E continuaria dormindo tranqüilamente, não fossem os chacoalhões de Dona Eulália, intimando-a a acordar.
Sua madrasta entrara furiosa em casa, depois de passar a madrugada inteira sabe-se lá onde.
Toda sua ira se devia ao fato de que ao chegar na pequena vila onde morava, foi imediatamente comunicada por suas vizinhas bisbilhoteiras, do que ocorrera durante a madrugada, na quermesse. Suspeitando de que o tumulto se dera em razão de alguma armação de sua enteada, adentrou a casa em que morava, com tanta fúria que até mesmo os vizinhos temeram quanto a integridade física da garota.
E assim foi. Dona Eulália chacoalhou Raíssa, até que ela acordou, e sobressaltada perguntou:
-- O que foi? O que está acontecendo?
-- Ah ... você não sabe? Pois eu vou refrescar sua memória. O que foi que você aprontou ontem à noite?
-- Eu? Aprontei?
-- Não seja cínica, todo mundo te viu na quermesse. Vamos, desembucha logo.
-- Eu já disse que não fiz nada.
-- Sua mentirosa. É claro que você está envolvida até o pescoço nisso. Ê aqueles seus amiguinhos ... estão envolvidos também?
-- Eu não sei do que a senhora está falando.
-- Ah ... sabe sim. E é isso que a senhorita vai me responder agora. – disse Eulália gritando e sacudindo Raíssa – Você vai me contar já o que aconteceu ontem ou você não saí deste quarto por um mês.
No que Raíssa riu.
-- Do que é que você está rindo?
-- Faz-me rir. Como é que eu vou sair daqui com essa perna? – disse mostrando o enorme curativo feito na perna direita.
-- Ah é? Pois você vai ver então uma coisa, sua ingrata.- enquanto falava isso, sacudia a enteada com mais e mais força, até chegar um momento em que começou a esbofeteá-la.
Nisso Raíssa começou a gritar:
-- Pare com isso. Você está me machucando. Pára.
-- Eu não vou parar com nada enquanto você não parar de berrar. Sua loca ... Mas eu sei de um jeito de fazer você me contar direitinho essa história. – enquanto dizia isso, apontava para a perna ferida.
-- Você não pode fazer isso. – respondeu Raíssa assustada.
-- Posso sim. Tanto posso, que vou fazê-lo.
No entanto, não obstante Dona Eulália tencionar agravar o estado do ferimento de sua enteada, a mesma, no ímpeto de se defender, berrou a plenos pulmões, que precisava de ajuda, que sua madrasta iria incendiar a casa com as duas dentro.
Ao ouvir os berros da enteada, temendo que os vizinhos ouvissem, Eulália desistiu de seu intento.
Assim, não restou outra alternativa a Eulália senão sair do quarto da enteada, espumando de raiva.
Por conta desse incidente, muitos dos vizinhos foram até a casa das duas para verificar o que estava acontecendo, e também para xeretar.
Não obstante isso, a madrasta de Raíssa tratou a todos muito bem. Espantosamente, chegou até a se desculpar pelo ocorrido.
Mas também só para os vizinhos e para as pessoas que lhe interessavam, é que Dona Eulália, dispensada tão cortês tratamento.
Para a enteada e as pessoas menos queridas, era de uma rispidez e tanto. Haja vista os comentários dos três amigos de Raíssa, sobre o temperamento dela.
A simples visão de Dona Eulália lhes causava arrepios. Tanto é por isso, que evitavam ir a casa de Raíssa, só para não ter o desprazer de encontrar tão desagradável criatura.
Por fim, resolvido o incidente, todos os vizinhos voltaram para suas casas, e continuaram com seus afazeres.
Durante todo o mês de julho, Dona Eulália saía para trabalhar, deixando Raíssa em casa, de molho, em virtude do acidente sofrido.
De vez em quando, apesar de Dona Eulália, seus amigos a iam visitar.
Tudo estava indo muito bem, não fosse o fato de, numa dessas visitas, os três darem de cara com a referida senhora.
O resultado desse encontro, não poderia ser pior. Sua madrasta, com seu modo rude e seco, praticamente expulsou os três de sua casa.
Ela simplesmente perguntou:
-- Já passou do horário de visitas. E além do mais, vocês não tem casa não?
Foi o bastante para afugentá-los por muito tempo. O pior é que, mesmo depois disso, Dona Eulália ainda arrumou motivo para discutir com Raíssa, afirmando que ela era uma desleixada, preguiçosa, encostada, que não servia para nada, que se já tinha idade suficiente para aprontar, devia criar vergonha na cara e trabalhar.
Raíssa, no entanto, não ouviu quieta desta vez. Retrucando todas as acusações, disse que ela era cruel, sem educação, estúpida e desagradável. Afirmou também, que nunca gostou dela, que só morava ali naquele lugar horroroso, por não ter outra opção.
Só que a reação de Raíssa não foi oportuna, porque sua madrasta acabou lhe jogando na cara que seu pai a havia abandonado, e que se não fosse por ela, estaria na sarjeta. O que sinceramente, não ajudou nem um pouco a apaziguar a contenda. Só serviu para deixar Raíssa ainda mais ressentida com a madrasta.
Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.
Poesias
quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021
A GANGUE DO TERROR - CAPÍTULO 8
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