Finalmente chegara o grande momento.
O dia da tão comentada quermesse.
A promissora festa que as beatas do Padre Olavo prepararam com tanto cuidado.
Os preparativos da festa agitaram toda a cidade nos dias anteriores.
A praça toda enfeitadas de bandeirinhas coloridas, lampiões feitos de papel colorido. As barraquinhas de madeira sendo armadas. As donas de casa mais ilustres da cidade preparando e testando seus quitutes. O palco do show sendo aos poucos montados, os microfones sendo testados. As crianças, aproveitando um momento de distração para brincar com os microfones.
A cada dia que passava as beatas ficavam mais alvoroçadas. Não viam a hora em que tudo estaria pronto.
E a cidade ficaria repleta de bandeirolas.
Quase que diariamente ligavam para a empresa encarregada do show pirotécnico para saber se tudo estava bem. Contrataram para o grande show da festa um grupo sertanejo ilustre nas cercanias, somente para animar mais ainda a tão desejada festa.
Para a noite ainda estavam reservados grupos de danças folclóricas, a celebração do casamento na roça, e os variados grupos de danças juninas. Para a abertura da festa, a Orquestra Municipal de Água Branca iria tocar o hino da cidade e algumas músicas folclóricas. Depois, haveria um discurso do Prefeito da cidade sobre a realização da quermesse e os investimentos da Prefeitura, no sentido de tornar Água Branca um pólo turístico na região.
Entre os comes e bebes haveria os já tradicionais pratos juninos como: pipoca, pamonha, milho verde cozido, pipoca, paçoca, pé-de-moleque, pastéis, churrasco, quentão, vinho quente, cerveja, refrigerante, bem como salgadinhos, bolos, tortas, e outras iguarias deliciosas. Nas barracas de prendas haveria a já tradicional pescaria, mas também teria jogo de argolas, de pontaria, corrida-do-saco, etc. Quanto a barraca do beijo, bem que tentaram colocar, mas como quem estava organizando a festa eram as mulheres, essa idéia foi posta de lado, para a tristeza dos rapazes da cidade.
Para as beatas, este acontecimento era uma oportunidade de ouro para mostrarem a competência que tinham em organizar eventos em prol da igreja, e acima de tudo, provarem que as festas, nas suas palavras, não precisavam serem pagãs para serem divertidas.
E nesse ponto todos concordaram, pois a cidade precisava de diversão e de um atrativo a mais para os turistas.
Muitas vezes, o próprio Prefeito chegou a dizer:
-- Esta cidade está muito parada. Precisamos trazer turistas para cá. Até a cidade vizinha, Água Viva, já se tornou um pólo industrial e turístico. Muitos moradores daqui acabaram indo morar lá por conta da falta de oportunidade em crescer aqui. Isso é desolador.
E o mesmo permanecia nesse monólogo horas a fio.
Sempre reclamava do marasmo da cidade. Só que nunca se mexeu para mudar isso. Alegando problemas orçamentários, acabava não fazendo nada. Sobre a acusação de desvio de verbas da Câmara, tratava o assunto como se fora uma falácia, questiúncula de somenos importância.
Mas enfim, a festa.
A tarde ía sumindo e a noite aos poucos, tomava o seu lugar.
A essa hora, começavam a aparecer os primeiros convivas.
Logo que chegavam eram saudados pelo ilustre Prefeito e sua mulher, a Primeira Dama da cidade, vindo em seguida Padre Olavo e as beatas completar o quadro de cicerones da noite.
Tudo estava indo muito bem, os convidados aparecendo e a Orquestra Municipal tocando canções folclóricas. Nesse ínterim, houve um discurso do Prefeito dando início oficialmente a quermesse.
Foi a partir desse momento que surgiram os primeiros fogos a iluminar os céus da cidade.
Todos os presentes olharam deslumbrados para o firmamento e aplaudiram a pseudo iniciativa do Prefeito.
A partir desse momento é que deu início a quermesse realmente.
Os moradores passaram então a consumir os produtos vendidos nas barracas, a participar das competições, e até a beber.
Como a festa era grande, as ruas próximas a igreja foram interditadas, para que houvesse espaço para tudo, até mesmo para a danças típicas. Quanto as danças, cerca de duas horas após o início da festa, já estavam se apresentando os primeiros grupos. Muitos apreciaram as danças.
Ao longe se podiam ouvir comentários elogiando a festa, sua organização, e até mesmo o discurso do Prefeito.
Quando Dona Eulália chegou na quermesse, todos a cumprimentaram. Alguns até chegaram a dizer:
-- Coitada! Tão boa gente e com uma enteada que é uma peste.
-- Eu tenho pena dela.
Para esta noite, Eulália tinha reservado uma bela roupa, estava maquiada.
Não lembrava nem um pouco a mulher maltrapilha que era. Somente quando ía para o trabalho é que se arrumava um pouco.
Mas aquela noite era uma exceção, queria se divertir, ao menos hoje, pensava.
Já Raíssa, quando chegou no local da quermesse, já era quase meia-noite. A festa já estava pegando fogo.
Quase todos os moradores da cidade estavam lá. Os seus amigos de escola estavam todos lá. Esperavam ansiosos.
O plano ía ser posto em ação dentro de uma hora, mas já estavam agitados. Por esta razão se afastaram um pouco de suas famílias e foram curtir um pouco a noite.
Foi nessa oportunidade que encontraram Raíssa. Como Água Branca é uma cidade pequena, muitos dos moradores a reconheceram e assim sendo, começaram a se preocupar. Muitos se perguntavam:
-- O que será que ela vai aprontar?
-- Ai, ai, ai, ai ... o que essa garota quer aqui?
Percebendo que algumas pessoas olhavam para ela, Luís, Cláudio e Léo trataram de pegá-la pelo braço e saíram de fininho do epicentro da festa, para que sua presença não chamasse tanto a atenção e o plano não fosse por água abaixo.
Ao perceberem que a presença de Raíssa incomodava algumas pessoas, combinaram que ela circularia pela festa como uma convidada, se divertiria um pouco, e dentro de uma e hora e meia, deveriam por o plano em prática.
Raíssa, antes de se dirigir para a praça da matriz, tratou de ir até o esconderijo e pegar os fogos. De lá, voltou para casa e se arrumou um pouco para a festa. Escondidos dentro de uma bolsa de sua madrasta, estavam os fogos.
Diante do atraso para a colocação em prática do plano, Raíssa se desentendeu com os três e disse que se eles não queriam participar, que ela faria tudo sozinha.
Quando ela tocou nesse ponto, todos a proibiram veementemente de começar a pôr em prática o plano do grupo. Ameaçaram até a tomar-lhe a bolsa, no que foram repelidos diante do seguinte argumento prático:
-- Ah é? E como é que vocês vão explicar o fato de estarem carregando uma bolsa feminina?
Tendo diante deles tal fato, tiveram de se calar e aceitar que ela permanecesse com a bolsa. Mas insistiram na proibição.
Depois disso se retiraram e deixaram-na sozinha.
No entanto, os três não estavam convencidos de que ela acataria as ordens.
Estando sozinha, Raíssa tratou de freqüentar a quermesse, pois fazia questão de ser vista pelo maior número de pessoas possível. Queria ter um álibi para poder se defender quando os fogos explodissem e a confusão estivesse armada.
Ao chegar a madrugada, mais precisamente as duas e dez da manhã, afastou-se furtivamente da festa, e encontrando um lugar reservado, retirou todos os fogos da bolsa e deixou-os escondidos atrás de um caixote de madeira.
Após, apareceu novamente no meio de todos e assim ficou por cinco minutos, sumindo novamente sem ninguém perceber. Nesse momento pegou os fogos e rumando para um morrinho próximo, começou a lançar e jogar os fogos.
No mesmo instante, se instalou a confusão. Todos os que estavam próximos do morro correram de um lado para o outro apavorados com os buscapés lançados. Por mais que corressem, não conseguiam se desvencilhar deles. Raíssa se divertiu presenciando a cena à uma certa distância.
Em seguida preparou os rojões e começou a lançá-los no meio da multidão. No meio de sua empolgação com a brincadeira, começou a se aproximar um pouco mais da festa, para poder ter mais impacto a explosão. Lançou vários rojões, até que, ao lançar o último, por ter caído próximo dela, ao explodir, lançou estilhaços de pólvora que atingiram sua perna.
Foi nesse momento que se ouviu um grito. E, os moradores, alvoroçados pela confusão, nem se deram conta do mesmo e trataram de sair dali. Dos poucos convivas que permaneceram na festa, todos foram até o local de onde se ouviu o grito e viram Raíssa com sua perna ensangüentada e gemendo de dor.
Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.
Poesias
quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021
A GANGUE DO TERROR - CAPÍTULO 6
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