Quando Rodrigo foi até o alpendre, qual não foi seu espanto ao ver o casal carregando duas malas, exaustos, parados em frente a sede.
Surpreso com a cena, Rodrigo foi logo perguntando o que havia sucedido.
O casal, explicando que resolvera sair da fazenda, comentou que Diego estava ficando louco. Dizendo que podia resolver tudo, tentava impedir o inevitável.
Percebendo que a perda da propriedade era praticamente certa, o mesmo sugeriu que eles passassem a morar com eles.
Thereza ao tomar conhecimento do ocorrido, não se opôs. Pedindo a uma das criadas que arrumasse um quarto para o casal ficar, pediu a ambos que ficassem à vontade. Dizendo que eles poderiam ficar na fazenda o tempo que quisessem, pediu licença e usando roupas de montaria, foi até a estrebaria. Lá escolhendo um animal, foi cavalgar pela fazenda.
Mais tarde, procurando saber como estava indo a colheita, conversou com Antenor, que colocou-a par de tudo.
Ricardo e Dorothéa, percebendo que quem tomava conta de tudo era Thereza, comentaram com Rodrigo que ela não era uma pessoa comum. O rapaz, orgulhoso da mulher, respondeu que não. Muito embora ele já tivesse se oferecido muitas vezes para ajudá-la, era muito raro ela aceitar sua ajuda.
Esse fato fazia os fazendeiros terem ainda mais admiração por sua pessoa.
Rodrigo, procurando ser útil, auxiliava como podia a esposa, todavia. Contudo, sentindo falta de um trabalho que o detivesse por um longo período, Rodrigo sugeriu a esposa voltar a advogar.
Thereza ao ouvir as palavras de Rodrigo, ficou desapontada. Isso por que, sequiosa por completar sua vingança, não podia partir agora.
Rodrigo, percebendo a resistência de Thereza em voltar a viver em uma grande cidade, perguntou-lhe o por quê de tanto interesse em permanecer por lá.
Pela primeira vez, Rodrigo perguntava a moça qual fora a razão para ela se instalar na região.
Thereza, dizendo sentira vontade de voltar as origens, contou a ele que sentia curiosidade em saber como estavam as coisas por lá.
Rodrigo desconfiado, não acreditou muito na história de Thereza. Mas sem saber direito o que pensar, resolveu deixar de lado suas desconfianças.
Contudo, algo havia se partido. Depois dessa conversa nunca mais Rodrigo veria a moça com os mesmos olhos.
Nessa época, Diego sem recursos para manter a fazenda, afundado em dívidas, acabou por perder a propriedade. Ao ser demandado judicialmente, Diego depois de muito lutar, perdeu a única propriedade que lhe restara.
Ao saber disso, Thereza, por meio de um representante, tratou de adquirir a propriedade. Como sonhava há muito tempo em comprar a propriedade, ao se ver prestes a adquiri-la, mal pôde conter a alegria.
No entanto, a alegria só foi completa quando ela finalmente conseguiu passar a escritura para seu nome.
Seu marido, ao tomar conhecimento de que fora ela quem comprara as terras que outrora pertencera a família de seu pai, exigiu que ela passasse as terras para seu irmão.
Thereza no entanto, respondeu que jamais faria isso. Mas disposta a não deixá-los em má situação, prometeu doar-lhes o sítio que adquirira juntamente com a fazenda.
Ricardo e Dorothéa, ao se tornarem donos daquele pedaço de terra, agradeceram penhoradamente Thereza.
Rodrigo porém, cismado com o comportamento de Thereza, passou a compreender seus propósitos.
Percebendo que Thereza voltara para região visando se vingar, perguntou a ela se ele também fazia parte de sua desforra.
Thereza, ouvindo as palavras do esposo, respondeu-lhe que nunca envolvera-o naquela história. Dizendo que precisava acertar as contas com Diego, respondeu que ele e Ricardo não tinham nada com isso.
Rodrigo não acreditou.
Muito embora a mulher tivesse tentado convencê-lo, nem por um minuto Rodrigo acreditou nela. Desesperada, Thereza percebendo que poderia perder o marido, pediu a ele que ficasse mais um pouco. Dizendo que a situação estava prestes a se resolver, prometeu faria seu irmão o administrador das terras.
Ao ouvir isso, Rodrigo se acalmou um pouco.
Para Thereza, só faltava agora fazer com que Diego descobrisse ser ela a nova proprietárias das terras.
No tocante a isso, foi apenas uma questão de tempo para o rapaz descobrir tudo.
Quando descobriu porém, furioso, Diego foi até sua fazenda. Insistindo em dizer que queria falar com Thereza, enfrentou Antenor que não parecia disposto a deixá-lo se aproximar da casa.
Rodrigo, percebendo a confusão, tentou conversar com Diego.
O mesmo porém, não estava nem um pouco interessado em falar com ele. Irritado começou a gritar o nome de Thereza.
A mulher, ouvindo seu nome, foi até o alpendre. Perguntando sobre o que estava acontecendo, ouviu como resposta:
-- O que está acontecendo, sua negra ordinária, é que você me roubou.
Thereza ao ouvir isso sorriu.
Diego percebendo o ar de satisfação da moça, continuou:
-- Ria. Pode rir sua negra maldita! Ria enquanto puder. Ria o quanto quiser. Ria bastante por que não tarda o dia em vais chorar muito.
Rodrigo, tentando conversar com o irmão, almejava uma aproximação, mas Diego, irascível não queria saber de conversas. Dizendo que tinha mais o que fazer, sumiu dali.
Aborrecido com o incidente, Rodrigo advertiu a mulher de que o ela estava fazendo, ainda se voltaria contra ela.
Thereza desdenhou. Dizendo que cão que ladra não morde, esqueceu as ameaças.
E assim, a vida prosseguiu.
Contudo, um certo dia, quando tudo parecia caminhar muito bem, uma tragédia se abateu sobre sua vida.
Rosália, cavalgando sozinha, ao se aproximar da propriedade recém-adquirida por Thereza, acabou sendo baleada. A criança alvejada no peito, morreu na mesma hora.
Mais tarde, foi encontrada ao lado de um formigueiro por um escravo da aludida propriedade. Um escravo passando pelo local, ao reconhecer nela a filha de Thereza, tratou de levar o corpo até a sede da fazenda onde morava Thereza. Lá deixou o corpo deitado no gramado em frente a propriedade, o que causou desespero a todos.
Thereza, que a esta altura estava muito aflita, passou a procurá-la pela fazenda. Ao ver que a menina não estava em casa devassou toda a propriedade.
Palmilhando cada recanto da fazenda porém, não encontrou a menina.
Rodrigo, que a auxiliava na tarefa também não encontrou nenhum sinal de Rosália.
Quando então retornaram a sede, ao descobrirem o corpo de criança morta, Thereza, angustiada, foi a primeira a querer olhar a menina. Trêmula, virou o rosto da criança. Ao ver que a menina morta era sua filha Rosália, Thereza foi tomada de um profundo desespero. Ao constatar que sua filhinha jazia diante dela, Thereza gritou com todas as forças de seu coração.
Relutante, custava a acreditar que Rosália havia morrido. Lembrando-se das ameaças de Diego, Thereza acusou-o de ser o assassino de sua filha.
Rodrigo, dizendo que Diego jamais teria tido coragem de atirar na menina, cogitou visivelmente abatido, que qualquer um poderia ter atirado e acidentalmente atingido a criança. Ao dizer que o escravo lhe dissera onde a menina foi encontrada, Rodrigo comentou que aquele era um trecho muito fechado de floresta. Ali muitos homens caçavam.
Thereza contudo recusando-se a acreditar naquela história, respondeu que sua filha fora levada para o local.
Rodrigo quis discutir, mas notando a tristeza da mulher, resolveu esquecer a briga.
Por isso, nos dias que se seguiram, sentindo que precisavam se ajudar, abandonaram as diferenças e se apoiando, acompanharam desalentados o enterro da filha.
Como sucedera a Abelardo, a cerimônia foi breve. Emocionada, Thereza percebeu que mais um ente querido se despedia dela.
Ao perceber que nunca mais colocaria os olhos em sua filha, Thereza, por um instante pensou o quão longe havia chegado com sua vingança. Arrasada, só conseguia pensar no responsável por toda aquela maldade.
Por esta razão, dias depois, sentindo-se um pouco mais forte, prometeu a si mesma que iria acertar suas contas com Diego.
Ao perceber que tudo a sua volta ruía, constatou que os fazendeiros arruinados, deixaram de apoiá-la. Até mesmo Padre Lívio se afastou.
Thereza vendo-se abandonada por todos, resolveu agir.
Viajando para São Paulo, contratou os serviços de outro investigador. Cega de ódio, queria descobrir o paradeiro de Diego. Obcecada, só conseguia pensar nas palavras dele ameaçando-a.
Inquieta, Thereza esperava a conclusão das investigações.
Cleide preocupada com a amiga, tentou fazer com ela se distraísse, mas Thereza não estava interessada em distrações. Diante disso, Cleide não podia fazer nada.
Rodrigo, cansado de tentar convencer a esposa a retomar a vida, decidiu voltar para o Rio de Janeiro. Dizendo que precisava encontrar um novo significado para sua vida, aconselhou Thereza a fazer o mesmo.
Thereza no entanto, insistiu em ficar na fazenda.
Quando Rodrigo partiu, todos os que ficaram com ela perceberam o quão difícil seria impedi-la de fazer alguma besteira.
Dito e feito.
Uma semana depois da partida de Rodrigo, Thereza, ao tomar conhecimento do paradeiro de Diego, foi até seu encontro para se vingar.
Disposta a matá-lo, Thereza, comprando uma arma, partiu em seu encalço.
A mulher ao vê-lo morando num humilde casebre, vivendo como meeiro em uma pequena propriedade, sacou sua espingarda e mirando nele, ameaçou atirar.
Diego, olhando fixamente para ela, respondeu que já estava vingado.
Furiosa, Thereza ao ouvir a confirmação de ser ele o responsável pela morte de sua filha, apertou o gatilho.
Segundos depois, Diego jazia morto.
Thereza ao ver o corpo inerte, abandonou a espingarda.
Um dos meeiros ao ver a mulher diante do corpo de Diego, correu assustado.
Luciana Celestino dos Santos
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Poesias
sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021
A DEUSA NEGRA - CAPÍTULO 23
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