Poesias

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

VEM DANÇAR COMIGO? - CAPÍTULO 4

Caminhando na escuridão, a moça teve o maior cuidado para não acordar Angela, que acreditava estar dormindo. Porém, qual não foi sua surpresa ao se deparar com a irmã esperando-a em seu quarto, sentada em uma poltrona. 
Laura, ao acender a luz do quarto e se deparar com a irmã esperando-a, deu um grito. Assustada, não contava com a possibilidade de a irmã estar esperando-a em seu quarto.
Porém, passado o susto, foi logo perguntando:
-- O que você está fazendo aqui? 
Angela calmamente acomodou-se na poltrona. Depois respondeu:
-- Eu estou te esperando há três horas.
-- Para quê? – perguntou Laura curiosa.  
-- Para quê? Pois bem, eu vou refrescar sua memória. Não sei se você se lembra muito bem, mas de qualquer forma, eu me lembro. Não faz muito tempo, você deixou escapar que tinha arrumado um namorado.
-- Sim, mas aquilo foi uma bobagem... – respondeu Laura antes de ser interrompida pela irmã.
-- Não me interrompa. Eu quero concluir meu pensamento. Voltando ao que disse, você me disse que estava namorando. Certo? 
-- Sim, eu disse. Mas eu quero explicar que... – tentou dizer, mas novamente foi interrompida por Angela.
-- Pois bem. Você, ao arrumar um suposto namorado, não me apresentou o rapaz, nem fez questão nenhuma de que eu viesse a conhecê-lo. Agora, novamente em companhia dessas suas amigas, sai todos os sábados a noite. Isso quando não sai também aos domingos, sabe-se lá para quê, volta tarde da noite, e não me dá explicações. Você já se deu conta do quanto seu comportamento é inadequado?
-- Inadequado por quê? – perguntou Laura intrigada.
-- Ah! Você quer saber por quê? Pois então eu vou te explicar. Primeiro. Nenhuma moça de família se comporta da forma lastimável como você vem se comportando ultimamente. Você já se deu conta disso?
Laura ficou irritada. Ao ouvir o comentário da irmã, respondeu:
-- Quer dizer que para você, meu comportamento é inadequado?
-- Sim. E quer saber do que mais? As pessoas já andam comentando sobre você. E o pior, elas têm razão. Você não está se dando o devido respeito. Afinal de contas, onde você pensa que vai chegar, agindo dessa maneira?
-- Eu não estou entendendo o rumo dessa conversa. Afinal de contas, você me esperou para me desancar? – perguntou Laura, visivelmente irritada. 
-- Não minha querida. Eu estou falando isso para o seu bem. Se estou te avisando, é por que eu me importo de verdade com você. Eu gosto de ti, e me irrita profundamente quando ouço as pessoas fazerem comentários maldosos a seu respeito. Eu não quero ver você cair na boca do povo. – respondeu Angela, com voz doce.
Laura todavia, não estava nem um pouco preocupada com os avisos da irmã. Por isso, assim que Angela encerrou a conversa, tratou logo de pedir para que ela saísse de seu quarto. 
Angela atendeu prontamente o pedido.
Nisso, Laura, aborrecida com o entrevero que tivera com a irmã, ao tentar dormir, só conseguia se virar na cama. Sim, o desentendimento fora sério. Para Laura, Angela havia ido longe demais. 
Porém, por mais raiva que tivesse de Angela, a moça não sabia que atitude tomar com relação a irmã. 
Como o apartamento em que viviam era de Angela, Laura não tinha nem como pedir para que ela saísse. Além disso, com seu salário de vendedora, não teria condições de manter um apartamento tão grande. Não bastasse isso, Laura não tinha como bancar uma casa sozinha. 
Todavia, as coisas não podiam continuar como estavam. Afinal de contas ela já era maior de idade e não cabia a Angela tomar conta de sua vida. 
Assim, irritada, Laura passou o restante da noite em claro. Incomodada com as palavras de Angela, a moça só conseguiu dormir quando já era dia claro. Por isso, precavida, ao sentir que o sono estava vindo, trancou a porta do quarto, deixando a chave lá e dormiu.
Fez bem.
Fez bem por que Angela, ao se levantar, foi logo chamar Laura para tomar o café. Se a porta estivesse encostada, fatalmente Angela, entraria no quarto e a obrigaria a se levantar, mesmo que ainda estivesse com sono.
Daí a razão do cuidado que Laura tivera.
Dito e feito. 
Angela, ao perceber que não era atendida, ameaçou entrar no quarto. Porém, ao virar a maçaneta, percebeu que a porta estava trancada. Aborrecida, começou a bater na porta, exigindo que Laura abrisse.
Como a moça dormia pesadamente, nem sequer ouviu o escândalo de Angela.
Enquanto isso, Angela, constatando que não seria atendida, desistiu. Desistiu e foi preparar o próprio café. Irritada com o comportamento de Laura, foi até bom que a moça estivesse dormindo, pois se aparecesse diante dela, fatalmente as duas acabariam brigando. 
Porém, conforme a tarde ía se acabando, Laura, finalmente acordou. Descansada, foi primeiramente, olhar pelo buraco da fechadura, para ver se Angela não estava por perto. Depois de verificar que a irmã aparentemente, não estava por ali, abriu a porta com todo o cuidado. 
Após abrir a porta, foi olhar para o corredor para ver se Angela não a estava espreitando. Atentamente, olhou para os dois lados como se estivesse atravessando uma rua. Tudo tranqüilo. Foi aí então, que com roupas na mão, a moça trancou novamente a porta do quarto e foi até ao banheiro.  
Lá Laura tomou um bom banho, e vestindo uma roupa leve, foi dar uma volta pela cidade. São Paulo nessa época, apesar de suas grandes dimensões, era uma cidade pacífica. Por isso, mesmo com a noite se aproximando, não havia problema nenhum em Laura sair de sua casa, ainda que sozinha, para passear pelas ruas da cidade.
E assim, foi caminhando sozinha que Laura conseguiu pensar melhor em sua vida, e tentou encontrar uma solução para tentar resolver seus problemas. Afinal de contas, não queria passar o resto de sua vida brigando com sua irmã. 
Isso por que, Angela, era a única família que possuía. Era sua única parente próxima, que ainda estava viva. Ademais, mesmo com muitos defeitos, Angela a acolhera. Não bastasse tê-la recebido em sua casa, Angela cuidou dela e terminou de criá-la. Isso por que, quando Laura se viu sozinha no mundo, não tinha mais do que doze anos. 
Assim, mesmo com as maiores implicâncias da irmã, Laura tinha uma grande consideração e gratidão por tudo o que Angela fizera por ela.
Por isso mesmo, nas inúmeras vezes que Benê criticou sua irmã, a moça fez questão de defendê-la. Isso por que, apesar de seu temperamento costumeiramente rude, Angela fizera muito por ela.
Mas Benê a despeito disso, considerava ainda assim, a atitude de Angela, muito exagerada. No entanto, não brigava com a amiga por isto.
Sim, Angela não era má pessoa. Talvez um pouco autoritária e mandona, mas fora generosa com ela no momento em que ela mais precisou.  
E assim pensando, Laura ficou a caminhar por horas. Nessas horas, passou por vários lugares, ouviu música e pessoas conversando ruidosamente. De longe, observou um casal de namorados que encantando com as estrelas, parou para admirar o firmamento.
Mais tarde, depois de muito pensar, a moça voltou para casa.
Ao entrar no apartamento, Laura viu Angela sentada num canto da sala, amuada, triste. Desanimada, a mulher não tinha nem ânimo para discutir com Laura – sua única irmã. 
Tudo por que Angela estava desapontada com o comportamento da irmã. Isso por que, para ela, Laura estava rebelde demais. Tão rebelde que Angela não conseguia entender por quê. Apesar de ser muito mais velha que Laura, Angela, também já  tivera dezoito anos. No entanto, em nenhum momento se comportara como a irmã.
Ao contrário, com menos de vinte anos, casou-se, para, com menos de cinco anos de casada, enviuvar. Sim, Angela ficou viúva muito cedo. Porém, a despeito de sua viuvez, a moça não ficou desamparada. Em razão de seu marido ser muitos anos mais velho que ela, já havia galgado um bom posto em seu trabalho e amealhado um bom patrimônio. Assim, quando faleceu, deixou Angela em boa situação financeira. Tão boa que Angela, mesmo ainda muito jovem, não precisou trabalhar.
E assim, mesmo viúva, logo após o falecimento dos pais, fez questão de levar Laura para sua casa e cuidar dela como se fora uma filha.   
 As duas então, lembrando-se disso, foram tomadas de um profundo sentimento de emoção. Laura então, ao ouvir de sua irmã, que ela só queria seu bem, ficou profundamente enternecida. Emocionada, a moça tratou logo de abraçar a irmã e dizer que lhe era muito grata por tudo que fizera por ela. E prosseguiu, dizendo:
-- E por mais que a gente brigue, se desentenda, nunca se esqueça disso, por que eu sempre vou me lembrar, de tudo o que você fez por mim. 
Angela ao ouvir as palavras da irmã, caiu no choro.
Laura ao ver que Angela chorava, comentou que não dissera aquilo para fazê-la chorar, e sim para tentar se desculpar pela última briga que tiveram.
Angela então, ao ouvir Laura, comentou:
-- Eu não estou chorando de tristeza. Eu estou emocionada. Nunca pensei que eu viveria para ouvir isso. Eu não esperava. Mas é muito bom ouvir que você reconhece o meu esforço. Obrigada minha querida. 
Nisso, Laura abraçou novamente a irmã, e as duas ficaram abraçadas, por um longo espaço de tempo. 

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.  

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