Poesias

sábado, 29 de fevereiro de 2020

Tu Te Tornas Eternamente Responsável Por Aquilo Que Cativas



Dizem que muitas coisas pelas quais passamos durante a vida nos servem de ensinamento
 ou de preparação para as dificuldades futuras.
A todo momento na vida fazemos escolhas.
Muitas coisas na vida acontecem sem que possamos compreender o significado. 
Mas como dizem, tudo na vida passa, e que na vida as agruras e os sofrimentos são inevitáveis. 
Não é possível viver sem que haja algum obstáculo a ser transposto, alguma dificuldade a ser superada. 
Muitas vezes precisamos passar por algumas barreiras para que possamos aprender a viver. 
Mas acima de tudo, nossa vida é o resultado de nossas escolhas, dos caminhos que traçamos percorrer.
Dizem os mais velhos que se não podemos compreender  o hoje, amanhã a vida nos dará respostas. 
Nos dará respostas se tivermos a maturidade e a paciência para buscarmos entender as coisas no momento certo. 
Momento este que nem sempre temos a paciência para esperar ou a ilusão de entender.
Um dia o grande poeta Mário Quintana resolveu escrever sobre a maturidade num poema que tem o mesmo nome do início desta frase, “um dia”. 
Nesse poema ele disse que um dia, muitas coisas incompreensíveis para nós na juventude, passam a fazer sentido e a ter um significado quando encontramos a  maturidade. 
E também,que muitas vezes, independentemente da idade, só entendemos ou aceitamos algo quando já é tarde demais.
O poema é todo sobre o significado de certas coisas e situações que demoramos para entender, e uma das partes mais lindas da poesia, é quando o ilustre poeta afirma que um dia saberemos a importância da frase: ”Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas.”
Essa frase, de tão grandioso significado, nos remete para as escolhas que fazemos na vida. Para mim possuindo até um sentido além do humano, metafísico.
“Cativar, tornar cativo, capturar, ganhar a simpatia, a estima, seduzir, atrair, granjear, prender, ligar, sujeitar, ficar sujeito, penhorar-se, render-se, apaixonar-se, enamorar-se.”
Ou seja, a tão bela frase dita no poema tem dois sentidos. 
Aquilo que a nós cativa, podemos tanto apreender e conquistar, como por ela sermos conquistados. 
É portanto uma troca, que no poema pode ser tanto humana como pode ser também uma idéia, um ideal, um sonho que cativamos e que nos cativa, um carinho e até mesmo um caminho como o qual devemos sempre ser fiéis, mesmo quando nada parece dar certo.
Algo que transcende esta simples existência humana, esta simples condição na qual vivemos. 
Em poucas palavras, aquilo que cativas pode ser o significado da própria vida. 
É sentido o qual, muitas pessoas buscam em sua vida e tantas outras o perdem, e o perdendo perdem também o sentido da vida.
Podemos escolher o que cativamos, mas que esta escolha seja responsável  posto que se assim não o for, e perderes o que cativavas, não cativavas o que era seu. 
Não sabias o que é cativar. 
O que queremos, o que amamos, o que gostamos, enfim, o que nós cativamos, é um compromisso além da vida,além do humano, além do tangível. 
É um compromisso com os outros, não somente com você. 
É um compromisso com a sua realização como pessoa, e algumas pessoas possuem esse sentido primordial em suas vidas escrito de forma indelével na sua história de vida. 
Haja vista os heróis, as grandes mulheres, as pessoas de certa maneira predestinadas na nossa história. 
As pessoas que passam anos de suas vidas lutando e buscando por algo em que acreditam.
 Pode ser nas lutas por igualdade e justiça, na busca por realizar um antigo sonho que engrandecerá a vida de outras pessoas, seja na realização pessoal que mudará a sua vida e que também poderá mudar a vida de outras pessoas.
Portanto, numca se esqueças de uma coisa, “serás eternamente responsável por aquilo que cativas”. 
O bem que tu cativas será o acalento de tua existência, poderá ser até mesmo, a tua existência.

Enamorar, enumerar

As brumas encobrem as estradas,
As ruas, outrora nítidas, ganham contornos indivisos
Árvores floridas de manacá ao longo dos caminhos,
Árvores frondosas de flores amarelas
E um longo caminho a percorrer

Para se chegar em lugar de calma e contentamento
Do alto da serra se avista, o contorno das cidades,
Os mangues, as matas, os ajuntamentos das gentes, civilização

 Atravessando túneis e caminhos, se percebe as cidades se aproximando
Ao longo da rodovia, as edificações ganham forma,
Transformam-se em cidades
Que entre as construções, se faz por revelar entre uma e outra, uma nesga de mar

O mar, finalmente, para lá vou chegar
Festa de água, sal, céu, sol e ar

As gaivotas na areia a espreitar,
O próximo passo, o próximo voo,
E até o mergulho a realizar

Andando na areia, com suas asas recolhidas
Inopinadamente a alçarem voo
Mostrando suas asas imensas
A rasgar os céus de nuvens intensas, imensas

Casais a andar de mãos dadas pela praia
Moças esbeltas a desfilarem com suas roupas de praia,
Biquínis, saídas de praia
Cabelos longos, curtos, lisos, ondulados
A conversarem, ideias trocarem

Casais e pessoas, a brincarem nas águas rasas e revoltas do mar
Águas frias, a empurrar os banhistas para o lado oposto onde entraram

Pais e crianças pequenas a brincarem na água
Crianças a correrem a toda a velocidade em direção ao mar
Casais a ouvirem músicas nos quiosques
Interagindo com os cantores, nem sempre afinados

De longe a se apreciar um mar ora azulado
Ora verde esmeralda
E a lua minguante a refletir-se nas água do mar

O sol se despedindo de nós
A apresentar um espetáculo de tons e semi tons,
Que precisamos voltar os olhos para admirar

Caminhando pelas ruas de paralelepípedos,
Ruas asfaltadas, também se pode ver ciclistas, corredores
Os coqueiros e o mar ao fundo,
Com belas construções a enfeitar as quadras

E como tudo, que tem prazo e pressa
O retorno a vida pulsante das cidades,
Das multidões,
Dos enxames de abelhas, as colmeias das gentes
Do salve-se quem puder,
E se puder me salve também

Casais a se abraçarem em frente ao metrô
Cena que de tão rara, fica a lembrar roteiros de filme
A quebrarem a fria rotina da cidade apressada

Pinturas bonitas nas estações,
Instalações artísticas, esculturas
Painéis, a mostrar a frieza das coisas sólidas

A multidão apressada, inconstante,
Eu também impaciente
Tudo tarda,
Demora nesta terra de baldeações e integrações constantes

E o metrô, ao abrir suas portas,
A servir de abrigo, aos trabalhadores fatigados da viagem diária
Muitos a se escorarem nos espaços livres

Mas também, tem os cansados recostados as estruturas metálicas, as portas
Atrapalhando o fluxo das pessoas e da vida,
Como sempre acontece aos lugares onde circula muita gente

E o verde a disputar espaço em meio a floresta de concreto
A natureza a brigar com a dureza das humanas, ou desumanas criações
Com árvores e plantas florindo em meio ao concreto e a poluição
Nos caminhos e desvãos em que se avista a cidade

E embora haja gente mergulhada em seu cansaço, e em sua rotina
Ainda se pode ver, gente interessada em mudar
Com seus rostos entretidos em suas leituras
Além das expressões de tédio diárias

E como já dizia o poeta,
Acaso tudo se referindo ao amor,
Que o tédio, rime com prédio,
Em sua rotina de desinteresse diário

Sinto saudades de minha praia!
E o amor residindo nas coisas mais prosaicas,
E nas mais inesperadas, demonstrações de afeto!

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.

Por que?

Por que tanta ignorância
Por que tanta gente Meu Deus?
Por que todos correm na contramão?
Por que a vida é assim?

Eterna busca pelo sucesso que nem todos terão?
Não pelo menos da forma como imaginam

Por que percorremos tão longas distâncias?
Nunca chegamos em lugar algum,
Apenas as mesma instâncias frias de sempre

Por que não podemos aproveitar,
Os finais de tarde para passear?
Por que não podemos trabalhar,
Sem nos demorar em sua ida e sua volta?

Por que a vida é tão insana?
Por que o mundo tão irracional?
Por que tudo funciona tão mal?

Por que nossas instituições são tão falhas?
Por que temos que aguentar tantos desaforos?
Por que temos que ser humilhados, desrespeitados, ofendidos?

Por que não podemos fazer da nossa vida o que queremos?
E assim, poder contemplá-la em sua inteireza
E não pela metade, quase sempre com pressa

Pressa de não poder chegar, de se atrasar, de a vida complicar
Por que a cada instante que passa,
Mais a vida grita:
Tem mais gente para chegar,
Apresse-se ou então, tudo vai tumultuar!

Sinto-me sendo expulsa do próprio lugar em que habito!
Ser humano, grande homem
Capaz de grandes prodígios,
Mas incapaz de pensar o bem estar do próprio humano

Ó grande falha humana!
Ou será o homem, grande falha da divina criação?

Sinceramente não sei,
E nisto fico a pensar então

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte. 

Divagações

Aproveitando o dia em gostosas leituras
Contemplo o universo da literatura

Com seus grandes, pequenos poemas
Quantas experiências à disposição
De existências tão ávidas de vivências
Da vida morna, repetida e cotidiana

As horas passam, passam as horas
E finalmente o dia chega ao fim
Quem sabe um dia teremos a vida
 Assim como a desejamos ter

Vivê-la, como merecemos viver
Por enquanto vamos saboreando,
Os pequenos movimentos alegres
Os instantes de saborosa diversão

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.

Pensamento

Pensamentos dispersos,
E de pensamento em pensamento
Acaba por se chegar a alguma conclusão
Ou a sabedoria

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte. 

Dispersos

A vida cheia de riscos é
De formas que devemos nos arriscar,
Posto que o máximo de derrota que podemos ter
É nada levar

E assim sendo, permanecermos de mãos vazias
Mas plenos de experiências e sensações vividas
Por procurarmos não deixar a vida apenas passar

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.

A Vida

A vida da gente
Dizem que a vida da gente
É a vida que a gente leva

Devemos portanto, muito bem aproveitá-la
Pois ao dela partirmos, nada dela levamos
A não ser as experiências vividas
Bem ou mal experienciadas!

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.   

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

VALONGO - CAPÍTULO 4 VERSÃO ALTERNATIVA

Ajustados entre si Vandré e Venâncio percorreram os cartórios da região, em busca de registros da família.
Foi uma busca demorada e trabalhosa.
Com efeito, a criança de nome Tarcísio, fora registrada em outra cidade, E que na época em que Dona Carolina era moça, fazia parte do município onde ficava a propriedade do Valongo.
Para chegarem neste ponto, os moços perderam três idas em cartórios da região, inclusive da cidade onde estava localizada a fazenda.
Desanimados, sempre que dirigiam aos cartórios e não encontravam informações, ficavam desapontados.
Um dia, conversando na venda que havia na vila próxima a fazenda, os moços comentaram entre si, como fariam para descobrir o registro de uma pessoa nascida por volta do final dos anos quarenta e início dos anos cinquentas.
Nisto, um frequentador da venda informou que naqueles tempos, os registros de nascimentos, quando eram feitos, eram realizados num cartório localizado em outro município.
Desta forma, os rapazes agradeceram a informação, e no dia seguinte rumaram em direção ao cartório.
Lá, depois de uma certa peregrinação, finalmente descobriram onde estava localizado o registro de Tarcísio, filho de Carolina e Adroaldo.
Vandré, ao consultar o registro, ficou exultante.
Finalmente estava a encontrar vestígios da origem da família.
O moço solicitou uma cópia do documento.
Dias depois, o moço regressou ao cartório, onde retirou a cópia solicitada do documento.
Em casa, na sede da fazenda, o moço guardou o documento com todo o cuidado.
Afinal, ninguém poderia desconfiar que estava investigando o paradeiro e a origem do homem.
Como já soubessem que o homem não havia sido criado na região do Valongo, começaram a divagar sobre em que lugar o tal Tarcísio vivera, e onde estava sepultado.
Com isto, nos dias em que estiveram na fazenda, aproveitaram para conversar com as primas Lara e Antonia.
Falavam sobre as crianças, sobre a importância de se ter uma família.
Elogiaram os filhos das moças.
Lara e Antonia disseram que estavam vivendo em São Paulo, circunstância que motivou Vandré a convidá-las a visitar sua casa.
Argumentou que eram uma família mas que conviviam muito pouco.
Venâncio respondeu que a correria do dia a dia afasta e priva as pessoas da convivência diária.
Lara e Antonia concordaram.
Eram moças, e um pouco mais jovens que Venâncio, regulando a idade de Vandré.
Conversando com as jovens, os mesmos descobriram que as moças haviam se casado, mas os relacionamentos pouco duraram.
Ao ouvir isto, os moços curiosos, perguntaram da maldição imposta sobre a família.
Rindo, as moças comentaram que casamento era forma de falar, já que viveram em união estável, circunstância que se equipara a um casamento.
Curioso, Venâncio perguntou-lhes se não tiveram nenhum interesse em se casar.
Lara respondeu-lhe que não.
Argumentou que o que fazia a união de um casal não era um pedaço de papel e sim a confiança e o amor existente entre eles.
concordou.
Venâncio brincando, respondeu que agora entendia por que o irmão não havia se casado.
Vandré então rindo, pediu ao irmão para que se calasse.
Em dado momento da conversa, Venâncio falou as moças em tom de brincadeira, que já sabia por que não haviam se casado no civil.
Curiosas, as moças perguntaram por que.
E Venâncio respondeu:
- Por que estavam com medo da maldição!
As mulheres se entreolharam e começaram a rir.
Descontraídas, as mulheres chegaram a dizer que estavam fartas da história da maldição.
Da praga que uma velha maluca lançara sobre a família.
Antonia disse que isto só atingia quem realmente acreditava nestas besteiras.
Venâncio concordou.
Argumentou que por conta de uma bobagem, as mulheres de sua família, deixaram de lado a possibilidade de serem felizes.
Para ele, as histórias de insucessos amorosos e filhos varões que não vingaram, eram fruto de um tempo de grandes dificuldades, sem acesso a informação, E ao mínimo de condições básicas de saúde.
E que tal desinformação deram origem a lendas e a crendices.
Nisto Lara argumentou que as Carolinas acreditavam seriamente nisto.
Venâncio retrucou dizendo que adorava a mãe e a avó, mas que se tratavam de pessoas simples, e muito impressionáveis.
O jovem por seu turno, mudaria o seu modo de pensar.
Isto por que, ainda quando estava no velho casarão, o jovem e parte da família, se depararam por um estranho, que surgira na cozinha da residência.
Era um homem idoso, cujo nome não foi declinado.
Estava agitado, andando de um lado para o outro.
Dizia querer falar com Josué.
Quando todos os que estavam na sala, se entreolharam, já bastante assustados com a visita inesperada.
Ninguém conseguia compreender o que estava acontecendo.
Nisto, o homem desapareceu.
Sumiu da mesma forma que entrou.
Sem deixar vestígios.
Vandré e Venâncio, que estavam na sala ao lado da mãe, e das primas, ficaram perplexos.
Nenhum dos empregados viu o homem entrando na casa e tampouco saindo.
Quando a velha senhora, Carolina, tomou conhecimento do ocorrido, ao ouvir nome Josué, lembrou ser este um dos nomes de um dos filhos da primeira Carolina.
O garoto morreu ainda em criança.
Intrigada, a mulher procurou se lembrar de alguém que vivia ou que vivera na região e que possuía o mesmo nome.
Por mais que se esforçasse, a mulher não conseguia se lembrar.
Dizia que sua memória já não era mais a mesma.
Sua filha por sua vez, dizia para a mãe descansar.
Visando tranquilizá-la, disse que fariam orações em memória a todos os antepassados, e também para que este homem encontrasse seu rumo, e que não viesse mais importuná-los.
Nisto, recomendou para que os funcionários trancassem a porta da residência, mesmo durante o dia, observando que entrasse e quem saísse do casarão.
Os visitantes por seu turno, avisariam quando saíssem da casa, se iriam para algum lugar e quando voltariam.
Todos concordaram com a recomendação.
E precavidos, trataram de fazer as orações.
Chegaram a organizar um terço, onde toda a família se reuniu para rezar.
A mãe de Vandré e Venâncio também mandou celebrar missas na igreja que havia na vila.
Com isto, sempre que os convidados saíam da sede avisavam.
Também informavam a hora aproximada em que voltariam.
Vandré e Venâncio continuaram com suas andanças pelos arrabaldes.
Continuaram as conversas com Lara e Antonia, na esperança de descobrir algo sobre a história de Tarcísio.
Mas as moças não comentavam sobre o assunto.
Parecia que não gostavam de falar sobre o pai.
Circunstância que os deixou bastante intrigados.
Afinal de contas, por que tanto segredo?
Conversando sobre a mãe, Vandré tentou trazer a baila a memória de Tarcísio.
No que as moças comentaram que o pai era bastante ausente, e que não tinham muito a dizer a seu respeito.
Venâncio, percebendo que não lhes agradou o comentário, resolveu mudar o rumo da conversa. Gentil, perguntou das crianças, já que tudo parecia tão silencioso.
Lara e Antonia concordaram.
Preocupadas, foram atrás dos filhos, para verificar o que estava acontecendo.
Para variar, as crianças estavam na cozinha, a mexer nas panelas, tachos de cobre, e demais utensílios domésticos.
Sempre que viam algo que não conheciam, perguntavam o que era.
Djanira, já acostumada com o jeito das crianças, respondia com toda a paciência do mundo.
Quando Lara e Antonia apareceram na cozinha para ralhar com as crianças, a cozinheira respondeu-lhes que se todas as perguntas e todos os problemas do mundo fossem saber o que era um tacho de cobre, uma panela, uma escumadeira, tudo seria muito mais fácil.
Djanira, comentou que eles estavam apenas curiosos.
Mas recomendou que não era bom que permanecessem na cozinha, por não ser lugar de crianças curiosas.
Lara e Antonia concordaram com a cozinheira.
Razão pela qual retiraram as crianças de lá.
Levaram as crianças para o alpendre e disseram-lhe que tinham um imenso campo a frente para brincar, com a recomendação de que não poderia sair de suas vistas.
E assim,as crianças ganharam o mundo.
Brincaram de se esconder atrás das árvores.
Subiram em seu tronco, sentaram em suas raízes.
Olharam o céu e as nuvens, para dizer com o que se pareciam.
Lara e Antonia olhavam envaidecidas para os filhos.
Venâncio e Vandré observaram as crianças brincando.
Lembraram de seus tempos de criança.
Rindo, comentaram que se tivessem tanto espaço livre para brincar quando eram crianças, suas vidas provavelmente seriam bem diferentes.
Venâncio, argumentou que gostava da vida na cidade.
Dizia que seu escritório estava indo de vento em popa, e que não tinha interesse de voltar ao campo.
Vandré, respondeu que sua vida acadêmica não lhe permitia viver no campo.
Com efeito, os rapazes e parte da família participou da festa organizada para Dona Carolina.
Forma como era tratada por todos.
Com o passar dos dias, conforme o estado de saúde da matriarca se agravava, os rapazes recomendaram a mãe que levassem a avó, para a capital, pois ali teria um melhor tratamento, recebendo acompanhamento médico.
Mas a matriarca se recusava a sair de sua fazenda.
A mulher falou com detalhes sobre a história de suas ancestrais.
Dizia possuir anotações, diários e relatos da vida de quase todas elas.
Venâncio e Vandré ouviram o relato da velha senhora com toda a atenção.

Conforme a história era contada, os moços começaram a entender as motivações da mulher.
O por quê de levar a criança para longe de si.
De todas elas, percebeu o empenho em preservar a família, lutando pela sobrevivência de todos.
Por um momento chegaram a acreditar que poderia ser uma sina.
Ficaram penalizados com as histórias de perda, com o sofrimento.
Diziam que era muita tristeza para uma mesma família.
Curiosos, chegaram a se perguntar se de fato havia uma maldição, o que poderiam fazer para livrar o restante da família da triste sina.
Ao voltarem para São Paulo, retomando suas atividades diárias, Vandré comprometeu-se em conversar com especialistas em cultura indígena.
Gostaria de saber o que se pode fazer quando uma suposta maldição é lançada sobre uma descendência.
Venâncio não mais debochava da ideia.
E assim Vandré, conversou com alguns especialistas.
De vários deles, ouviu que segundo lendas indígenas, poderia se fazer rituais, ou utilizar amuletos, que segundo a crença dos nativos, protegiam contra os maus espíritos.
Vandré curioso, pedia detalhes, mais informações.
Chegou ao muiraquitã, mas descobriu inúmeros outros amuletos.
Cada qual com uma finalidade.
Venâncio, voltou a encontrar a noiva, que parecia aborrecida com a demora do moço em regressar para São Paulo.
Dizia que havia demorado muito por lá.
O moço perguntou-lhe se havia melhorado da indisposição.
Ester respondeu-lhe que sim.
Quando o moço perguntou-lhe se havia ficado em casa, a moça respondeu que sim.
Porém, ao retornar ao escritório, e em conversas com conhecidos, o moço descobriu que a jovem fora vista por diversas vezes conversando com rapazes em bares e casas noturnas.
Foi o bastante para o rapaz exigir satisfação da moça, que tentou a todo custo dizer que não havia saído de casa, e que devia ter sido confundida com outra pessoa.
Venâncio porém, não queria saber de desculpas.
Ríspido, perguntou-lhe se era para isto que havia ficado em São Paulo.
Argumentou que se não e estava interessada em ter um relacionamento sério com alguém, não deveria ficar enganando e mentindo para ele.
Ester tentou argumentar, disse que estava sendo radical, mas Venâncio estava irredutível.
Não queria saber de desculpas.
Razão pela qual terminou seu relacionamento com a moça.
Quando Carolina soube da novidade, lamentou o ocorrido, mas asseverou que havia males que vinham para o bem.
Venâncio contudo, ficou muito desapontado com a moça.
Para consolá-lo, Vandré conversou com ele.
 Disse que logo logo, ele iria encontrar uma boa moça, e esquecer a decepção que tivera com Ester.
O moço porém, não queria falar na moça.
Assim, sempre que ameaçava tocar no assunto, tratava logo de desconversar, encaminhando a conversa para outros temas.
Perguntava do trabalho de Vandré.
Nestas conversas, Venâncio perguntou ao irmão se estava progredindo, em suas pesquisas.
Vandré respondeu-lhe que sim.
Participou-o das novidades.
Falou-lhe do interesse em pesquisar amuletos.
Venâncio perguntou-lhe se acreditava realmente no poder de amuleto.
Vandré disse-lhe que por enquanto estava apenas pesquisando.
Argumentou que precisava entender por que a família acreditava tanto em maldição.
Venâncio respondeu, que ao conhecer um pouco mais da história da família, passou a entender o por quê de tantas pessoas acreditarem em maldição.
Dizia que de fato eram pessoas sofridas, e compreensível sua apreensão.
Vandré concordou.
Argumentou porém que acreditar em maldição no entanto, era um pouco prematuro.
Venâncio ofereceu ajuda, mas Vandré respondeu-lhe que esta busca cabia a ele.
Completou dizendo porém, que caso precisasse, o chamaria para acompanhá-lo em suas pesquisas.
Venâncio respondeu que estaria sempre a postos.
Nos dias que se seguiram, a moça ficou a ligar para Venâncio, que se recusava a atendê-la.
Assim, sempre que via o número do telefone da moça em seu aparelho celular, tratava de desligar o aparelho.
Certa vez, a moça apareceu no escritório do moço.
Dizia estar arrependida do seu jeito desinteressado e do jeito displicente pelo qual conduzira o namoro.
Tentando argumentar, dizia que desta vez tudo seria diferente.
Insistia em ter uma nova chance com o rapaz.
Mas Venâncio estava irredutível.
Com isto, sempre que a moça ligava para o escritório, instruía a colega Tânia a despachá-la.
E Tânia inventava diversas desculpas.
Dizia que Venâncio estava em uma reunião, que havia saído, que não se encontrava no setor.
Aborrecida, Ester chegou a cercar a moça na saída do escritório.
Queria tomar satisfações.
Disse-lhe que sabia que estava sendo instruída por Venâncio, mas que não se daria por vencida e trataria de reconquistá-lo.
Por fim foi embora.
Tânia ficou perplexa, e a se perguntar do por quê da atitude da moça.
Contou o ocorrido a Venâncio.
O moço, ao tomar conhecimento do fato, ficou envergonhado.
Tentando se desculpar, argumentou que não tinha o direito de envolvê-la em toda aquela confusão.
Prometeu que iria conversar com a moça, e dar um ponto final na história.
Tânia ao ouvir isto, argumentou que ele não tinha que dar satisfações para ela.
Mas o moço insistiu.
Argumentou que ela sempre fora tão gentil com ele, e com todos os colegas do escritório.
Merecia ser respeitada.
Por fim, recomendou a mulher, que caso Ester lhe causasse mais problemas, deveria comunicá-lo para que fossem tomadas as medidas cabíveis.
Tânia ao ouvir isto, comentou que não pretendia causar transtornos para ninguém.
Venâncio respondeu-lhe, que quem havia criado problemas era Ester.

Nisto, dias depois, o moço apareceu de surpresa na casa da moça.
Ester ao vê-lo ficou radiante.
Por alguns instantes, acreditou que o moço estava disposto a reatar o namoro.
Contudo, quando o moço começou a dizer que ela havia passado dos limites, e que se continuasse a importuná-lo ou a qualquer de seus colegas, seria compelido a tomar medidas legais contra ela.
Argumentou que ameaça era crime, e que ela poderia ser presa por isto.
Ester ficou surpresa com a agressividade.
Argumentou que nunca havia visto ele tão nervoso.
Venâncio por seu turno, argumentou que tampouco conhecia o lado inconveniente da moça.
Afirmou-lhe que estava avisada e que caso voltasse a ligar para o escritório, ou ficasse cercando seus funcionários, ela iria se entender com ele.
Ester tentou argumentou com o moço, mas Venâncio rebateu dizendo que ela estava avisada.
A moça teve que se calar.
Nisto o moço se retirou.
Ester fechou a porta.
Ficou chorando.
Estava arrependida da burrada que havia feito, mas já era tarde, não havia mais como consertar o estrago.

Com o tempo, o moço começou a sair com Tânia.
A moça atenciosa, era o oposto de Ester.
Certa vez, o moço ofereceu uma bonita bijuteria para a moça.
Tratava-se de um broche.
Dizia ter sido de sua avó.
Tânia, ao observar o objeto, comentou que era lindo.
Contudo, não precisava mentir dizendo se tratar de um objeto de valor.
Venâncio ficou completamente sem graça.
Tânia tratou de completar, dizendo que trabalhou numa joalheria e conhecia um pouco de jóias.
Rindo, disse que não seria fácil de enganá-la.
Ressaltou que sabia que não se tratava de uma peça de família.
Jantaram.
Venâncio pediu-lhe desculpas.
Disse que fora um tolo por mentir.
No que Tânia concordou.
Argumentou que entendia o fato dele estar ressabiado com as mulheres, mas que isto não justificava uma atitude tão boba.
 O rapaz concordou.
Argumentou que fora infantil.
Que tentou testá-la, e o tiro saiu pela culatra.
Tânia riu.
Disse que não estava mais em idade de passar por avaliações.
Venâncio então, perguntou como a moça havia descoberto a mentira.
Demonstrou curiosidade.
Tânia então, após ao jantar, enquanto estava sendo conduzida ao carro pelo moço, resolveu contar o segredo.
Disse que ao observar a bijuteria, verificou os materiais.
Argumentou que por se tratar de uma suposta jóia que pertencera a sua avó, era um objeto antigo, que certamente sofrera algum desgaste do tempo, por mais cuidado que houvesse em seu manuseio.
Ressaltou que a peça não tinha marcas do tempo, parecendo ter acabado de sair da fábrica.
Novinha em folha, com um brilho intenso.
Mais tarde ao segurar a peça, comentou que era um trabalho muito bem feito, e que uma pessoa menos atenta certamente seria enganada pelo truque.
Venâncio riu.
Estava admirado.
Disse-lhe que nunca havia conhecido alguém tão interessante, e inteligente quanto ela.
Seus colegas advogados, ao tomarem conhecimento da novidade, parabenizaram-no.
Diziam:
- Até que enfim você se tocou!
- Já não era sem tempo!
- Até que enfim.
Todos que o conheciam, parabenizaram o moço, quando souberam que ele estava saindo com Tânia.
Nenhum deles gostava de Ester.
Consideravam a moça fútil e interesseira.
Quando o moço finalmente comentou do término do namoro com os amigos, todos lhe disseram, que foi a melhor coisa feita por ele.
Que deixasse ela encontrar alguém na justa medida para ela, diziam.
Quando Venâncio e Tânia passaram a namorar, todos os seus amigos comemoraram.
Elogiaram seu bom gosto, dizendo que Tânia era uma mulher bonita.
Venâncio concordava.
Dizia ter tirado a sorte grande.
Considerava-se um homem de sorte.
Vandré, quando soube do namoro, parabenizou o irmão.
Venâncio brincou com o irmão, dizendo que agora era hora dele desencalhar.
Vandré retrucava rindo que estava satisfeito com sua solteirice.
Logo foi apresentado a namorada do irmão.
Tânia era uma moça educada, elegante, discreta.
Quando Venâncio contou ao irmão que falara um pouco sobre sua pesquisa a moça, mencionou que ela conhecia pessoas que possuíam coleções de objetos indígenas, entre eles amuletos.
Vandré perguntou ao irmão, de onde ela conhecia estas pessoas.
Venâncio respondeu-lhe que a moça tinha amigos antropólogos e arqueológos e estes objetos seriam doados a um museu.
Curioso, o moço pediu para falar com Tânia, que lhe contou com mais detalhes a história.
Comentou que já havia visto algumas peças e que estava todas muito conservadas.
Mencionou que o objeto que mais lhe impressionou foi um muiraquitã.
Vandré ficou interessado e pediu a moça para agendar um encontro com os tais amigos.
Disse que tinha muito o que conversar com eles.
Tânia sorridente, respondeu-lhe que agendaria um encontro.
Venâncio agradeceu a gentileza da moça.
Por alto, já havia lhe dito que o irmão estava uma pesquisa sobre cultura indígena.
No que Tânia mencionou os amigos.
Relatou também que muita gente possuía ancestrais indígenas na família.
Venâncio concordou.
Certa vez, a moça comentou possuir curiosidade em conhecer a história de seus antepassados.
Seus ancestrais.
Comentou pouco conhecer da história dos avós, e menos ainda dos bisavós, e de quem os antecedeu.
E no entanto, lá estava ela, descendente de todas estas pessoas que não conhecia.
Contudo, mesmo não as conhecendo, faziam parte de sua história.
Rindo, comentou aquilo era meio louco.
Venâncio ficou a pensar nas palavras da moça.
Perdido em pensamentos, ficou pensando em como deveria ser reconfortante saber sua origem. Curiosamente sabia das histórias de seus ancestrais, mas pouco sabia a respeito de seus pais, em especial, quem teria sido seu pai.
Tânia, percebendo a distração do moço, perguntou-lhe:
- Oi? Moço? Onde você está?
Venâncio então, ao perceber que a moça lhe chamava, pediu-lhe desculpas.
Disse que estava distraído.
Tânia perguntou-lhe então:
- Posso saber em que tanto pensas? Espero que não seja nenhuma mulher. - completou rindo. Venâncio olhou a moça com deboche.
Rindo, comentou que estava pensando em muitas mulheres.
E nisto, começou a citar nomes de atrizes da tevê.
Tânia, ao perceber a provocação, jogou uma almofada no moço.
O jovem segurou o objeto.
Venâncio argumentou então, que a vida era muito engraçada.
Disse que enquanto alguns querem conhecer a história dos avós, bisavós, trisavós, outros só gostariam de saber quem foram seus pais.
Como se encontraram, como se conheceram, se houve amor entre eles.
Tânia ouvia com atenção.
Disse que aquilo tudo aquilo era familiar.
Foi então, que como todo o cuidado, perguntou se Carolina não havia lhe contado nada sobre seu pai.
Venâncio respondeu-lhe que não sabia nem se ele e Vandré, eram filhos do mesmo pai.
Tânia ao ouvir isto, pediu-lhe desculpas.
Disse que havia se metido onde não fora chamada. Venâncio então respondeu-lhe que não havia falado nada demais, e que ela, como parte da família, tinha todo o direito de se inteirar de seus assuntos.
Tânia fez menção de argumentar, mas Venâncio, ao perceber isto, comentou que iria apresentá-la ao restante de sua família, quando voltasse a fazenda do Valongo.
Disse-lhe que iria apresentá-la como sua noiva.
Tânia tentou argumentar mas Venâncio disse-lhe que eram favas contadas.
A mulher ficou intrigada.
Como assim, favas contadas?
E Venâncio respondeu-lhe que ela estava condenada a ficar a seu lado, por todos os séculos, dos séculos, dos séculos.
Ao ouvir isto, a mulher caiu na risada.
- Que conversa mais louca?
Nisto o homem segurou sua mão, beijou seu rosto, e perguntou-lhe se aceitava se casar com ele.
Tânia ria.
Venâncio impaciente, indagou-lhe, exigiu uma resposta.
Tânia risonha, respondeu que sim.
O moço, achando graça, comentou que já estava pensando que ela iria desistir dele.
Falou rindo para ela nunca mais repetir isto.
Tânia argumentou que ele era muito engraçadinho.
Quando recebeu um telefonema de Carolina, informando que a matriarca havia piorado, Venâncio convidou a moça para acompanhá-lo em viagem.
A jovem tentou desconversar, mas Venâncio mas foi rápido.
Disse que ela estava intimada a comparecer na Fazenda Valongo em sua presença, sob pena de condução coercitiva.
Risonho, Tânia perguntou-lhe como faria para conduzi-la coercitivamente, caso não fosse espontaneamente.
Venâncio respondeu-lhe que requisitaria força policial.
Debochada, Tânia perguntou do que se tratava a tal força policial.
Venâncio respondeu que chamaria toda a Guarda Nacional, na pessoa de seu irmão, seus amigos, e sua mãe.
Argumentou que caso precisasse tomar esta medida drástica, estaria perdida.
Tânia ria.
Disse-lhe que não tinha jeito, e que diante das circunstâncias, iria acompanhá-lo na viagem.
Por fim, argumentou se não iria incomodar se o acompanhasse.
Venâncio respondeu-lhe que não.
Tânia porém, insistiu para que o moço informasse a mãe, de sua ida.
E Venâncio então, telefonou para a mãe.
Informou-lhe que estava noivo de Tânia e se poderia levá-la para lá.
Carolina, ao ouvir a história de noivado, ficou apreensiva.
Pensou que se tratava de Ester.
Venâncio teve que lhe contar que terminara o noivado com Ester.
Comentou que conheceu uma moça, que na verdade já era sua colega de trabalho, e estavam namorando.
Venâncio comentou que resolveu ficar noivo de Tânia.
Carolina ao ouvir o relato do moço, ficou desconfiada.
Chegou a perguntar ao moço, se não estava se precipitando.
Afinal, mal terminou um noivado e praticamente começou outro.
Recomendou-lhe juízo e mencionou que esperava que ele soubesse o que estava fazendo.
Venâncio, um pouco decepcionado com a reação da mãe, comentou que apesar do balde de água fria, estava feliz.
Argumentou que quando ela conhecesse Tânia, suas reservas iriam desaparecer.
Por fim, Carolina mencionou que não era momento de se levar visitas a fazenda.
No que Venâncio comentou que ela fazia parte da família, e que precisava apresentá-la a avó.
Carolina, percebendo o entusiasmo do moço, acabou concordando.
Contudo, recomendou-lhe que dissesse a moça que não se tratava de um evento festivo.
Venâncio concordou com as recomendações.
Carolina então, acabou concordando.
Com isto, dias depois, o trio seguiu viagem.
Venâncio contou do estado de saúde da avó.
Tânia chegou a lhe perguntar se aquela era a melhor hora para conhecer sua família.
Venâncio retrucou dizendo que todos estavam esperando por ela.
Tânia concordou em acompanhá-lo.
Preparou sua mala.

Viajaram de avião.
E do aeroporto, seguiram de carro para a fazenda.
Um funcionário da fazenda, os aguardava no aeroporto.
Ao chegarem na fazenda, Venâncio lhe mostrou a porteira.
Disse-lhe que aquele lugar era o Valongo.
Tânia curiosa, perguntou o por quê do nome.
Vandré respondeu-lhe que se tratava de um antigo mercado de escravos.
A moça respondeu que havia uma cidade em Portugal, com o mesmo nome.
Venâncio argumentou que talvez por isto, o mercado tinha este nome.
Nisto, chegaram a sede da fazenda, onde foram recepcionados por Carolina.
Venâncio apresentou as mulheres.
A mãe, Carolina, disse que a moça era bacharela em direito, sendo seu braço direito e esquerdo no escritório. Venâncio apresentou a mãe com a pessoa que cuidou dos filhos, e agora estava cuidando da mãe.
Tânia estendeu a mão.
As mulheres se cumprimentaram.
Nisto a mulher levou a moça para seu quarto.
Venâncio e seu irmão dormiriam em outro.
Séria, a mulher olhou para o filho dizendo para que tivesse juízo.
Tânia achou graça.
Mais tarde, ao passear pela propriedade, a moça comentou que Carolina era muito zelosa.
Venâncio rindo, comentou que ela não sabia o quanto.
O moço ensinou a moça a andar a cavalo.
 Tânia retrucou dizendo que estava bem com os pés no chão e não tinha interesse em ficar montada em um animal que não sabia controlar.
Mas Venâncio prometeu escolher um cavalo manso para que ela pudesse aprender.
E assim, depois de muito insistir, acabou convencendo a moça.
Tânia relutante, aceitou subir em um animal.
Venâncio auxiliou-a.
Segurou as rédeas do animal, e caminhou ao lado do cavalo.
A moça surpreendeu-se com os modos gentis ou cavalheirescos de Venâncio.
No dia seguinte, o rapaz mostrou a mulher as ruínas do antigo mercado de escravos.
Denominado Valongo, o qual dera origem a fazenda.
Do antigo mercado, só restaram pedras e parte de uma parede.
Venâncio comentou que uma vez, ele e seu irmão brincaram por ali.
Disse que foi uma festa.
Enquanto todos os procuravam pela fazenda, lá estavam os dois brincando de esconde-esconde em meio às ruínas.
Venâncio falou que até a cozinheira, Djanira, procurou pelos meninos.
Venâncio e Vandré por sua vez, só retornaram ao casarão tarde da noite.
Carolina já os esperava de cinta na mão.
Rindo, Venâncio comentou que levaram uma surra daquelas.
Tânia ficou admirada do relato.
Afirmou que aquelas ruínas ficavam longe da sede da fazenda, e que eles se arriscaram em ir sozinhos para aquele lugar ermo.
Comentou rindo, que Carolina tinha toda a razão em lhes dar uma surra.
Venâncio rindo, concordou.
Comentou que na época não entendia direito a preocupação de todos, apenas achava tudo muito divertido.
Agora porém, entendia que os pais ficavam atentos, por conta das reinações das crianças.
Tânia concordou dizendo que com seus sobrinhos, era a mesma coisa.
Um minuto de distração e lá estavam eles aprontando.
Os anjinhos, como costumava dizer.
Venâncio curioso, comentou que ela pouco falava da família.
Tânia argumentou dizendo que não havia nada demais, que a sua família, era igual a tantas outras que haviam por aí.

Antes de viajarem, a moça agendou um encontro de Vandré, com seus amigos pesquisadores.
Nisto, Venâncio, Tânia e Vandré seguiram para um sítio, onde foram muito bem recebidos.
Capinam e seus auxiliares, mostraram aos visitantes amuletos, cocares, arcos e flechas.
Contaram sobre lendas indígenas.
Vandré demonstrou interesse nos rituais religiosos, na figura do pajé, e nas histórias de feitiçaria.
Rindo Capinam disse-lhe que contaria tudo o que sabia sobre o tema.
Em conversas com o homem, o rapaz descobriu a história de uma maldição lançada sobre uma família.
Vandré curioso, perguntou detalhes da história.
Capinam comentou que conforme a lenda, vários descendentes morreram, não vindo a chegar a idade adulta.
Curioso, Vandré perguntou se o feitiço não poderia ser desfeito com algum ritual.
 Rindo, o homem comentou que conforme a lenda, o pajé, usando ervas especiais, e praticando um ritual com toda a tribo, conseguiu anular os efeitos da maldição.
Vandré fazendo troça, perguntou que ervas teriam sido essas, e qual teria sido o ritual realizado.
Capinam argumentou que haviam diversas teorias, mas nenhuma resposta certeira.
Argumentou inclusive, que tal história era tratada como lenda, em que pesem personagens reais retratadas na mesma.
Vandré ao ouvir isto, perguntou-lhe se podia dar mais detalhes da história.
Capinam respondeu-lhe que se tratava de uma família influente da região.
Contudo, disseram-lhe que não poderia declinar seu nome, em respeito aos parentes vivos, os quais não autorizaram, a liberação da informação.
Acreditavam que se o fizessem, seriam vítimas de preconceito.
O moço ao ouvir isto, demonstrou um certo desapontamento.
Capinam ao perceber que aquelas informações eram importantes para ele, indagou do motivo de tanto interesse.
Nisto o moço conversou que em sua família, haviam rumores de histórias parecidas.
Disse que seu interesse era histórico, pois estava interessado em escrever um livro sobre o assunto.
Rindo, Capinam comentou que ele teria um vasto trabalho para pesquisar o tema.
Prestativo, ofereceu-lhe livros.
Comentou que não sabia se tratar de um pesquisador.
Mencionou que Tânia não lhe mencionara o fato.
Vandré retrucou dizendo que estava fazendo segredo.
Comentou que não que ninguém sabia, pois estava fazendo uma surpresa.
Capinam estranhou mas entendeu as razões do moço.
Nisto, o homem convidou o trio para almoçar. Tânia, Venâncio e Vandré, tomaram um café na propriedade do homem.
Mais tarde o trio caminhou pela propriedade, sendo apresentado os artefatos.
Durante o almoço, Capinam, sugeriu ao trio que o acompanhasse em uma caminhada pelo litoral. Comentou que haviam descoberto sambaquis.
Vandré, ao ouvir isto, ficou interessado.
Nisto, a visita durou o dia.
O moço, sempre que descobria algo interessante, fazia anotações em um bloco.
Pernoitaram na propriedade do homem.
No dia seguinte tomaram um lauto café da manhã e seguiram viagem.
Capinam despediu-se do trio, desejando-lhes uma boa viagem, e que convidando-os a voltar sempre que pudessem.
Ao regressarem a capital, Vandré agradeceu Tânia.
Disse-lhe que a visita fora muito útil.
Com efeito, nas últimas semanas, ao conviver mais com Tânia, Vandré percebeu que o irmão havia feito uma boa escolha ao eleger a moça como sua namorada.
Vandré conhecia Ester de vista, mas em conversas com o irmão, sempre que o nome da moça era trazido pelas conversas, invariavelmente o moço comentava que ela era mimada.
Dizia que gostava de oferecer-lhe presentes, e que a moça sempre que recebia algum agrado, se mostrava mais gentil.
Vandré ao começar a tomar conhecimento do comportamento displicente da moça, passou a considerá-la uma péssima opção para o irmão.
Isto por que, todas as vezes em que agendou encontros com o irmão, a moça inventava desculpas para se fazer ausente.
Vivia adoentada.
Tal fato não passou despercebido de Vandré.
Mas o moço evitava qualquer juízo de valor sobre a moça. Ao contrário da mãe, que não gostava do jeito desinteressado da moça.
Mas Tânia era o oposto de Ester.
Mais presente, ofereceu-se por diversas para auxiliar nos afazeres domésticos.
Carolina é que sempre a dispensava das lides domésticas.
Dizia que uma moça urbana como ela, que vivia comendo fora de casa, não devia nem saber cozinhar.
Rindo Tânia respondeu-lhe que seu trabalho lhe propiciava desfrutar de uma boa condição de vida, e que em razão da vida corrida que levava, pouco tempo lhe sobrava para fazer comida.
Contudo, em que pese este fato, relata que nos tempos de vacas magras, cozinhou muito macarrão, muito arroz, feijão, ovo e frango.
Disse que não era tão boa dona de casa quanto as mulheres da família, mas que sabia se virar na cozinha.
Carolina agradeceu, mas respondeu que não seria necessário.
Com o tempo, e conquistando a confiança da mulher, Tânia começou a brincar dizendo que ela estava com medo de comer uma comidinha ligeiramente queimada.
Carolina olhou-a com espanto, e perguntou-lhe se costuma queimar a comida.
Rindo, Tânia respondeu que não.
Disse estar apenas brincando.
A mulher com o tempo, percebendo o jeito brincalhão da moça, com o tempo, deixou de levar a sério seus comentários.
Certo dia, encontrando-se à sós com o filho, elogiou sua escolha.
Disse Tânia era uma moça prestativa e que ele ao se casar com ela, estaria fazendo um grande acerto.
Comentou que não conhecera Ester, mas disse saber que ela não servia para ele.
Venâncio comentou que Ester fora um erro, mas que Tânia era a mulher de sua vida.
Carolina ao ouvir isto, sorriu para o filho.
Quando soube que o noivado fora apenas um pedido a moça, seguido da posterior compra de um anel e oferecimento a ela, Carolina argumentou que o noivado precisava ser comemorado em grande estilo.
Vandré concordou, argumentando que aquele noivado estava muito mixuruca.
Nisto, prepararam um belo jantar, onde o moço repetiu o pedido.
Carolina sugeriu que o moço presenteasse a jovem com uma joia da família.
Dona Carolina, já havia sido apresentada a moça.
A matriarca se encheu de encantos pela moça, dizendo-lhe que era uma mulher forte, digna de entrar para a família.

Nisto, Dona Carolina entregou a filha, um broche, que pertencera a mãe de sua pentavó, Thereza.
Era uma joia pertencente a Carolina.
A filha, ao perceber que se tratava de um joia com a história da família, perguntou-lhe se não preferia oferecer um presente menos pessoal.
A velha senhora, ao ouvir isto, argumentou dizendo que ela era a pessoa certa.
Disse que ela se casaria com o moço e faria parte da família.
Carolina sentiu tanta certeza nas palavras da mãe, que deixou de lado suas prevenções.
E assim, no dia do jantar, a moça exibiu o anel de noivado ganho pelo moço.
Lara e Antonia ficaram admirando a joia, encantadas.
As crianças ficaram em volta observando a moça.
Tânia era só risos. Carolina dias antes, conversou como o filho e lhe mostrou o camafeu, que havia sido da primeira Carolina.
Venâncio pegou a joia e percebeu que dentro do mesmo havia um objeto.
Abriu o broche e descobriu dentro dele fios de cabelo.
A mulher, ao perceber isto, recomendou-lhe que guardasse aqueles fios com cuidado.
Curioso, Venâncio perguntou-lhe se sabia a quem pertenciam.
Carolina respondeu-lhe que eram da primeira Carolina.
Comentou que após a morte da esposa, o índio passou a guardar a joia como uma lembrança da memória da esposa.
A mulher comentou que no diário da moça, constava a informação de que durante a fuga da fazenda, a moça trazia pendurado no pescoço uma corrente e um camafeu, o qual foi perdido.
Anos mais tarde, ao se instalarem novamente na propriedade, o índio ofereceu-lhe um novo camafeu de presente.
Joia que a moça usava em ocasiões especiais.
Adorno guardado como herança de família, pensou Venâncio.
Com isto, argumentou que precisava contar a história do presente para a moça.
Carolina concordou.
Venâncio ao perceber o significado do gesto, abraçou a mãe.
Com efeito, durante o jantar, o moço, dizendo que já havia presenteado a moça com um anel de noivado, comentou que havia um presente ainda mais especial para ela.
Curiosa, Tânia perguntou-lhe do que se tratava.
Venâncio disse então, que era uma joia muito especial, pelo significado que trazia.
Argumentou que se tratava de uma joia da família.
Nisto o moço sacou o objeto do bolso e o colocou nas mãos da moça.
Tânia ao tocar o objeto, pensou tratar-se de um broche, mas ao analisá-lo melhor, percebeu se tratar de um camafeu.
Admirada, exclamou que conhecia a joia, dos romances que lera de Joaquim Manoel de Macedo, mas que nunca tinha visto um pessoalmente.
Encantada, abriu o presente, vindo a notar que em seu interior havia fios de cabelo.
Venâncio comentou que eram fios de cabelo da primeira Carolina.
A mãe de todos os descendentes da família.
Tânia olhou-o com admiração.
Venâncio então, contou-lhe detalhes sobre a história da família.
Tânia ouvia a tudo com muito interesse.
Em dado momento, Dona Carolina pediu a palavra ao neto.
Disse que precisa contar detalhes da história a moça.
Nisto a matriarca mostrou o diário de Carolina para ela.
Leu trechos do relato para Tânia, que interessada, perguntava mais detalhes sobre a história.
A certa altura, Carolina – a filha pediu para que todos se dirigissem a sala de jantar, pois a refeição seria servida.
Nisto, Tânia comentou que estava encantada de receber uma joia com tanta história.
Olhando para Dona Carolina, segurou suas mãos, e agradeceu o presente.
Disse-lhe que nunca havia ganho nada tão lindo.
A matriarca ficou comovida com o gesto.
Agradeceu a gentileza da moça, e auxiliada por Vandré e Venâncio, foi conduzida a sala de jantar.
Enquanto ceavam, conversavam animadamente.
Dona Carolina observava tudo com atenção, olhando para todos com extrema ternura.
Foi servido vinho e champagne.
No dia seguinte, a mulher chamou Tânia em seu quarto.
Apoiada em uma bengala, caminhou pelo recinto, mostrou os móveis que guarneciam o quarto, a penteadeira e outros objetos da avó Carolina, e de Rosália sua mãe.
Comentou que alguns móveis da fazenda, vieram de outro casarão, lá em terras do Sul do Brasil.
A mulher mostrou fotos e pinturas das mulheres da família.
Mostrou ainda, um baú, com uma série de cadernos.
Novamente leu trechos do que estava escrito, para a moça.
A certa altura a jovem percebeu que as ancestrais de Dona Carolina acreditavam que havia sido lançada uma espécie de maldição sobre a família.
Tânia ficou intrigada.
Mais tarde, em conversas com Vandré e Venâncio, descobriu a história das maldições.
Os moços comentaram que por muito tempo acreditaram, que tudo não passava de uma grande bobagem, mas que poderia não ser.
Rindo, Tânia acreditou que eles pudessem estar brincando.
A moça chegou a criticar os moços por acreditar naquela história.
Dizia entender que os mais antigos acreditassem, mas eles não.
Nisto afastou-se, indo se recolher em seu quarto.
Venâncio fez menção de ir ao seu quarto, mas Vandré aconselhou-o a esperar um pouco.
Disse que a moça devia estar confusa e que precisava por suas ideias no lugar.

Dias depois a moça arrumou suas malas.
Estava disposta a ir embora, em que pesem os argumentos de Venâncio para que ficasse.
Por conta disto, Vandré conversou com a moça.
Carolina também.
E Tânia teria partido, não fosse o sumiço das crianças.
Em razão da necessidade de se procurar por elas, a moça acabou desistindo de partir.
Prometeu auxiliar nas buscas.
E assim, no final da tarde, as crianças foram encontradas.
Tânia e Venâncio foram procurá-las nas ruínas do Valongo.
Vandré e Carolina foram procurá-las no celeiro e demais instalações da fazenda.
As crianças brincavam perto das ruínas.
Tânia e Venâncio, ao verem as três crianças brincando em volta de uma árvore que havia ali perto, chamaram-nas.
Aproximaram-se das crianças, que sorriram para eles.
Nisto, levaram as crianças de volta para a fazenda.
Lara e Antonia ao verem os filhos a sua frente, correram para abraçá-los.
Como as crianças estavam com fome, foram alimentadas.
Tomaram banho.
No dia seguinte, foram proibidas de sair da sede.
Estavam de castigo.
Os três tentaram argumentar, em vão.
Estavam proibidos de sair da casa.

Dias depois, Dona Carolina teve uma piora em seu estado de saúde.
Dois dias depois, a mulher veio a falecer.
Antes de falecer, falou com todos os descendentes da família.
Para Lara e Antonia, pediu que encontrassem um pai para seus filhos.
A filha Carolina, pediu para que reconstruísse sua vida, e que não ficasse sozinha, isolada naquela fazenda.
Aos netos Vandré e Venâncio, pediu para que se casassem e livrassem a família da triste sina.
Comentou com Venâncio que Tânia era boa moça, e que Vandré também iria encontrar uma boa moça.
Por fim, chamou o mais novo dos irmãos para um canto.
Cochichando em seu ouvido, disse que Tarcisio não tivera vida longa, mas que fora muito feliz enquanto vivera.
A mulher então, apontou para seu guarda-roupa.
Vandré abriu o móvel.
Carolina apontou na direção dos cabideiros.
O moço vasculhou o móvel até encontrar um fundo oco.
Ao achar o fundo falso, o moço retirou a madeira, vindo a encontrar pastas e livros.
Quase sussurrando, a mulher respondeu que tudo aquilo era seu.
Vandré ficou estático.
Foi preciso que Carolina insistisse, para que ele pegasse os livros.
A velha senhoria dizia que a história não poderia morrer com ela, e que todos os integrantes da família, deveriam saber o que havia ocorrido com seus ancestrais.
Vandré pegou os papéis com todo o cuidado.
Retirou tudo do guarda-roupa.
Por fim, a mulher apontou para um baú.
Com um fio de voz, respondeu que ali estava guardado o tesouro das existências.
Carolina, a filha disse que estava guardada toda a memória da família.
Vandré deixou toda a documentação próxima.
Por fim, a senhora pediu para que todos se aproximassem.
Disse baixinho que não tinha do que se arrepender.
Nisto, mexeu a cabeça para um lado.
Faleceu.
Dona Carolina foi enterrada junto as outras mulheres da família.

Nos dias que se seguiram, Antonia, Lara e as crianças partiram.
Por fim, Vandré, Tânia e Venâncio partiram.
Vandré retomou sua rotina acadêmica.
Ministrava aulas, e nas horas vagas ficava entretido na leitura dos diários das mulheres da família.
Teve o trabalho imenso o de encaminhar os documentos para sua casa na capital.
Carolina se incumbiu de providenciar o transporte do material para São Paulo.
Tratou-se de uma pequena mudança.
Venâncio, em visitas ao irmão, foi informado que parte dos livros precisava ser restaurado, e que isto envolvia muito trabalho e dinheiro.
Venâncio então, tratou de entrar em contato com a moça.
Solicitou informações a respeito do andamento do inventário.
Com o tempo, trouxe dinheiro para o irmão restaurar os papéis.
De posse do dinheiro, o moço contratou restauradores para a realização do trabalho.
O processo de restauração levou meses.
Enquanto isto, o moço lia as histórias, e fazia anotações em seu caderno.
Descobriu que o filho de Carolina, Abaeté, casou-se com uma branca, com ela vindo a ter várias filhas.
O moço fora prefeito da cidade, trazendo melhorias para o lugar, como escolas e até um pronto socorro.
Vandré descobriu que o homem era respeitado no lugar.
Habilidoso, conseguiu acrescer novas terras a antiga propriedade de seus pais.
Por conta de seu dinheiro, conseguiu casar-se com uma branca do lugar.

Helena, admirou-se do jeito corajoso do moço.
Embora se vestisse como um branco, era evidente sua ascendência indígena.
Nesta época, já havia feito melhorias na escola do povoado, angariando o respeito dos fazendeiros e moradores da região.
Passou a participar das festas, e foi numa dessas comemorações que convidou a moça para dançar.
Helena constrangida olhou para o pai, que prontamente a autorizou a dançar com o moço.
Ao fim da festa, o moço ofereceu-se para acompanhar a moça e sua família no regresso a fazenda.
Otacílio porém, respondeu que não havia necessidade.
Agradeceu a oferta, mais informou não ser preciso.
Abaeté então retirou-se.
Porém, sempre que se encontrava com a moça e sua dama de companhia, cumprimentava-as.
A certa altura, aproveitando uma ida de Otacílio a vila, disse ter interesse em lhe falar.
No que o homem perguntou:
- E qual é o assunto?
Abaeté então, sem pestanejar, respondeu que tinha interesse em Helena.
O fazendeiro olhou-o desconfiado.
O índio continuou.
Disse que pretendia se casar com a moça.
Argumentou que tinha casa, terras e que poderia proporcionar uma boa vida a moça, com conforto, além de seu afeto.
O fazendeiro curioso, perguntou-lhe por que acreditava que ele autorizaria o enlace.
Abaeté, surpreso com a indagação, argumentou que era um homem de bem, e que estando a moça sob seus cuidados, poderia ele ficar descansado que a moça nunca seria maltratada.
Otacílio, respondeu-lhe que tinha certeza disto.
Contudo, argumentou que precisava conversar com Helena.
Nisto, convidou o moço para visitá-lo na fazenda.
 Abaeté concordou.
Nisto, ficou ajustado que se encontrariam pela manhã.
O moço ansioso, no dia combinado, vestiu uma de suas melhores roupas para visitar a moça na fazenda.
Otacílio o esperava no alpendre.
Simpático, convidou-o para entrar.
Abaeté timidamente, adentrou a propriedade.
O fazendeiro comentou que em sua casa, as moças eram muito bem educadas.
Sabiam bordar, costurar, cozinhar, tocar piano, cantavam e sabiam ler e escrever.
Otacílio afirmava com orgulho, ser um dos poucos fazendeiros que permitiram as filhas estudarem com professoras particulares.
Disse que Helena sabia até um pouco de francês.
Abaeté disse ao fazendeiro que quando tivesse filhos, todos estudariam, fossem homens ou mulheres.
O moço comentou que Thereza sabia ler e escrever, e que Laura também fora iniciada no mundo dos livros.
Ao ouvir o suspiro do índio ao falar da irmã, o fazendeiro disse ter lamentado a morte.
Abaeté respondeu-lhe o tempo passava, mas a saudade da irmã não.
Otacílio, se solidarizando com o moço, comentou que infelizmente a morte se fazia muito presente naquelas paragens.
Comentou que ele próprio também perdera diversos filhos.
Abaeté lamentou o ocorrido, dizendo sentir muito.
Otacílio então comentou que aquele não era o momento de lembranças tristes.
Disse ao moço para que seguisse até a sala de jantar, indicando-lhe o caminho.
Nisto chamou Helena.
Abaeté então se deparou com uma mesa repleta de bolos, biscoitos, frutas e demais quitutes.
Uma escrava apareceu para servi-lo.
Abaeté então se acomodou.
Em seguida apareceu Helena.
O moço levantou-se.
Quando a jovem sentou-se em seu lugar de costume, o rapaz ofereceu-se para ajeitar sua cadeira.
Helena com um gesto concordou.
Abaeté ajeitou sua cadeira.
Helena agradeceu e o moço tornou a se sentar.
Sem jeito, o moço lhe ofereceu bolos, suco.
A sinhazinha tinha que a todo o momento recusar os oferecimentos.
Só aceitou um pedaço de bolo de fubá e o café.
Abaeté sugeriu servi-la, no que a moça retrucou dizendo possuir criadas para tanto.
O moço rindo, concordou.
A escrava então serviu-lhe um café fresquinho.
Conforme suas próprias palavras.
Abaeté e Helena se olhavam.
Depois de algum tempo, surgiram os pais da moça.
Abaeté novamente se levantou para cumprimentar a mãe da jovem.
A mulher agradeceu a gentileza do jovem.
 Nisto o homem perguntou como ia a fazenda.
Abaeté que lá havia muito trabalho, mas também muita alegria.
Otacílio respondeu que em suas terras, não era muito diferente.
Muito trabalho, mas também havia as festas.
O rapaz comentou que as recepções da família na cidade eram famosas.
Acrescentou que suas celebrações na fazenda eram animadas, mas nada que se aproximasse em requinte, das festas do senhor Otacílio.
O fazendeiro riu.
Comentou que também apreciava a simplicidade.
Acrescentou que tinha interesse em ser convidado para os eventos ocorridos em sua fazenda.
Abaeté sorriu, e comentou que certamente seria convidado.
Mais tarde, o homem recomendou que a mulher e a filha se retirassem.
Disse que tinha assuntos particulares a tratar com o moço.
Nisto, Abaeté e Otacílio conversaram sobre a proposta.
Abaeté reiterou sua intenção de casar, e perguntou se a jovem estava disposta a se casar com um nativo, que não era branco, e cuja ascendência europeia se originava da mãe.
O estancieiro comentou que havia conversado com a mulher e com a filha.
Ressaltou que da parte dele, não haveria nenhum impedimento para o casamento.
Argumentou não se importar com o fato dele não ser um legítimo descendente de europeus e sim, um legítimo filho da terra.
O fazendeiro argumentou que ele sim tinha direito de se dizer brasileiro, pois nascera naquelas terras e conhecia aquelas matas.
Mencionou que a diferença de costumes não o incomodava, tendo em vista que havia se adaptado com a convivência com os brancos.
Abaeté ressaltou que sempre vivera em companhia dos brancos, mas que nunca abandonara sua cultura, apenas se adaptando a uma nova condição.
O fazendeiro concordou.
Argumentou que os primeiros portugueses, também tiveram que desbravar florestas.
Rindo, o índio comentou que quanto a isto, não haviam muitas diferenças entre as duas culturas.
O fazendeiro concordou.
Dizendo que estavam se entendendo, pediu licença, e se afastou.
Otacílio então, chamou a filha e a esposa.
Com as mulheres na sala, o homem informou que em conversa com a família, ficou ajustado que a moça receberia visitas na fazenda, afim de conhecê-lo melhor.
Abaeté novamente cumprimentou a moça.
Em seguida o fazendeiro comentou que assim que estivessem firmes e decididos, poderia marcar a data para o casamento.
Abaeté concordou.

Thereza sua irmã, assim como Laura, em que pesem serem filhas de Abaré, não possuíam os traços indígenas tão marcantes quanto os do irmão.
Eram mais parecidas com a mãe.
Até na cor da pele.
Quanto a isto, Thereza era a mais parecida com Abaré.
Com seus cabelos lisos, trazia-os sempre presos numa trança, enfeitada com uma fita branca.
Às vezes colocava uma flor na ponta para enfeitar.
Vaidosa, adorava cantar modinhas.
Abaeté sempre que podia, levava a irmã em suas incursões pela cidade.
A moça sabia ler e escrever, e adorava as modinhas.
Certo dia, em passagem pela cidade, puderam acompanhar uma festa de fantasiados que lançavam objetos uns nos outros.
O moço respondeu-lhe que se tratava de uma festa trazida pelos portugueses.
Thereza ficou chocada com a agressividade da comemoração.
Pediu para o irmão levá-la de volta para casa.
Abaeté comentou rindo:
- Depois os índios e os negros é que são considerados selvagens!
Nisto o rapaz segurou a irmã pelo braço.
Seguiram em direção a uma mercearia, onde o moço comprou alguns utensílios.
Thereza encantou-se por uma caixinha de música.
Abeté ao perceber que a mulher ficou o tempo todo a mexer no objeto, tratou de adquiri-lo para a irmã.
A moça agradeceu.
Por fim, os irmãos seguiram de coche para casa.
A moça estava elegantemente vestida de vestido e anáguas, espartilho.
Trazia em seu pescoço um camafeu.
Jóia que pertencera a mãe.
Abaré, após o falecimento de Carolina, triste, abatido, ofereceu a lembrança a filha.
Abalado dizia não ter condições de se desfazer dos pertences da esposa.
Tanto que os objetos foram cuidadosamente guardados em um quarto afastado da casa.
Abaeté, após o falecimento do pai, resolveu deixar os pertences de ambos juntos.
Também não tivera coragem de se desfazer de nada.
Triste, dizia que tudo no casarão lembrava os pais, e que precisava honrar a memória dos dois.

Enquanto lia os relatos, Vandré percebeu ao vasculhar os volumes, indagou se sua mãe Carolina havia feito registros, como as suas ancestrais.
Em conversas com a mãe, exigiu que ela apresentasse seu diário.
Argumentou que somente entenderia como desfazer a maldição, se soubesse de todos os relatos, toda a trajetória da família.
Mencionou que lendo os diários das mulheres da família, descobriu a origem de Tarcísio, e por que o mesmo carregava este nome.
Contudo, faltavam detalhes sobre sua vida, como teria morrido.
Carolina tentou argumentar, dizendo que não sabia de detalhes da vida do irmão.
Argumentou que não conviveram.
Ressaltou que quando nasceu, o menino já havia sido afastado da convivência da família.
Mencionou que a mãe acreditava estar protegendo-o, em assim procedendo.
Mas Vandré, em visita a mãe, insistiu que ela apresentasse o diário.
Argumentou que sem aquela ferramenta, pouco poderia fazer para que a maldição lançada sobre a família fosse desfeita.
Carolina relutou, mas com o tempo, acabou concordando em entregar os diários.
Argumentou que escondeu parte da história, tentando proteger a ele a ao irmão.
Por fim, mostrou um livro guardado de Carolina.
Comentou havia achado o objeto, enquanto fazia a limpeza do quarto.
Mencionou que estava guardado em uma caixa, junto ao vestido de noiva que Rosália fizera para ela, o qual nunca tivera oportunidade de vestir.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.

VERSÃO ALTERNATIVA.

VALONGO - CAPÍTULO 26 - VERSÃO OFICIAL

De avião, Vandré foi até a capital do estado, vindo a realizar o restante da viagem, em um carro alugado.
Ao chegar na cidade onde Abaeté fora eleito intendente, o moço descobriu que a antiga estância havia se transformado em um distrito da cidade, pouco restando da propriedade original.
Visitando o cartório do distrito, descobriu que as terras foram vendidas diversas vezes, e que pelas suas dimensões, foram desmembradas e transformadas em pequenas propriedades, que com o tempo foram loteadas e transformadas em moradias, e condomínios residenciais verticais.
Vandré, ao descobrir que as terras de seus ancestrais, viraram um empreendimento comercial, lamentou.
Chegou a criticar a postura dos novos proprietários das terras, dizendo que a falta de preocupação em preservar a memória do país, era o que transformava o Brasil, num país subdesenvolvido.
Lamentou que o casarão tinha desaparecido, só restando sua memória nas velhas fotografias, mostradas por sua avó Carolina.
Fotografias e pinturas.
Na Fazenda do Valongo, havia um velho quadro retratando o velho casarão.
A velha senhora mostrava com orgulho, as origens da família, mas dizia com tristeza, que nunca havia pisado naquelas terras.
Ao se lembrar disto, Vandré chegou a pensar que foi bom Dona Carolina não ver aquilo.
Pois se para ele foi difícil se deparar com mudança tão radical, o que seria para ela, acostumada com os tempos de antanho, se deparar com tamanha transformação.
Neste momento, um cliente do cartório, foi informado que o velho casarão ainda existia, embora não em sua forma original.
O homem conduziu Vandré aos limites do distrito.
Quando o moço avistou uma construção em ruínas, mostrou-a a Vandré, que se espantou como o estado de degradação da construção.
Perguntou:
- É este o casarão onde morou Abaeté Chagas?
- É sim! - respondeu o moço.
Vandré então, pediu para se aproximar.
Chegando mais perto, Vandré percebeu que a construção estava em ruínas.
Praticamente só a fachada estava de pé, quase como o fora nos tempos em que a estância fora invadida e incendiada.
Quase como nos tempos de Abaré e Carolina.
Emocionado, o moço chegou bem perto, da construção.
Odílio, o homem que o acompanhou na empreitada, disse para que tivesse cuidado.
Argumentou que não se sabia em que condições estava, o que havia restado da construção.
Mencionou que a fachada da casa, poderia desabar.
Vandré parou em frente a construção.
Avistou nas proximidades, ciprestes, paineiras e figueiras.
Recordou-se que o grande Abaeté, assim como seu pai Abaré, fora sepultado em um caixão de madeira de lei.
Feito da derrubada de algumas velhas árvores da fazenda.
Alguns índios eram exímios escultores e entalhavam os caixões, faziam móveis, e trabalhavam na estrutura das casas, fazendo janelas, portas e todo o madeiramento necessário.
Abaré era bom nisto.
Escrevera Carolina, em seu diário, repleto de recordações.
O moço levara o caderno em sua viagem.
Odílio, em conversas com o moço, percebendo a importância do documento que Vandré trazia nas mãos, comentou que aquela documentação não poderia ficar adstrita a família, devendo outras pessoas, tomarem conhecimento dos relatos.
Disse que aquelas histórias familiares também contavam a história do sul.
Vandré disse que o manuscrito não era seu.
Razão pela qual, não poderia dispor da forma como bem entendesse.
Odílio lamentou.
Argumentou que havia uma grande chance de tudo aquilo se perder.
Vandré comentou a certa altura, que precisava conversar com o restante da família.
Afinal a história de todos estavam registradas naqueles diários, e não apenas a memória do sul.
Nisto, o moço tirou fotos do casarão, do que restara da antiga propriedade, das antigas casas de colonos.
Adentrou a construção em ruínas e tirou fotos.
Também tirou fotos da cidade, do distrito e da transformação do lugar.
Conversando com Odílio, descobriu que a propriedade estava abandonada desde a morte de seu antigo proprietário, e que nenhum herdeiro apareceu para reivindicar sua propriedade.
Ao ouvir isto, Vandré se espantou.
Pesquisando o registro em cartório, descobriu que o último proprietário adquiriu a propriedade há mais de quarenta anos.
Verificando no cartório de pessoais naturais da localidade, constatou que o homem falecera há cerca de vinte anos.
Como nenhum herdeiro reclamou a propriedade, a herança jacente, tornou-se vacante.
Mais tarde, as terras naturalmente passaram a pertencer ao município.
Odílio comentou que havia interesse por parte de alguns moradores do lugar, de transformar o local em uma espécie de museu, mas que a prefeitura do lugar não estava interessada.
O moço disse que por ser longe da cidade, não havia interesse comercial na exploração econômica do local.
Vandré considerou um desperdício um lugar como aquele, ficar abandonado.
Disse que se pudesse, recuperaria o casarão, e transformaria o lugar em museu para contar a memória do lugar.
Argumentou que quanto a distância, poderia ser erigido um hotel fazenda.
Odílio gostou da ideia.
De tão animado, mostrou um cartão ao moço.
Disse que se ainda tivesse interesse na recuperação da região, para procurá-lo.

Com efeito, ao vasculhar melhor as terras, ficou se perguntar onde seus ancestrais estariam enterrados.
Odílio respondeu-lhe que os corpos, enterrados na fazenda, foram trasladados para um dos cemitérios da cidade.
Vandré então, empreendeu verdadeira peregrinação pelos cemitérios da cidade.
Descobriu vários túmulos dispersos, no principal cemitério da cidade.
Vandré concluiu se tratar da primeira necrópole do lugar.
Também descobriu um cemitério afastado, onde foram enterrados os escravos da região, e uma placa homenageando os mortos em um conflito ocorrido em 1877.
A placa indicava a família Abaré Chagas.
Vandré também retratou a placa.
Lugar de memórias quase perdidas, que emocionaram o rapaz.
Mais tarde, ao mostrar fotos para a família, todos ficaram abismados com o estado de abandono do lugar.
Também mostrou fotos dos túmulos e placas de homenagem aos túmulos dos mortos que fizeram parte da história da família.
Todos ficaram impressionados e emocionados com tudo.
Vandré então, comentou que aquelas terras estavam abandonadas.
Mencionou que tinha interesse em conversar com o prefeito do lugar.
Conversando com a família mencionou seu interesse em recuperar as terras e em resgatar a memória do ilustre Abaeté, e seu pai Abaré.
E toda sua descendência até a segunda Carolina, que vendeu as terras para seguir em viagem para outro estado.
Todos apreciaram a ideia, principalmente Marília, que se ofereceu para ajudar o moço.
Com o financiamento de Carolina, Vandré se afastou do trabalho na universidade, mediante a concessão de licença não remunerada.
Ficou anos trabalhando no projeto.
Odílio, Marília e Vandré, conversaram com dois prefeitos.
Finalmente tiveram autorização para trabalhar em terras da prefeitura.
Para tanto, houve uma licitação.
O trio, tratou de abrir uma empresa, para participar da disputa.
Com uma certa dificuldade, ganharam a licitação e o direito de exploração das terras por alguns anos.
O trio recuperou o antigo casarão, montaram um hotel fazenda, e recuperaram a área verde do local.
O empreendimento se tornou modelo de gestão para os empresários do lugar.
Enquanto tudo foi acontecendo, Venâncio, Tânia, Lara, Antonia, as crianças, Carolina e todos os amigos foram visitar o lugar.
Mais tarde suas pesquisas para resgatar a memória da família se transformaram num romance: “Valongo”.
Vandré então, abandonou de vez, a vida acadêmica.
Neste ínterim, Venâncio e Tânia, se casaram na Fazenda Valongo.
Todas as pessoas da família foram convidadas.
Marília trouxe um amigo.
Lara reatou seu relacionamento com seu antigo companheiro, para a alegria de suas filhas, que voltaram a conviver com o pai.
A moça chegou até a comentar que as crianças estavam mais calmas.
Antonia, por sua vez, continuava a cultivar sua solteirice.
Vandré compareceu ao casamento, acompanhado de uma jovem moça.
Tempos depois Venâncio e Tânia, tiveram um filho, de nome Olavo.
Esta criança nasceu e cresceu.
Vindo a se tornar adulto, formou-se em direito, e passou a trabalhar no escritório do pai.
Trouxe muito orgulho a família, que finalmente estava livre da maldição.
O garoto cresceu e gerou descendência vivendo até chegar a idade avançada.
Eram os anos finais do século XXI.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte. 

VALONGO - CAPÍTULO 25 - VERSÃO OFICIAL

O moço ansioso, no dia combinado, vestiu uma de suas melhores roupas, para visitar a moça na fazenda.
Otacílio o esperava no alpendre.
Simpático, convidou-o para entrar.
Abaeté timidamente, adentrou a propriedade.
O fazendeiro comentou então, que em sua casa, as moças eram muito bem educadas.
Sabiam bordar, costurar, cozinhar, tocar piano, cantavam e sabiam ler e escrever.
Otacílio afirmava com orgulho, ser um dos poucos fazendeiros que permitiram as filhas estudarem com professoras particulares.
Disse que Helena sabia até um pouco de francês.
Abaeté disse ao fazendeiro que quando tivesse filhos, todos estudariam, fossem homens ou mulheres.
O moço comentou que Thereza sabia ler e escrever e que Laura também fora iniciada no mundo dos livros.
Ao ouvir o suspiro do índio ao falar da irmã, o fazendeiro disse ter lamentado a morte.
Abaeté respondeu-lhe que o tempo passava, mas a saudade da irmã não.
Otacílio se solidarizando com o moço, comentou que infelizmente a morte se fazia muito presente naquelas paragens.
Comentou que ele próprio também perdera diversos filhos.
Abaeté lamentou o ocorrido, dizendo sentir muito.
Otacílio então comentou que aquele não era o momento de lembranças tristes.
Disse ao moço para que seguisse até a sala de jantar, indicando-lhe o caminho.
Nisto chamou Helena.
Abaeté então se deparou com uma mesa repleta de bolos, biscoitos, frutas e demais quitutes.
Uma escrava apareceu para servi-lo.
Abaeté então se acomodou.
Em seguida apareceu Helena.
O moço levantou-se.
Quando a jovem sentou-se em seu lugar de costume, o rapaz ofereceu-se para ajeitar sua cadeira.
Helena com um gesto concordou.
Abaeté ajeitou sua cadeira.
Helena agradeceu e o moço tornou a se sentar.
Sem jeito, o moço lhe ofereceu bolos, suco.
A sinhazinha tinha que a todo o momento recusar os oferecimentos.
Só aceitou um pedaço de bolo de fubá e o café.
Abaeté sugeriu servi-la, no que a moça retrucou, dizendo possuir criadas para tanto.
O moço rindo, concordou.
A escrava então serviu-lhe um café fresquinho.
Conforme as próprias palavras da criada.
Abaeté e Helena se olhavam.
Depois de algum tempo, apareceram os pais da moça.
Abaeté novamente se levantou para cumprimentar a mãe da jovem.
Eurídice agradeceu a gentileza do jovem.
Nisto Otacílio perguntou como ia a fazenda.
Abaeté respondeu que lá havia muito trabalho, mas também muita alegria.
Otacílio mencionou que em suas terras não era muito diferente.
Havendo muito trabalho, mas também festas.
O rapaz comentou que as recepções da família na cidade eram famosas.
Abaeté, acrescentou que suas celebrações na fazenda eram animadas, mas nada que se aproximasse em requinte, das festas do senhor Otacílio.
O fazendeiro riu.
Comentou que também apreciava a simplicidade.
Acrescentou que tinha interesse em ser convidado para os eventos ocorridos em sua fazenda.
Abaeté sorriu e comentou que certamente seria convidado.
Mais tarde, o homem recomendou que a mulher e a filha se retirassem.
Disse que tinha assuntos particulares a tratar com o moço.
Nisto, Abaeté e Otacílio conversaram sobre a proposta do moço.
Abaeté reiterou sua intenção, e perguntou se a jovem estava disposta a se casar com um nativo, que não era branco, e cuja ascendência europeia se originava da mãe.
O estancieiro comentou que havia conversado com a mulher e com a filha.
Ressaltou que da parte dele, não haveria nenhum impedimento para o casamento.
Argumentou não se importar com o fato dele não ser um legítimo descendente de europeus e sim, um legítimo filho da terra.
O fazendeiro comentou que ele sim tinha direito de se dizer brasileiro, pois nascera naquelas terras e conhecia aquelas matas.
Mencionou que a diferença de costumes não o incomodava, tendo em vista que havia se adaptado a convivência com os brancos.
Abaeté ressaltou que sempre vivera em companhia dos brancos, mas que nunca abandonara sua cultura, apenas se adaptando, a uma nova condição.
O fazendeiro concordou.
Argumentou que os primeiros portugueses, também tiveram que desbravar florestas.
Rindo, o índio comentou que quanto a isto, não haviam muitas diferenças entre as duas culturas.
O fazendeiro concordou.
Dizendo que estavam se entendendo, Otacílio pediu licença, e se afastou.
O fazendeiro então, chamou a filha e a esposa.
Com as mulheres na sala, o homem informou que em conversa com a família, ficou ajustado que a moça receberia visitas na fazenda, afim de conhecê-lo melhor.
Abaeté novamente cumprimentou a moça.
Em seguida o fazendeiro comentou que assim que estivessem firmes e decididos, poderia marcar a data para o casamento.
Abaeté concordou.

Thereza sua irmã, assim como Laura, em que pesem serem filhas de Abaré, não possuíam os traços indígenas tão marcantes quanto os do irmão.
Eram mais parecidas com a mãe.
Até na cor da pele.
Quanto a isto, Thereza era a que mais se parecia com Abaré.
Com seus cabelos lisos, trazia-os sempre presos numa trança, enfeitada com uma fita branca.
Às vezes colocava uma flor na ponta para enfeitar.
Vaidosa, adorava cantar modinhas.
Abaeté sempre que podia, levava a irmã em suas incursões pela cidade.
A moça sabia ler e escrever, e adorava as modinhas.
Certo dia, em passagem pela cidade, Abaeté e Thereza, puderam acompanhar uma festa de fantasiados, os quais lançavam objetos, uns nos outros.
O moço respondeu-lhe que se tratava de uma festa trazida pelos portugueses.
Thereza, ficou chocada com a agressividade da comemoração.
Pediu para o irmão levá-la de volta para casa.
Abaeté comentou rindo:
- Depois os índios e os negros é que são considerados selvagens!
Nisto o rapaz segurou a irmã pelo braço.
Seguiram em direção a um armazém, onde o moço comprou alguns utensílios.
Thereza, encantou-se por uma caixinha de música.
Abaeté ao perceber que a mulher ficou o tempo todo a mexer no objeto, tratou de adquiri-lo para a irmã.
A moça agradeceu.
Por fim, os irmãos seguiram de coche para casa.
A moça estava elegantemente vestida de vestido e anáguas, espartilho.
Trazia em seu pescoço um camafeu.
Joia que pertencera a mãe.
Abaré, após o falecimento de Carolina, triste e abatido, ofereceu a lembrança a filha.
Abalado, dizia não ter condições de se desfazer dos pertences da esposa.
Tanto que os objetos foram cuidadosamente guardados em um quarto afastado da casa.
Abaeté, após o falecimento do pai, resolveu deixar os pertences de ambos juntos.
Também não tivera coragem de se desfazer de nada.
Triste, dizia que tudo no casarão lembrava os pais, e que precisava honrar a memória dos dois.

Com o tempo, e com a frequência das visitas, Helena acabou se afeiçoando a Abaeté, e por fim, concordou com a proposta de casamento do moço.
Eurídice e Otacílio festejaram.
O homem comentou por fim, que a filha mais nova se casando, estando todas as demais encaminhadas, podia morrer tranquilo.
Para celebrar a data, foi agendado um jantar de noivado, na propriedade da família, na vila.
Abaeté vestiu sua melhor roupa.
Thereza, estava encantadora em seu vestido com várias anáguas.
Helena ao vê-la, elogiou sua elegância.
Conversaram, e a jovem aristocrata, ao perceber que Thereza era uma moça instruída, passou a lhe falar de livros e de modinhas.
Tornaram-se amigas.
Quando Abaeté faleceu, deixando para ambas a propriedade, as duas mulheres, reuniram forças para administrar o patrimônio deixado por ele.

Enquanto lia os relatos, Vandré percebeu ao vasculhar os volumes, que faltavam alguns detalhes.
Chegou a se perguntar se sua mãe Carolina havia feito registros, como as suas ancestrais.
Em conversas com a mãe, Vandré exigiu que ela apresentasse seu diário.
Argumentou que somente entenderia como desfazer a maldição, se soubesse de todos os relatos, toda a trajetória da família.
Mencionou que lendo os diários das mulheres da família, descobriu a origem de Tarcísio, e por que o mesmo carregava este nome.
Contudo, faltavam detalhes sobre sua vida, como teria morrido.
Carolina tentou argumentar dizendo que não sabia de detalhes da vida do irmão.
Relatou que não conviveram.
Ressaltou que quando nasceu, o menino já havia sido afastado da convivência da família.
Mencionou que a mãe, Carolina, acreditava estar protegendo-o, em assim procedendo.
Mas Vandré, em visita a mãe, insistiu que ela apresentasse o diário.
Argumentou que sem aquela ferramenta, pouco poderia fazer para que a maldição lançada sobre a família fosse desfeita.
Carolina relutou, mas com o tempo, acabou concordando em entregar os diários.
Argumentou que escondeu parte da história, tentando proteger a ele a ao irmão.
Por fim, mostrou um livro guardado de Carolina.
Comentou havia achado o objeto, enquanto fazia a limpeza do quarto.
Mencionou que estava guardado em uma caixa, junto ao vestido de noiva que Rosália fizera para ela, o qual usara na cerimônia realizada para celebração da união do casal.
A mulher não se casou, mas usou o vestido feito pela mãe.
E assim, antes mesmo que a moça tivesse um pretendente, sua mãe preparou as escondidas, um bonito vestido de casamento.
Quando Carolina conheceu Adroaldo, a mulher se encheu de esperanças.
Tanto que em dado momento, mostrou o bonito vestido branco bordado, para a filha, que se encantou com a delicadeza da peça.
Chegou a vestir o modelo, e a mostrá-lo para mãe, andando de um lado para o outro do quarto.
Por fim, Rosália recomendou que a filha, guardasse a roupa.
Carolina então, guardou com todo o cuidado em um baú, a peça.
Por vezes, trancava a porta e vestia a roupa.
Imaginava-se entrando em uma igreja enfeitada de flores, sendo conduzida pelo capataz da fazenda até o altar.
Empolgada, chegou a descrever em detalhes o vestido no diário.
Vandré, descobriu a história do vestido, ao ler o diário da avó.
Também procurou observar detalhes da peça.
Era um lindo vestido de renda, que seria o sonho de qualquer moça daqueles tempos.
O jovem emocionou-se ao ler o relato de Carolina e a frustração por nunca ter podido usar o vestido em um casamento de verdade.
No diário, havia menção ao fato de que a moça enfrentou a mãe para poder usar o vestido na cerimônia realizada pelo padre.
Mas enfim, usou a peça.
Por fim, descobriu que a mulher, mesmo tendo que enfrentar a mãe e da sociedade da época para ficar ao lado de Adroaldo, conseguiu se afirmar e ser respeitada.
Com o tempo, a despeito do descontentamento da mãe com o relacionamento, acabou por auxiliá-la na administração da fazenda.
Adroaldo por sua vez, passou a fazer a contabilidade dos negócios da família, sempre sob o crivo de Rosália e de Carolina.
Carolina foi feliz ao lado de Adroaldo, tendo dois filhos.
Tarcísio fora criado longe da família, pelos pais de Adroaldo, que se encantaram com a criança. Diziam em cartas, que o menino não dava trabalho algum.
Que era estudioso e aplicado.
Além de muito obediente.
A única coisa que preocupava o casal, era a saúde frágil do garoto.
Ana e Estênio por diversas vezes, tiveram que levar o garoto para o hospital.
Com efeito, a saúde do garoto só melhorou, após a família se mudar para o litoral.
Longe da localidade onde haviam morado, e bem longe das terras de Carolina.
Nisto, o garoto recuperou sua saúde, e sua disposição melhorou a olhos vistos.
O garoto fez amizade com os meninos do lugar.
Brincava de jogar bolinhas de gude, de futebol, empinava pipa.
Brincava de esconde-esconde e importunava as meninas, que gostavam de brincar de boneca.
Certo dia, quando uma delas ficou chorando, Ana, ao tomar conhecimento do fato, ralhou com o menino, dizendo que ele não devia maltratar as pessoas.
Dizia que isto não era certo.
Mas o triste mesmo, aconteceu quando um dos garotos, em uma briga para ver quem dava o pontapé inicial em uma bola de futebol, mencionou que ele Tarcísio, era criado pelos avós, por que não era bem-vindo na casa dos pais.
Ao ouvir isto, o moleque afirmou que aquilo era mentira.
Argumentou que por motivo de saúde, era criado pelos avós.
Como o menino parecia não acreditar em suas palavras, Tarcísio esbofeteou o moleque, que lhe deu uma rasteira.
Disse-lhe que estava expulso do jogo.
Tarcísio e levantou dali e foi mancando para casa.
Quando Ana o viu mancando, e com os olhos vermelhos, perguntou-lhe o que havia acontecido.
O garoto então, subiu as escadas e ficou em seu quarto.
Ana preocupada, foi atrás do garoto, para verificar o que havia acontecido.
O menino então, comentou o que haviam lhe dito no campinho.
A mulher retrucou dizendo que aquilo era bobagem, que Carolina o adorava, que o amava tanto que não mediu esforços para que ele ficasse bem e se recuperasse de seu problema de saúde.
Revoltado, o menino disse que não acreditava.
Questionou o fato da mãe pouco visitá-lo.
Ana respondeu-lhe que não podia, que Carolina tinha que trabalhar, e que raras vezes podia se ausentar da fazenda.
Mas Tarcísio não queria saber de entender.
Por muito tempo se sentiu abandonado e posto de lado.
Ana e Estênio procuravam estar sempre presentes.
Participavam das festinhas na escola, dos eventos da comunidade.
Com o tempo, Tarcísio passou a considerá-los como seus pais de verdade.
Adroaldo por seu turno, era quem mais visitava o garoto.
Quando nasceu Carolina, a mãe e o pai da criança, a apresentaram ao garoto.
Tarcísio ficou revoltado ao saber que ela seria criada na fazenda, ao lado dos pais, enquanto ele era privado disto.
Com o tempo, o garoto passou a evitar as visitas dos pais.
Por algum tempo, estudou em colégio interno onde era sempre visitado por Ana e Estênio.
Ao se tornar adulto, despedindo-se de Ana e Estênio, o moço passou a residir em uma república de estudantes, assim que ingressou em uma universidade.
Passaria a estudar longe dali, em outro estado, ainda mais longe da propriedade de Carolina.
Ao ser aprovado no vestibular, participou a novidade a Ana e Estênio, que ficaram felizes.
O homem porém, ao percebeu o quão distante ficava a faculdade, lamentou que teria dificuldades em visitá-lo.
Sorrindo, Tarcísio comentou que ele poderia visitá-lo usando o velho carro da família.
Dias mais tarde, de malas prontas, o moço seguiu de carro com o pai, para a localidade.
Animando, comentou no caminho, sobre os planos de se formar.
Contou que sentiria saudade dos dias de sol, do contato com a areia da praia, o sal do mar, as garotas bonitas de maiô.
Estênio achava graça nas palavras do moço.
Quando finalmente chegaram na república, o moço deixou suas malas no chão.
Logo foi apresentado aos colegas de quarto, que também conheceram Estênio.
Tarcísio fez questão de apresentá-lo como seu pai.
O homem cheio de orgulho, comentou que havia ajudado a criá-lo e que poderia sim, ser considerado seu pai.
Nisto o moço seguiu com Estênio pela a universidade.
Caminharam pelos longos corredores da instituição, conheceram seus jardins, o lago.
Estênio comentou que o lugar era muito bonito.
Argumentou que diante de tanta beleza era impossível não encontrar estímulo para estudar.
Tarcísio rindo, comentou que havia entendido o recado.
Carolina, ao tomar conhecimento do êxito do filho, ficou apreensiva.
Contudo, ao tomar conhecimento de que a instituição ficava distante de sua propriedade, tranquilizou-se.
Nisto, ao tentar visitá-lo, a mulher foi impedida por Ana e Estênio, que disseram que não poderiam fornecer o endereço da instituição.
Argumentaram que não tinham autorização de Tarcísio.
Carolina, comentou que eles não precisavam da autorização do moço, por que ela era a mãe dele.
Mas o casal estava decidido.
Não forneceram o endereço.
Lamentaram as circunstâncias, mas disseram que não poderiam trair a confiança do moço.
Argumentaram que se o fizessem, perderiam Tarcísio para sempre.
Carolina furiosa, dizia que eles não tinha direito de esconder-lhe esta informação.
Argumentou que eram eles que estavam traindo sua confiança.
Nisto, retirou-se da casa.
Carolina recordou-se do falecimento de seu companheiro.
Adroaldo, falecera em poucos anos de convivência.
Quando o homem morreu, o garoto fora chamado às pressas para comparecer no velório do pai. Tarcísio resistiu a ideia, mas por insistência de seus pais de criação, seguiu até a Fazenda Valongo. Lá, o garoto avistou o caixão e um homem deitado dentro dele.
A referida visão, causou-lhe uma má impressão.
O garoto quis sair dali, mas Ana o abraçou, disse-lhe para que não tivesse medo.
Dizia que não iria sair de perto dele.
E nisto Ana e Tarcísio permaneceram juntos durante todo o velório.
Carolina tentou se aproximar, mas o garoto se mostrou bastante arredio.
A mulher ao perceber isto, ficou magoada.
Mas entendendo a situação, procurou não insistir.
O garoto estava magoado, pois acreditava ter sido preterido.
Adulto, a mulher chegou a enviar-lhe cartas para explicar o por quê da distância.
Sem êxito.
Tarcísio sequer se deu ao trabalho de ler as missivas, devolvendo-as.
Vandré, de posse dos diários, também pode observar a existência de cartas guardadas.
Lendo os textos dos diários e o conteúdo das cartas, Vandré descobriu que o tio se formou em engenharia, vindo a encontrar um emprego na região em que estudara.
Para o litoral, só voltou para visitar os pais de criação, e tomar banhos de mar.
Em uma nova cidade, conheceu uma moça com a qual veio a se casar.
Chamava-se Marília, e foi apresentada a Ana e Estênio, que gostaram da moça.
Com o tempo, se casaram.
Em cartas, o moço relatar ter conhecido Marília em seu tempo de estudos.
A moça era uma mulher avançada para a época.
Circunstância que chamou a atenção do rapaz, que dizia estar cansado de mocinhas provincianas.
Dizia que Marília era moderna, tinha um trabalho de meio período, e não era obcecada por casamento, como algumas moças que frequentavam a instituição.
Tarcísio dizia que a maioria delas não estava interessada em ter uma profissão, e sim, em encontrar um bom casamento.
Nas cartas dirigidas aos pais, dizia que havia conhecido algumas das moças, mas que nunca conseguiu engatar um namoro, pois as mesmas só estavam interessadas em se casarem.
Ana e Estênio achavam graça nas palavras do moço, pois sabiam que isto era fase, que passaria com o tempo, e que o casamento é condição natural da vida humana.
Ana dizia estar certa de que ele acabaria encontrando uma boa moça e se casando.
Dito e feito.
O casamento foi realizado no litoral, com direito a lual, fogueira e trajes como batas indianas.
Ana e Estênio parecia um casal hippie.
Os pais de Marília, mais tradicionais, usaram roupas mais formais.
A mulher usava um vestido florido e sandálias, e o homem, bermuda e camisa.
A cerimônia foi registrada por um fotografo.
Ana ficou com algumas fotos, e o álbum ficou em poder de Marília, que não se cansava de mostrar aos amigos.
O casal teve duas filhas, Lara e Antonia.
Tarcísio trabalhou por vinte anos como engenheiro.
Faleceu quando as filhas eram adultas, mas não chegou a conhecer os netos.
As moças, educadas com o jeito livre da mãe, não se interessaram em casamento.
Lara teve duas meninas, Tereza e Helena, de diferentes relacionamentos e sua irmã tivera um menino, de nome André.
Antonia não vivia mais com seu antigo convivente, e Lara havia optado por dar um tempo em seu relacionamento.
Quando o pai faleceu, Marília se encarregou de cuidar das filhas.
Tarcísio faleceu dormindo.
Para surpresa de todos, tendo em vista de se tratar de alguém jovem ainda.
Tarcísio morreu com cinquenta anos incompletos.
Com a dedicação e o trabalho da mãe, as duas moças se formaram.
Lara era formada em letras, e Antonia havia se formado em engenharia.
As duas trabalhavam.
Vandré e Venâncio, quando tomaram conhecimento da luta das moças, as admiraram.
Marília ainda estava viva, mas havia optado em não conviver com a família de Tarcísio.
Com o tempo, descobriu a história da maldição e a justificativa para o afastamento de Tarcísio do convívio com a família.
Contudo, não concordava com a atitude de Carolina.
Quando a conheceu, Marília a cumprimentou formalmente, mas nunca procurou se aproximar da mulher.
Dizia não querer magoar o marido, já tão machucado com a história.
A aproximação, só começou após o falecimento de Carolina, e mediante muita insistência das filhas.
Marília então foi apresentada a toda a família.
Vandré e Venâncio ao conhecê-la, logo simpatizaram com a mulher.
Em conversas com Marília, descobriram que Tarcísio era um homem trabalhador, e dedicado a família.
A mulher comentou que fora ele quem a convencera a se casar.
Rindo, comentou que naqueles tempos, não acreditava em convenções, e que o casamento era uma instituição falida.
Nisto, contou que Tarcísio não queria um relacionamento sem compromisso.
Argumentou que relacionamento já pressupõe comprometimento.
E assim, como jeitinho, comentou que namoro não implicava em um futuro casamento, que podiam primeiro se conhecerem, para depois se casarem.
Marília por sua vez, disse que Tarcísio era insistente e que acabou a convencendo, depois de um certo tempo de namoro, a se casar.
Feliz, comentou que se casaram na praia, em um lual.
Contou que sentia falta do marido, e de Ana e Estênio, sempre tão bons com ela.
Marília comentou que quando o marido morreu, ambos já eram falecidos.
Triste relatou, que foi melhor assim, pois deve ser muito difícil para um pai e uma mãe ver um filho partir antes da hora.
Venâncio e Tânia, se encantaram com a história.
Com a convivência com Marília, nas visitas a fazenda, que se tornaram frequentes, a certa altura, Vandré perguntou-lhe, por que uma mulher ainda tão bonita, não havia tentado reconstruir sua vida com outro relacionamento.
Rindo, a mulher agradeceu o elogio e comentou que embora não tivesse um relacionamento firme, não estava sozinha.
Vangloriando-se, comentou que nunca precisou pagar por companhia.
Vandré, respondeu que tinha certeza que não.

Quanto a história de sua mãe, o moço descobriu em leituras ao diário, que Carolina havia se envolvido com um funcionário da fazenda, vindo a engravidar de Venâncio.
Seu nome era Pedro.
Para se encontrarem, o casal se dirigia as ruínas do Valongo.
Lá, conversavam por longas horas, riam, e ficavam correndo entre as ruínas, como duas crianças.
Com o tempo, a moça engravidou, e sua mãe, ao tomar conhecimento do ocorrido, deu-lhe dinheiro para que passasse a residir em outra cidade.
Ficou revoltada com o ocorrido, mas não havia mais nada a ser feito.
Carolina então, mudou-se para São Paulo, onde deu a luz Venâncio e criou o filho.
Pedro, por sua vez, temendo a reação de Dona Carolina, ao tomar conhecimento da gravidez da moça, se evadiu da fazenda, nunca mais sendo visto.
Mais tarde, e após algum tempo de namoro com Licurgo, Carolina acabou por fica grávida de Vandré.
Com isto, quando sua mãe Carolina, tomou conhecimento da segunda gravidez da filha, recriminou-a.
Disse a ela que estava destruindo a reputação da família.
A moça, ao ouvir isto, comentou que não havia sido ela quem havia dado início a história da maldição, e a todos os relacionamentos malfadados da família.
Foi o bastante para ser esbofeteada por sua mãe.
Furiosa, Carolina dirigiu-se ao quarto onde estava hospedada no Valongo, arrumou suas coisas e foi embora.
Não sem antes dizer que Licurgo estava disposto a assumir o filho, bem como a paternidade de Venâncio, que nem sequer era seu filho.
Com isto, partiu.
Dona Carolina por sua vez, ao se ver sozinha, sem a companhia da mãe ou da filha, resolveu escrever-lhe missivas.
Nelas dizia que queria conhecer Licurgo e saber de suas intenções com Carolina.
Com efeito, o moço chegou a apresentar a moça a sua família.
Foi marcada a data do casamento e tudo.
Mas o homem, para infortúnio de Carolina, faleceu um mês antes do casamento.
Grávida, a moça optou levar a gravidez adiante, amparada pela família do noivo.
Contudo, nunca mais pensou em se casar.
Vandré, ao ler o relato da mãe, ficou emocionado.
Mais tarde, mostrou o diário ao irmão, e pediu-lhe para que lesse.

Venâncio então, guardou o diário, e junto com Tânia, leu os relatos da mãe.
Ao término da leitura, que se estendeu por alguns dias, o moço respondeu que nunca tinha conhecido a história de uma família, com uma sina mais triste que a sua.
Vandré, por seu turno, ao tomar conhecimento da história da mãe, pediu-lhe desculpas.
Disse-lhe que passara a vida inteira cobrando um pai, que ela não poderia lhe dar.
Confidenciou ainda, que gostou de saber que o seu pai queria assumir a ele e ao irmão.
Contudo, não conseguia entender, por que a mãe havia escondido a história.
Argumentou que não havia desonra alguma em sua origem.
Carolina respondeu-lhe que como não havia se casado, não faria nenhuma diferença contar ou não a história.
Argumentou que escondera o fato para melhor protegê-los.
Mencionou que quanto menos soubessem sobre a própria origem, menos se exporiam.
Vandré, por seu turno, argumentou que isto não os livrou de preconceitos e comentários maldosos.
Disse que nem todas as crianças aceitavam brincar com eles, por serem filhos de mãe solteira.
Ao ouvir isto, Carolina chorou.
Comentou que nunca fora sua intenção infligir sofrimento aos filhos, mas que ela própria fora a maior castigada pelo ocorrido.
Disse que as pessoas apontavam para ela nas ruas, e que fora alvo de assédio, em locais de trabalho, por conta de ser mãe solteira.
Relatou que por reagir as investidas, perdeu inúmeros empregos.
Comentou que por ser mãe solteira, não era nada fácil encontrar emprego.
Mas estudou e se formou professora, conseguindo se aposentar na profissão.
Nisto, comentou que pessoas amigas a ajudavam nestes momentos de dificuldades, inclusive Dona Carolina.
Chorando, a mulher comentou que ela e os filhos não passaram fome em certos períodos difíceis, por conta da ajuda da velha matriarca, que mesmo sendo contrária ao modo como levava sua vida, nunca deixou de ajudá-la.
Vandré então, abraçou a mãe.
Compreendendo suas atitudes, comentou que nem sempre a atitude mais certa era esconder a verdade.
Contudo, como mesmo a verdade não mudaria em nada as circunstâncias, compreendeu que as pessoas agiam conforme seu entendimento.
Entendeu que a mãe agira da forma como agira, por considerar que era o melhor a ser feito.
Sozinha, sem o apoio da família, como deve ter sofrido para aprender a viver.
Nisto, Carolina comentou que após a morte de Licurgo, os pais do moço a auxiliaram financeiramente.
Com o tempo, chegaram a oferecer dinheiro para que sumisse dali e não contasse a ninguém que Licurgo era o pai de Vandré.
Diziam que não ficava bem um morto, ter um filho com uma mulher solteira.
Carolina, ao ouvir isto, ficou revoltada.
Expulsou o casal de sua casa, e os pais de Licurgo nunca mais apareceram.
Neste momento, ao se recordar de fatos passados, a mulher comentou que reconhecia que havia errado ao não procurar os pais do moço.
Afinal de contas ele tinha direito a parte do patrimônio da família.
Vandré ao ouvir isto, comentou que Venâncio lhe dissera que o patrimônio era do casal, e que não havia herança de pessoa viva.
Argumentou que talvez o casal pudesse pagar uma pensão para ele, enquanto fosse menor de idade e incapaz de prover sua subsistência.
Mais tarde, foi a vez de Venâncio conversar com a mãe.
Curioso, perguntou-lhe se nunca mais havia ouvido falar de Pedro.
Carolina respondeu-lhe que não.
Venâncio insistiu em perguntar se o homem nunca tivera interesse em procurar pelo filho.
A mulher respondeu-lhe novamente de forma negativa.
Ouvir estas palavras, lhe causou profundo pesar.
Disse que perdera mais que o irmão, pois Vandré ao menos tinha um pai que o queria.
Carolina ao ouvir isto, disse-lhe que quem havia perdido naquela história toda fora Pedro que perdera a oportunidade de conhecer um garoto de valor.
Menino dedicado, estudioso, que a enchia de tanto orgulho que mal cabia dentro dela.
Insistiu em dizer que quem havia perdido era Pedro, o qual perdera a oportunidade de conhecer o homem de valor, no qual havia se transformado.
Carolina acrescentou ainda, que o homem era um traste, que não valia o trabalho de ser procurado, mas que não iria ficar chateada, se ele demonstrasse interesse em tentar localizar o pai.
Apenas o advertiu que ele poderia não encontrar o que estava procurando, e pior, poderia arrumar uma encrenca para o resto de sua vida.
Abraçando o filho, e depois segurando o seu rosto, comentou que se o encontro fosse realmente necessário, o tempo se encarregaria de aproximá-los.
Venâncio, ao ouvir as palavras de sua mãe, disse que sabia que poderia se decepcionar, mas que ainda assim, pretendia procurar seu pai, ao menos para saber por que nunca se interessara por ele.
Carolina, olhando-o nos olhos disse que entendia seu lado.

E Venâncio, ao voltar para São Paulo, contratou os serviços de um detetive particular.
Por meses o homem buscou o paradeiro de Pedro.
O homem porém, havia sumido.
Ao tomar conhecimento do insucesso na localização de Pedro, Carolina, que havia descrito o homem, e colaborado para sua localização, ficou aliviada.
Contudo, percebendo a decepção de Venâncio, tratou de consolar o filho.
Tânia também procurou alentá-lo.
Carolina com o tempo, passou a reconhecer as qualidades de Tânia, passando a elogiar a moça publicamente.
Para ela seria um orgulho ter a moça como nora.
Mais tarde, Vandré, após muita pesquisa leitura, conversando com pajés e outros pesquisadores, achou por bem, realizar um ritual para a família.
Conversando com Venâncio e Tânia, o moço decidiu que a cerimônia, deveria abarcar, vários rituais.
E assim foi feito.
A fazenda mais parecia um centro de convenções de eventos indígenas.
Foram vários dias de orações e danças.
Alguns rituais, mais pareciam festas.
Um dos pajés disse que havia muito sofrimento naquelas terras, não só herança da maldição lançada sobre a família, mas também dos castigos de antigos escravos que eram vendidos no local.
Vandré disse que o local de fato, fora antigo mercado de escravos.
O pajé respondeu-lhe muitos deles foram espancados no lugar.
Lara e Antonia por sua vez, chegaram a chamar um padre para celebrar uma missa na propriedade e abençoar a casa, as ruínas, e todas as construções da propriedade.
Marília por sua vez, comentou que após os rituais, passou a sentir um pouco mais de leveza ao circular pelo lugar.
Vandré, em pesquisas mais detalhadas, ao analisar a papelada da fazenda, descobriu que se tratava de uma antiga fazenda abandonada, quando Carolina e Olavo adquiriram a propriedade.
Descobriu também documentos relativos a venda das terras sulinas, bem como documentos atestando a localidade da fazenda.
Tempos depois, o moço viajou para o estado gaúcho.

Luciana Celestino dos Santos
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