Poesias

quinta-feira, 4 de março de 2021

A FLOR DO ALTO - CAPÍTULO 3

Por algum tempo Angélica ficou a pensar na história do filme.
Ficou a sonhar com um príncipe encantado.
Francelino, ao perceber o ar perdido da filha, ficou deveras preocupado.
Ângela porém, tentando tranqüilizá-lo, dizia que aquilo não passava de paixonite.
Contudo, em que pesem as palavras da esposa, o homem continuava preocupado.
Angélica por sua vez, continuava a assistir filmes, e ficava cada vez mais encantada por aquele universo. Achava-o mágico.
Era lá que todas as vicissitudes da vida eram sublimadas.
Era ali, naquela tela retangular, que todos os sonhos se tornavam realidade. Que a mediocridade não tinha lugar.
Angélica, cinéfila e fã de Rodolfo Valentino, acompanhava todos os seus filmes.
Encantou-se com a película “O Águia”, em que interpretou um herói anti-convencional, que roubava dos ricos. Uma espécie de Hobin Hood das estepes. Já no início do filme, o moço era um valoroso soldado russo, um cossaco, sendo assediado por sua czarina. Acossado, resolve voltar para casa.
Nisto descobre que sua família fora espoliada e que estava sendo procurado, pesando sobre si, a pena de fuzilamento, e o estigma de desertor.
Mas o herói não se abate. Transforma-se no Águia Negra, e defende os interesses dos russos explorados.
A certa altura do filme, para se vingar do homem que lhe causou tantos problemas – recebendo poderes da imperatriz, a czarina – faz-se passar por um preceptor francês, reencontrando a encantadora moça que encontrara em certa oportunidade.
A moça porém, é inflexível. Somente o aceita, quando descobre ser ele, o Águia Negra.
Encantada que ficara com o filme, a jovem contou todos os detalhes da fita, para sua mãe, Angélica.
Lúcia e Cláudia, também eram só encantamento com o moço.
No Brasil, os filmes chegavam com um certo atraso, mas nada que destruísse o encantamento de tão belas histórias.
Em uma dessas idas ao cinema, Angélica assistiu ao filme “Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse”, e se deslumbrou com um Rodolfo Valentino de bombachas e indumentária gaúcha. Fazia papel de argentino. Angélica ficou magnetizada com a cena da dança, em que o exímio dançarino, dançou um tango, desbancando um oponente.
Foi exatamente numa dessas idas ao cinema, que Angélica conheceu Herculano.
O jovem, de boa aparência, lembrava muito o ídolo latino, fato este que chamou a atenção de Angélica e de suas amigas.
Tímidas porém, não ousavam se aproximar.
Herculano por sua vez, ao perceber que Angélica costumava ir ao cinema com certa freqüência, passou a esperá-la na saída do estabelecimento.
Por diversas vezes ficou a olhá-la sem se aproximar.
Angélica olhava disfarçadamente para o moço.
Quando o olhar de ambos se encontravam, sorria tímida.
A certa altura, finalmente o jovem resolveu aproximar-se.
Quando Lúcia e Cláudia notaram a aproximação, tentaram puxar Angélica pelo braço.
A moça porém, resistiu.
Nisto, o jovem aproximou-se.
Cumprimentou a jovens, e perguntou-lhes se haviam gostado do filme.
Lúcia e Cláudia, responderam que sim.
Angélica por sua vez, disse que as fitas com o astro Rodolfo Valentino, eram maravilhosas.
Nisto, Herculano se apresentou, e comentou que gostava do fato dele interpretar homens valentes, desbravadores, destemidos. Relatou que entendia a fascinação das mulheres por ele, e comentou que muitos homens perdiam muito, por não tratarem bem suas mulheres.
Lúcia e Cláudia, percebendo o olhar de Herculano em direção a Angélica, tentaram novamente puxar a amiga, que desta vez se deixou levar.
Herculano despediu-se então da moça. Acenou para ela.
Angélica, em dado momento, virou-se e correspondeu ao gesto, acenou também.
Em outras sessões, o moço continuou acompanhando os passos da moça.
Em dado momento, se apresentou.
Angélica fez o mesmo.
Lúcia e Cláudia, aconselharam a amiga a contar para a mãe o que estava acontecendo.
Disseram que não era certo, um homem se aproximar de uma moça daquela forma.
Cláudia disse-lhe que deveria pedir ao moço para se apresentar a sua família.
Angélica, comentou com ar pensativo, que contaria a mãe o ocorrido.
Com o tempo, o moço passou a trocar algumas palavras com a moça.
Educadamente, pedia para as amigas da moça para conversar reservadamente com Angélica.
Cláudia e Lúcia ficavam apreensivas com isto.
De longe observavam o moço dirigir galanteios a Angélica, que sorria.
Herculano beijava a mão da moça.
Com o tempo, passaram a se sentar juntos na sala do cinematografo.
Assistiam as películas de mãos dadas.
Cláudia e Lúcia, não sabiam mais o que dizer a amiga para alertá-la de que aqueles encontros furtivos, não acabariam bem.
Insistiam para que Angélica contasse a mãe o que estava acontecendo.
Impaciente, Lúcia ameaçou contar a seus pais, que ela estava adotando um comportamento muito estranho.
Angélica, ao perceber que a amiga iria fazer o que estava prometendo, pediu insistentemente para que ela nada contasse a seus pais. Dizendo que isto iria arruinar sua vida, comentou que estava apaixonada por Herculano, e que se ela contasse algo, iria fugir.
Lúcia e Cláudia ficaram perplexas ao ouvirem tais palavras.
Perguntavam-se: “Onde havia parado aquela moça tão doce de antes? Havia desaparecido para dar lugar a uma doida?”
Lúcia não sabia o que fazer.
Tentando chegar a um entendimento sobre como agir, ficava a conversar com Cláudia.
Lúcia estava deveras preocupada com os desvarios da amiga.
Angélica por sua vez, ao perceber que Lúcia contaria a seus pais sobre os encontros, após encontrar Herculano na saída do cinema, onde se encantava com mais uma película de Rodolfo Valentino, contou-lhe o que estava acontecendo.
Comentou que Lúcia e Cláudia ameaçaram contar a seus pais, que ela estava se encontrando com ele nas saídas do cinematografo.
Herculano, ao ouvir tais palavras, demonstrou nervosismo.
Pediu a Angélica que convencesse suas amigas a nada contar. Comentou que a situação se demonstrava muito delicada.
Angélica perguntou-lhe se não poderiam fugir.
Herculano ao ouvir estas palavras, inicialmente, mostrou-se surpreso com a proposta, mas depois de muito conversar com a moça, concluiu que aquela era uma boa idéia.
Curioso, perguntou a moça, para onde ela pensava ir.
Sem titubear, Angélica respondeu que poderiam fugir para o litoral.
Comentou que conhecia bonitos lugares na região.
Com isto, a moça confidenciou que arrumaria uma pequena mala, com alguns pertences.
Herculano indagou onde se encontrariam.
Angélica respondeu que poderiam se encontrar duas ruas afastadas de sua casa. Nisto explicou detalhadamente, onde ele a ficaria aguardando.
Mais tarde a moça se despediu.
Herculano, segurou então a mão da moça e beijou-a cerimoniosamente.
Desta forma, ao chegar em sua casa, a jovem justificou a demora no cinema, argumentando que Lúcia e Cláudia não paravam de enumerar as qualidades da película.
Ângela parecia não desconfiar de nada.
Nisto, a moça se trancou no quarto.
Começou a preparar sua pequena mala. Dobrou vestidos, colocou sapatos, uma escova, etc.
Quando chegou a noite, ao notar que Francelino e Ângela dormiam, desceu sorrateiramente as escadarias, abriu a porta da sala. Caminhou pelo imenso jardim que circundava a casa, abriu o portão e saiu.
Em alguns minutos, encontrou-se com Herculano.
O que a moça não sabia, é que Lúcia e Cláudia haviam se encontrado horas antes com Ângela e alertado a mulher sobre os planos da filha em fugir com o conquistador.
Nervosa, Ângela se encarregou de contar o ocorrido ao marido, que ficou furioso. Ao ouvir a história, disse nervoso, que havia deixado a filha muito solta, e que isto não poderia resultar em boa coisa. Argumentou que Angélica precisava se casar e ter filhos, para se livrar dessas idéias fantasiosas de príncipe encantado.
Irritado, ameaçou bater em Angélica, colocá-la de castigo.
Quem o demoveu da idéia, foi Ângela que argumentou de que nada adiantaria espancá-la ou colocá-la de castigo. Argumentou que seria apenas se distraírem um pouco e ela acabaria fugindo com o rapaz.
Nisto Francelino se perguntou:
- E o que fazer então?
- Simples! Fingir que de nada sabemos, para ver até onde Angélica irá com esta história.
Ao ouvir tais palavras, Francelino argumentou que a moça poderia fugir.
Ângela respondeu que precisava que alguém plantasse guarda em frente a casa e discretamente seguisse a moça.
Francelino imediatamente se lembrou de Carlos.
Ângela retrucou a sugestão do marido, argumentando que ele já havia apresentado o rapaz a moça, e que Angélica não se impressionara com o mesmo. Perguntou se seria uma boa idéia chamar o moço para auxiliá-los.
Francelino argumentou enérgico, que se deixasse a escolha de um pretendente ao cargo da filha, certamente ela escolheria um doidivanas, como aquele com quem Angélica pretendia fugir.
Nisto, mencionou que Carlos era um rapaz de ótima família, e que estava interessado em sua filha.
Ângela perguntou-lhe como poderia saber disto.
O homem respondeu que sempre se encontrava com o moço, o mesmo aproveitava para de alguma forma perguntar sobre a moça.
Ângela nervosa, acabou concordando.
Nisto Francelino ligou para o rapaz, pedindo-lhe aflito para auxiliá-lo. Por telefone, disse que sua filha estava em sérios apuros, e que necessitava de sua ajuda.
Carlos, aflito, perguntou o que se passava.
Francelino por sua vez, sem entrar em detalhes, pediu para que o rapaz fosse o mais depressa possível para sua casa.
Carlos respondeu então, que o faria imediatamente.
Discreto, o moço respondeu aos familiares que surgira um imprevisto com um amigo, e que precisava auxiliá-lo. Recomendou aos pais que não se preocupassem, pois provavelmente, voltaria tarde.
Nisto sua mãe abraçou-o recomendando para que se cuidasse.
- Não se preocupe! – foi o que disse a mãe.
Quando chegou a casa de Francelino, o moço foi colocado a par dos fatos que se sucediam.
O homem não escondeu-lhe nada.
Honesto, Francelino disse que não quisesse ajudá-los, entenderia perfeitamente. Argumentou que ele também não estava preso a nenhum compromisso com sua família.
Carlos respondeu então, que Angélica não tinha culpa do que estava acontecendo. Argumentou que devido sua ingenuidade, estava sendo vítima de um sedutor barato. Nervoso, respondeu que deviam se apressar, e que precisavam de um plano.
Francelino respondeu-lhe que precisavam vigiar os passos de Angélica, sem que ela percebesse o que estava acontecendo.
Carlos, percebendo o plano, sugeriu ficar escondido na ala dos empregados, e que assim que a moça saísse de casa, a seguiria para ver onde ela e o safardana se encontrariam.
Francelino recomendou então ao rapaz, que precisavam ser diligentes, ou a presa poderia fugir.
Carlos concordou.
Nisto, ficaram discutindo o plano.
O moço prometeu que ao descobrir quem era o conquistador, desferiria bons sopapos neles.
Ângela e Francelino estavam apreensivos.
Para eles, foi muito difícil fingirem tranqüilidade, quando a filha voltou do cinema.
Carlos também ficou irritado com a descoberta. Mas procurou se controlar.
Nisto, ficou atento aos passos dentro da casa.
Ao ver a moça sair sorrateiramente do quarto, acompanhou-a atentamente descer as escadarias do palacete. Viu-a abrir a porta da casa, caminhar pelo jardim, abrir o portão e sair.
Discreto, seguiu-a à distância.
Sentiu um choque ao vê-la junto de Herculano.
O galanteador, disse-lhe que juntos seriam felizes, e que ninguém atrapalharia sua felicidade.
Herculano segurou suas mãos e beijou-as.
Angélica sorriu.
Quando o moço iria pegar a mala da moça, Carlos apareceu inopinadamente, desferindo um safanão no moço.
Herculano caiu sentado no banco da praça.
Angélica começou a gritar. Desesperada, pediu a Carlos para parar de bater no moço.
Carlos contudo, não ouvia ninguém.
Desta forma, investiu novamente contra o moço, desferindo-lhe um soco.
Angélica começou a gritar.
Nisto apareceu Francelino.
Ao ver o pai se aproximando, Angélica pegou sua mala.
Carlos segurou então seu braço.
A moça olhou-o furiosa. Dizendo para ele soltar seu braço, falou rispidamente que ele era muito desagradável. Argumentou que o detestava e que nunca o perdoaria pelo que estava fazendo.
Francelino ao se aproximar, sinalizou para Carlos, como a pedir licença.
Ao olhar nos olhos de sua filha, Francelino notou que Angélica estava chorando.
A moça então jogou-se nos braços do pai para pedir perdão.
Carlos então, percebendo que o moço iria fugir, disse ao rapaz, que se ele ousasse novamente se encontrar com Angélica, ele iria se entender não com o pai da moça, mas com ele.
Atrevido, Herculano perguntou com que direito ele se arvorava em defensor da donzela.
Carlos respondeu então sem pensar, que o estava fazendo na qualidade de pretendente da moça.
Herculano engoliu em seco. Argumentou que Angélica nunca lhe dissera que estava comprometida.
Carlos respondeu que o noivado ainda não se realizara, mas que agora ele estava ciente de Angélica dentro em breve estaria noiva.
Nisto o conquistador pegou sua mala e saiu correndo.
Carlos gritou para nunca mais aparecesse por ali.
Nisto Francelino conduziu a filha para casa.
Carlos seguiu atrás, segurando a mala da moça.
Ao adentrar a imensa sala do casarão, o moço depositou a mala de Angélica no chão.
Percebendo que a família precisava de privacidade, despediu-se de Francelino e de Ângela. Desculpando-se disse que estava tarde, e que seus pais deviam estar preocupados com sua demora.
Francelino embora nervoso, conseguiu se lembrar de pedir recomendações a Diva e Odair.
Carlos agradeceu a lembrança. Prometeu que ligaria no dia seguinte para saber como todos estavam.
Francelino conduziu-o até a porta e o agradeceu pelos préstimos.
Elogiou-o dizendo que era um rapaz de ouro e que a mulher que se casasse com ele, seria muito ditosa.
O moço agradeceu e se despediu do homem.
Nisto, ao verem-se sozinhos, Ângela abraçou a filha.
A mulher disse entre lágrimas, que temeu que ela se perdesse. Pediu-lhe para que nunca mais fizesse aquilo.
Francelino nervoso, pediu a mulher para que parasse com todo aquele drama. Disse que ninguém havia se perdido, e que aquilo deveria ter servido de lição para as duas.
Nisto o homem argumentou que Angélica estava de castigo, e que somente sairia de casa para ir ao colégio. Ressaltou que era de casa para a escola, e da escola para casa.
Angélica, derrotada, não retrucou. Tratou de pegar sua mala e subiu o mais rápido que pode para seu quarto.

Luciana Celestino dos Santos
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