimento da esposa, procurando se retratar e diminuir um pouco sua culpa, terminou o relacionamento de anos que manteve com Thereza.
Contudo a despeito, do rompimento dos dois, assumiu com a ex-amante, o compromisso de ajudar a manter as meninas. Nada lhes faltaria.
E assim o fez. Cumpriu com o prometido.
No entanto, a despeito disso, nunca mais, foi ver as filhas.
Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário