Poesias

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

COISAS DO BRASIL PARTE 4 – REGIÃO SUDESTE - CAPÍTULO 2

Conforme escrevia, lembrou-se de uma lenda muito interessante. 
Ouvia-a quando em passeio pela região do Estado de São Paulo. 
A lenda era conhecida na localidade como sendo: ‘A Lagoa Azul’. 
Ainda na época dos bandeirantes – homens que desbravaram o país em busca de ouro e pedras preciosas – surgiu a lenda de uma linda lagoa situada em terras que atraíram o interesses destes desbravadores. 
Tão logo souberam que estas terras eram ricas em ouro e diamantes, diversos homens ousados e ambiciosos rumaram para lá, na esperança de enriquecer. 
Nem todos alcançaram seu objetivo. 
Uns ficaram mais pobres do que eram. 
Outros contudo, conseguiram remediar-se, e alguns poucos ficaram realmente ricos. 
Estes eram, de fato, poderosos e sua vontade era lei. 
Entre estes últimos estava o pai de Dalva. 
Ele possuía importantes garimpos de ouro e diamantes, de onde inúmeros escravos extraíam a riqueza necessária para seu amo viver luxuosamente. 
A moça era filha única, e seu pai lhe dava o que havia de melhor: roupas trazidas do estrangeiro especialmente para ela, jóias que fariam inveja a uma rainha, perfumes finíssimos... 
Enfim, a jovem, vivia uma vida luxuosa. 
O mal era o orgulho dele, que escravizava a filha de tal modo que, muitas vezes, ela desejou ser pobre, mas viver com mais liberdade. 
-- Por que não posso ser como as outras moças? Por que hei de sair sempre com o rosto coberto, como se estivesse escondendo-me de alguém? – perguntou ela, um dia. 
-- Ora, será que você não compreende? Você é a filha do homem mais rico deste lugar! – resmungava ele. 
-- E o que tem isso? 
-- Não é qualquer um que tem o direito de ver seu rosto! Essa gente não merece tal privilégio! 
A moça não tinha outro recurso, senão continuar a sair com o rosto coberto. 
Às vezes, um moço menos avisado aproximava-se da casa do ricaço, movido pela curiosidade de conhecer a bela Dalva. 
Pobre dele! 
Se o homem percebia, mandava alguns de seus escravos mais fortes fazer-lhe uns carinhos com chicotes e porretes... 
Um dia, Dalva quis saber: 
-- Por que o senhor faz isso, meu pai? -
-- Ora, por quê?! Não vê? São uns aventureiros. Pretendem casar-se com você para ficar com o meu dinheiro. Mas podem desistir. Não vai ser fácil, não. Pelo menos, enquanto eu estiver vivo... 
-- O senhor não deveria preocupar-se com isso. Sabe que nem tomo conhecimento da presença deles. Não há necessidade de maltratá-los tanto. 
-- Como não? Eles precisam aprender. 
Por esta razão, os escravos já estavam cansados de tanto surrar os rapazes que tentavam conhecer Dalva. 
Em certa ocasião, quando ela saiu a passeio pelo campo com algumas escravas, resolveu tirar o véu, com o qual sempre cobria o rosto. 
-- Olhe, Sinhá, seu pai não vai gostar disso. Pode ficar bravo. – disse uma das mucamas. 
A moça achou graça: 
-- Ele não quer que os estranhos vejam meu rosto. Mas quem é que vai encontrar-me neste lugar? Só se forem as aves, os bichos. 
-- Sabe como o patrão é. – tornou a mucama – Quando dá uma ordem, é para ser cumprida. 
-- Não tenho medo. – afirmou a moça. – A ordem que ele deu é para a cidade. No campo, não tem valor. 
As escravas acabaram por concordar com a argumentação da moça. 
Dalva e as mucamas sentaram-se então na relva e começaram a conversar sobre os mais variados assuntos. 
Uma das escravas era muito engraçada, e sabia contar anedotas como ninguém. 
Dalva e as outras riam até não poder mais. 
Estavam assim, distraídas, quando surgiu um cavaleiro. 
Vinha devagar, e seu cavalo aparentava cansaço. 
Aproximou-se das moças, tirou o chapéu, e perguntou-lhes diversas coisas sobre a região. 
Enquanto falava não conseguia tirar os olhos de Dalva. 
Nem ela, nem as escravas lembraram-se da ordem de seu pai. 
O cavaleiro ficou encantado com Dalva e ela, por sua vez, não deixou de se impressionar com o porte do forasteiro: forte, decidido, desenvolto. 
Porém de uma simplicidade encantadora. 
Contou-lhe que era um garimpeiro à procura de fortuna. 
Antes de ir embora, o moço perguntou onde era a casa de Dalva. 
Ela deu a informação, diante dos olhos surpresos das mucamas. 
Uma das escravas não resistiu: 
-- Sinhá! Se ele se aproximar da casa será espancado por ordem de seu pai! 
-- Eu ia avisá-lo! – respondeu a moça, e contou ao jovem como era seu pai. 
No que o estranho ficou horrorizado e disse que dinheiro nenhum pagava aquele sofrimento. 
Ele partiu, prometendo escrever-lhe. 
E, assim começou a troca de bilhetes. 
Uma das mucamas, a mais amiga de Dalva, foi escolhida para ser a recadeira. 
Os bilhetes iam e vinham cada vez em maior quantidade, e o namoro foi ficando cada vez mais firme. Como para todo segredo existe um traidor, uma das mucamas incumbidas de fazer companhia à Dalva concluiu que, se falasse ao pai da moça sobre o namoro, por certo seria recompensada. 
O pai de Dalva ao saber disso, porém, ficou furioso e tomou todas as providências para castigar o audacioso garimpeiro. 
Colocou escravos espiões atrás do moço, para que ele fosse surpreendido no momento de enviar algum bilhete. 
Mandou que os escravos acompanhassem a mucama e lhes disse: 
-- Procurem ter certeza de que ele é o homem. Depois, fiquem atrás dele, até surgir uma boa oportunidade. Aí... já sabem o que fazer, não é mesmo? – e fez um gesto significativo. 
Por outro lado, avisado pela escrava traidora, surpreenderia a mucama recadeira, para lhe dar o castigo que achava merecido. 
Guiados pela escrava, não demorou muito, para que vissem a mucama de confiança de Dalva receber um bilhete de um moço. 
Então, era aquele! 
Trataram de ir atrás do namorado. 
Ele saiu a cavalo e os escravos, também. 
Enquanto isto, a mucama foi entregar o bilhete à sua patroa. 
Neste exato momento exato, o pai de Dalva apareceu. 
-- Muito bem! Quer dizer que você esqueceu as minhas ordens?! Pois nunca mais esquecerá nada, pode ficar sossegada! – disse ele, resoluto. 
Imediatamente, ele chamou alguns escravos e mandou que levassem a mucama para o tronco, pois merecia sofrer o devido castigo. 
De nada valeram os gritos da infeliz. 
Dalva implorou ao pai que não castigasse a escrava, pois a culpa era sua e de mais ninguém. 
Ele contudo, não quis saber de nada. 
Mandou que a filha fosse para o quarto e de lá não saísse, até segunda ordem. 
Depois, ele foi assistir ao castigo da mucama. 
O homem, mandou então que amarrassem a escrava num poste de madeira, e ordenou aos escravos que batessem, até que ela não se queixasse mais. 
A coitada não resistiu às chicotadas e morreu ali mesmo. 
Um pouco mais distante, os escravos, que estavam seguindo o namorado de Dalva, encontraram a esperada oportunidade. 
O garimpeiro apeou perto da lagoa, conhecida por Lagoa Azul, para dar de beber ao seu cavalo. 
Um escravo apontou-lhe uma espingarda e atirou. 
Ao ver-se ferido de morte, teve tempo anos apenas, para pronunciar o nome de Dalva. 
E assim, depois de realizado o serviço, o escravo tratou de lhe enterrar. 
O garimpeiro, foi enterrado ali mesmo, na beira da lagoa. 
O pai de Dalva ficou muito satisfeito com o resultado. 
Tanto, que resolveu dar pessoalmente à sua filha o que ele considerava uma boa notícia. 
-- Pois é, minha filha. – disse ele, com uma expressão de alegria. – Posso afirmar-lhe que a mucama recadeira não fará mais o que fez. Creio que ela ganhava dinheiro daquele malandro, que só queria a minha riqueza. Agora, ele não tem mais quem lhe traga os recados. Sabe por que? Porque ela está morta. E também, ele não precisará mais dela, já que não poderá escrever mais. 
A moça, percebendo que algo de ruim tinha acontecido ao namorado, perguntou, aflita: 
-- Por que? O que aconteceu a ele? 
O ricaço deu uma gargalhada e respondeu bem devagar: 
-- A esta hora, ele está descansando, para sempre, perto da Lagoa Azul. 
Dalva, completamente transtornada, correu para fora da casa, montou um cavalo e partiu para a lagoa, em cujas águas se atirou. 
Em sua perseguição, vinham o pai e diversos escravos, mas, com a força do desespero, ela corria mais depressa que o vento, e eles não conseguiram alcançá-la. 
Dalva nunca mais foi encontrada. 
Os garimpeiros têm muito medo de chegar perto deste lugar. 
Alguns afirmam já ter visto ali, a pobre moça, chorando na beira da lagoa, em noites de luar. 
Como até hoje ela tem esperanças de encontrar o seu namorado, costuma atrair, com seus olhos lindos e luminosos como diamantes, o garimpeiro que se aproxima, levando-o para o fundo das águas. 
Ela quer ver, de perto, se ele não é o seu amado...1

1 Histórias e Lendas do Brasil (adaptação do texto original de Gonçalves Ribeiro) – São Paulo: APEL Editora, sem/data, tirado do site: www.terrabrasileira. net/folclore/regioes/3contos/entesnor.html.

Texto retirado de artigos da internet sobre o folclore brasileiro, e de guias de viagens sobre o Brasil.
Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.

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