O vento ao soprar para nós pesadamente sua brisa, sentiu um leve tremular de suas
lembranças.
Contou-me que ele, num dia triste, ousara se lançar contra sua natureza.
Lembro-me bem de sua melancolia ao dizer estas palavras:
“Certa vez, ocorreu-me a idéia de não fazer soprar nenhuma brisa, durante um longo
dia.
Senti uma pontada de superioridade por estar contrariando minha natureza.
O dia foi
passando, a tarde chegando e o frio se encontrando...
Por um momento tive a sensação de
que tinha um dever a cumprir, fazer ventar profundamente para que as folhas de uma velha
árvore caíssem.
Mas qual o quê!
Senti-me inferiorizado por tão humilde tarefa e não realizei-a.
Fiquei sossegado
deslizando discretamente sobre o ar, delicadamente feito para as pessoas respirarem.
Passei por muitos lugares.
Conheci nas minhas etéreas andanças a brisa do soprar
leve e refrescante, etc., e fiquei maravilhado ao saber que eu era o vento, que às vezes
violentamente, soprava altaneiro, grandes quantidades de ar frio.
A brisa do mar sentiu-se encantada de estar ao lado de tão nobre figura e quis
conhecer mais sobre mim.
Contei-lhe sobre o inverno que ela conhecia, apesar de viver na beira do mar, entre
outras coisas.
Ao final da tarde, depois da longa conversa, disse-lhe adeus e voltei para o
meu lugar.
Cheguei suavemente para que ninguém notasse que estive ausente.
Ao voltar, dei-me
conta de algo havia mudado para todos, só que eu, não dera valor àquilo tudo.
O mundo não parou só porque eu não executei minha tarefa e ninguém se deu conta
de que eu não estava ali.
E eu fiquei só.
Pairei na solidão fria e gélida que nos alcança
quando estamos tristes.
Senti-me desolado, olhava em volta e ninguém reparava em mim.
Nem os passarinhos se recolheram para mais tarde rumarem para outras paragens.
Enraivecido soltei um forte vento.
Rajadas de ar frio fizeram as pessoas tremerem.
Aí me dei
conta de que a natureza quer é que a vida siga seu ritmo e não que forças se lancem contra
ela.
O problema é que eu não soube valorizar meu trabalho e fui severamente repreendido
por isto.
Por isso, uma coisa te digo, nunca despreze o que é teu, por que é tudo que você tem.
É a sua vida e isso ninguém poderá tirar de você...”
Depois dessas palavras, o vento ficou longamente pensando, pensando e...
Finalmente se despediu. Foi ao longe executar sua tarefa que tão dura era, de lançar frio,
onde antes havia calor para que as pessoas se voltem para si mesmas e não deixem de fazer
o que lhes faz bem.
Para que não vivam como pássaros sem asas que não podem voar, nem
para perto, nem para longe, muito menos sonhar em voar...
Luciana Celestino dos Santos
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