Vi certa vez, no final de uma entrevista, as palavras de um ilustre cidadão deste tempo, comentando a respeito do tédio.
Dizia ele em suas poéticas palavras, que o tédio era um mal necessário, já que não é possível estar o tempo todo envolto em grandes acontecimentos, em grandes experiências.
Que a vida também é composta por momentos de tédio, muitos aliás, e que por ser parte integrante de nossa existência, devemos nos acostumar com ele.
Não nos tornamos menores por vivenciarmos momentos de vazio absoluto, sem nada de interessante para contar. Isto também faz parte da vida.
Às vezes é necessário atravessarmos um longo deserto em nossas vidas, para que em dado momento irrompa algo novo, para que possamos produzir algo de importância, de belo.
Como se a terra estivesse adormecida, procurando se recompor para que após um longo período de repouso, possa fazer brotar lindas flores, frutificar, disseminar o verde. Enfim renascer em vida e viço.
Como se despertasse de um longo período de sono, de um longo período sem atividade e sem interesses.
Segundo o sábio homem, precisamos destes tempos de árido deserto em nossa existência, para que possamos adormecer para o que não interessa e nos voltarmos para nós mesmos, a fim de descobrirmos o que temos de melhor em nós.
Quem sabe até para que descubramos a nossa essência, e descobrindo-a, possamos mostrar aos outros, o que temos de melhor em nós mesmos.
Tédio quem sabe é um tempo de descobertas.
Tempo de nos introvertermos.
Voltarmos para nós e talvez descobrirmos quem somos de verdade.
Tempo de ruptura com idéias antigas. De trabalharmos nossos pensamentos, nossas idéias.
E assim, com o passar do tempo, fazermos germinar novas idéias, florescer lindas flores de um novo tempo, um novo jardim em nossa existência.
Desta forma, de acordo com o pensamento do entrevistado, não devemos nos queixar dos momentos de tédio, e sim nos deixarmos levar por ele, aproveitando o que ele tem de bom para nos oferecer.
Afinal de contas, não dizem que os gregos cultivavam o ócio, o qual pode ser um tédio para alguns?
Não era um valor para eles?
Com efeito, os gregos não viam com bons olhos os negociantes, negadores do ócio.
Por sua vez, o trabalho antigamente, possuía a conotação de torturar, fazer sofrer.
Mais tarde passou a ter a conotação de que enobrece o homem.
Muitas vezes cheguei a conclusão de que empobrece.
Isto por que, poucas pessoas conseguem enriquecer trabalhando.
Ademais, para muitas pessoas este é o tédio.
Mas enfim, como disse o entrevistado, um mal necessário.
Afinal de contas a maioria das pessoas precisa trabalhar para sobreviver.
Mas voltando ao ócio...
Não dizem que existe o ócio criativo?
Em algumas profissões, principalmente para os poetas, o tal ócio é uma necessidade premente, imperiosa.
Um ócio o qual precisam usufruir para que possam produzir boas idéias, escrever belas e boas poesias. Enfim, criar.
O ócio portanto, não é algo inútil, muito embora possa parecer.
É o outro lado de uma moeda chamada atividade.
Palavra tão usada e tão mal empregada.
Nos tornamos escravos do tempo.
Raramente temos tempo para cultivar o ócio.
Por esta razão também, sofremos mais com o tédio.
Fatigados, pensamos mais nos problemas da vida, e no quanto ela é dura.
Já dizia Guimarães Rosa: “Viver é difícil”.
Desanimados, temos menos tempo para contemplar a beleza da vida.
Nos atemos em contemplar a pobreza, a miséria, a deselegância, a falta de educação, de modos, o péssimo estado de conservação dos prédios.
O quanto muitas cidades estão descuidadas, maltratadas e abandonadas, como os habitantes que moram nela, como as pessoas que circulam nela.
A vida se tornou algo burocrático e rígido. Temos que cumprir metas, prazos, regras, etc.
Ficamos enfastiados.
E aí, ao invés do tédio ser algo produtivo, se torna realmente um vazio, um deserto de esperanças, e, ao invés de renascermos de nosso estado letárgico, mergulhamos mais fundo em nossa tristeza, em nossa indiferença... num círculo vicioso que nunca acaba e do qual é difícil escapar.
O que fazer para fugirmos disso?
É o que estou tentando descobrir.
Ultimamente venho tentando ocupar os momentos em que posso cultivar meu ócio, com coisas prazerosas para mim, pelo menos.
Estou ouvindo mais música, cantando mais, assistindo bons filmes na televisão, passeando mais. Mas não é o bastante!
Preciso voltar a ler mais obras literárias, poemas, romances, escrever mais, sonhar mais, construir mais mundos imaginários, mergulhar mais fundo dentro de mim.
Lembro-me do tempo em que criava mundos de histórias e do quanto isto me fazia feliz.
Preciso recuperar um pouco deste tempo.
Um pouco, por que como um filósofo grego já dizia: As águas de rio, não passam duas vezes pelo mesmo lugar.
O tempo não volta, mas ainda podemos ser felizes.
Muito embora, não seja possível ser feliz o tempo inteiro.
Sim, descobri a duras penas, que a felicidade constante e eterna é uma quimera.
Mas podemos ter belos momentos de felicidade.
Muito embora seja impossível ser feliz o tempo inteiro, temos que lutar pela felicidade.
Também descobri que a felicidade não é algo impossível de ser alcançado. Todavia, não é fácil ser feliz. É uma luta constante.
De fato é mais fácil ser infeliz do que feliz. Basta que nos entreguemos aos pensamentos derrotistas, que nos deixem abalar, que derrubem a nossa alto estima.
Não, não podemos deixar que destruam nossos sonhos, que nos digam que nunca iremos conseguir o que desejamos, e pior, aceitarmos isto.
Se o tédio é inevitável como nos disse o pensador, devemos aproveitar o que ele pode nos oferecer e utilizar esta ferramenta para que após algum tempo de inação, possamos, assim como a árvore, frutificar, semeando boas idéias, as quais deverão germinar produzindo bons frutos.
Como a terra adormecida, que irrompe em plantas, flores e frutos. Fazendo medrar a vegetação, a qual explodirá em verde.
Os bons pensamentos devem irromper a barreira da mente, e transformar o mundo em que vivemos.
Acredito o sentimento de tédio é uma constante na história da humanidade, e que este sentimento é cíclico na vida dos homens.
Saber lidar como ele é um desafio para toda a nossa existência.
Quem sabe possamos dominar o tédio. Ou então possamos bem conviver com ele.
Luciana Celestino dos Santos
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