Poesias

quarta-feira, 4 de agosto de 2021

TEMPOS DE OUTRORA - CAPÍTULO 1

Lembranças, templo de velhas saudades, alegria, tristeza, mágoa e revolta. Recordações de uma época que não retornará. De um tempo que embora triste e querido, resiste nas memórias de um passado que não volta mais. 
Essa história começa nos idos de 1852, nas cercanias da hoje conhecida, cidade de Petrópolis.
Eram tempos felizes.
Nessa época viveu nestas paragens, uma ilustre família da Capital. 
Família essa que hoje, poucos sabem a respeito. 
Os poucos que dizem ter conhecido a família, não comentam o assunto. Não gostam de falar sobre isso. Preferem esquecer. Para a sociedade fluminense, importa mais saber sobre as novidades na Corte do Império, do que comentar sobre os acontecimentos passados.
É bom sonhar com os bailes organizados no Palácio Imperial, com a nobreza e suas delicadas maneiras nos salões. Os saraus, as festas, as confraternizações. O luxo e o requinte de uma vida que poucos podem usufruir. 
Enquanto alguns privilegiados convivem com a abundância, protegidos em suas pequenas fortalezas, livres de toda miséria e pobreza; outros – aliás, a grande maioria da população, não só daquela, mas de outras cidades e vilarejos –, convivem com a mais absoluta pobreza.
É nesse cenário que um jovem rapaz, agora vive.
Distante dali, da efervescente Corte Imperial, na região de Vassouras, mais tarde elevada a categoria de cidade, vive um rapaz pobre, que trabalha para um senhor, fazendeiro ilustre do lugar, e conhecido criador de animais. Diferente de todos os demais latifundiários das cercanias que cultivam café, José, cuida da criação de cavalos. 
Para este senhor, o jovem realiza serviços de conservação dos estábulos, trata os cavalos, e os treina. Possuí uma rotina dura de trabalho. Para realizar suas tarefas, precisa acordar muito cedo. 
Este senhor, patrão de Ticiano, possuí dois filhos, uma moça de quinze anos e um rapaz de dezessete. Ambos possuem uma vida de príncipes. O rapaz, como todos os filhos de fazendeiros ricos, se prepara para viver alguns anos na Europa estudando. Já a moça é educada por ali mesmo, na fazenda. Muito embora já tenha estudado em colégio interno, para que com isso pudesse ter alguma instrução e refinamento, ambos exigidos na vida social, a moça agora, deveria ficar na fazenda.
Com isso de vez em quando José e a família iam para a Corte. 
Assim, enquanto o ilustre fazendeiro aproveitava a viagem para passear com a família, tratava também, de realizar a venda de alguns de seus belos animais. 
Quando surgia alguma oportunidade também aproveitava para participar de eventos relacionados com seu trabalho, na cidade. Em razão disso, o fazendeiro colecionava alguns prêmios obtidos em leilões, em virtude da qualidade de seus animais.  
Essa  era a rotina de viagens da família Vieira. Lazer para a esposa e os dois filhos, e trabalho para José. 
E assim, aproveitando então a estada na Capital da Província, Tereza – a filha –, e Tiago – o rapaz –, bem como a mãe Catarina, tratavam logo de visitar os mais belos cenários da cidade. Faziam compras, passeavam pela Rua do Ouvidor, caminhavam pelo Jardim Botânico. Enfim, toda vez que rumavam para lá, revisitavam todos os lugares que já estavam acostumados a admirar em postais enviados por amigos. 
Com isso, enquanto os filhos do patrão estavam sendo educados para a vida em sociedade, o jovem, que possuí quase a mesma idade deles, trabalha de sol a sol, numa dura rotina diária. 
Como dia de descanso apenas o domingo, que usa para suas leituras, e estudos de história e literatura. Ás vezes, aproveita o dia, para, com a carona de um dos empregados da fazenda, ir até a cidade para gastar um pouco de suas míseras e parcas economias com mais livros e tecidos para suas roupas. Por seu trabalho na fazenda, não tinha que gastar seu dinheiro com alimentação. 
A morada, é um casebre, próximo a cocheira. Simples. Só possuí uma cama, um baú para guardar alguns pertences adquiridos em virtude dos anos lá trabalhados, alguns livros e roupas de cama, bem como um penico, uma jarra de barro, uma bacia de uma louça barata para molhar o rosto, e uma tina, para que pudesse se banhar. 
Daí se concluí portanto, que Ticiano não possuí muitos pertences. De seu realmente, não possuí quase nada. Quando chegara nestas paragens, as únicas coisas que trazia consigo, eram uma foto amassada de uma família, e uma trouxa de roupas.   
Destituído de qualquer vaidade, não possuía roupas adornadas, somente o necessário para estar dignamente trajado. Aliás, alguns de seus trajes, diga-se de passagem, estavam bastantes surrados.         

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

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