Na rua, os carros
No céu, o sol e a chuva
O telefone tocou
Na mente fantasia...
Você me ligou
Naquela tarde vazia
E me valeu o dia (2x)
Pela janela, vejo fumaça, vejo pessoas...
Na rua, os carros
No céu, o sol e a chuva
O telefone tocou
Na mente fantasia...
Você me ligou, naquela tarde vazia
Na mente fantasia (2x)
Você me ligou
Naquela tarde vazia
E me valeu o dia...
Valeu o dia! (2x)
Você me ligou, naquela tarde vazia
Na mente fantasia (2x)
Podia ter muitas garotas
Mas você é diferente
Você me ligou, naquela tarde vazia
E me valeu o dia
Valeu o dia! (2x)
Na mente fantasia (2x)
Cantando a melodia (2x)
(IRA – Tarde Vazia)”
Encontrando-se só, Flávio ficou a lembrar de uma tarde em que sua amada resolveu telefonar-lhe, contando as novidades do dia.
Feliz, a moça comentou que havia conseguido arrumar um emprego em sua área de formação e que dentro em breve começaria a trabalhar.
Para Flávio, que se encontrava sozinho, ouvir aquelas palavras, foram como um bálsamo a aplacar seus momentos de solidão.
Isto porque ele, gostava muito de Letícia, mas sempre que tentava dizê-lo, acontecia alguma coisa para interrompê-lo.
Não que o mesmo fosse tímido, mas as circunstâncias não ajudavam muito.
A fama de cobiçado, também não ajudava muito.
Não que Letícia soubesse se essa fama correspondia a realidade. Apenas não acreditava que alguém tão bonito pudesse se interessar por ela. Em que pesem suas qualidades.
Sim por que Letícia era bela.
Embora não tivesse uma beleza estonteante, era bonita, sim.
Mas uma beleza comum. Mas num mundo em que não existem tantas coisas e pessoas bonitas, conseguia se sobressair.
Tanto que era alvo de uma certa inveja. Inveja por sua beleza, por sua simpatia, por sua inteligência.
Talvez a inteligência e seu temperamento espirituoso, sejam o que mais tenham cativado Flávio.
Pois bem, naquela tarde, um simples telefone iluminou todo o seu dia.
Ouvir a voz de Letícia foi como um raio de luz penetrando a escuridade da sala.
Isto por que Flávio estava desiludido com o rumo que as coisas estavam tomando. Estava desesperançado do amor.
Esperava encontrar alguém especial. Alguém com que dividir os sonhos, os aborrecimentos, as desilusões, as alegrias, os momentos maravilhosos a dois.
Em todos os relacionamentos, apenas amores mornos, alguns desentendimentos.
Será que viver a dois é só tédio e aborrecimento?
Recusava a acreditar nisto.
Mas estava perdendo a esperança de encontrar alguém especial. Afinal de contas, já contava com mais de trinta anos.
Já não era mais um garoto sonhador. Era um homem feito. Vivido e experiente.
Mesmo assim, ainda acreditava que poderia encontrar uma espécie de princesa.
Uma versão masculina para a história do príncipe encantado das mulheres.
E assim, mesmo sendo objeto de cobiça, continuava só.
Este assédio não o entusiasmava. Acreditava que o que era objeto de cobiça era sua aparência, não ele.
Desta forma, ao aparecer Letícia em sua vida, encantou-se. Moça simples, encantadora. Como já foi dito, bonita, inteligente. Aplicada, estudiosa.
E o mais importante, não ficou deslumbrada com Flávio, como a maioria das mulheres que se aproximavam, dele ficavam.
Mas voltando ao telefonema, Letícia comentou com Flávio que começaria a trabalhar com direito ambiental. Havia conseguido um emprego em uma repartição pública especializada no assunto.
Comentou que havia mais de um ano que vinha realizando concursos públicos.
Ao ouvir aquela voz agradável proferindo boas novas, Flávio respondeu:
- Que maravilha! E quando você começa a trabalhar?
Letícia comentou que segunda-feira começaria a pegar no batente.
Flávio sabia o quanto isto era importante para a moça.
Isto por que, acompanhava já há algum tempo o desencantamento de Letícia com seu atual trabalho. Sabia que a moça não estava feliz trabalhando num escritório de direito e contabilidade.
Por conta disto Flávio sempre dizia que ela não deveria desistir daquilo que queria.
Algumas vezes chegou a vê-la chorando por conta de sua insatisfação com o trabalho.
Sempre prestativo, dizia que ela deveria continuar procurando um emprego mais condizente com sua formação, e que mais cedo ou mais tarde, uma oportunidade apareceria.
Letícia sempre foi grata pelos conselhos.
Durante algum tempo, os dois trabalharam juntos, e foi aí que começou uma grande amizade.
Já se conheciam há uns dois anos, quando Flávio já era advogado há algum tempo, e ela estagiou no mesmo escritório de advocacia e contabilidade em que ele trabalhava.
No atual momento estava começando a advogar em um escritório de advocacia e contabilidade indicado por ele. Porém, em que pesem as expectativas, a moça não estava satisfeita com o trabalho. Letícia já havia percebido há muito tempo, que a advocacia não era sua praia.
Flávio já havia percebido isto. Razão pela qual estava feliz pelo fato de a moça ter passado em um concurso público.
Nisto, durante a ligação, ele comentou que estava trabalhando muito em uma causa cível, que se fosse bem sucedida renderia muito dinheiro. Comentou sobre a demora do processo, sobre o valor vultoso dos recursos interpostos, e que este certamente levaria alguns anos para ser encerrado.
Comentou que fora convidado para ser sócio no escritório.
Letícia comentou que esta era uma ótima notícia. E emendou:
- Que ótimo! Então não sou só eu que tenho uma notícia boa.
Flávio respondeu:
- Pois é! Então .... Por que já que ambos temos ótimas novidades e coisas boas para comemorar não saímos um dia desses para celebrar o momento? Já faz tanto tempo em que não nos encontramos pessoalmente.
- É verdade! Tenho andado em falta com você. Mas não é por culpa minha. É que minha vida virou uma roda viva nos últimos meses, justamente por conta deste novo emprego. Estou me desdobrando entre meu trabalho no escritório de contabilidade e providenciando a documentação necessária para começar a trabalhar na repartição.
- Ah, é por isso então, que eu quase nunca encontro a senhorita em casa nos finais de semana?
Letícia riu:
- Sim, é exatamente por isso. Todo mês pelo menos dois domingos são para fazer provas.
Nisto, percebendo que a conversa estava se encaminhando para outro lado, retrucou:
- Ei, e o meu convite?
Letícia meio sem jeito, respondeu que aquele mês estava complicado para ela.
Mas Flávio insistiu.
A moça percebendo que seria indelicado recusar, concordou.
Porém, argumentando que não seria possível agendar um compromisso para aquele mês, comentou que assim que pudesse ligaria para que eles pudessem marcar o encontro.
Flávio respondeu que ficaria esperando.
E assim, Letícia se despediu de Flávio com um até breve.
Ao desligar o telefone, após se despedir de Letícia, sentiu-se de alma leve. Pode-se dizer até feliz.
Acreditava estar dando o primeiro passo em direção a algo mais sério.
Já nem sabia dizer a quanto tempo gostava dela.
Talvez desde o momento em passou a conhecê-la melhor.
Como não sentiu receptividade por parte dela, acabou por começar um namoro que não durou um ano sequer.
Carolina até parecia interessada em Flávio, mas o moço não demonstrava o mesmo entusiasmo na relação.
Certa vez, ao perceber a frieza com que atendera o telefonema da namorada, Bruno mesmo temendo a indiscrição, comentou que não sentia entusiasmo dele com relação ao namoro.
Flávio por sua vez, tentou desconversar mas sabia que seu colega Bruno estava certo.
Tanto que semanas após, o casal decidiu terminar o relacionamento.
Carolina, percebendo que não havia contrapartida por parte de Flávio em relação ao relacionamento, foi quem tomou a iniciativa de romper a relação.
O moço por sua vez, sentiu-se culpado por não corresponder ao sentimento que ela nutria por ele.
Tanto que Flávio só tranqüilizou-se em relação a Carolina, quando descobriu que a moça estava de casamento marcado com um rapaz que fora seu namorado nos tempos da adolescência.
Acreditava que se a moça estava reatando os laços com alguém que fora tão importante em seu passado, é por que o que existiu entre ambos devia ser muito forte.
Com isto, passadas algumas semanas, o moço recebeu o convite de casamento de Carolina.
Flávio ficou muito feliz com a notícia.
Carlos indiscretamente, chegou até a perguntar se ele não estava arrependido de deixar a moça escapar.
Flávio por sua vez respondeu que agora ela estava ao lado de uma pessoa que a amava de verdade, e que não poderia haver algo melhor do que isto. Dizendo que tinha muito carinho por ela, comentou que sentiu a separação no começo, mas que agora estava aliviado.
Mas voltando ao assunto principal...
Naquela tarde, estava se sentindo verdadeiramente só. Aborrecido com o rumo que sua vida pessoal estava tomando, já começava a acreditar que nunca encontraria uma pessoa legal, com quem tivesse afinidades.
Flávio estava triste.
Porém pensando em Letícia, acreditou que com ela as coisas seriam diferentes.
Pensando consigo mesmo, disse que ele e a moça tinham muito em comum.
Isto por que, no tempo em que Letícia trabalhou no escritório de advocacia e contabilidade, os dois conversavam bastante.
Foi lá que Flávio descobriu que a moça adorava MPB, seus principais expoentes, como Caetano Veloso, Gilberto Gil.
Nisto Flávio comentou que seu pai se chamava Gilberto.
Letícia ficou encantada com a coincidência. Dizendo que pai e filho tinham nomes de talentos da MPB perguntou como seus pais haviam escolhido seu nome.
Flávio respondeu então, que não havia nenhuma relação entre seu nome e o consagrado cantor de MPB de mesmo nome. Disse sim que seus pais gostavam do nome, acharam sonoro, e resolveram batizá-lo com ele.
Letícia comentou então que gostava do nome.
Flávio perguntou se ela gostava do cantor.
A moça respondeu que sim, que era um de seus cantores e compositores, predileto.
E assim, engataram uma conversa sobre Música Popular Brasileira.
Sempre que se encontravam nos corredores do escritório, trocavam entre si novidades sobre o cenário da música brasileira.
Certa vez Flávio comentou que estava ouvindo um cantor chamado Vander Lee e que estava adorando seu repertório, principalmente a música “Esperando Aviões”. Comentou também sobre uma cantora chamada Isabela Taviani, a qual considerou excepcional.
Letícia comentou que conhecia os cantores. Ótimos. Foi então que afirmou que o Brasil era pródigo em artistas da palavra. Cantores, compositores, poetas e escritores.
Flávio concordou.
- De fato, o Brasil é uma terra muito abençoada de talento nas letras, sejam elas cantadas, faladas ou escritas. Pena que isto não se reverta em uma boa formação cultural das pessoas.
Letícia igualmente concordou. Respondeu que no Brasil a cultura é considerada algo como supérfluo, perfumaria. O que achava uma pena. Contou que admirava quem conseguia sobreviver da arte num Brasil onde a cultura é tão pouco valorizada.
Flávio então, aproveitou para elogiar o espírito de luta e a garra dos brasileiros que escolhem viver da arte, mesmo em meio a tantas dificuldades. Disse que não fosse a persistência e a garra de tantos artistas, não seria possível a existência de uma cantora do porte de Elis Regina, entre outros tantos vultos.
Letícia comentou que também adorava uma cantora de nome Maria Rita, filha da citada cantora. Admirada com o talento da moça, comentou que ela não ficava em nada a margem da mãe, embora considerasse que não cabiam comparações entre elas.
Flávio respondeu então que eram talentos diferenciados. Comentou também sobre os livros de poesia que já lera como Camões, Castro Alves e seu “Navio Negreiro”, clamando para que Andrada arrancasse o pendão dos ares. A bandeira, pavilhão nacional, símbolo da nação. E que Colombo fechasse a porta de seus mares.
Dando continuidade a idéia do bardo, comentou que custava a acreditar que as nações, mesmo as mais desenvolvidas, estiveram envolvidas até o pescoço com a escravidão. Ressaltou que muitos reflexos da desigualdade social, sentidos até hoje nesta terra, são reflexos desse tempo de vergonha.
Letícia emendou dizendo que a libertação dos escravos tampouco resolveu o problema. Isto por que os negros foram libertados, ao menos aparentemente, mas não tiveram nenhuma paga pelo tempo em estiveram cativos. Foram libertados e mandados embora sem garantias, sem terem para onde ir, o que comer. Resultado, foram postos à margem da sociedade, passaram a viver em morros. Longe da dita civilização branca. Entregues ao Deus dará.
Ao ouvir tais palavras, Flávio comentou que eles tinham muito em comum. Ressaltou que gostavam das mesmas coisas, das mesmas músicas, filmes, livros.
De fato Letícia também gostava de ler. Comentou que adorava poesias, embora não conhecesse muitas. Disse que sempre que tinha tempo para se ocupar de coisas que não estavam relacionadas aos estudos jurídicos, gostava de ler. Isto para ela era uma higiene mental.
Decepcionada, chegou até a comentar que fazia tempo que não lia um bom livro. Comentou que estava se ocupando de seus estudos.
Disse ainda que já lera Machado de Assis, e que por isto não gostaria de cultivar as rabugens do pessimismo. Ressalvou que assim que tivesse tempo, voltaria a ler alguma coisa de literatura.
Flávio comentou que já havia lido “Dom Casmurro”, e “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, além de “Quincas Borba”.
Letícia disse que também gostava de José de Alencar, Joaquim Manoel de Macedo, Jorge Amado.
Certa vez conversaram sobre Luiz Vaz de Camões e a epopéia “Os Lusíadas”. Flávio comentou que não se esquecia do início da obra. Falou dos barões assinalados e do engenho e da arte. Entusiasmado com a conversa, comentou que o engenho e a arte foram de Camões, para escrever algo tão inspirado.
Flávio comentou que gostava das poesias de Camões, mas também gostava da poesia brasileira. Dos clássicos como Castro Alves, Álvares de Azevedo entre outros. Comentou que estava em falta com os poetas contemporâneos, conhecendo pouco de sua poesia.
Letícia chegou a comentar certa vez que havia na MPB muitos bons poetas, lindas letras de músicas.
Flávio brincou dizendo que estas pessoas existiam para tornar a poesia uma coisa mais acessível.
Adoravam conversar sobre estas coisas, música, livros e até filmes.
Flávio lembrou-se que ambos já haviam saído juntos algumas vezes para assistir peças de teatro, para ir ao cinema, etc.
Durante estes passeios, conversavam sobre os livros que leram, que gostariam de ler, as músicas que gostavam, e as melodias que tocavam nas rádios.
Criticavam o gosto duvidoso dominante nas músicas atuais. Que os bons cantores e compositores estavam soterrados em meio a tanto mal gosto. Que era difícil ouvir música de boa qualidade nos últimos tempos, e que muitos artistas estão divulgando seus novos trabalhos na internet.
- Ainda bem que inventaram a rede mundial de computadores! – comentou Flávio.
Flávio gostava da companhia de Letícia e vice-versa.
Adoravam sair juntos por que tinham interesses em comum.
Certa vez o próprio Flávio comentou que nenhuma de suas namoradas gostava das mesmas coisas que ele. Respondeu que a única pessoa com que possuía algum interesse em comum, fora Carolina, que gostava de algumas cantoras de MPB de que ele gostava, mas que o interesse comum terminava aí, já que a moça não gostava de ir a shows, e tirando as cantoras de seu interesse, só gostava de ouvir música pop americana. O que ele particularmente disse que detestava.
Tentando criar um gancho para mencionar que Letícia era uma ótima companhia, disse mais uma vez que o gosto pessoal de ambos, combinava.
Sutil, comentou que adorava quando eles saíam juntos.
Vicente, Francisco, Cleide, Bruno, Leandro e Carlos, já haviam percebido o interesse de Flávio por Letícia.
Certa vez Cleide perguntou para Flávio se eles estavam namorando.
O moço respondeu que não.
O tempo porém, faria com as coisas mudassem.
Depois de uma série de convites para ir ao cinema e ao teatro, e comentários sobre os filmes e peças teatrais que assistiram, a coisa foi evoluindo para shows...
Um beijo deu início a tudo.
Para surpresa de Flávio, Letícia correspondeu ao beijo.
O moço ficou feliz.
Letícia ficou um tanto surpresa com a reação de Flávio, mas decidiu corresponder ao beijo.
Flávio comentou então, que estavam namorando.
Letícia respondeu que não sabia.
O moço riu.
Quando Karina soube do namoro do casal, ficou eufórica.
Isto por que desconfiava já há algum tempo que estava acontecendo algo entre os dois. Em mais de uma oportunidade comentou com a filha que toda aquela dedicação só poderia ter um significado, o moço estava interessado nela.
Mas até a relação chegar neste ponto, levou algum tempo.
Flávio continuava pensando em sua vida...
Mais vez sozinho, Flávio resolveu tomar um banho.
Antes disto, lembrou-se de quando ele e Letícia ficaram sozinhos pela primeira vez em seu apartamento. De quando se olharam daquele jeito quente, sem desgrudarem os olhos um do outro.
Foi num destes instantes mágicos que a moça, (depois de se abraçarem, beijarem, se tocarem, se amarem) tocou seu rosto, e olhando fixamente para seus olhos, disse-lhe que havia uma música de Flávio Venturini, a qual parecia ter sido feita especialmente para ele.
Intrigado ele quis saber que música poderia ser esta.
- Descubra você. – respondeu ela, provocativa.
- Provavelmente ele criou uma composição pensando em uma mulher.
Letícia retrucou:
- Mas a música se casa perfeitamente com você!
Flávio ficou por semanas pensando de que música ela estava falando.
Curioso, perguntou inúmeras vezes a ela sobre o que ela estava falando. Que música poderia ser?
Mais Letícia não contava. Gostava de vê-lo curioso.
Um dia porém, acreditando haver encontrado uma boa ocasião para comentar sobre a aludida música, a moça falou o nome da música.
Flávio pediu para ela cantar a música, mas a moça titubeou.
Contudo, após certa insistência do moço, ela acabou cantando.
E assim mais tarde ela cantaria a canção “O Melhor do Amor”:
“Amo teus olhos castanhos da cor verde mel.
Devoro.
Teus olhos encantos tamanhos, que são o prazer dos meus.
Amo o riso mais lindo que Deus já criou.
Adoro.
Teus olhos de seda e de rosa que são o melhor do amor.
Olhos que falam de amar, na beira do mar, das estrelas.
Olhos que tiram do mar, a luz, a cor.
Quem te fez, soube combinar o tom, dos olhos de mel com a pele marrom.
Luz marrom, onde se escondeu o mar, que eu só eu vi, no teu olhar.
Mar de corais.
Verde mel, letais.
Amo a pele morena do teu corpo nu.
Adoro.
Teus pêlos, as coxas, os olhos que são o melhor do amor.
Olhos que falam de amar, na beira do mar, das estrelas.
Olhos que tiram do mar, a luz, a cor.
Quem te fez, soube combinar o tom, dos olhos de mel com a pele marrom.
Luz marrom, onde se escondeu o mar, que eu só eu vi, no teu olhar.
Mar de corais.
Verde mel, letais.”
O homem ficou encantado.
Desta forma, Letícia revelou o segredo em um das muitas noites de amor que o casal teve.
Flávio comentou então, que adorava as composições de seu xará, mas não conseguia descobrir a qual delas a moça se referia, já que quase todas falavam ao coração.
Chegou até a pensar que seria “Noites com Sol”, canção pela qual era apaixonado.
Flávio disse-lhe que quando eles estavam abraçados juntos na cama, ou quando dormiam abraçados numa rede, como fizeram em uma ida ao litoral, onde ficou apreciando as estrelas no firmamento, chegou a desejar noites com sol.
Foi então que começou a cantar:
“Ouvi dizer que são milagres
Noites com sol
Mas hoje eu sei não são miragens
Noites com sol
Posso entender o que diz a rosa
Ao rouxinol
Peço um amor que me conceda
Noites com sol
Onde só tem o breu
Vem me trazer o sol
Vem me trazer amor
Pode abrir a janela
Noites com sol e neblina
Deixa rolar nas retinas
Deixa entrar o sol
Livre será se não te prendem
Constelações
Então verás que não se vendem
Ilusões
Vem que eu estou tão só
Vamos fazer amor
Vem me trazer o sol
Vem me livrar do abandono
Meu coração não tem dono
Vem me aquecer nesse outono
Deixa o sol entrar
Pode abrir a janela
Noites com sol são mais belas
Certas canções são eternas
Deixa o sol entrar.
Noites Com Sol - Flávio Venturini - Composição: Flávio Venturini/Ronaldo Bastos”
Letícia riu:
- Que romântico!
E beijou-lhe a face.
Os olhos castanhos claros de Flávio, ficaram marejados.
Mais uma vez Flávio tinha a certeza que a indiferença inicial de Letícia era um jeito “Falso Blasé”, de dizer que o amava.
Tão certo quanto ela era uma figura rara.
Naquela tarde, estava se sentindo verdadeiramente só. Aborrecido com o rumo que sua vida pessoal estava tomando, já começava a acreditar que nunca encontraria uma pessoa legal, com quem tivesse afinidades.
Flávio estava triste.
Porém pensando em Letícia, acreditou que com ela as coisas seriam diferentes.
Pensando consigo mesmo, disse que ele e a moça tinham muito em comum.
Isto por que, no tempo em que Letícia trabalhou no escritório de advocacia e contabilidade, os dois conversavam bastante.
Foi lá que Flávio descobriu que a moça adorava MPB, seus principais expoentes, como Caetano Veloso, Gilberto Gil.
Nisto Flávio comentou que seu pai se chamava Gilberto.
Letícia ficou encantada com a coincidência. Dizendo que pai e filho tinham nomes de talentos da MPB perguntou como seus pais haviam escolhido seu nome.
Flávio respondeu então, que não havia nenhuma relação entre seu nome e o consagrado cantor de MPB de mesmo nome. Disse sim que seus pais gostavam do nome, acharam sonoro, e resolveram batizá-lo com ele.
Letícia comentou então que gostava do nome.
Flávio perguntou se ela gostava do cantor.
A moça respondeu que sim, que era um de seus cantores e compositores, predileto.
E assim, engataram uma conversa sobre Música Popular Brasileira.
Sempre que se encontravam nos corredores do escritório, trocavam entre si novidades sobre o cenário da música brasileira.
Certa vez Flávio comentou que estava ouvindo um cantor chamado Vander Lee e que estava adorando seu repertório, principalmente a música “Esperando Aviões”. Comentou também sobre uma cantora chamada Isabela Taviani, a qual considerou excepcional.
Letícia comentou que conhecia os cantores. Ótimos. Foi então que afirmou que o Brasil era pródigo em artistas da palavra. Cantores, compositores, poetas e escritores.
Flávio concordou.
- De fato, o Brasil é uma terra muito abençoada de talento nas letras, sejam elas cantadas, faladas ou escritas. Pena que isto não se reverta em uma boa formação cultural das pessoas.
Letícia igualmente concordou. Respondeu que no Brasil a cultura é considerada algo como supérfluo, perfumaria. O que achava uma pena. Contou que admirava quem conseguia sobreviver da arte num Brasil onde a cultura é tão pouco valorizada.
Flávio então, aproveitou para elogiar o espírito de luta e a garra dos brasileiros que escolhem viver da arte, mesmo em meio a tantas dificuldades. Disse que não fosse a persistência e a garra de tantos artistas, não seria possível a existência de uma cantora do porte de Elis Regina, entre outros tantos vultos.
Letícia comentou que também adorava uma cantora de nome Maria Rita, filha da citada cantora. Admirada com o talento da moça, comentou que ela não ficava em nada a margem da mãe, embora considerasse que não cabiam comparações entre elas.
Flávio respondeu então que eram talentos diferenciados. Comentou também sobre os livros de poesia que já lera como Camões, Castro Alves e seu “Navio Negreiro”, clamando para que Andrada arrancasse o pendão dos ares. A bandeira, pavilhão nacional, símbolo da nação. E que Colombo fechasse a porta de seus mares.
Dando continuidade a idéia do bardo, comentou que custava a acreditar que as nações, mesmo as mais desenvolvidas, estiveram envolvidas até o pescoço com a escravidão. Ressaltou que muitos reflexos da desigualdade social, sentidos até hoje nesta terra, são reflexos desse tempo de vergonha.
Letícia emendou dizendo que a libertação dos escravos tampouco resolveu o problema. Isto por que os negros foram libertados, ao menos aparentemente, mas não tiveram nenhuma paga pelo tempo em estiveram cativos. Foram libertados e mandados embora sem garantias, sem terem para onde ir, o que comer. Resultado, foram postos à margem da sociedade, passaram a viver em morros. Longe da dita civilização branca. Entregues ao Deus dará.
Ao ouvir tais palavras, Flávio comentou que eles tinham muito em comum. Ressaltou que gostavam das mesmas coisas, das mesmas músicas, filmes, livros.
De fato Letícia também gostava de ler. Comentou que adorava poesias, embora não conhecesse muitas. Disse que sempre que tinha tempo para se ocupar de coisas que não estavam relacionadas aos estudos jurídicos, gostava de ler. Isto para ela era uma higiene mental.
Decepcionada, chegou até a comentar que fazia tempo que não lia um bom livro. Comentou que estava se ocupando de seus estudos.
Disse ainda que já lera Machado de Assis, e que por isto não gostaria de cultivar as rabugens do pessimismo. Ressalvou que assim que tivesse tempo, voltaria a ler alguma coisa de literatura.
Flávio comentou que já havia lido “Dom Casmurro”, e “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, além de “Quincas Borba”.
Letícia disse que também gostava de José de Alencar, Joaquim Manoel de Macedo, Jorge Amado.
Certa vez conversaram sobre Luiz Vaz de Camões e a epopéia “Os Lusíadas”. Flávio comentou que não se esquecia do início da obra. Falou dos barões assinalados e do engenho e da arte. Entusiasmado com a conversa, comentou que o engenho e a arte foram de Camões, para escrever algo tão inspirado.
Flávio comentou que gostava das poesias de Camões, mas também gostava da poesia brasileira. Dos clássicos como Castro Alves, Álvares de Azevedo entre outros. Comentou que estava em falta com os poetas contemporâneos, conhecendo pouco de sua poesia.
Letícia chegou a comentar certa vez que havia na MPB muitos bons poetas, lindas letras de músicas.
Flávio brincou dizendo que estas pessoas existiam para tornar a poesia uma coisa mais acessível.
Adoravam conversar sobre estas coisas, música, livros e até filmes.
Flávio lembrou-se que ambos já haviam saído juntos algumas vezes para assistir peças de teatro, para ir ao cinema, etc.
Durante estes passeios, conversavam sobre os livros que leram, que gostariam de ler, as músicas que gostavam, e as melodias que tocavam nas rádios.
Criticavam o gosto duvidoso dominante nas músicas atuais. Que os bons cantores e compositores estavam soterrados em meio a tanto mal gosto. Que era difícil ouvir música de boa qualidade nos últimos tempos, e que muitos artistas estão divulgando seus novos trabalhos na internet.
- Ainda bem que inventaram a rede mundial de computadores! – comentou Flávio.
Flávio gostava da companhia de Letícia e vice-versa.
Adoravam sair juntos por que tinham interesses em comum.
Certa vez o próprio Flávio comentou que nenhuma de suas namoradas gostava das mesmas coisas que ele. Respondeu que a única pessoa com que possuía algum interesse em comum, fora Carolina, que gostava de algumas cantoras de MPB de que ele gostava, mas que o interesse comum terminava aí, já que a moça não gostava de ir a shows, e tirando as cantoras de seu interesse, só gostava de ouvir música pop americana. O que ele particularmente disse que detestava.
Tentando criar um gancho para mencionar que Letícia era uma ótima companhia, disse mais uma vez que o gosto pessoal de ambos, combinava.
Sutil, comentou que adorava quando eles saíam juntos.
Vicente, Francisco, Cleide, Bruno, Leandro e Carlos, já haviam percebido o interesse de Flávio por Letícia.
Certa vez Cleide perguntou para Flávio se eles estavam namorando.
O moço respondeu que não.
O tempo porém, faria com as coisas mudassem.
Depois de uma série de convites para ir ao cinema e ao teatro, e comentários sobre os filmes e peças teatrais que assistiram, a coisa foi evoluindo para shows...
Um beijo deu início a tudo.
Para surpresa de Flávio, Letícia correspondeu ao beijo.
O moço ficou feliz.
Letícia ficou um tanto surpresa com a reação de Flávio, mas decidiu corresponder ao beijo.
Flávio comentou então, que estavam namorando.
Letícia respondeu que não sabia.
O moço riu.
Quando Karina soube do namoro do casal, ficou eufórica.
Isto por que desconfiava já há algum tempo que estava acontecendo algo entre os dois. Em mais de uma oportunidade comentou com a filha que toda aquela dedicação só poderia ter um significado, o moço estava interessado nela.
Mas até a relação chegar neste ponto, levou algum tempo.
Flávio continuava pensando em sua vida...
Mais vez sozinho, Flávio resolveu tomar um banho.
Antes disto, lembrou-se de quando ele e Letícia ficaram sozinhos pela primeira vez em seu apartamento. De quando se olharam daquele jeito quente, sem desgrudarem os olhos um do outro.
Foi num destes instantes mágicos que a moça, (depois de se abraçarem, beijarem, se tocarem, se amarem) tocou seu rosto, e olhando fixamente para seus olhos, disse-lhe que havia uma música de Flávio Venturini, a qual parecia ter sido feita especialmente para ele.
Intrigado ele quis saber que música poderia ser esta.
- Descubra você. – respondeu ela, provocativa.
- Provavelmente ele criou uma composição pensando em uma mulher.
Letícia retrucou:
- Mas a música se casa perfeitamente com você!
Flávio ficou por semanas pensando de que música ela estava falando.
Curioso, perguntou inúmeras vezes a ela sobre o que ela estava falando. Que música poderia ser?
Mais Letícia não contava. Gostava de vê-lo curioso.
Um dia porém, acreditando haver encontrado uma boa ocasião para comentar sobre a aludida música, a moça falou o nome da música.
Flávio pediu para ela cantar a música, mas a moça titubeou.
Contudo, após certa insistência do moço, ela acabou cantando.
E assim mais tarde ela cantaria a canção “O Melhor do Amor”:
“Amo teus olhos castanhos da cor verde mel.
Devoro.
Teus olhos encantos tamanhos, que são o prazer dos meus.
Amo o riso mais lindo que Deus já criou.
Adoro.
Teus olhos de seda e de rosa que são o melhor do amor.
Olhos que falam de amar, na beira do mar, das estrelas.
Olhos que tiram do mar, a luz, a cor.
Quem te fez, soube combinar o tom, dos olhos de mel com a pele marrom.
Luz marrom, onde se escondeu o mar, que eu só eu vi, no teu olhar.
Mar de corais.
Verde mel, letais.
Amo a pele morena do teu corpo nu.
Adoro.
Teus pêlos, as coxas, os olhos que são o melhor do amor.
Olhos que falam de amar, na beira do mar, das estrelas.
Olhos que tiram do mar, a luz, a cor.
Quem te fez, soube combinar o tom, dos olhos de mel com a pele marrom.
Luz marrom, onde se escondeu o mar, que eu só eu vi, no teu olhar.
Mar de corais.
Verde mel, letais.”
O homem ficou encantado.
Desta forma, Letícia revelou o segredo em um das muitas noites de amor que o casal teve.
Flávio comentou então, que adorava as composições de seu xará, mas não conseguia descobrir a qual delas a moça se referia, já que quase todas falavam ao coração.
Chegou até a pensar que seria “Noites com Sol”, canção pela qual era apaixonado.
Flávio disse-lhe que quando eles estavam abraçados juntos na cama, ou quando dormiam abraçados numa rede, como fizeram em uma ida ao litoral, onde ficou apreciando as estrelas no firmamento, chegou a desejar noites com sol.
Foi então que começou a cantar:
“Ouvi dizer que são milagres
Noites com sol
Mas hoje eu sei não são miragens
Noites com sol
Posso entender o que diz a rosa
Ao rouxinol
Peço um amor que me conceda
Noites com sol
Onde só tem o breu
Vem me trazer o sol
Vem me trazer amor
Pode abrir a janela
Noites com sol e neblina
Deixa rolar nas retinas
Deixa entrar o sol
Livre será se não te prendem
Constelações
Então verás que não se vendem
Ilusões
Vem que eu estou tão só
Vamos fazer amor
Vem me trazer o sol
Vem me livrar do abandono
Meu coração não tem dono
Vem me aquecer nesse outono
Deixa o sol entrar
Pode abrir a janela
Noites com sol são mais belas
Certas canções são eternas
Deixa o sol entrar.
Noites Com Sol - Flávio Venturini - Composição: Flávio Venturini/Ronaldo Bastos”
Letícia riu:
- Que romântico!
E beijou-lhe a face.
Os olhos castanhos claros de Flávio, ficaram marejados.
Mais uma vez Flávio tinha a certeza que a indiferença inicial de Letícia era um jeito “Falso Blasé”, de dizer que o amava.
Tão certo quanto ela era uma figura rara.
Mas voltando ao banho, Flávio, atravessou todo o apartamento até chegar o banheiro da suíte.
No quarto despiu-se, jogando as roupas de qualquer jeito pelo chão, e depois entrou no banheiro.
O homem entrou então no chuveiro, ligou-o e começou a molhar o corpo e a se ensaboar.
Lembrar destes momentos felizes neste momento lhe fazia mal.
Acabara de brigar com Letícia por um motivo qualquer e acreditava que não voltariam a se entender.
Imerso nestes pensamentos, ficou a relembrar dos momentos que estiveram juntos.
Nisto, sem que percebesse, alguém sorrateiramente, entrara no apartamento.
Caminhando lentamente vasculhou o apartamento.
Ao perceber que Flávio se banhava, despiu-se, jogando as roupas pelo chão, e entrou no banheiro.
Distraído, o homem não percebeu sua presença.
Letícia abriu o box com todo o cuidado, e pegando o sabonete passou a ensaboar o corpo de Flávio.
Ele achou que estava sonhando.
Quando Letícia aproximou-se, e segurando-o pelos braços e beijou-o, percebeu que não se tratava de alucinação.
No rádio ligado se podia ouvir o cantor Dalton cantando:
“Hum, mas se um dia eu chegar muito estranho
Deixa essa água no corpo, lembrar nosso banho
Hum, mas se um dia eu chegar muito louco
Deixa esta noite saber, que um dia foi pouco
Uh, uh, cuida bem de mim
E então misture tudo, dentro de nós
Por que ninguém, vai dormir nosso sonho
Minha cara pra quê, tantos planos?
Se quero te amar, e te amar, e te amar muitos anos
Hum, tantas vezes eu quis ficar solto
Como se fosse uma lua a brincar no seu rosto
Uh, uh, cuida bem de mim
E então misture tudo, dentro de nós
Por que ninguém vai dormir nosso sonho ....”
Beijaram-se muito dentro do box, entre outras coisas.
Se amaram.
Flávio esfregou as costas de Letícia.
Estavam reconciliados.
Flávio e Letícia dormiram abraçados.
O moço já nem se lembrava mais do motivo bobo pelo qual brigara com a moça.
Não se lembrava mais da cena de ciúmes.
Da dramática cena em que chamou a atenção da moça por achar que ela estava dando atenção para um rapaz que não parava de olhar para ela.
Por conta deste motivo fútil, brigou com a moça e Letícia sem paciência, deixou-o falando sozinho.
Aquele encontro selara a reconciliação.
Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.
Nenhum comentário:
Postar um comentário