Poesias

terça-feira, 30 de março de 2021

CARINHOSO - PARTE I - CAPÍTULO XV

O homem então, comentou que a moça certamente não era uma interesseira, e que não havia motivos para tantas reservas. Argumentando que se ela gostava dele de verdade entenderia o que ocorrera, relatou que talvez num primeiro momento, ela ficasse decepcionada, mas que depois, acabaria compreendendo seus motivos.
Felipe não parecia convencido disto.
Mencionou que a moça tinha interesse em freqüentar uma faculdade.
Epaminondas achou interessante.
Felipe então, pediu auxílio ao parente.
Insistiu para que ele o ajudasse a encobrir a mentira por algum tempo.
Perguntou-lhe aflito se não poderia fingir ser seu motorista.
Epaminondas considerou toda a idéia um completo absurdo.
Felipe insistindo, comentou que ele poderia fazer ás vezes de empresário do Grupo Oliveira.
O homem continuou resistindo a idéia.
Felipe argumentou então, que ele não precisaria aparecer na empresa se não quisesse. Apenas precisava combinar com os empregados da casa e com sua família, a história.
Para todos os efeitos, Felipe era o motorista particular dele.
Epaminondas, ao ouvir toda a conversa, bem que tentou se recusar em ajudá-lo na idéia, mas acabou sendo convencido, por olhares suplicantes, e muitos por favor.
Mesmo contrariado, acabou concordando em auxiliar o rapaz.
Para isto no entanto, impôs algumas condições.
Epaminondas respondeu que a farsa não poderia durar muito tempo.
Felipe concordou. Argumentou que a mentirinha duraria menos tempo, do que ele imaginava.
Ocorre que inicialmente uma história mentirosa, a situação ganhou proporções maiores.
Para convencer a moça de que era motorista particular, Felipe passou a usar o uniforme do motorista de Epaminondas, e a dirigir para o tio.
Isto por que, certo dia, ao passar em frente ao imóvel do abastado parente de Felipe, Leila resolveu pedir licença e entrar.
Lá descobriu que Felipe não se encontrava, e que havia outro motorista na casa.
Leila chegou a pensar que o moço estava desempregado.
Uma das empregadas da casa, ciente da combinação de Felipe com o patrão, comentou que Felipe estava de licença, e que a pessoa que atendia como motorista particular, estava ocupando a função provisoriamente.
Leila ficou um tanto quanto desconfiada, mas como a empregada fora convincente, a moça acabou se convencendo da história.
Quem achava a história da farsa incrivelmente engraçada, eram os filhos de Epaminondas.
Ao conhecerem Leila, ficaram encantados com a beleza da moça.
Casados e com filhos, comentaram que entendiam por que o jovem primo havia se interessado pela moça.
Felipe por sua vez, conseguiu sustentar a história por algum tempo.
Conhecidos da moça, chegaram a ver Felipe lavando o carro da família.
Neste ínterim, a jovem apresentara o moço aos pais, a vizinhança, aos colegas de trabalho.
Leila por sua vez, conhecia todos os empregados de Epaminondas.
Contudo, não havia sido apresentada aos pais do moço.
Tal fato a deixava deveras incomodada.
Certo dia, ao andar pelas ruas de São Paulo, avistou alguém com o perfil de Felipe, muito bem vestido, e dirigindo um belo carro.
Ao mexer em seus pertences, Leila recordou-se do cartão que o moço lhe apresentou. Lembrou-se de ter sido informada ao ligar para o referido número, que a secretaria se referiria ao moço como senhor Felipe.
Curiosa, resolveu realizar uma ligação para o referido número.
Foi novamente atendida pela secretaria que lhe confirmou o fato de que Felipe era o motorista da empresa.
Leila então perguntou o nome do dono da empresa.
No que a secretaria, já devidamente instruída por Felipe, respondeu que era o senhor Epaminondas.
Leila por sua vez, agradeceu e desligou o telefone.
Contudo, em que pese a confirmação das informações, algo não soava bem.
Afinal de contas, se Felipe era apenas um motorista, como poderia ter um cartão da empresa e com o telefone da presidência?
Ao questionar isto com uma colega, ela acreditou que esta regalia se devia ao fato do moço prestar serviços ao dono da empresa.
Leila não ficou muito convencida disto.
Considerava estranho o fato.
Com isto, ao comentar o que vira com Felipe, o mesmo ficou apreensivo.
A moça percebeu.
Felipe por sua vez, tentando disfarçar o constrangimento, argumentou que se tivesse posses, não precisaria trabalhar de motorista para uma família. Alegou que ela se confundira vendo alguém parecido com ele.
Leila resolveu então mudar de assunto.
Saíram para dar uma volta.
Caminharam pelas ruas do centro da cidade.
Ruas amplas, muita área verde. Uma São Paulo de sonhos.
Juntos, foram ao cinema.
Assistiram ao um filme de Rita Hayworth.
Na saída do local, um conhecido de Felipe o reconheceu.
Animado, aproximou-se e perguntou-lhe do trabalho:
- Felipe! Há quanto tempo! Continua trabalhando como homem de negócios? Como vão as empresas?
O moço tentou se afastar do conhecido, sem êxito.
Leila ouvira as palavras do colega de Felipe.
Felipe cumprimentou então o rapaz, e argumentou que sua vida ia caminhando.
Pedindo licença a Leila, puxou o colega para um canto do estabelecimento e insistiu para que ele dissesse que o havia confundido com outra pessoa.
Olívio não entendeu nada.
Felipe pediu-lhe desculpas. Disse que a moça que o acompanhava, nem sequer sonhava que ele pudesse ser dono de uma empresa.
O moço ao ouvir isto, pediu desculpas. Argumentou porém, que por sua reação, Leila não acreditaria na história de engano. Mencionou que estava evidente que se conheciam.
Tentando ajudar, sugeriu dizer que havia um colega em comum, o qual havia prosperado, e que o havia convidado para ser seu sócio. Com isto, entrara com o trabalho, mas no momento de receber os dividendos, fora passado para trás. Daí a necessidade de continuar a trabalhar com motorista.
Felipe respondeu que sua sugestão era mais apropriada.
Com isto, o moço apresentou o colega.
Leila, visivelmente desconfiada, perguntou de onde eles se conheciam.
Felipe então contou-lhe a história que havia combinado com o colega.
A moça continuava desconfiada.
Felipe então, mencionou que havia feito um curso superior, mas que estava tendo trabalho para atuar na área.
Razão pela qual trabalhava como motorista particular.
Ao ouvir a história do moço, Leila sentiu um pouco de pena.
Argumentou que não sabia que ele havia se formado. Relatou que pouco conhecia de sua vida.
Felipe respondeu que se sentia envergonhado por não conseguir emprego em sua área de formação.
Mencionou que havia se formado em direito.
Ao ouvir isto, Leila perguntou se poderia informar seu nome para algum colega.
Relatou que tentaria ajudá-lo a encontrar trabalho.
Felipe agradeceu.
Por fim, o colega se afastou. Pediu desculpas pelo incômodo.
Nisto, caminhando pela capital paulistana, Leila comentou que pouco sabia dele.
Felipe respondeu um tanto sem jeito, que não tinha muito para contar, e que ela sabia o que era necessário.
Em dado momento ele pediu para que ela sempre fosse esforçada e que tentasse entender que ninguém era perfeito.
Leila ficou intrigada.
Ao tentar perguntar-lhe o que queria dizer com aquelas palavras, Felipe a interrompeu dizendo que precisavam voltar para casa, ou ficaria muito tarde.
Leila tentou fazer uma pergunta, mas o moço interrompeu-a dizendo que somente responderia perguntas no dia seguinte.
Ao ver a noite a se espraiar pela cidade, respondeu que apostava que chegariam em casa rapidamente.
Leila perguntou-lhe como poderia ter tanta certeza.
Felipe respondeu brincando que possuía poderes mágicos, e que faria surgir um ônibus na próxima esquina.
Nisto, chamou a moça para fazer uma pequena corrida.
Com efeito, ao lá chegarem, se depararam com um ônibus.
Leila respondeu que ele era impossível.
Desta forma, o casal chegou rapidamente em casa.
No dia seguinte, a pedido de Felipe, Epaminondas passou pelas empresas.
O moço precisava manter a farsa.
Razão pela qual passou parte da manhã em seu escritório e logo após, se encaminhou para a casa de Epaminondas.
Lá se ocupou em lavar o carro da família.
Nisto, quando Leila o viu, se convenceu de que ele realmente trabalhava ali.
Mesmo assim, perguntou-lhe por que ficara tão estranho.
Felipe respondeu que só estava preocupado com o futuro.
Mencionou que ela, sendo tão esforçada, vendo um fracassado ao seu lado, poderia perfeitamente se cansar dele e preferir alguém em uma condição social melhor.
Foi o suficiente para a moça se aborrecer e dizer-lhe que não estava interessada em homens endinheirados. Argumentou que sua dificuldade em arrumar trabalho na área era momentânea.
Felipe desculpou-se então com a moça.
Leila, esboçando um sorriso, respondeu-lhe que estava desculpado.
Se abraçaram.
Leila ao sair da mansão, ficou pensando qual seria a melhor forma para ajudar o moço.
Conversando na loja em que trabalhava, dias depois, descobriu que alguns colegas conheciam escritórios de advocacia, e que poderiam indicá-lo para trabalhar na área.
Um deles por sua vez, estranhou a dificuldade do rapaz.
Mencionou que o rapaz parecia esforçado, pelos relatos da moça, não justificando-se a dificuldade em arrumar trabalho.
Semanas depois, o moço recebeu uma proposta de emprego.
Quando soube o nome do empregador, Felipe ficou desesperado.
Isto por que, o moço fora seu colega de trabalho, e caso se apresentasse em seu escritório, sua farsa seria descoberta.
Preocupado, pediu um conselho ao tio, que recomendou-lhe contar toda a verdade a Leila.
Felipe respondeu que ainda não era o momento.
Diante disto, resolveu contatar o tal colega e contar o que estava acontecendo.
O moço achou graça quando Felipe contou que estava metido em uma grande confusão. Relatou que estava namorando uma moça e que ela acreditava que ele era bacharel em direito, mas que estava trabalhando como motorista, por não conseguir trabalho na área jurídica.
Clóvis argumentou que ele estava todo enrolado, e que a mentira não se sustentaria por muito tempo.
Felipe respondeu que não pretendia manter a mentira por muito tempo, mas não poderia revelar a verdade naquele momento. Argumentou que ela não entenderia.
Clóvis respondeu que ele estava encrencado. Contudo, tentando auxiliar o amigo, prometeu atendê-lo. Comentou que para todos os efeitos ele se encaminhava para uma entrevista. No entanto, ante as circunstancias, seria ridículo contratá-lo.
Felipe concordou e agradeceu o auxílio.
E assim, conforme o combinado, na data agendada, compareceu para a falsa entrevista.
Durante cerca de meia hora, ele e Clóvis ficaram conversando sobre os tempos da faculdade, a época em que passou a freqüentar os teatros.
Felipe contou-lhe que estava gostando de uma garota muito especial e que precisava desfazer a confusão em que havia se envolvido.
Clóvis aconselhou-a a não demorar para contar a verdade, posto que se ela descobrisse a verdade sozinha, seria muito pior.
Felipe respondeu que não demoraria.
Nisto, retornou para a empresa.
No final da tarde, ao se encontrar com Leila, a moça perguntou-lhe como havia se saído na entrevista.
Felipe respondeu-lhe que estava aguardando uma resposta para os próximos dias, mas sentia que havia se saído muito bem.
Com isto, perguntou a moça, o que ela faria caso descobrisse que poderia ganhar muito dinheiro.
Leila ficou intrigada.
Felipe insistiu. Perguntou-lhe o que faria caso aparecesse um homem muito rico em sua vida.
Leila respondeu que não estava entendendo.
Felipe indagou se ela não gostaria de viver uma vida confortável, com abundância.
Leila retrucou dizendo que sua vida era muito boa. Alegou que não precisava de muita coisa, não havendo necessidade de arrumar um marido rico.
Silenciou por alguns instantes.
Após, completou dizendo que não fazia questão de um riquinho metido a besta, e que ninguém a compraria com dinheiro.
Ao ouvir estas palavras, Felipe engoliu em seco.
Preocupado, respondeu que nem todos os ricos eram arrogantes e prepotentes. Afinal existem pessoas boas, em quaisquer lugares.
Leila concordou. Mas intrigada, indagou o porquê de todas aquelas perguntas.
Felipe respondeu que era apenas curiosidade.
Leila por sua vez, percebendo a expressão preocupada do moço, perguntou-lhe se estava tudo bem.
Como Felipe insistisse que tudo estava bem, Leila perguntou-lhe se havia algo que gostaria de dizer.
Constrangido, o moço respondeu que não.
Leila insistiu:
- Você tem certeza?
Felipe respondeu gaguejando:
- Não.
- Você está estranho!
Felipe então, percebendo o ar intrigado da moça, respondeu que eram preocupações com a entrevista, com seu emprego, mas que tudo acabaria bem. Argumentou que não queria tocar no assunto.
Leila concordou.
O moço então, convidou-a para um passeio nos arredores.
Leila concordou.
Felipe disse-lhe que gostava muito dela, e que com o tempo ela descobriria coisas a seu respeito, que a fariam se surpreender.
Abraçando-a, pediu desculpas por qualquer coisa.
Leila não sabia o que dizer.
Felipe pediu para que ela o abraçasse.
Mais tarde, o moço a deixou na porta de sua casa.
Ao entrar em casa, a moça ficou a pensar nas palavras ditas pelo rapaz.
Intrigada, perguntava-se o que estaria se passando com ele.
Angustiado Felipe pediu conselhos ao tio-avô.
Perguntou-lhe como fazia para contar a verdade a moça.
Epaminondas aconselhou-o a não prolongar a mentira. Recomendou-lhe que na próxima vez que se vissem, contasse tudo.
Felipe concordou.
Argumentou que não agüentava mais viver aquela vida dupla, e que se sentia sendo desleal com a moça, ao esconder-lhe a verdade.
Chegou a dizer que devia ter desfeito o equivoco desde o começo.
Epaminondas, colocando as mãos em seu ombro, respondeu-lhe que nunca era tarde para tanto.
Com isto, Felipe despediu-se do tio, e encaminhou-se para a empresa.
Passaria o dia trabalhando em seu escritório.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.   


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