Conforme haviam combinado, depois de uma semana de castigo, os quatro colegas se reuniram após o término das aulas para confabularem. Trataram de organizar um plano.
No entanto, precisavam de dinheiro para comprar as bombas, rojões e demais artefatos para soltarem no dia da festa.
E mais, deviam fazer isso, sem levantar suspeitas.
Isso porque tanto seus pais, quanto professores, estavam de olho neles. No menor deslize cometido tomariam mais uma advertência.
Por isso conversavam após o término da aula e voltavam correndo para casa almoçar. Tudo para não chegar a atenção, ou não dar na vista, como dizia Luís.
Como o silêncio ao redor deles era muito grande, todos ficaram desconfiados. Para despistar eventuais curiosos, os quatro começaram a passar bilhetinhos em sala de aula uns para os outros, de forma a desviar a atenção dos professores, que ao perceberem a troca de informações, deram-lhes algumas broncas, e os avisaram que se continuassem, seriam expulsos da sala.
E assim, se passaram os dias.
De acordo com o planejado, Luís e Cláudio arrumaram dinheiro, para comprar os apetrechos para o tão esperado dia.
Primeiramente, os dois disseram para os pais, que por estarem na época das festas juninas, precisavam de dinheiro para os comes e bebes.
Ante os pedidos, tanto o pai de Cláudio, quanto a mãe de Luís, disseram aos mesmos que o dinheiro seria dado no dia da festa. Diante da negativa dada, ambos insistiram com seus pais para que lhes fosse dado um adiantamento. Insistiram tanto que seus pais acabaram convencidos e lhes deram o dinheiro.
A partir daí, o plano de Raíssa entrou em ação.
Com o dinheiro em mãos, Raíssa, pegou o dinheiro dos dois amigos e se dirigiu a um depósito onde se vendia estas mercadorias para menores.
Tratava-se de uma casa pequena, que nos fundos possuía uma pequena edícula onde estavam os artefatos e que só ela, somente ela conhecia.
Ao tê-los em mãos, tratou de escondê-los num local que também conhecia muito bem e onde sabia que ninguém se atreveria a procurá-los.
Nesse lugar, os fogos estariam muito bem guardados, pois ela escondeu-os dentro de uma vala e cobriu tudo com folhagens. Passou umas duas horas se ocupando deste trabalho. Até que tudo ficou bem protegido.
Depois disso, tratou de voltar para casa. Quando se deu conta no meio do caminho do adiantado da hora, passou a caminhar mais célere.
Precisava chegar em casa antes do término da jornada de trabalho de sua madrasta, pois se aquela megera a visse chegar em casa tão tarde, não a deixaria entrar em casa. Em virtude disso ou ela teria que dormir do lado de fora da casa, ou então, tentar pular o muro que protegia a residência e aí, entrar pela janela do seu quarto.
Correu, correu, correu tanto que quase trombou em Pedro, um garoto com quem ela mal falava. Tencionava pedir desculpas pelo incidente, só que ele foi mais rápido e disse:
-- Hei, cuidado. Você quase me atropelou.
-- Desculpe. Não foi minha intenção.
-- A pressa toda é porque?
-- Por nada.
-- Ah, sim ... nada.
-- Desculpe ... mas eu tenho que ir.
-- Não foi nada. Até logo. – respondeu ele.
Nisso Raíssa se virou e nem olhou para trás, continuando a correria.
Finalmente, quando se aproximou alguns quarteirões de sua casa, que ficava numa das vilas pobres da cidade, é que diminuiu a carreira, e passou a caminhar normalmente. Em seu bairro todos a conheciam, mas, tirando alguns garotos, e duas colegas, ninguém a cumprimentava.
Muitos fingiam não vê-la.
Isso tudo, por conta de sua convivência com a madrasta, que não era a das mais pacíficas e que era conhecida de todos os moradores do lugar.
Por conta de sua madrasta e de sua pose de boa mãe, os moradores achavam Raíssa atrevida e rebelde. Alguns chegavam até a considerá-la uma má influência e com isso afastavam seus filhos de sua convivência.
O que não incomodava nem um pouco Raíssa, que até gostava dessa reputação. Sempre achou divertido chocar as pessoas.
Quando em criança, adorava brincar com os moleques na rua, participar das brigas. Muitas vezes, chegou até a bater nos colegas por conta de discussões e quase sempre levava a melhor. Tirando algumas escoriações e sangramentos em virtude das brigas, quase sempre escapava incólume.
O que não evitava que ouvisse muitos sermões de sua madrasta que sempre a advertia de que com seu comportamento ninguém iria se aproximar dela, que não nunca iria se casar com aquele gênio de cão, etc. Mas ela não se importava com isso. Já estava acostumada a ser ofendida por sua madrasta. A ser destratada, e até humilhada em público por ela. Talvez por esta razão as pessoas não sentiam confiança nela.
Pois se até a madrasta a criticava tão ferozmente, é porque havia algum motivo para tanto. O fato é que, poucas pessoas se aproximavam dela. De fato, não fossem os amigos da escola e alguns poucos conhecidos, a moça estaria completamente só.
Mas enfim, divagações a parte, conforme ía sendo colocado, Raíssa se aproximava de sua vila.
Caminhava calmamente agora.
Passou pelas ruas do lugar e finalmente encontrou a sua casa.
Por sorte, sua madrasta ainda não tinha chegado e assim, pode entrar e se instalar confortavelmente em seu quarto. Tirou os sapatos e deitou-se na cama.
No dia seguinte, todos foram para a escola.
Como de costume, após o sinal entraram na sala de aula.
E como já fazia algum tempo que havia sido realizadas as provas, os professores começaram a divulgar as notas.
Surpreendentemente, Raíssa, tida com uma das alunas mais indisciplinadas da sétima série, tirou boas notas, o que é claro, a tornou alvo de vários comentários dentro da sala de aula.
Isso porque Raíssa era reconhecidamente tida como uma péssima aluna, pois ano após ano tirava péssimas notas e quase sempre, passava no sufoco. Raramente ficava de recuperação, mas não era boa aluna. Não, não. Isso ela nunca foi. No último ano inclusive, quase foi reprovada. Mas enfim, a redenção, ela tinha tirado boas notas.
Inobstante as boas notas, muita gente suspeitou se tratar de armação.
Alguns alunos chegaram a sugerir que ela havia colado.
Quando tal boato chegou aos ouvidos de Raíssa, a primeira coisa que ela quis saber foi quem havia dito aquela mentira. Por pouco não arrumou uma grande confusão dentro da escola.
Seus amigos Luís, Cláudio e Leocádio, trataram de acalmar os ânimos, desviando a atenção dela.
Primeiramente, Luís lhe perguntou:
--Você já comprou os fogos?
-- Claro.
-- E onde estão? – perguntou ansioso Cláudio.
-- Na hora certa vocês saberão. – respondeu secamente.
-- Vê lá, heim? Não vai furar de novo não. – disse Léo.
-- Eu não vou falhar. – disse ela e saiu do pátio.
Quando Raíssa saiu, os três garotos se entreolharam e disseram:
-- Será que ela vai cumprir com o prometido? – insistiu Leocádio.
-- É claro que vai. Ela só furou aquele dia por causa de um problema com a madrasta. – respondeu Cláudio.
-- Espero que você tenha razão.
-- Eu também espero, Luís. – disse Cláudio.
Nesse momento, o sinal da escola bateu e todos retornaram as suas salas, pois havia aulas a serem ministradas.
A aula seguinte era de matemática, o terror da garotada, e para piorar, era uma aula dupla, o que tornava o final da manhã um martírio para quase todos os alunos. Teorema de Pitágoras, fórmula de Báskara, realmente esse nunca foi o forte de muitos alunos. Até mesmo do quarteto, que penava para passar de ano nessa disciplina.
Mas enfim, era um sacrifício que eles tinham que fazer se eles queriam se livrar da cobrança de suas famílias.
Ao final das aulas, novamente, bateu o sinal, sinônimo de término das aulas.
Agora os quatro poderiam conversar com mais tranqüilidade.
Poderiam planejar com calma o momento em que soltariam os fogos.
Foi nessa conversa que se revelou o propósito de Raíssa, que tencionava soltar buscapés e bombinhas durante o show programado, causando um estardalhaço entre os moradores da cidade e tornando a festa inesquecível para todos estes, segundo suas próprias palavras. Queria de certa forma, estragar a festa das beatas. Só que isso deveria de ser feito quando a festança estivesse no seu ápice, senão não teria graça. Daí tanto empenho em combinarem a hora certa para a brincadeira. Ademais, não poderiam ser vistos, pois se isso acontecesse, acabaria a brincadeira.
Então ficou combinado, que todos agiriam na surdina, para não levantar suspeitas. Nada poderia dar errado. E ninguém poderia desistir. Por isso também, é que houve a votação para saber se todos concordavam com o plano de animar a festinha da cidade, nas próprias palavras do grupo.
Como não houve desistências, trataram de combinar os mínimos detalhes para que tudo desse certo.
E nessa conversa toda, os quatro organizando a brincadeira, passaram um bom tempo conversando.
Já se divertiam imaginando a confusão que isso iria causar.
Por um triz é que não foram pegos conversando, pois os pais de Cláudio e Luís já vinham buscá-los, diante da demora dos dois em voltar para casa.
Afortunadamente, os quatro só não foram pegos juntos porque Raíssa se afastou para beber água e Leocádio, logo que notou que a presença dos mesmos, tratou de se afastar, pois nesse momento é que se dera conta do quanto estava atrasado para o almoço e que precisava chegar o mais depressa possível em casa.
Com isso somente os dois garotos estavam juntos quando o pai do Cláudio e a mãe do Luís se aproximou:
-- O que vocês dois estavam fazendo aqui no pátio sozinhos até essa hora? – perguntou desconfiada a mãe de Luís.
-- Nada mãe. Só estavamos conversando o Cláudio e eu. Nada mais.
-- Nada de mais. Sei. Então, porque demoraram tanto? – insistiu o pai de Cláudio.
-- Nada pai. É que ... o Luís e eu estavamos comentando sobre a festa de sábado. De como ela será.
-- É. E por isso acabamos nos empolgando e perdendo a hora. – comentou Luís.
-- Só fomos nos dar conta do adiantado da hora quando vocês dois chegaram.
-- Desculpe, isso não vai mais se repetir. Eu esqueci do castigo. – respondeu Luís.
-- Vocês dois, junto com a aquela menina ... não estão aprontando nada. Estão? – perguntou novamente o pai de Cláudio.
-- Não pai. Eu te garanto.
-- E você Luís, sabe de alguma coisa que aquela menina esteja aprontando?
-- Não mãe. Eu vou lá saber o que se passa na cabeça daquela garota?
-- Então, vamos embora pra casa, esquentar o almoço. – disse a mãe de Luís.
-- Então vamos, tchau Cláudio, tchau Seu Rogério.
-- Tchau Luís, até logo Senhora Marta.
--Até logo Cláudio, Seu Rogério.
-- Até logo para todos. Vamos Cláudio. – falou Seu Rogério.
Nisso todos foram para suas respectivas casas.
Nas casas de Luís, Cláudio e Leocádio, todos comeram comida esquentada e passaram a tarde diante dos olhos vigilantes de suas famílias que não queriam vê-los ao lado daquela menina irritante. Qual seja, Raíssa.
Enquanto isso o tempo ía passando, e os garotos se liberavam aos poucos da vigilância familiar.
Só não podiam cometer o deslize de serem vistos fora da escola ao lado de Raíssa.
Por isso, sempre que precisavam se reunir, marcavam o encontro num campinho, situado num lugar retirado da cidade. Os quatro passavam ali boas horas se divertindo e comentando sobre a surpresa que iam fazer na festa. Combinaram ainda, que o planejaram, não poderiam contar para ninguém.
Raíssa os fez prometer que, mesmo que um deles fosse descoberto, este não iria entregar o serviço, se manteria silente. Se quedaria calado mesmo que levasse uns safanões. E nesse ponto todos, concordaram.
Luciana Celestino dos Santos
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Poesias
sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021
A GANGUE DO TERROR - CAPÍTULO 5
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