Poesias

quinta-feira, 5 de agosto de 2021

TEMPOS DE OUTRORA - CAPÍTULO 20

A propósito, Rogério desde a primeira vez que vira Ticiano, notou que o conhecia de algum lugar. 
Isso por que, em diversas conversas com o rapaz, inúmeras vezes, Rogério teve a sensação de já conhecê-lo. Assim, mesmo diante das negativas do rapaz, Rogério acreditava que já o tinha visto antes. Daí a razão em investigar seu passado.
E assim, como única pista, Rogério sabia que como bom cavaleiro que era, provavelmente Ticiano vivera alguns anos em uma fazenda, cuidando de animais. Contudo, mesmo diante desta pista, havia muito trabalho a ser feito. Por esta razão contratou ele, os serviços de um detetive.  
Nisso, Ticiano, que estivera a trabalho em outra localidade, finalmente retornou ao seu labor. Porém depois de quase um ano na capital, Ticiano foi novamente convocado para uma viagem. Desta vez passaria alguns meses, numa cidade na região serrana da província. 
Ao saber da novidade, o mancebo ficou um tanto quanto incomodado. Temendo que pudesse vir a ser reconhecido, fez o possível para que seu superior chamasse outra pessoa para o encargo. Porém, a despeito disso, ordens são ordens, e não cabia a ele, um simples oficial, discuti-las.
Diante disso, sem ter alternativas, o rapaz acabou viajando para a aludida cidade.
Rogério, então, sequioso de conhecer algo mais sobre o novo amigo, decidiu viajar para a mesma localidade. Cauteloso porém, resolveu esperar um pouco para rumar para lá. Isso por que não queria chamar a atenção do mancebo que já devia estar bastante desconfiado da inesperada aproximação.
Assim, com todo o cuidado, Rogério esperou pacientemente alguns meses, até viajar para a cidade. 
Quando então finalmente chegou à cidade, Ticiano, com oficial de cavalaria, fazia ronda pela cidade. À essa altura, o rapaz já era conhecido de boa parte das pessoas que por ali viviam.
Com isso, quando Rogério chegou à região, não foi nada difícil encontrar o rapaz. 
Josué, amigo de Ticiano, desde os primeiros tempos de exército, também havia sido deslocado para lá. Este, companheiro do jovem mancebo, foi quem comunicou a Rogério, que Ticiano era conhecido na localidade. 
Rogério então, na vã tentativa de descobrir algo mais sobre Ticiano, encheu Josué de perguntas, as quais, a grande maioria, o jovem não conseguiu responder. Em razão de Tício – a maneira como ele chamava o rapaz – ser reservado, Josué não sabia muita coisa sobre a vida dele. 
Contudo, respeitando as reservas do amigo, Josué nunca se preocupou em saber sobre seu passado. Por isso, ao ser inquirido por Rogério, Josué sentiu-se deveras incomodado. Além disso, desconfiado das intenções de Rogério, tratou logo de avisar o amigo de que o tal cavalheiro estava querendo saber demais sobre sua vida. 
Ticiano, que a esta hora estava almoçando, ao ouvir de Josué, que Rogério estava tentando descobrir algo sobre seu passado, ficou deveras preocupado. De tão nervoso, chegou a derrubar os talheres que segurava, no chão.
Josué, que até então, nunca vira o amigo perder a calma, ficou deveras surpreso com a reação de Tício a notícia. Mas este, percebendo a impressão do amigo, respondeu que estava preocupado com um assunto particular.
Josué, porém, não ficou nem um pouco convencido disso. Ao perceber que sabia muito pouco a respeito do amigo, chegou a acreditar que o mesmo guardava um segredo. Algo muito sério devia ter acontecido a ele para que passasse a agir tão discretamente.
Observando o comportamento do amigo, percebeu que o mesmo sempre evitava sair, tinha poucos amigos. Além disso, certa vez, quando saíram juntos, Ticiano, ao vistar uma certa pessoa, tratou logo de se esconder, como se estivesse com medo de ser reconhecido.
Sim, o comportamento do jovem era bastante estranho.
Além disso, o rapaz era refinado demais para quem tinha uma origem humilde. E quanto a isso, até mesmo os companheiros de farda de Tício concordavam. Provavelmente o rapaz era de família nobre. Talvez ele tivesse sido muito rico, mas depois sua família perdeu tudo. Foi a essa conclusão que chegaram tanto Josué quanto Rogério, que essa altura descobria algo mais sobre o rapaz.
Diante dessa constatação, Rogério tratou de avisar imediatamente o detetive. Por meio de um telegrama, Horácio foi informado que o jovem talvez tivesse a tal ascendência nobre.
Enquanto isso, ali na região, um baile era organizado em honra aos militares.
Com toda essa pompa, até mesmo Ticiano foi instado a comparecer ao evento.
Rogério, ao saber do baile, fez questão de ser convidado para a festa.
E assim, foi que durante o evento, pôde ver Ticiano dançando pelo salão. Dançando com algumas das moças, o jovem se esqueceu por algum tempo de sua vida. Distraído em sua dança, nem sequer percebeu que era observado por Rogério. 
À essa altura, uma jovem, de nome Margarida, procurando conhecê-lo melhor, fez questão de que alguns de seus amigos arrumasse um encontro com o rapaz.
Foi assim, que Ticiano, estando a sós por um instante foi convidado por um grupo de rapazes para tomar uma bebida. Ressabiado, o rapaz acabou recusando o oferecimento.
Os jovens, contudo, não desistiram. Insistentes, reiteraram o convite e só o deixaram novamente a sós, quando o jovem concordou em conversar um pouco com eles.
Pronto, estava arrumado o encontro.
E lá foi Ticiano, sem saber o que o esperava. 
Por isto, qual não foi sua surpresa, quando ao chegar no jardim, avistou Margarida, uma jovem conhecida na região. Ticiano, sem saber o que fazer, muito menos o que dizer, acabou perguntando:
-- O que é que a senhorita faz aqui?
Margarida no entanto, não se intimidou nem um pouco com a indagação do mancebo. Ao contrário, ousada, respondeu:
-- O mesmo que você. Eu vim fazer um passeio. Às vezes, mesmo nas melhores festas, é bom ficar um pouco sozinha. Você não concorda?
-- Às vezes, é bom ficar a sós. Mas não foi por isso que eu vim para cá.
-- Não? – perguntou a moça, falsamente surpresa.
-- Não. Provavelmente eu fui alvo de uma pilhéria. Mas eu acho bom que se assim o foi, quem participou da brincadeira não apareça na minha frente a partir de agora. Com licença, senhorita. – disse já se afastando.
-- Espere. – pediu Margarida. – Me desculpe os modos, eu não me apresentei. Me chamo Margarida. A propósito, qual é o seu nome?
-- Ticiano. – respondeu segurando as mãos da jovem, e num delicado gesto de cortesia, beijou-as. 
Depois, dizendo ter pressa, alegou que tinha que partir.
Margarida, no entanto, insistiu para que o jovem não fosse ainda. Dizendo que ainda não tinha dançado com ele, argumentou que gostaria de valsar. 
O jovem, no entanto, sem ter como recusar o pedido, gentilmente a conduziu até o centro do salão e lá dançou com a moça, que parecia encantada com suas maneiras. 
Depois, despedindo-se da moça, Ticiano alegou que precisava partir. 
Nessa altura, Rogério finalmente tivera a oportunidade que esperava. Assim, vendo Ticiano sozinho, tratou logo de se aproximar e conversar com o rapaz. 
O rapaz, que até então não tinha se encontrado com Rogério, surpreendeu-se com sua presença na festa. Tanto que chegou a comentar:
-- O senhor por aqui? Pensei que estivesse de passagem.
-- Meu caro Tício, acaso pensaste que eu viria para cá e não veria meu amigo? Podes não acreditar, mas eu tenho muita estima por você.
-- É mesmo? É por causa desta tal estima que andas devassando minha vida? Aliás, qual a razão de tudo isso? – perguntou demonstrando claramente o quão estava incomodando com as constantes perguntas de Rogério.
-- Me desculpe se pareço inconveniente, mas é que eu acho que você é muito mais do que aparenta ser. Tenho certeza absoluta que posso te ajudar.
Ao ouvir isso, Ticiano respondeu então:
-- Pois bem! Quer me ajudar? Então não se intrometa mais na minha vida. Se o senhor fizer isso, já vai me ajudar deveras. – finalizou saindo do salão. 
Rogério porém, mesmo diante da severa admoestação sofrida, não desistiria de seu intento. Decidido a desvendar o passado de Ticiano, se empenharia mais ainda para descobrir detalhes. 
Nisso, ao término do baile, aproveitou para dar uma caminhada pelas ruas da cidade. Desapontado por ter causado uma má impressão em Ticiano, ainda assim, prosseguiria em sua investigação. 
Acreditando que o jovem pudesse ser um fidalgo, filho de um homem de posses, Rogério queria ajudar o amigo a melhorar sua vida. Porém, não poderia imaginar o que estaria por vir.

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria. 

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