Poesias

quinta-feira, 5 de agosto de 2021

TEMPOS DE OUTRORA - CAPÍTULO 17

Ressabiado, a ele não interessava se reencontrar com certos acontecimentos e pessoas. Queria esquecer o passado.
Para ele, só sua vida presente importava. Do passado, não queria sequer as lembranças. 
Daí sua resistência em retornar ao palco de tantos acontecimentos tristes em sua vida.
Mas, a despeito de tudo isso, Ticiano tinha que obedecer as ordens dadas. Mesmo contrariado, não poderia se contrapor as ordens de um superior hierárquico.
Diante disso, Tício aceitou os fatos, e juntamente com os outros militares, rumou para a Corte Imperial.
Durante a longa viagem, veio a sua memória, passagens de sua vida. 
Preocupado, o rapaz recordou-se do tempo em que viveu na Fazenda Passárgada, e dos tempos em que vivera como errante, vagando por entre cidades, até chegar em Serra Azul. 
Ticiano lembrou-se ainda de quando fugira, indo parar nas terras de José. 
Saudoso, recordou-se com carinho, de todas essas passagens em sua vida.
Mas não estava feliz. Estava deveras preocupado. O rapaz sentia-se intranqüilo com a possibilidade de vir a ser reconhecido na Corte.
Por isso, ao lá chegar, evitou circular pelas ruas da cidade. 
Como já foi mostrado, Ticiano sentia-se desconfortável com a mudança. Tal fato, inclusive, causou estranheza em seus companheiros de farda. Cismados com a atitude do colega, os rapazes começaram a cogitar o porquê da atitude do rapaz.
Surpresos, não entendiam o porque de tanta tristeza. Afinal, Ticiano havia sido promovido. Além do mais, estava agora, vivendo em uma cidade repleta de acontecimentos. Cidade esta, que era o sonho da grande maioria dos militares que estavam servindo em Serra Azul.
Josué mesmo, achava um absurdo o amigo ficar tão recluso. 
A caserna era um local onde os militares se reuniam enquanto estavam em serviço. Contudo, havia os momentos de folga, em que os mesmos poderiam se divertir, e circular pela cidade. 
Jovens como eram, para eles, conhecer a Cidade do Rio de Janeiro, era um grande acontecimento.
E assim, durante as folgas, os jovens soldados aproveitavam para passear, freqüentar alguns cafés e restaurantes, e se divertirem em bordéis.
Os cadetes, soldados e oficiais, aproveitavam muito as folgas. Isso porque, não era sempre que eram dispensados do trabalho.
Aliás, para fazerem a segurança da família real, os militares eram organizados em grupos. Grupos esses, que se dividiam em turnos. Assim, o palácio nunca ficava desprotegido.
Ticiano, aproveitando-se disso, pedia freqüentemente, ao seu superior hierárquico, para que adiasse sua folga. Sob a desculpa de que queria conhecer melhor seu trabalho, e se preparar para tanto, constantemente, Ticiano se oferecia para permanecer em serviço.
No entanto, após dois meses de trabalho intenso, seu superior imediato, o intimou para que ficasse de folga por alguns dias. Afinal, não havia necessidade de o jovem rapaz trabalhar tanto. Tão jovem, precisava se distrair com outras coisas.
E assim, o capitão o dispensou do serviço por alguns dias.
Decepcionado, Ticiano tentou permanecer no quartel, mas o general, ao vê-lo por lá, ordenou-lhe que se retirasse. Que fosse sair, passear.  Afinal a cidade era tão linda! Por que não aproveitar?
Sem outra alternativa, Ticiano foi então, passear pelas ruas da cidade. Passou por lojas, cafés, restaurantes, igrejas. Viu fausto e riqueza, mas viu também exploração e miséria. Andou tanto, que chegou a encontrar alguns dos seus companheiros, durante seu passeio pela cidade.
Josué ao avistá-lo, foi logo lhe chamando e o convidando para se integrar ao grupo.
Espantado, o rapaz perguntou a razão pela qual Ticiano resolvera sair do casulo.
Ticiano então, lhe explicou que, fora intimado a ficar de folga. Disse brincando, que os oficiais já não agüentavam mais olhar para sua cara.
No que, ao ouvirem isso, os cinco rapazes que estavam à mesa, caíram na risada.
Josué então comentou:
-- Espirituoso, heim? Que bom que está um pouco mais animado! 
-- Eu não estava triste. Só queria me inteirar um pouco mais do trabalho. – disse secamente.
-- O que estava acontecendo com você? Por acaso deixou alguém por lá? – disse Josué, referindo-se a Serra Azul.
-- Não. Só não me sentia a vontade em voltar para cá. – disse, sem pensar.
-- Quer dizer então, que já viveu aqui?
-- Não necessariamente. Mas já estive de passagem. – respondeu, tentando consertar a situação. 
E assim foi. Durante a tarde, os jovens militares visitaram alguns dos lugares famosos da cidade. À noite, todos retornaram para o quartel, à exceção de Ticiano, que tinha alguns dias de folga.
Assim, seus colegas de profissão só puderam colocar novamente os olhos nele, quando este retornou de sua folga.
Muito embora tenha resistido o quanto pôde, para sair do quartel, Ticiano havia retornado, com o semblante mais leve. Seus amigos e colegas notaram que o mesmo, parecia ligeiramente feliz.
Realmente, algo de muito bom acontecera. O rapaz, estava muito bem.
Curiosos, seus companheiros de quarto, ao verem-no tão bem, não se cansaram de fazer perguntas.
Mas, Ticiano, reservado que era, só respondia com evasivas, as perguntas formuladas.
Para seus amigos, muito embora Ticiano não dissesse nada, parecia que tinha arrumado uma mulher. Ou então, havia se divertido muito em um dos vários bordéis da cidade.
Com isso, no dia seguinte, todos tiveram que trabalhar pesado. 
Ticiano e Josué, por exemplo, foram chamados para acompanhar alguns nobres em um pequenique. 
Contudo, o passeio não transcorreu conforme o esperado.
No caminho para o convescote, uma confusão se instalou. Uma horda de mendigos se aproximou da carruagem.
De início, não pareceram perigosos. Contudo, ao se aproximarem e verem que não eram ouvidos em suas reivindicações, ameaçaram virar a carruagem. Diante da confusão, Ticiano e Josué, precisaram agir.
Cautelosos, os dois rapazes tentaram conversar com os mendigos. No entanto, de nada adiantou somente falarem. Assim, os dois empunharam suas espadas e puseram o bando de indigentes para correr.
Com isso, diante do ocorrido, os nobres acharam por bem, retornar a Corte.
Ao lá chegar, os nobres foram avisados de que tal lugar era perigoso. Por ser muito afastado da cidade, alguns marginais se escondiam ali para assaltarem os viajantes.
Os nobres precisavam ter mais cuidado portanto. 
Por conta disso, o capitão que convocou os dois oficiais, foi severamente repreendido. Estando na cidade há mais tempo, já devia saber que alguns lugares não deveriam ser freqüentados pela corte.
E assim, afastado de suas funções, foi substituído. 
Por isso, Ticiano e os demais oficiais daquele destacamento, passaram a trabalhar sob as ordens de um novo capitão.

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

Nenhum comentário:

Postar um comentário