Poesias

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

A GANGUE DO TERROR - CAPÍTULO 20

Com isso, tratou de se apressar, e correndo, seguiu em direção ao hotel onde estava hospedada.
Ao chegar, esbaforida, subiu para seu quarto, pegou suas malas, que a essa altura já estavam bem mais pesadas do que as que havia levado, e desceu.
No saguão do hotel, acertou as contas, pagou e saiu. De lá, foi direto para a rodoviária.
No guichê, comprou uma passagem que a levaria de volta para sua cidade e entrou no ônibus.
Durante a viagem, ficou observando da janela do ônibus, a paisagem, e se lembrou de como tinha ido para a Água Viva.
E pensar que fez todo o percurso de ida a pé. Agora voltava de ônibus.
Foi aí que se deu conta de tudo que havia mudado em sua vida. Passara a se vestir melhor, freqüentou bons lugares enquanto esteve por lá.
Feliz, pela primeira vez na vida, sentia que tudo iria mudar. Não dependia mais de sua madrasta.
Só cabia ela, resolver a questão. Ao pensar nisso, tranqüilizou-se. Afinal de contas, com dinheiro, resolveria tudo.
Contudo, precisava ser cautelosa.
Conforme o combinado, usando documentos falsos, Marcílio abriu uma conta para Raíssa. Assim, sua madrasta não teria como tomar-lhe o dinheiro que ganhara. Isso porque, Raíssa sabia que, mais cedo ou mais tarde, Dona Eulália tentaria controlar o seu dinheiro.
E assim transcorreu a viagem.
Com isso, quanto mais o ônibus se afastava de Água Viva, mais perto ela ficava da confusão que era sua vida.
Mas isso não a desanimava. Precisava enfrentar a situação.
Seu Marcílio, seu chefe, já havia lhe pedido paciência. Só precisa de tempo para resolver a situação.
Quando Raíssa finalmente chegou a cidade, percebeu que alguns policiais próximos.
Temendo ser parada por um deles, tratou de discretamente sair de lá, misturada com alguns turistas que estavam indo na direção da Praça da Matriz. Dali, seguiu imediatamente, em direção a sua casa.
Caminhando, finalmente chegou a vila onde morava.
Discreta, procurou dar uma volta no quarteirão e entrou furtivamente no quintal do vizinho. Dali por diante, acabou por pular o muro que separava sua casa da casa vizinha, e adentrou-a sem que nenhum dos moradores percebesse isso. Retornou como se nunca houvesse saído.
Como já era de seu conhecimento, provavelmente sua madrasta estaria trabalhando aquela hora. Isso porque, já fazia meses que havia fugido. Assim, não haveria razão para que continuasse em casa, esperando que Raíssa aparecesse.
Por isso, pôde, calmamente, entrar em seu quarto e dormir, enquanto sua madrasta não retornava do serviço. Cansada que estava, dado que dormira muito pouco, em poucos minutos adormeceu. Como se nada a preocupasse. Tranqüilamente dormia.
Dormiu tão bem, que nem percebeu quando sua madrasta chegou.
Quando Dona Eulália chegou em casa, tirou os sapatos e deixou sua bolsa em cima do sofá.
Ao se dirigir para o quarto, reparou que a porta do quarto da enteada estava trancada. Curiosa, virou a maçaneta e constatou que a porta havia sido trancada por dentro. Tentou olhar pelo buraco da fechadura, mas havia algo cobrindo a abertura. Provavelmente a chave, pensou. Aborrecida passou a bater na porta, dizendo:
-- Abra a porta Raíssa. Eu sei que você está aí dentro.
Conforme ía batendo na porta, em virtude de não ouvir nenhum resposta, começou a se enfurecer. Passou a bater furiosamente na mesma. Queria por que queria, conversar com a enteada, e faria isso, nem que precisasse derrubar a porta.
E assim o fez, continuou batendo.
Enquanto a fúria de Dona Eulália permanecia lá fora, Raíssa, dormia sossegadamente. Tão tranqüilamente dormia, que só foi perceber a barulheira que sua madrasta estava fazendo, quase meia hora depois de começar o barulho.
Ao ouvir o escândalo de Dona Eulália, nada de sobressaltos.
Acostumada com o temperamento destemperado da madrasta, não era de admirar-se que assim procedesse. Com isso, tratou de se levantar e compor-se.
Depois de alguns minutos, Raíssa abriu a porta e deixou a madrasta entrar.
Sabia que ouviria poucas e boas em razão do que fizera, mas, sabedora disso, tratou de impedir que Dona Eulália começasse a falar.
Para isso, começou dizendo:
-- Eu já sei o que a senhora vai falar. Por isso, poupe-me dos seus discursos e me ouça, pelo menos uma vez. Eu fugi de casa sim. Fiquei meses sumida. Não dei recado nem aviso, e não quero ser repreendida por isso. Fiz isso, porque eu tenho o direito de seguir e escolher como eu quero viver a minha vida. E acima de tudo, eu não quero nunca mais depender de você. Não quero mais ouvir de sua boca, que a senhora me faz um favor me criando. Eu não preciso mais da senhora.
Ao ouvir isso, Dona Eulália ficou surpresa. Como pode, uma criatura dessas, falar com ela dessa maneira? Logo ela que gastou seu tempo a criando?
E assim, revoltada, mais do que depressa, retrucou:
-- Ah, é mesmo, sua fedelha? E onde você arrumou tanta autoridade, para vir falar assim, comigo?
-- No meu trabalho. – respondeu secamente.
-- No seu trabalho? E onde você arrumou trabalho?
-- Numa cidade vizinha.
-- Que cidade?
-- Não interessa. – respondeu desabrida.
-- Escute aqui, mocinha, eu não tenho que ficar aqui, ouvindo desaforos. Você não é minha filha, e mesmo que fosse, não teria o direito de falar comigo desta maneira. Afinal de contas, quem pensa que é? Por acaso, como pensa em continuar morando aqui, me enfrentando desse jeito? Pensa que eu sou alguma idiota?
-- Eu não preciso continuar aqui. Só depende da senhora.
-- Ah, é mesmo? E onde a senhorita pretende morar? Debaixo a ponte? – perguntou Dona Eulália, irônica.
-- Sinceramente, isso não é problema seu. Eu me viro.
Nisso, Dona Eulália caiu na gargalhada.
-- Como é que você, pretende se virar? Por acaso está ganhando tanto dinheiro assim?
-- Estou ganhando dinheiro suficiente para poder até alugar uma casa, se isso for necessário.
-- Muito bom. Então, por que voltou?
-- Não sei ao certo. Talvez seja porque eu também tenho o direito de ficar aqui.
-- É mesmo? E por que julga isso?
-- Por que esta casa foi comprada com o dinheiro do meu pai, e até onde eu sei, está em meu nome.
Ao ouvir isso, Dona Eulália desistiu de enfrentá-la e então disse:
-- Está bem. Eu não vou criar problemas com você. Pode ficar. Mas tem um porém, amanhã você vai acordar e ir para a escola. E também ... já que está trabalhando, vai dividir as despesas da casa.
-- Sem problemas. Desde que seja só as despesas da casa. Eu não tenho que sustentar ninguém.
-- Ingrata. E pensar que eu já te ajudei tanto. Mas não pense que isso vai ficar assim. Isso vai ter volta.
Disse isso e saiu do quarto.
Mesmo diante da ameaça de Dona Eulália, Raíssa se sentia vitoriosa. Afinal conseguiu enfrentar a fera, em condições de igualdade.
Não precisava mais se preocupar com a presença incômoda de Dona Eulália.
Mas atenta, sabia que não poderia deixar de tê-la sob suspeita. Mesmo podendo enfrentá-la, sabia que ela não era uma pessoa de confiança. Se soubesse de algo que a prejudicasse, não se furtaria em revelar a todos. Por isso, precisava ter muito cuidado com a madrasta. Não poderia levantar suspeitas.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

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