Poesias

quarta-feira, 4 de agosto de 2021

TEMPOS DE OUTRORA - CAPÍTULO 5

Conforme os dias foram se seguindo, os sonhos de Ticiano iam se tornando agora, menos freqüentes. Depois de tantas noites dormindo mal, passara agora a dormir normalmente, sem sobressaltos.
Foi nesse ínterim que Tício resolveu que, quando juntasse uma boa quantia em dinheiro, sairia da fazenda e viveria em outro lugar. Isso por que sentiu que precisava mudar sua vida de alguma forma. Necessitava partir em busca de algo que se perdera e do qual não esqueceu o valor.
Mas ainda teria que trabalhar na fazenda por mais algum tempo, até arrumar um bom dinheiro e planejar o que iria fazer quando de lá saísse.
Por essa razão trabalhou ainda mais algum tempo na fazenda.
Mas, esqueçamos o trabalho pelo menos por alguns instantes. 
Isso por que, em comemoração ao bom resultado nas vendas de seus animais, José planejava cuidadosamente uma festa. 
Festa essa da qual participariam todos os fazendeiros da região com suas respectivas famílias. 
De acordo com as palavras do simplório Juvenal, lugar onde os peões, não poderiam colocar os pés, que dirá participar. 
No entanto, para espanto de todos, José, o fazendeiro para o qual trabalhavam, cuidadosamente preparou uma espécie de festa a parte para eles. Para que assim, todos pudessem comemorar o resultado do trabalho. 
Em razão disto, todos ficaram extremamente agradecidos ao fazendeiro, e passaram a considerá-lo ainda mais digno de suas estimas.
Ticiano, em virtude dos recentes problemas pelos quais passou, não queria, de forma alguma, participar da festa. Não estava inclinado a aceitar o convite de José.
No entanto, quando a negativa de Ticiano chegou aos ouvidos do fazendeiro, este tratou então, de imediatamente chamá-lo, por meio dos amigos do rapaz, para participar da festa. 
Mesmo assim, Ticiano resistiu. Só foi aceitar o convite quando, o fazendeiro apareceu em sua casa e intimou-o pessoalmente a comparecer a festa, sob pena de aborrecê-lo tal recusa. 
Foi nessa oportunidade que o fazendeiro, ficou sabendo por meio dos amigos do rapaz, que ele estivera um pouco adoentado e que estava se recuperando.
Ao saber disso José indagou o rapaz a respeito do assunto.
Ticiano, respondeu então, que não estivera doente, e que tampouco estava convalescendo. Com isso, perguntou ao patrão:
-- Como foi que o senhor tomou conhecimento disso?
-- Seus amigos me contaram. – respondeu sem rodeios.
-- Já devia saber.
-- Mas, não se aborreça com eles não. Eles estavam preocupados com você.
-- Mas eles não deviam aborrecer o senhor com isto. Não era nada grave. 
-- No entanto, se isso acontecer novamente ... Se vosmecê rapaz, estiver com algum problema me avise. Não haverá problema nenhum se precisar faltar algum dia. Vosmecê e seus amigos, não são meus escravos. E mesmo que o fossem, estando doente, trataria de dispensá-los do labor. Não sou um tirano. 
-- Eu sei. Só não queria incomodá-lo. Não era nada sério.
-- Não me incomoda. Vagabundagem sim.
Disse isso, e despedindo-se de Ticiano saiu. 
Ao sair, lembrou-se de quando ele havia chegado e de como ele era diferente dos outros peões. A primeira vista, não, pois estava sujo e maltrapilho. Mas depois limpo e adequadamente vestido, parecia outra pessoa.  
Por isso mesmo, ao conhecer um pouco de sua história, José se solidarizou com o rapaz. Quis ajudá-lo. 
Ticiano parecia tão triste e sozinho. Sem rumo, desesperançado. 
Pouco a pouco, José foi descobrindo que ele era um rapaz esforçado, dedicado, inteligente. Muitas vezes, chegou a se perguntar se aquele jovem, era realmente o que parecia. 
Isso por que, até mesmo sua aparência destoava dos outros jovens, filhos de camponeses. Ticiano possuía feições suaves, seu porte era altivo, seu modo de falar era mais polido.
Catarina, sua esposa, já comentara o assunto. Vestido como Tiago, facilmente o teriam como filho de fazendeiro.
Pensando nisso, José arquitetou um plano. Queria vestir uma antiga roupa sua em Ticiano, para ver como ficava. 

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

TEMPOS DE OUTRORA - CAPÍTULO 4

Ao se recolher, Ticiano, posto que estava transido de sono, imediatamente adormeceu. 
Agora, finalmente poderia se desligar um pouco daquela realidade. 
Poderia enfim sonhar. 
Muito embora acreditasse que não havia sonhos. Sua vida era uma dura demonstração desta constatação.
Não obstante, sua firmeza com relação a isso, ultimamente, vinha-lhe em sonhos, a imagem de uma família unida e feliz, brincando num imenso jardim. Ao final do jardim havia um campo totalmente sem vegetação. Nele só havia terra e ao longe algumas árvores. Neste cenário, pai, mãe e dois filhos brincavam de pegar um ao outro, e de jogar bola entre si. No sonho a família rolava na lama, e algumas vezes, fazia um pequenique.
Não obstante parecer um sonho alegre, na primeira vez que o sonhou, Ticiano acordou sobressaltado. Aquela alegria era para ele algo distante e inatingível. Soava com uma lembrança extremamente dolorosa. Algo que preferia esquecer. 
Diante do sonho inesperado, assustado que estava, Ticiano tratou de fixar seus olhos em algum ponto do quarto. E assim ficou por alguns minutos. 
Durante esse tempo, pensou em muitas coisas. Mas, em razão do que sonhara, seus pensamentos estavam desordenados. Vinha-lhe a mente muitas idéias confusas. 
Somente depois de olhar fixamente para o baú que tinha em frente a cama, e se acalmar, é que a estranha sensação que tomara conta de seu corpo passou.
Depois de algum tempo, ao se dar conta de já era tarde, voltou a dormir. No dia seguinte precisava estar bem para poder trabalhar. Precisava do serviço. E assim, voltou a dormir. 
Passadas algumas horas, levantou-se e imediatamente, começou a se preparar para mais um dia de trabalho. Com isso, como de costume, trocou a roupa, lavou o rosto, e foi trabalhar. 
Durante o dia, trabalhou normalmente, mas seus amigos perceberam que o rapaz estava com um ar cansado. Ao ver-se alvo da curiosidade dos companheiros de trabalho, o rapaz disse logo, que não dormira bem a noite, e que por isso parecia cansado. 
Não havia nada demais. Muito menos com o que se preocupar, dada as explicações apresentadas.
Não obstante o breve relato de Ticiano, Caio e Juvenal ainda especulavam o que teria se sucedido para que Tício tivesse dormido tão mal ou tão pouco. Intrigados que estavam com aquela história, os dois chegaram até a fazer um pouco de troça com o amigo, no que ele ignorou.
Nisso, o dia foi passando. Sobreveio a noite, e todos foram se recolher. Ticiano dirigiu-se para sua casinha e logo tratou de se preparar para dormir.
E assim fez. Ao colocar o pijama, deitou-se na cama e dormiu. Dormiu, dormiu, e continuaria dormindo não fosse novamente o sonho. Exatamente igual a noite anterior.
Agora, estranhamente, já se passando dois anos em que ali estava, passara a sonhar repetidas vezes, o mesmo sonho. Não entendia o por que disto. 
Há muito tempo atrás, sonhou seguidas vezes aquele mesmo sonho. Só que com o passar dos anos, aquela terrível cena, apagou-se de sua memória. Já estava desacostumado daquelas imagens. 
Para ele, a aludida cena fazia parte de um passado distante do qual não queria guardar lembranças. Não sentia saudade daquele tempo, em que noite após noite, sonhava com a referida família, quase sempre na mesma situação. Não queria novamente, passar por isso.
No entanto, o sonho voltou a ser freqüente, infelizmente para ele. 
Mas ao contrário de antes, dada a repetição dos seus sonhos, passou a se acostumar com eles, de certa maneira, muito embora a imagem da família feliz, ainda o perturbasse. 
A despeito, do sonho, contudo, passou também, a sentir vontade de sair daquele lugar. Queria ir embora dali. Não se sentia mais animado em permanecer naquela fazenda.  
E nisso, os dias iam se passando. Ticiano, continuava a sonhar o aludido sonho. 
Não obstante isto, uma vez, além da cena das brincadeiras no descampado, houve um momento em que surgiu um estranho que quis conversar com a jovem mãe. Tratava-se de um homem alto, bem vestido e de maneiras elegantes que queria conhecê-la. O jovem senhor, insistiu muito para vê-la apesar de sua resistência. Parecia aflito. 
Entretanto, apesar da aflição do homem, a jovem mulher parecia determinada a não atendê-lo. Pediu ao marido para que dissesse que não poderia lhe falar. Assim, o esposo tentou o quanto pôde conversar com o aristocrata, já que pelos modos parecia sê-lo. 
Mas, apesar do pedido do marido para que este não incomodasse sua esposa, e da insistência do consorte para que lhe fosse adiantado o assunto, o estranho homem reiterava constantemente que o assunto era particular, pessoal e urgente. Que só ela interessava.  
Inobstante, a alteração da cena, as personagens dos sonhos anteriores permaneciam as mesmas. Somente o enredo é que fora modificado. 
Ademais, quando acordou, Ticiano, tratou de se levantar. 
Ao se preparar para o trabalho, o rapaz tentou se lembrar do que sonhara mas não conseguiu. Parecia, ter perdido uma parte do sonho. 
Nisso ao lavar o rosto, Ticiano tentou mais uma vez reavivar a lembrança, mas não conseguiu. Só conseguia se lembrar da resistência da mulher em atender o estranho homem.
O rapaz queria tentar se lembrar do restante do sonho, mas não conseguia. Ao constatar que o esforço era inútil, se precipitou contra a porta e saiu.
Quanto se dirigiu a cocheira para tratar dos cavalos, retirou um dos animais e deu-lhe um banho. Depois trocou o feno e levou o animal de volta para a cocheira. 
O rapaz, já estava saindo com outro cavalo, quando Mário o avistou. Ia cumprimentá-lo. Mas este, ao perceber a expressão abatida do amigo, aconselhou-o a ir até a sede e pedir para que o dispensassem do labor, pelo menos pelo dia.
Só que, teimoso que era, Ticiano não deu a devida atenção aos conselhos de Mário. Disse-lhe que estava bem, e que aquilo era uma leve indisposição.
Mas Mário insistiu com Ticiano afirmando que ele já vinha apresentando este abatimento há algum tempo. Preocupado Mário foi dizendo que primeiro, foi a expressão de cansaço no rosto, agora o abatimento. 
Ao ouvir isso Ticiano rebateu alegando ser talvez uma gripe. Todavia não convenceu o camponês. 
Para Mário, a alegada indisposição era algo mais sério que ele não queria contar.
Por esta razão, durante toda a jornada, Mário tentou saber do amigo o que se passava. Todavia, não obteve respostas. 
Não bastasse isso, por causa da insistência do amigo, Ticiano se fechou mais do que de costume. 
Acabrunhado, durante o horário de almoço comeu pouco, o que preocupou deveras os amigos, e ficou encolhido em um canto do refeitório improvisado. 
O rapaz ficou pensando no que estava acontecendo nas últimas semanas. Ensimesmado não conseguia parar de se lembrar do sonho que não queria mais sonhar. Não se sentia confortável por ter a lembrança daquela família em seus pensamentos. Sentia-se mal por sonhar com isso. Sentia-se perdido, sem ter para onde recorrer. 
E assim, novamente transcorreu o dia. Todos se recolheram e cuidaram de descansar, pois precisavam trabalhar no dia seguinte.

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

TEMPOS DE OUTRORA - CAPÍTULO 3

Tício, era como o rapaz era conhecido por alguns colegas de labuta, os quais sempre foram camaradas com ele. Os mesmos gostavam de sua companhia, pois ele trabalhava bem, embora, o achassem um pouco triste e solitário. Coisas de amigo. 
Mário, Caio, Sérgio e Juvenal eram as pessoas mais chegadas a ele, desde que chegou àquelas paragens, há quase dois anos. No começo o achavam um pouco taciturno e sombrio. Não parecia estar interessado em amizades. 
Os quatro ao conhecerem-no se espantaram ao vê-lo sozinho, sem família. Até mesmo, porque, quando Ticiano chegou àquelas cercanias, estava sujo e maltrapilho. Parecia fugir de alguma coisa. Entretanto, não parecia assustado.
O fazendeiro, dono da propriedade, José, estranhou um bocado a ausência de seus pais, dada a tenra idade que o mancebo parecia ter. Assim, quando foi ter com o rapaz, procurou logo se inteirar de sua situação. 
Preocupado com a possibilidade de se tratar de um menor desaparecido, crivou-o de perguntas. Chegou até mesmo a pensar em levá-lo para um abrigo de menores, dada a insistência do rapaz em dizer que não tinha pais. No entanto desistiu de tal intento ao constatar que o jovem era um excelente trabalhador.
José, reiteradas vezes tentou saber sobre a família de Ticiano. Pensou até em investigar a vida pregressa do rapaz. Mas o fazendeiro abandonou essa idéia, mesmo o jovem tendo, em conversas com o então futuro empregador, mencionado ter vindo de São Paulo. 
Para José, havia algo de estranho em suas poucas explicações sobre sua origem. Não havia muitos detalhes em sua história, e quando alguém tentava descobrir mais sobre sua vida, Ticiano se fechava como se fora uma ostra. 
Contudo, o fazendeiro aceitou-o em sua fazenda. Enquanto fizesse um bom trabalho, não haveria motivos para dispensá-lo.
Até porque, acostumado com a discrição do jovem mancebo, José nunca tivera um motivo sequer para desconfiar dele. Mesmo as rusgas que havia entre Ticiano e Tereza, não davam razão para desconfiar do rapaz que sempre agira corretamente com o patrão.
Além do mais, sempre que José via sua filha Tereza junto do moço, tratava logo de admoestá-la e proibi-la de fazer troça com ele.
Ticiano era portanto, um rapaz correto. Por isso, pouco se podia falar contra ele. Exceto por seu temperamento fechado e sua insistência em não falar sobre sua vida, o seu comportamento era impecável.
Mas havia, como já foi dito, esta estranha aura de mistério que circundava sua vida. Sempre sério, taciturno, alguns camponeses o achavam presunçoso, outros, ao contrário. Ao se aperceberem de sua habilidade para a leitura e para os estudos, concluíram tratar-se de alguém com um certo refinamento e portanto membro de uma rica família. 
Estes últimos comentários caíram nos ouvidos de José, que novamente, depois de meses em que Ticiano trabalhava para ele, pensou em investigá-lo. O fazendeiro cogitou até, ir a São Paulo, para descobrir seu paradeiro. 
Isso por que José, sempre achara muito estranha a história que ele havia contado. 
Para ele a história de que os pais de Ticiano morreram quando ele era muito pequeno, e que havia sido criado por uma tia, era pouco provável. Contudo ao ouvir que o rapaz era maltratado constantemente, e por que isso resolveu fugir, José então, começou a acreditar na história. 
Foi por esta razão também, que Ticiano comentou que antes de chegar lá, se escondeu em vários lugares. Até que chegou naquela região, e logo ficou sabendo que havia um fazendeiro que precisava de empregados. Necessitado de um pouso, imediatamente se candidatou para o labor. Assim, depois de muito caminhar, ali chegou e por lá ficou. 
Com isso, no começo, alguns dos camponeses pensaram se tratar de um andarilho, mas como Ticiano permanecera na fazenda, descartaram a idéia. Um andarilho não ficaria tanto tempo num mesmo lugar.  Mário, um dos colegas de Tício, cismou que o rapaz trazia consigo uma dor muito grande, daí aquele jeito gélido e duro de tratar as pessoas. Ele achava que Ticiano se comportava daquela maneira para se defender. Por isso, várias vezes, tentou descobrir em vão o que fizera ele ser tão indiferente. Curioso comentava com os amigos:
-- Não adianta, Ticiano é duro como uma rocha. Não comenta sobre seu passado.  
-- O Tício, não fala de nada. Vosmecê quer dizer. – retrucou Juvenal.
-- Não adianta, Mário. Ele não quer contar. Não podemos obrigá-lo. – disse Caio. 
-- Deve ter acontecido algo muito sério em sua vida, para que não queira falar. – insistiu Mário.
Ás vezes, Mário, Caio, Sérgio e Juvenal, se reuniam numa venda que havia próxima a fazenda onde trabalhavam e ficavam a noite inteira bebendo e conversando. Falavam sobre a vida de trabalho duro que tinham, dos outros camponeses iguais a eles, sobre a vida do patrão, etc. Também, perguntavam ao dono do estabelecimento sobre as novidades, e nessa conversa se divertiam por horas e horas. 
Naquelas paragens, essa era uma das poucas distrações que os campesinos tinham. As idas à cidade eram escassas, só se dirigindo para lá quando havia absoluta necessidade. Não precisavam comprar seus alimentos porque, com seu labor garantiam a comida. 
Isso já  era uma grande conquista, dado que, a grande maioria dos trabalhadores que havia eram escravos, que nada recebiam por seu trabalho. Por essa razão, eram uma exceção. Possuíam liberdade. Poderiam de lá sair quando quisessem. Ao contrário dos escravos.
Entretanto, para que sairiam de lá? Na Fazenda Passárgada tinham tudo que precisavam. Toda a família deles ali trabalhava e era dali que retiravam seu sustento. Ademais, já estavam por ali há muito tempo. 
Lugar pacato, sossegado, tranqüilo, repleto de fazendas cafeeiras. De longe, nas precárias estradas de terra que existiam, se podia ver a imensidão da verdura das lavouras de café. Tudo por ali era calmo. 
Quando surgia um estranho, alguém de outras paragens, era um acontecimento. 
Isso por que, esta era uma forma de conhecerem outros lugares, visto que a maioria dos camponeses que ali viviam, vieram de regiões próximas, ou até mesmo, já nasceram lá. O lugar mais distante que conheciam era a cidade próxima. 
Então, o aparecimento de alguém novo por lá, era uma forma de se ter novidades e assunto para conversar.  
Por isso, quando Ticiano surgiu por lá, todos queriam conhecer sua origem. 
Contudo como o rapaz se revelou uma pessoa extremamente calada, uma aura de mistério permanecia ao redor. 
Em razão disso, mesmo após algum tempo, Ticiano ainda era motivo de assunto para muitos dos camponeses do lugar.

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

TEMPOS DE OUTRORA - CAPÍTULO 2

Apesar de sua pouca idade, Ticiano não era a dado a grandes confabulações, ficando boa parte do tempo calado. Por isso possuí poucos muitos amigos.
E apesar de seu interesse pelos estudos, não era muito suave em suas maneiras. Era um pouco rude com as pessoas. Por muitos era tido como um sujeitinho arrogante e até presunçoso.
Os próprios filhos do fazendeiro, o tratavam com pouco caso, e reiteradas vezes, tentaram intimidá-lo e humilhá-lo.
No que, apesar de sua origem simples, não se deixava intimidar. Se tentam ofendê-lo respondia firmemente que, respeito é uma troca, e que quem não o respeitava, não devia exigir dele respeito.
A despeito de suas maneiras sisudas, quando necessitava argumentar com os filhos do fazendeiro sobre algo que o incomodava, não se fazia de rogado.
Uma vez disse que:
-- A finalidade do ser humano é a busca de sua realização, e a partir do momento em que se tenta escravizar um homem, ou reduzi-lo a condição análoga de escravo, vosmecês estão praticando, não só contra esse homem, mas também, contra toda a humanidade, um ato de violência. O fim de qualquer ser humano, não é a escravidão, nem a exploração deste por outro homem. Não é reduzindo um homem a mera condição de objeto, que conseguirão retirar dele sua consciência, suas convicções. Ademais, até onde sei, a própria Igreja Católica, através de seu maior símbolo, recrimina isso. Não é o próprio Jesus Cristo, que diz, ‘Amai-vos uns aos outros?’ Se ele realmente disse isso, ele já estava pregando a igualdade em sua época.
Depois que terminou de dizer estas palavras, calou-se e saiu.
Entretanto, diante de tal argumentação, todos que por ali estavam, ficaram impressionados. Como alguém aparentemente tão pobre e simplório poderia ter uma visão tão crítica e perigosa sobre a condição dos escravos?
Ao chegar aos ouvidos de José a tal conversa, o fazendeiro tratou logo de chamá-lo. Queria ter com ele.
Ao ser chamado, o rapaz, imediatamente se dirigiu a sede da fazenda.
Ticiano, adentrando a sede da fazenda, atravessou a sala principal para chegar até o escritório do fazendeiro, o qual ao vê-lo foi imediatamente inquirindo-o:
-- O que vosmecê, tem contra a escravidão?
Imediatamente, o rapaz, notando o sinal que o fazendeiro fazia, tratou de fechar a porta. Em seguida, respondeu:
-- Aparentemente nada. Somente o fato de que quem está submetido a este regime, está privado de sua liberdade.
-- Bobagem. Se eu os libertasse agora, eles não teriam para onde ir.
-- Eu sei. Mas isso não é culpa deles, nem do senhor. Tenho perfeita consciência de que este sistema é tão antigo quanto a própria humanidade. O que não o impede de estar errado.
-- E que é que o senhor quer que eu faça?
-- Nada. O senhor, apesar disso, trata bem todos eles pelo que vejo, e só não os liberta por que não teria como.
-- Vosmecê, acha realmente isso, Ticiano?
-- Sim eu acho. Se o senhor realmente libertasse seus escravos, teria que enfrentar a ira e a reprovação de todos os seus amigos fazendeiros escravagistas. Todos eles temeriam os reflexos de sua atitude.
-- Ticiano, vosmecê me surpreende dizendo isto. Realmente, eu não poderia fazê-lo sem o apoio dos outros fazendeiros, e até mesmo do governo, pois como eu faria para contratar novos trabalhadores, para colocá-los em seu lugar?
-- Realmente, um problema de difícil solução. Diante de tal fato, eu não tenho mais argumentos.
-- Está bem Ticiano. Pode se retirar.
-- Com licença.
Dito isso, retirou-se e ao sair, encostou a porta.
Essa fora apenas uma das diversas conversas que o rapaz teve com seu patrão.
Deveras, diversas vezes Ticiano foi interpelado pelos filhos do fazendeiro que tentavam atingi-lo de alguma forma.
Uma vez, Tiago usou o argumento de que os homens devem amar uns aos outros, para tentar desarmá-lo.
No que Ticiano retrucou:
-- Talvez isso tudo seja uma grande quimera. Não existe uma forma de escravizar as pessoas para que possam ser controladas. No entanto, foi ensinado através da religião, aos humilhados, que se conformem com a escravidão que lhes é imposta. Para que assim, não reajam. Porque quando morrerem terão o reino dos céus.
Ao estar diante de uma afirmação tão inesperada e perturbadora, dada sociedade e a época em que vivia, Tiago encontrou-se sem argumentos para se defender das palavras de Ticiano. Não esperava por aquilo. Afinal, Ticiano era sempre tão cristão em suas colocações!
Por fim, para não se sentir em grande desvantagem, Tiago tratou de adverti-lo de não dizer o que acabara de dizer para qualquer um, pois se o fizesse poderia ter problemas.
Enfim, sempre que encontrava oportunidades para falar de coisas que lhe interessava, Ticiano acabava por mostrar um pouco do que ía dentro de si.
Exatamente nessas horas, quando enfim, proferia algumas palavras, é que podia notar, que Ticiano, não era um camponês ignorante e inculto. Nesses momentos, via-se nele um brilho de cultura, algo de educação.
Certa vez, Catarina ao ouvi-lo conversar com seu filho, intrigada, indagou:
-- Porque será que esse rapaz veio para cá? Pelo seu jeito de falar, nota-se que possuí alguma instrução.
-- Não sei. Às vezes, eu brinco com ele dizendo-lhe que ele é um peão ignorante, mas ...
-- Mas o que Tiago?
-- É que ele me lembra alguém, algo muito familiar.
-- Quem?
-- Tolice da minha parte. Como é que ele poderia ser algum conhecido meu?
-- Verdade. Mas que esse rapaz é muito mais que um peão, isso ele é.
Por esta razão e também por outras, a família Vieira sempre desconfiou um pouco da vinda do jovem Ticiano para lá.
Os próprios filhos do fazendeiro, viviam a provocá-lo e quando ele lhes respondia, ou, como acontecia na maioria da vezes, ignorava-os, o jovem mancebo demonstrava uma certa altivez. Sem dúvida alguma, o misterioso rapaz era muito mais do que o que mostrava ser.
Certa vez, Tereza, a filha do fazendeiro tentou provocar-lhe, dizendo palavras grosseiras. Ao que Ticiano, o jovem empregado de seu pai, distraído que estava com seus pensamentos, nem ouviu suas imprecações.
Ao perceber que não era notada, Tereza imediatamente puxou o prato em que estava a refeição do jovem e a atirou no chão. Por pouco o rapaz não bateu em Tereza. Para tanto, o rapaz precisou se conter.
Com isso, depois do incidente, Ticiano abandonou o refeitório improvisado próximo a sede da fazenda e se dirigiu a cozinha, para poder finalmente, terminar sua refeição.
Ao terminar a refeição, farta, embora muito simples, Ticiano retornou a sua labuta diária. Trocou a água dos animais, colocou mais feno na cocheira para os cavalos, e no final do dia, ao cair da tarde, se recolheu, para então descansar.
Muito embora estivesse cansado, cuidadosamente, retirou as botas, guardou-as debaixo da cama, e na penumbra do quarto, banhou-se e trocou a roupa suada do trabalho, por outra, a qual usava como uma espécie de pijama.
Depois, tratou de deitar-se e dormir.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

TEMPOS DE OUTRORA - CAPÍTULO 1

Lembranças, templo de velhas saudades, alegria, tristeza, mágoa e revolta. Recordações de uma época que não retornará. De um tempo que embora triste e querido, resiste nas memórias de um passado que não volta mais. 
Essa história começa nos idos de 1852, nas cercanias da hoje conhecida, cidade de Petrópolis.
Eram tempos felizes.
Nessa época viveu nestas paragens, uma ilustre família da Capital. 
Família essa que hoje, poucos sabem a respeito. 
Os poucos que dizem ter conhecido a família, não comentam o assunto. Não gostam de falar sobre isso. Preferem esquecer. Para a sociedade fluminense, importa mais saber sobre as novidades na Corte do Império, do que comentar sobre os acontecimentos passados.
É bom sonhar com os bailes organizados no Palácio Imperial, com a nobreza e suas delicadas maneiras nos salões. Os saraus, as festas, as confraternizações. O luxo e o requinte de uma vida que poucos podem usufruir. 
Enquanto alguns privilegiados convivem com a abundância, protegidos em suas pequenas fortalezas, livres de toda miséria e pobreza; outros – aliás, a grande maioria da população, não só daquela, mas de outras cidades e vilarejos –, convivem com a mais absoluta pobreza.
É nesse cenário que um jovem rapaz, agora vive.
Distante dali, da efervescente Corte Imperial, na região de Vassouras, mais tarde elevada a categoria de cidade, vive um rapaz pobre, que trabalha para um senhor, fazendeiro ilustre do lugar, e conhecido criador de animais. Diferente de todos os demais latifundiários das cercanias que cultivam café, José, cuida da criação de cavalos. 
Para este senhor, o jovem realiza serviços de conservação dos estábulos, trata os cavalos, e os treina. Possuí uma rotina dura de trabalho. Para realizar suas tarefas, precisa acordar muito cedo. 
Este senhor, patrão de Ticiano, possuí dois filhos, uma moça de quinze anos e um rapaz de dezessete. Ambos possuem uma vida de príncipes. O rapaz, como todos os filhos de fazendeiros ricos, se prepara para viver alguns anos na Europa estudando. Já a moça é educada por ali mesmo, na fazenda. Muito embora já tenha estudado em colégio interno, para que com isso pudesse ter alguma instrução e refinamento, ambos exigidos na vida social, a moça agora, deveria ficar na fazenda.
Com isso de vez em quando José e a família iam para a Corte. 
Assim, enquanto o ilustre fazendeiro aproveitava a viagem para passear com a família, tratava também, de realizar a venda de alguns de seus belos animais. 
Quando surgia alguma oportunidade também aproveitava para participar de eventos relacionados com seu trabalho, na cidade. Em razão disso, o fazendeiro colecionava alguns prêmios obtidos em leilões, em virtude da qualidade de seus animais.  
Essa  era a rotina de viagens da família Vieira. Lazer para a esposa e os dois filhos, e trabalho para José. 
E assim, aproveitando então a estada na Capital da Província, Tereza – a filha –, e Tiago – o rapaz –, bem como a mãe Catarina, tratavam logo de visitar os mais belos cenários da cidade. Faziam compras, passeavam pela Rua do Ouvidor, caminhavam pelo Jardim Botânico. Enfim, toda vez que rumavam para lá, revisitavam todos os lugares que já estavam acostumados a admirar em postais enviados por amigos. 
Com isso, enquanto os filhos do patrão estavam sendo educados para a vida em sociedade, o jovem, que possuí quase a mesma idade deles, trabalha de sol a sol, numa dura rotina diária. 
Como dia de descanso apenas o domingo, que usa para suas leituras, e estudos de história e literatura. Ás vezes, aproveita o dia, para, com a carona de um dos empregados da fazenda, ir até a cidade para gastar um pouco de suas míseras e parcas economias com mais livros e tecidos para suas roupas. Por seu trabalho na fazenda, não tinha que gastar seu dinheiro com alimentação. 
A morada, é um casebre, próximo a cocheira. Simples. Só possuí uma cama, um baú para guardar alguns pertences adquiridos em virtude dos anos lá trabalhados, alguns livros e roupas de cama, bem como um penico, uma jarra de barro, uma bacia de uma louça barata para molhar o rosto, e uma tina, para que pudesse se banhar. 
Daí se concluí portanto, que Ticiano não possuí muitos pertences. De seu realmente, não possuí quase nada. Quando chegara nestas paragens, as únicas coisas que trazia consigo, eram uma foto amassada de uma família, e uma trouxa de roupas.   
Destituído de qualquer vaidade, não possuía roupas adornadas, somente o necessário para estar dignamente trajado. Aliás, alguns de seus trajes, diga-se de passagem, estavam bastantes surrados.         

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

SONHO DE VALSA - CAPÍTULO 14

Paulo ao ver a filha dormindo, contudo, não ficou nem um pouco convencido de que as coisas estavam tranqüilas. Intrigado com o barulho que ouvira, pensou em acordar Laura para saber o que estava acontecendo. 
Rose, vendo que a filha dormia, pediu ao marido que não a acordasse. No dia seguinte, os dois, conversando calmamente com as garotas, descobririam o que havia se passado.
Paulo concordou.
E assim no dia seguinte, durante o café da manhã, o casal, preocupado perguntou a Marilu se ela havia brigado com a irmã.
A moça, pensando um pouco, respondeu da seguinte forma:
-- Não eu que eu saiba. Nós brigamos Laura?
Laura, ao ouvir a resposta da moça, pensando um pouco, falou:
-- Não. 
Mas Rose e Paulo, não ficaram nem um pouco convencidos com as respostas dadas. Por isso mesmo, ao comentarem sobre os berros de Laura, insistiram em perguntar por que então ela estava berrando.
A moça, pensando um pouco no que iria dizer, e tentando ganhar tempo, perguntou:
-- Eu berrei?
-- Sim. – respondeu Paulo. – Berrou sim.
-- Bom... se eu berrei, provavelmente devo tê-lo feito dormindo. – respondeu Laura.
-- Sei. – respondeu Paulo, nem um pouco convencido com a resposta dada. 
Contudo, como não havia mais nada a ser feito, a conversa se encerrou.
Nisso, com o passar dos dias, Marilu se encontrou novamente com Maurício. O rapaz, levando-a para passear, foi até o Parque do Ibirapuera. Os dois, enquanto caminhavam em meio a natureza, conversaram. 
Mais uma vez o tema inicial da conversa foi a viagem de Marilu pela Europa. Contudo, esse não foi o único tema das conversas que tiveram. 
Isso por que Maurício, curioso para saber como estava sendo seu retorno para o Brasil, encontrou uma boa maneira de saber um pouco mais sobre ela. 
Marilu contou então que estava se adaptando aos poucos. Contudo, viver com a família para ela, era algo inigualável.
Maurício ao ouvir as palavras da moça, sorriu.
Com isso, aproveitando o calor da tarde, os dois aproveitaram para tomar um sorvete.
Mais tarde, depois de conversarem um pouco mais sobre suas vidas, o moço perguntou a Maria Lúcia se ela tinha namorado.
Desconcertada com a pergunta, Marilu perguntou ao rapaz, o por quê de tanta curiosidade. 
Maurício, respondeu que era uma simples curiosidade.
Marilu, sem entender nada, olhava para ele.
O rapaz então, perguntou:
-- E o que tem demais nessa pergunta? Eu só quero saber. Para que você saiba, eu não tenho namorada.
-- Não?
-- Não. E você?
-- Não. – respondeu ela.
-- Que ótimo! – respondeu Maurício.
-- Ótimo por que?
-- Por que? Por que só assim eu vou poder te pedir em namoro. 
-- Pedir em namoro? – perguntou a moça surpresa.
-- Sim. Você quer me namorar?
Marilu, sem jeito respondeu que não sabia o que dizer.
Maurício, insatisfeito, perguntou:
-- Como não sabe?
-- Não sei. – respondeu a moça.
Maurício, nem um pouco satisfeito com a resposta, insistiu para que a moça lhe respondesse.
Marilu, ainda sem saber o que dizer, pediu ao rapaz que lhe concedesse alguns dias para pensar.
Sem ter outra alternativa, Maurício acabou concordando.
Nisso, ao final de alguns dias, Marilu, depois de muito pensar no assunto, acabou concordando. Afinal de contas, se Maurício era uma boa pessoa, não havia problema nenhum em que os dois ficassem juntos. 
Assim, quando os dois novamente se encontraram, a moça, enchendo-se de coragem, respondeu que aceitava namorá-lo.
Feliz, o rapaz, abraçou-a calorosamente. Animado, Maurício começou a fazer planos para os dois. Dizendo que a moça tinha que conhecer seus pais, prometeu fazer com ela grandes passeios. Eufórico, chegou a dizer que também precisava conhecer os pais dela.
Marilu, ao ouvir as palavras do rapaz sorriu.
Com isso, os dois começaram a sair mais, juntos. Animados, iam juntos ao cinema, passeavam por parques. 
Maurício, dizendo a moça que precisavam voltar a Praça da República, comentou que foi lá que os dois se conheceram. 
Marilu, ao ouvir o rapaz, assentiu com a cabeça.
Sim, precisavam voltar lá. E voltaram. Quando os dois chegaram até a praça, Maurício, pedindo para que a moça sentasse no banco que ela havia se sentado tempos atrás, começou a descrever a roupa que ela estava usando no dia.
Marilu, impressionada com a precisão de detalhes, perguntou a ele se o mesmo se lembrava da roupa que ela usara na primeira vez que os dois foram ao cinema.
Sorrindo Maurício respondeu que ela usava um tailler muito bonito.
A moça, impressionada, comentou que ele estava certo.
Maurício ao vê-la tão feliz, perguntou se ele não merecia um prêmio por ser tão atencioso.
Curiosa, Marilu perguntou o prêmio que ele gostaria de ganhar.
O rapaz respondeu simplesmente:
-- Um beijo!
Marilu, surpresa com o pedido, comentou:
-- Que coisa! Um beijo!
Maurício, percebendo o constrangimento, disse que ela não precisava fazê-lo ali, em público. Isso por que, a moral da época não permitia esse tipo de comportamento.
Por isso mesmo o rapaz, segurando a mão da moça, conduziu-a pelo passeio. Caminhando entre árvores, apreciaram a beleza da praça, ouviram o canto dos pássaros e conversaram sobre o pedido.
Mas para que o beijo acontecesse, seriam necessários muitos outros passeios.
E assim, um dia, depois de assistirem um belo filme, os dois, caminhando pelas ruas da cidade, ao chegarem em um local onde poucas pessoas circulavam, aproveitando a oportunidade, beijaram-se pela primeira vez.
O beijo singelo, revelou-se para os dois, a coisa mais fascinante do mundo. 
A moça, que nunca havia beijado ninguém, ficou deslumbrada. A simples lembrança do beijo a fazia sorrir.
Já Maurício, cada vez mais apaixonado, ao se lembrar do beijo, mais saudades sentia de Marilu. Receoso porém, sentia que já estava mais do que na hora de se apresentar a família da moça.
Marilu, também pensava assim.
Por isso, mesmo quando os dois se encontraram novamente, a moça fez questão de deixar claro que queria apresentá-lo a sua família. Contudo, não queria pressioná-lo. Em razão disso a moça deu liberdade para que ele escolhesse a data do encontro.
E Maurício, escolheu.
Nisso, Laura, depois de ficar algum tempo afastada de Maria Lúcia, voltou a ameaçá-la com chantagem. Dizendo que a mesma não havia cumprido com sua promessa, ameaçou contar aos pais, sobre seus encontros com Maurício.
Maria Lúcia, aborrecida com a irmã, respondeu que ela podia fazer o que bem entendesse com aquela informação, já que nos próximos dias Maurício iria se apresentar a família para oficializar o namoro.
Laura, surpresa com a novidade, perguntou a irmã:
-- Vocês estão namorando?
Marilu sorriu. 
Embora não tivesse respondido claramente a pergunta da irmã, o sorriso já dizia tudo. Os dois estavam juntos.
Laura, atônita com a novidade, titubeou por um instante, mas depois, pensando na situação, disse:
-- Pois bem. Muito inteligente de sua parte. Mas o que você não sabe é que eu vi vocês dois juntos em circunstâncias muito estranhas.
-- Ah Laura, por favor, onde você pensa que vai conseguir chegar com essa história?
-- Muito mais longe do que você imagina. Ou você pensa que eu vou engolir essa história? Você pensa que eu sou idiota? Eu vi vocês dois juntos. Muito antes dessa história de namoro. Pensa que eu não sei que você pediu para que ele não a trouxesse até em casa? 
Marilu, irritada com a petulância da irmã, respondeu que ela não tinha nada com isso. 
Laura então, percebendo que havia irritado a irmã, não contente com isso, resolveu dizer ainda:
-- E não é só isso. Saiba você, que eu posso destruir esse namoro antes mesmo de começar... Eu posso dizer que ele não é tão boa pessoa como tudo mundo pensa... Já pensou Marilu, se todo mundo achar que ele é um transviado?
Marilu, ao ouvir as palavras de Laura, respondeu dizendo que aquilo era uma mentira. Uma afirmação falaciosa.
Laura retrucou dizendo que, independente de que o que dissesse fosse mentira, ainda assim, seus pais ficariam preocupados. O que certamente tornaria Maurício suspeito.
Marilu ao perceber que Laura queria prejudicá-la desafiou-a:
-- Você não teria coragem de fazer isso.
-- A não? Pois então me aguarde. – respondeu Laura decidida.
Marilu apreensiva, por um instante ficou sem ação. 
Laura percebendo isso, provocou a irmã:
-- E então? Onde está toda aquela determinação?
Marilu, titubeante perguntou:
-- E o que você pensa ganhar com isso? Ou será que é pelo simples prazer de me prejudicar?
Laura ao ouvir as perguntas da irmã, lançou-lhe um sorriso maldoso. Não bastasse isso, ainda respondeu:
-- Não sei dizer ao certo. Talvez seja realmente uma vingancinha sim, por que não? Mas também é uma resposta ao pouco caso que fez dos meus avisos... Mas quer saber de uma coisa? Bem feito pra você. Agora você vai saber que eu não estava brincando... É... vai ser divertido.
Marilu irritada, respondeu:
-- Você não vai fazer isso.
-- Vou sim. – retrucou Laura.
Marilu, por sua vez, ao ouvir a resposta da irmã, disse:
-- Ah! Mas não vai mesmo. 
Furiosa, Marilu segurou Laura pela blusa e puxando sua roupa, respondia a todo momento:
-- Não vai não.
Laura, por sua vez, vendo que a irmã não estava de brincadeira, pediu reiteradas vezes para que a mesma a soltasse.
Marilu porém, cansada da chantagem da irmã, decidiu que resolveria a questão imediatamente. Assim, ao ver que as duas estavam sozinhas em casa, Marilu resolveu acertar as contas com a moça. 
Furibunda, Marilu esbofeteou a irmã. 
Decepcionada com Laura, Marilu, que sempre fora calma e compreensiva com esta, diante dos últimos acontecimentos, perdeu toda sua paciência. Por isso mesmo, decidida a resolver a questão, Marilu não pensou duas vezes. Aplicou um corretivo na irmã.
Enquanto batia em Laura, Marilu ía dizendo que cada um daqueles tapas era a paga que ela tinha por tudo de errado que fizera na vida.
Laura, cansada de apanhar, pedia a irmã a todo momento para que ela parasse de agredi-la.
Mas Marilu não parava. 
E assim Marilu só parou de bater em Laura, quando, cansada, mandou que ela saísse de sua frente. 
Laura, levantou-se e chorando, tencionou dizer algo a Marilu.
A moça, percebendo isso, não a deixou falar. Avisando-a disse que não queria que a briga fosse contada aos pais. Dizendo que não ficaria nem um pouco satisfeita se o seu nome fosse envolvido na história, Marilu recomendou-lhe que dissesse que fora agredida na rua. Além disso, se ela contasse algo que desabonasse Maurício, Marilu ameaçou aplicar-lhe uma surra ainda maior. Avisando que ela apanharia tanto que não conseguiria se mexer, Marilu deixou bem claro que não aceitaria nenhum tipo de chantagem. 
Depois de ouvir todas as advertências da irmã, só restou a Laura ir para seu quarto. Humilhada, não tinha nem como retrucar Marilu.
E assim, Laura se recolheu em seu quarto. Envergonhada com a situação, a moça não desceu para jantar e fingindo dormir, não falou com a mãe.
Rose estranhou deveras o comportamento da filha, mas Paulo, dizendo que Laura sempre fora assim, acabou convencendo a esposa a deixá-la sozinha.
Nisso Marilu tomando coragem decidiu contar a mãe que estava namorando.
Rose surpresa quis logo saber com quem.
Marilu respondeu.
Rose apreensiva, disse logo que queria conhecer o rapaz.
Marilu, dizendo que pretendia levar o rapaz para que a família o conhecesse, pediu a mãe que a ajudasse a conversar com Paulo sobre o assunto.
Foi então que Rose se deu conta de que maior obstáculo a essa aproximação era seu marido. Todavia a mulher, percebendo a alegria nos olhos da filha, prometeu que faria de tudo para convencer o cabeça-dura do Paulo de que deveria conhecer o rapaz.
Contudo, como se pode imaginar, não foi nada fácil para Rose desempenhar esta tarefa a contento. Todavia, paciente, a mulher procurou explicar ao marido, que se o rapaz fazia questão de ser apresentado a família, era por que estava muito bem intencionado em relação a Marilu. Além disso, perguntando ao marido se ele não achava que sua filha merecia ser feliz, Rose começou a convencer o marido. 
Paulo concordou. Sim Marilu merecia ser muito feliz. 
Foi assim que aos poucos, Rose conseguiu convencer o marido a aceitar o namoro da filha. Dizendo que Marilu não era uma desmiolada, comentou que a filha possuía inúmeros predicados. Predicados que encantariam não só um, mas vários rapazes.
Paulo ao ouvir isso, também concordou com a esposa. Sim Marilu era encantadora.
Assim, depois de algum tempo, o homem concordou em marcar um almoço para conversar com o rapaz.
Conforme combinado, o rapaz, visivelmente nervoso, apresentou-se a família. Dizendo que estava muito interessado em conhecer a família de Marilu, comentou simpático, que todos eram exatamente como a moça descrevera para ele.
Curiosa, Rose perguntou ao rapaz como Marilu os descrevera.
Maurício então, contou que a moça sempre se referia a eles com muito carinho.
Laura, que ouvia a tudo calada, parecia contrariada. Porém, como não queria atrair para si a ira da irmã, a moça preferiu quedar-se silente. Durante o jantar o não proferiu nenhuma palavra.
Já recuperada da briga que tivera com a irmã, a moça nem sequer dirigia a palavra a ela.
Com relação a alguns arranhões que apareceram em seu rosto, Laura disse que caiu andando de bicicleta.
Rose e Paulo, desconfiados da explicação, tentaram por diversas vezes descobrir o que estava acontecendo, mas a certa altura, cansados de ouvirem as evasivas de Laura, resolveram deixar o assunto de lado.
E assim, a briga entre ela e Marilu nunca foi descoberta pelos dois.
Com isso, Marilu, satisfeita ao ver que seus pais aprovaram o namoro dela com Maurício, passou a sistematicamente ignorar Laura. 
Por isso, toda vez que a moça lhe fazia uma provocação, Marilu fazia de conta que nada ouvira.
Certa vez Rose, quando viu a cena, repreendeu severamente Laura. 
Irritada, a moça subiu pela escada reclamando. Dizendo que eles sempre defendiam Maria Lúcia, comentou ressentida que sua presença na casa não significava nada.
Porém, as imprecações de Laura ficavam nisso. Nunca mais a moça ousou importunar Marilu. Mesmo assim, seu temperamento não mudou.
E apesar de Marilu estar namorando, Laura mantinha seu temperamento irascível. 
Mas Rose e Paulo, acostumados com o gênio da filha, já não se surpreendiam com suas atitudes intempestivas.
Enfim, tudo estava quase como sempre fora.
Mas uma nova mudança aconteceria na vida da família.
Muito embora a São Paulo da época fosse uma cidade pacata, ainda assim, alguns crimes, vez por outra aconteciam. Esses crimes dada a brutalidade e a raridade com que ocorriam, causavam perplexidade em toda a população. Incrédula, a população mal podia acreditar que algum ser humano pudesse praticar tantas maldades.
Não era a banalidade que hoje se percebe nas páginas de jornais.
Mas uma coisa não se pode negar. Apesar de tais crimes não serem comuns na época, a violência sempre esteve presente na história de todas as civilizações. Inegável.
Foi exatamente nesse contexto, que se deu o seqüestro de Marilu. 
A moça, depois de sair do cinema juntamente com Maurício, resolveu fazer um passeio por um dos parques da cidade. 
Lá, caminhando por entre árvores, mata nativa, flores e muita beleza, Marilu, afastando-se de Maurício, acabou sendo levada por dois estranhos.
 Distraída, a moça não percebeu quando dois homens se aproximaram, e utilizando-se do elemento surpresa, a seguraram. Marilu, ao sentir uma mão pousando sobre seu ombro, bem que tentou se desvencilhar dela. Em vão. Enquanto ela se debatia com um deles, o outro avançou sobre ela e colocando um lenço sobre seu rosto, conseguiu fazer com que a mesma desmaiasse.
Maurício, ao notar que Marilu não estava por perto, passou a procurá-la. Preocupado com seu sumiço, o rapaz esquadrinhou cada canto do parque à sua procura. 
Tudo em vão. Marilu, sumira como que por encanto.
Desesperado, ao perceber que a moça havia desaparecido, Maurício não sabia o que fazer. Nervoso, mesmo assim tentou pensar em que medida tomaria. No auge do desespero, o rapaz pensou em chamar a polícia. 
Assim o fez. Caminhando em direção a delegacia da região o rapaz se lembrou que precisava contar aos pais da moça que ela havia desaparecido. Contudo, como faria isso? Não tinha coragem. Temeroso de que o culpassem, achou melhor ir primeiro a delegacia para depois contar a Rose e Paulo, o que havia acontecido.
Nervoso, ao chegar a delegacia, o rapaz pediu ao escrivão, para falar com o delegado. Dizendo que sua namorada fora sequestrada,  comentou que tinha pressa em falar com o delegado.
O homem, ao saber da gravidade da situação, chamou imediatamente o delegado. 
Maurício então, ao ver-se diante do delegado, começou a relatar o que havia ocorrido. Dizendo que ele e sua namorada, passeavam tranqüilamente no parque quando tudo aconteceu, relatou que em dado momento, Marilu desapareceu. Conforme o tempo foi passando e ele foi percebendo que a moça não voltava, resolveu ir atrás dela. Procurando-a em todos os lugares, ele vasculhou cada recanto do parque. Sem êxito, no entanto.
O delegado no cumprimento de sua função, visando esclarecer a situação, fez inúmeras perguntas ao rapaz. 
Maurício, mesmo atordoado com que sucedera, não se furtou a responder nenhuma delas. E assim, ao término da lavratura da ocorrência, o rapaz, ansioso, perguntou ao delegado se eles iriam procurá-la.
O homem respondeu:
-- Mas é claro que sim. Este é o meu dever!
Maurício, depois de ouvir as palavras do delegado, ficou mais calmo.
Contudo o mais complicado, ainda precisava ser feito. O rapaz então, novamente, procurando encontrar coragem, resolveu se encontrar com a família da moça.
Ao chegar na casa da namorada, o rapaz, pedindo a um dos empregados para entrar, contou que precisava falar com os pais de Marilu. Depois que os dois começaram a namorar, Maurício ao tomar conhecimento da forma como todos a chamavam, passou a também chamá-la por seu apelido. 
O empregado então, ao ouvir o pedido do rapaz, abriu o portão e pedindo para que ele entrasse lhe deu passagem. 
Maurício foi até a entrada da casa. Lá, uma empregada o atendeu e recomendou que ele ficasse na sala. Oferecendo café e suco, perguntou se o mesmo queria beber alguma coisa.
Nervoso, Maurício recusou a oferta. Aflito, comentou com a empregada que precisava falar o quanto antes com os pais da namorada.
A empregada, percebendo o ar aflito do rapaz, falou que chamaria Rose imediatamente.
Maurício esperou. Ansioso, os minutos que antecederam a entrada da mãe da namorada na sala, pareceram-lhe uma verdadeira eternidade.
Rose ao entrar na sala, fez questão de cumprimentá-lo. Porém, ao ver o semblante do rapaz, a mulher foi logo lhe perguntando:
-- Mas o que foi que aconteceu?
Maurício, procurando escolher as palavras, respondeu titubeante, quase gaguejando que Marilu havia desaparecido.
Dona Rose, ao ouvir isso, ficou desesperada.
-- Desaparecido? Como desaparecido? Ela não estava com você?
-- Estava. – respondeu o rapaz nervoso. – Estava sim. Mas de repente, Marilu, querendo conhecer melhor o lugar, se distanciou de mim. Quando me dei conta disso, resolvi esperar um pouco para que ela voltasse, já que ela sabia onde eu estava. Contudo, ao perceber que ela não voltava, eu resolvi procurá-la pelo parque. Procurei-a em todos os lugares. Quando eu percebi que ela não estava lá, fui até a delegacia relatar o que havia acontecido.
-- E o que o delegado disse? – perguntou Rose aflita.
-- Ele respondeu que tomaria as providências necessárias.
-- E você tem certeza de que ela não está perdida, procurando-o? – perguntou a mulher recusando-se a acreditar no que estava acontecendo.
-- Tenho. Eu procurei ela em todos os lugares. Não havia como ela ter saído do parque sozinha.
-- E eu posso falar com este delegado? – perguntou ela, visivelmente nervosa.
-- Mas é claro que pode. Se a senhora quiser, eu a acompanho até lá.
Ao ouvir o gentil oferecimento do rapaz, Rose agradeceu. Mas temendo que Paulo ao saber do ocorrido, passasse a acusá-lo do acontecido, achou por bem, declinar do oferecimento.
Maurício, compreendendo o por quê da recusa, explicou-lhe onde ficava a delegacia, e pediu a ela que tentasse se manter calma, pois tudo acabaria bem.
Rose, agradeceu novamente a gentileza e prometendo ficar calma levou-o até o portão. Lá o rapaz se despediu e prometendo ligar mais tarde, disse que aguardaria notícias.
Rose então, pegou o carro e dirigindo até a delegacia, conversou com o delegado.
Ao tomar conhecimento de detalhes do ocorrido, comentou com o delegado que Maurício foi muito prestativo e esperto ao ir primeiramente a delegacia, para depois conversar com ela. Isso por que, quanto antes a polícia ficasse sabendo do ocorrido, mais depressa o caso poderia ser solucionado.
O delegado concordou. 
Rose então, pedindo licença ao delegado, comentou que precisava avisar o marido sobre o que estava acontecendo. 
Primeiramente, ligou para casa. Mas, ao ouvir da empregada que o marido não havia voltado, resolveu ligar para seu escritório. 
Quando Paulo ficou sabendo do ocorrido, o homem ficou possesso. Sabendo que a moça estava com Maurício, Paulo furibundo, comentou com a mulher que ele tinha responsabilidade no que estava acontecendo.
Rose, tentando acalmar o marido comentou que o rapaz havia tomado todas as providências para que Maria Lúcia fosse achada o quanto antes. Além disso, dizendo que estava na delegacia, pediu a ele que a encontrasse lá.
Paulo, irritado, desligou o telefone e pedindo para um de seus funcionários fechar o escritório, foi, o mais rápido que pôde, ao encontro da esposa.
Lá delegacia, o homem também conversou com o delegado e tomando conhecimento dos detalhes que envolveram o desaparecimento da filha, comentou que sua filha nunca teve esses rompantes. Dizendo que a mesma nunca lhe dera trabalho, comentou que provavelmente a levaram a força para fora do parque. 
O delegado então, dizendo que Rose, também elogiou o comportamento da filha, pediu a ele que se acalmasse um pouco. 
Paulo resolveu se sentar.
Quando um dos policiais retornou, o delegado foi logo pedindo informações. Porém, para sua decepção a moça não fora encontrada.
De posse de sua descrição física, o delegado, visando facilitar a busca, pediu aos pais de Marilu que providenciassem uma foto.
Rose então, diante do pedido do delegado, lembrando-se que sempre levava fotos das filhas consigo, escolheu uma de suas melhores fotos, e entregou-a ao delegado.
O homem ao segurar a foto nas mãos, comentou que assim as coisas ficariam mais fáceis.
E assim as buscas prosseguiram.
Rose e Paulo, determinados a encontrar a filha, elaboraram cartazes com a foto da moça. Angustiados com a falta de notícias, os mesmos pregaram em cada poste que encontraram, a foto da filha. Esperançosos acreditavam que assim conseguiriam encontrá-la.
Maurício preocupado, ligou algumas vezes para a família. Outras vezes, angustiado com o silêncio, foi até a delegacia. Porém tudo continuava com antes. A única coisa que havia mudado é que Paulo não estava mais bravo com ele.
Convencido pela esposa que o rapaz não tivera culpa do ocorrido, Paulo deixou isso de lado e passou a se concentrar na busca por Maria Lúcia.
E assim, após alguns dias, finalmente um homem, sem se identificar, ligando para a família, comentou que sabia onde Marilu estava.
Rose ao ouvir as palavras do estranho, foi logo perguntando onde ela estava.
O estranho respondeu:
-- Por enquanto eu não posso dizer. O que eu posso revelar é que ela está bem.
Rose não compreendeu. Aturdida a mulher perguntou:
-- Mas o que você quer?
O estranho respondeu então o quanto gostaria que ela pagasse em cruzeiros. 
Rose desesperada, só fazia perguntar:
-- Por que vocês estão fazendo isso? Me diz, por que você está fazendo isso?
O estranho respondeu então onde e quando ela devia deixar o dinheiro. Em seguida desligou o telefone. 
Desesperada Rose, continuou no telefone. 
Paulo ao ver a mulher segurando o aparelho, pediu para que ela desligasse. Dizendo que precisava deixar o telefone livre para entrar em contato com os possíveis responsáveis pelo sumiço de sua filha, pediu a mulher para desligar o telefone.
Rose, sem saber o que fazer, respondeu que um estranho havia ligado para ela. 
Paulo logo perguntou quem era.
A mulher então, voltando a si, desligou o telefone. Procurando explicar o que havia se passado, contou ao marido que um estranho ligara, e dissera a ela que se quisessem ver Marilu bem, deviam deixar dinheiro em algum lugar. 
Paulo ao ouvir isso, ficou furioso. Dizendo que isso era inadmissível, comentou que faria o que pediram, mas que avisaria a polícia sobre a ligação.
Rose, ao ouvir isso, pediu ao marido que não avisasse a polícia.
Paulo ao ouvir as palavras da esposa, comentou que entendida sua preocupação. Mas, dizendo que não podia omitir essa informação, prometeu a mulher que nada de mal aconteceria a filha em virtude disso.
Rose porém, continuava a insistir para que o marido não contasse nada sobre a ligação a polícia.
Paulo contudo, insistiu em dizer que precisava falar.
Determinado foi logo a delegacia. O delegado, ao saber da novidade, recomendou que Paulo fizesse o que o bandido mandou. Enquanto isso ele e seus policiais, preparando-se para o flagrante, cercariam a rua e pegariam o meliante.
Paulo, percebendo a gana do delegado em prender o bandido, pediu insistentemente para que este tivesse cuidado, já que era a vida de sua filha que estava em jogo. 
O delegado prometeu que não se precipitaria.
Para Paulo, ouvir estas palavras, foi extremamente reconfortante.
Cauteloso, o homem seguiu todas as recomendações do delegado. Rose também.
Como seria ela quem levaria o dinheiro, a mulher tomou todo o cuidado para que o bandido não percebesse que ela estava acompanhada. 
Acompanhada por Paulo, Rose desceu do carro e andando boa parte do caminho a pé, finalmente chegou no lugar combinado. Lá deixou a mala e partiu. 
Nisso a polícia que aguardava uma aproximação, esperou calmamente a ação do bandido. 
Quando um dos meliantes foi buscar a mala, imediatamente recebeu voz de prisão.
Na delegacia, ao ser interrogado pelo delegado, o bandido acabou revelando que o outro comparsa o esperava no esconderijo onde estava a moça. 
Pressionado pelo delegado, o homem acabou revelando onde ficava o tal esconderijo.
Assim, foi apenas uma questão de tempo para que o outro meliante fosse preso, e a família que esperava a moça próxima dali, a reencontrasse.
Maurício, que durante todo esse tempo foi informado de tudo o que acontecia, mal podia esperar para ver a moça novamente. 
Depois do encontro emocionado com os pais, Marilu, finalmente recuperada do susto, foi conversar com o rapaz.
Emocionado, Maurício ao vê-la  abraçou-a, e chorando confessou que temia esta cena nunca mais se repetisse.
Marilu ao ouvir isso sorriu.
Depois, contando em detalhes o horror por que passara, revelou que apesar de não ter sido maltratada, sentiu muito medo e achou que não iria conseguir mais voltar para casa. 
Isso por que os dois bandidos que a vigiavam deixaram bem claro que não tinham nada a perder. 
Desesperada, ela passou inúmeros dias amarrada. Sem saber onde estava, tentou fazer de tudo para não se prejudicar. Assim, sempre que os dois lhe dirigiam a palavra, ela lhes respondia. 
Além disso, por vários dias ela não soube o que era uma roupa limpa, um banho. Tanto o era que quando ela foi libertada, usava a mesma a roupa com que fora raptada. 
Maurício ao ouvir as palavras da moça, ficou chocado. Feliz porém por tê-la de volta comentou:
-- Que bom que você voltou!
Laura por sua vez, sem saber direito o que estava acontecendo, posto que fora poupada por seus pais, ao vê-la entrar em casa, com a mesma roupa de dias atrás, perguntou espantada:
-- Mas o que foi que aconteceu?
Rose, que não queria conversar, comentou que depois falaria com ela.
E assim foi. 
Ao levar Marilu até seu quarto, Rose pediu que a moça tirasse suas roupas. Roupas essas que ela levaria imediatamente para lavar. 
A moça então, do banheiro, entregou a roupas para a mãe. A seguir banhou-se e escolhendo uma roupa limpa, deitou-se e dormiu. Exausta dormiu por várias horas.
Enquanto isso Rose, zelosa que era, preparou uma bandeja cheia de comida e deixou numa cômoda. Assim quando a moça acordasse encontraria tudo ao seu alcance.
Depois conversando com Laura, Rose revelou que Marilu fora seqüestrada e que por isso não fora para a escola todos esses dias.
Laura, percebendo que havia se excedido, ficou um pouco sem jeito ao saber da notícia. Isso por que, ao saber que a irmã faltaria alguns dias na escola, ficou irada e perguntou aos pais por que só ela tinha esses privilégios. Não satisfeita com isso, ao entrar no quarto bateu a porta.
Porém, sem perder a pose, Laura, fazendo-se de ofendida, perguntou a mãe por que ela não havia contado tudo a ela.
Rose explicou então que não achou que ela tivesse maturidade suficiente para ter conhecimento do que estava se passando.
Laura, ao ouvir o comentário da mãe, ficou chateada. Dizendo que aquilo era muito sério, respondeu que ela não tinha o direito de lhe esconder o que estava acontecendo. 
Rose concordou. Dizendo que ela e Paulo erraram ao não lhe contar o que estava acontecendo, ressaltou que não sabiam qual seria sua reação e assim, acharam por bem omitirem-se. 
Laura retrucou. Dizendo que não era tão egoísta como pensavam, revelou em que dado momento percebeu que havia algo estranho. Até por que Maria Lúcia não costumava faltar. Notando que moça estava há muito tempo ausente, chegou a conclusão de que os dois estavam escondendo alguma coisa dela. Isso segundo suas próprias palavras, deixou-a profundamente magoada.
Porém, cansada de brigar, Laura perguntou como estava Maria Lúcia.
Rose respondeu que ela estava dormindo.
Laura pedindo permissão a mãe, perguntou se podia ir até o quarto da irmã.
A mulher dizendo que ela ainda dormia, pediu que ela falasse com Marilu quando a mesma saísse do quarto. Comentando que Maria Lúcia estava abalada, recomendou a Laura que esperasse um pouco para falar com ela.
Laura concordou.
Nisso, com o passar dos dias, ao ver Marilu passeando pela casa, Laura, percebendo-a bem disposta, comentou que precisava conversar com ela. 
Marilu porém, dizendo que primeiro precisava se encontrar com Maurício, pediu para que a irmã deixasse a conversa para depois.
Decepcionada, Laura prometeu que esperar. 
E assim, Marilu, ansiosa por ver Maurício, vestiu um belo vestido florido e pedindo para Rose levá-la até o local do encontro, foi até lá.
Assim, os dois se encontraram, e conversaram sobre os últimos acontecimentos.
Preocupada, Rose pediu para que Maurício não a deixasse sozinha nem por um segundo. O rapaz educado, prometeu que nunca mais a deixaria sozinha.
Assim, enquanto os dois avistavam um lindo jardim, Maurício nem por um segundo desgrudou sua mão da mão de Marilu, que depois de muitos dias presa, finalmente podia saborear o gosto da liberdade. Empolgada, a moça caminhou um longo tempo com o rapaz.
Maurício ficou exausto.
A certa altura, pedindo para que a moça se sentasse um pouco, foi colher algumas flores e oferecendo-as a Marilu, abraçou-a novamente. 
Feliz, prometeu que nunca mais se separariam.
Depois do passeio, Marilu ao voltar para casa, percebeu que Laura a aguardava. Surpresa com isso, Maria Lúcia foi logo perguntando:
-- Laura! Mas o que é que você quer tanto falar comigo?
Laura, enchendo-se de coragem, contou a irmã, que a esperou por bastante tempo. Dizendo que precisava contar que ficara muito preocupada com ela, revelou, que apesar de não saber exatamente o que estava acontecendo, sentiu que havia algo errado. 
Marilu sorriu.
Laura prosseguiu. Dizendo ainda, que apesar das brigas, gostava muito dela, sabia que nunca ela deixaria de ir a escola, a menos que algo muito grave acontecesse.
Marilu sorriu mais uma vez.
Chorando, Laura falou ainda se Marilu a desculpava.
Sem entender o que a irmã queria dizer com aquilo, a moça perguntou:
-- Desculpar o que?
-- Desculpar meu jeito. Desculpar... aquilo que eu tentei fazer. Eu sei que mereci a reprimenda que eu levei. Me desculpa?
Marilu respondeu então, que não tinha nada que desculpar. Laura todavia, dizendo que estava em falta com ela, insistiu para que a mesma dissesse que a desculpava.
Maria Lúcia sem alternativas, acabou concordando. E assim, acabou dizendo que a desculpava por tudo. 
Laura ao ouvir o perdão agradeceu a irmã e prometeu que tentaria mudar seu comportamento. 
Contudo, não foi tão fácil assim. Mesmo prometendo que tentaria mudar, a moça discutiu muitas vezes com os pais e com a irmã. No entanto uma coisa mudou. Nunca mais a moça alegou que Marilu tinha privilégios em relação a ela.
Mais calma, eram mais raras as brigas.
Rose e Paulo, entendendo que esse comportamento era normal da idade, pararam de censurá-la por ser tão rebelde.
Esse proceder mudou sensivelmente a vida em família.
Depois disso, Laura nunca mais tentou desafiar os pais, ou se encontrou com seus amigos transviados. Curiosa porém, sempre que podia perguntava por eles. Ao saber que dois deles morreram em um desastre automobilístico decorrente de um racha, Laura nunca mais quis saber de se encontrar com o pessoal com quem meses atrás conversava.
Impressionada com a morte de dois conhecidos, Laura nunca mais cogitou a idéia de fazer parte do grupo.
Marilu e Maurício e por sua vez, continuaram namorando. 
Muito apaixonados, certa vez ouviram de seus respectivos pais que acabariam se casando.
Porém, os dois eram ainda muito novos para isso. Assim, jovens que eram, os dois aproveitavam para namorar. Dançando juntos em bailes, os dois aproveitavam para estar cada vez mais próximos.
Ao som de músicas de grandes orquestras os dois dançavam. 
Não só eles, mas todos os que participavam desses bailes dançantes. 
Porém, não havia ninguém como eles. E assim, exímios dançarinos como eram, despertavam os mais sinceros elogios. Por conta disso, os dois ganharam o apelido de ‘casal pé-de-valsa’. Feliz, ao serem perguntados como conseguiam dançar tão bem, os dois sempre respondiam que isso se devia ao fato de estarem vivendo um sonho de valsa.
Os demais dançarinos, sempre que ouviam estas palavras, ficavam encantados. 
Nisso, o ‘casal pé-de-valsa’, prosseguia deslizando pelos salões. 
Dançando e encantando a todos com seus passos mágicos. 

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.  

SONHO DE VALSA - CAPÍTULO 13

Rose, ao ver as duas irmãs descendo juntas as escadas, ficou admirada. Será que as duas haviam se entendido? Pensou. 
Mas, procurando conter a curiosidade, simplesmente perguntou:
-- Está tudo bem com vocês?
Ao ouvirem a indagação, Maria Lúcia assentiu com a cabeça, depois respondeu:
-- Sim. Está tudo bem.
Até mesmo Paulo, já desacostumado com tanta tranqüilidade dentro de casa, estranhou. 
Mas, para a felicidade de todos, o jantar transcorreu na mais profunda calma.
E as irmãs, apesar de não estarem amicíssimas, ao menos já estavam se falando, e isso já era um grande passo, já que Laura mal podia ouvir falar no nome de Marilu.
Enfim, parecia que desta vez, as coisas finalmente entrariam nos eixos.
Assim, conforme os dias se seguiram, as garotas iam e voltavam da escola. Seus pais, iam e voltavam do trabalho. E a vida seguia seu curso.
Com isso, conforme os dias e as semanas passaram, finalmente, o rapaz que havia pego uma das luvas de Marilu, se apresentou para a moça e devolveu a delicada peça.
Enquanto ela conversava com algumas garotas sobre a viagem que realizara, o rapaz aproximou-se. Dizendo que queria fazer uma devolução, pediu um minuto de sua atenção.
Ao ouvir isso, Marilu concordou e pediu licença para as amigas.
Assim, o rapaz ao perceber que seria atentamente ouvido, disse:
-- Desculpe o incômodo, mas é que eu queria devolver sua luva. Você a deixou cair no pátio, há algum tempo atrás, mas só agora eu descobri quem era a dona da peça. Aqui está. – disse ele mostrando a luva.
-- Obrigada. Foi muito gentil de sua parte procurar pela dona da peça. Agradeço muito. – disse já quase se virando.
Mas, quando fazia o gesto, Marilu foi novamente interrompida pelo rapaz. 
-- Senhorita, me desculpe. Mas qual é o seu nome?
Ao perceber que estava sendo indelicada, respondeu:
-- Me desculpe. Eu me chamo Maria Lúcia. E você?
-- Maurício. 
-- Muito prazer. – respondeu ela.
-- O prazer é todo meu. – respondeu ele, segurando-lhe as mãos.
Marilu, desconcertada com o gesto do rapaz, tentou afastar as mãos. No entanto, não conseguiu. 
Maurício, percebendo que a moça ficara constrangida, delicadamente soltou suas mãos. Desculpou-se e despediu-se.
Marilu então, ao terminar a conversa com o rapaz, voltou a falar sobre seu passeio na Europa, e de como foi proveitoso o ano que passou na Inglaterra estudando.
Mas, suas amigas, curiosas com a conversa dela com o rapaz, começaram a lhe fazer perguntas. Queriam saber o assunto da conversa, e por que ele havia lhe dado uma luva.
Ao perceber a curiosidade das amigas, Marilu tratou de se afastar das meninas. Alegando que a conversa não teve nada de interessante, foi logo para a classe.
Não queria se expor. E assim o fez. 
Maurício, que estudava em outra classe, após a conversa que teve com Marilu, foi acompanhar as aulas. Na sala de aula, procurando disfarçar seu alvoroço, pegou um livro e começou a lê-lo. E assim enquanto a aula não começava, ele lia. Isso por que, a simples visão da moça já lhe causava comoção.
Sem saber o que fazer para se aproximar dela, Maurício aproveitou-se das circunstâncias e, usando a desculpa de devolver uma luva, foi atrás da jovem.
Sim, isso por que, durante semanas apegou-se àquela luva, na frágil esperança de conseguir se aproximar de Marilu. Durante semanas, sonhou abraçado àquela luva, com ela, objeto de sua adoração. 
Por dias a fio ficou imaginando como seria o encontro dos dois. Romântico, imaginava mil coisas. 
Imaginava-a de echarpe, com seus lindos cabelos esvoaçando ao sabor dos ventos, sorrindo para ele. Passeando por entre monumentos franceses, imaginou-a distante, pensando quem sabe na vida. Ele, por sua vez, ficava de longe, admirando-a. Enfim, sonhava muito com o encontro.
No entanto, ao contrário do que imaginou, o encontro não foi em meio a paisagens românticas. Mas, a despeito disso, apesar de seu nervosismo, conseguiu ao menos um primeiro contato com a moça.
Contudo, ao perceber que não possuía mais desculpas para se aproximar de Marilu, Maurício ficou desolado. Como faria agora para falar com a moça?
Essa preocupação e a decepção por ter estragado tudo, ocupou-lhe mente por semanas. O que fazer para se aproximar novamente?
Tristonho, não sabia o que fazer. 
Mas esta tristeza não durou muito. Isso por que, ao final de algum de tempo, Maurício finalmente tomou coragem e se aproximou.
Suzana e Cora, por sua vez, interessadas em saber o que estava acontecendo, após o término das aulas, tencionando conversar com o rapaz, foram até ele. Sequiosas de conhecerem em detalhes a história da luva, as moças ficaram bastante tempo esperando o rapaz aparecer. Contudo, passavam pessoas e nada de Maurício aparecer. Desapontadas, as duas comentavam entre si:
-- É! Não foi desta vez! – afirmou Suzana.
-- Quem sabe na próxima. – disse Cora.
Sem ter mais nada a fazer, as duas foram para suas casas.
Marilu também voltou para sua casa. Lá almoçou e foi para seu quarto. 
Laura, que também estava em casa, aproveitando a presença de Marilu, foi bisbilhotar a moça. Verificando que Maria Lúcia se entretinha com os estudos, Laura aproveitou para tentar sair sorrateiramente de casa.
Porém, como ainda não havia sido liberada do castigo, Laura assim que alcançou o portão da casa, foi vista por um dos empregados que ao vê-la tão próxima da rua, mandou a mesma entrar novamente.
Laura, atrevida como sempre, bem que tentou retrucar e desobedecer a ordem. O empregado contudo, avisou, que se não o obedecesse iria imediatamente avisar sua mãe. Além disso disse que se ela saísse, teria que acertar suas contas com Rose.
Laura, percebendo que não tinha como sair, entrou furiosa em casa. Furibunda, pensava consigo mesma: ‘Isso não vai ficar assim.’
Tomada por um profundo sentimento de raiva, a moça pôs-se a pensar nos mais mirabolantes meios para sair de casa. Pensou em sair pela janela, pela porta, pelos fundos da casa. Enfim, pensou em diversas maneiras de burlar a vigilância de Rose. No entanto, nada parecia seguro o suficiente. Nesse ínterim, a moça lembrou-se da promessa de Marilu. Esta, disse que a ajudaria a convencer Rose a liberá-la do castigo.
Laura, lembrando-se disso foi até o quarto da irmã, e como quem não quer nada, foi puxando conversa. Perguntando a ela se estava muito ocupada, comentou que queria conversar um pouco.
Maria Lúcia, ao ver o comportamento aparentemente cordato da irmã, ficou surpresa. Isso por que, não era comum Laura ser gentil com as pessoas. Por esta razão, desconfiada dos propósitos da irmã, Marilu perguntou ressabiada:
-- Não. Não estou muito ocupada. Eu só estou adiantando os estudos, para já ter uma noção da matéria que será ministrada na aula que vem. – respondeu ela olhando atentamente para a irmã. – Vai. Pode falar. 
Laura então falou. Perguntando a ela se não gostaria de fazer um passeio, disse que ela poderia escolher o lugar.
Maria Lúcia não entendeu nada. Como nunca foi convidada por sua irmã para fazer nada, a moça ainda não tinha percebido as verdadeiras intenções de Laura. Mas, desconfiada, sabia que por trás de tanta gentileza, havia algum interesse. Ciente disso, perguntou:
-- E eu posso saber a razão de tanto empenho? Por que você está me convidando para um passeio? Você nunca foi disso!
Laura então, aparentando tranqüilidade, respondeu que estando cansada de brigar, estava mais do que interessada em fazer as pazes com ela.
Maria Lúcia entendeu menos ainda. Analisando a atitude da irmã, pôs-se a pensar. Finalmente, passado algum tempo, lembrou-se de haver prometido a mesma que iria tentar ajudá-la a se livrar do castigo. Quando lembrou-se disso, a moça respondeu:
-- Não precisa fazer todo esse teatro. Eu sei perfeitamente o que você quer! Não precisa se preocupar, eu falarei com mamãe.
Laura, fazendo-se de desentendida, comentou que não era nada disso. Dizendo que não tinha nenhuma intenção obscura por trás do convite que fizera a ela, insistiu para que Marilu aceitasse fazer o passeio.
Laura, adotando uma nova estratégia, queria fazer de tudo para convencer a irmã de que estava mudando. Por esta razão, procurou mostrar-se simpática. Primeiramente, convidando a irmã para passear, depois, fazendo-a se convencer de que ela não merecia o castigo imposto por sua mãe.
Assim, muito embora Maria Lúcia não tenha se convencido muito da boa vontade da irmã, aos poucos, Laura, acabou por fazê-la acreditar em seu teatro.
Quando Marilu se convenceu de que a irmã estava tentando mudar, ela foi logo pedir a mãe que liberasse Laura do castigo. Dizendo que a punição se alongara demais, comentou que a irmã estava a tempos, querendo passear pela cidade, em sua companhia.
Rose, quando ouviu a conversa da filha, comentou:
-- Olhe Marilu. Eu sei que você gosta muito de Laura e quer defendê-la a todo custo. Mas o fato é que ela ultrapassou todos os limites. Se eu coloquei de castigo foi por que esta foi a única maneira que eu encontrei de colocar um freio no comportamento desenfreado de sua irmã. Você sabe que sua irmã diversas vezes, saiu escondida à noite, sem minha permissão, para se encontrar, sabe-se lá com quem.
-- Mas mãe! Pelo que sei, faz bastante tempo que ela está de castigo. Quem sabe ela não pensou melhor e resolveu mudar de idéia? Pense bem mãe. Ela não pode ter se cansado de enfrentar vocês e sempre se prejudicar?
Rose então, concordou com a filha. Contudo em razão do comportamento de Laura, a mulher mostrou-se muito reticente liberá-la do castigo.
Marilu, percebendo que não seria nada fácil convencer a mãe a liberar a irmã do castigo, pediu a ela que fizesse um teste. Se Laura se comportasse, ela a liberaria do castigo. Caso contrário, a moça continuaria proibida de sair de casa.
Rose, relutante, acabou concordando em dar uma última chance a Laura. Mas avisando que se ela não respeitasse o acordo voltaria ao castigo, deixou bem claro que não facilitaria as coisas para Laura.
Maria Lúcia comentando que todos mereciam o benefício da dúvida, foi chamar a irmã.
A moça, ao ouvir seu nome, foi perguntar a irmã, se ela havia conseguido convencer Rose a liberá-la do castigo.
Maria Lúcia, dizendo que havia conseguido fazer a mãe amenizar o castigo, recomendou a Laura, que descesse para conversar com Rose.
Laura curiosa e apreensiva desceu as escadas. 
Rose então, chamou-a para uma conversa. Laura se aproximou. 
Sua mãe, dizendo que havia conversado com Marilu, concordou em liberá-la do castigo.
A moça ao ouvir isso, ficou exultante.
Rose, percebendo isso disse:
-- Eu se fosse você, não ficaria tão contente ainda. Eu não disse quais são as minhas condições.
Laura ao ouvir isso, ficou preocupada.
A mulher continuou. Dizendo que ela teria que convencê-la de que merecia este voto de confiança, Rose salientou que estava de olho nela e que seria só ela fazer uma bobagem, que estaria de volta ao castigo.
Laura não gostou nem um pouco de ouvir estas palavras.
Irritada com a atitude da mãe, não pôde esconder seu desapontamento. Contudo, tentando se controlar, a moça subiu as escadas e voltando para seu quarto, não retornou mais para a sala.
Remoendo sua raiva, Laura só conseguia pensar em como faria para convencer Rose de que merecia sua confiança e assim se livrar de seu olhar vigilante. 
Furiosa, a moça prometeu para si mesma que não colocaria tudo a perder. Sabedora de que não adiantava enfrentar os pais, resolveu que agora evitaria entrar em confronto com eles. Isso por que, todas vezes em que discutiu com os dois, foi ela quem acabou se prejudicando.  Assim, precisava mudar sua estratégia.
E assim o fez.
Cora e Suzana, estranhando o novo comportamento da moça, comentaram que ela estava no caminho certo. Sim, por que se ela queria ter um bom relacionamento com as pessoas o primeiro passo era mudar sua atitude. Isso por que ninguém, ninguém gosta de ficar ao lado de uma pessoa desagradável.
Desta forma, as duas moças, notando que Laura estava mais sociável, foram logo elogiar sua atitude.
Laura, procurando não discutir com ninguém, agradeceu o elogio. Simpática, comentou que estava planejando um passeio com a irmã. 
Cora e Suzana, quando ouviram isso, comentaram que era muito bom saber que ela estava se entendendo com Marilu. As moças, dizendo que ela era um amor, salientaram que Laura estava mais do que certa em se entender com a irmã. 
Laura, percebendo que a conversa estava agradando a ambas, tratou logo de as convidar para passeio. Dizendo porém, que precisava antes perguntar a irmã se ela concordava, prometeu que em caso afirmativo, as duas poderiam acompanhá-las no aludido passeio.
Cora e Suzana, ao ouvirem a proposta, agradeceram o convite. Animadas, pediram a Laura, que assim que ela soubesse qual era a posição de Maria Lúcia, que as avisasse.
Laura, determinada a estabelecer uma nova relação com as meninas, prometeu que as avisaria.
Nisso, assim que pôde conversar com a irmã, a moça comentou que convidara Cora e Suzana para o passeio. Marilu ao ouvir as palavras de Laura, comentou que ela fizera muito bem em convidar as duas para o passeio. Dizendo que estava em débito com as duas, elogiou a atitude de Laura.
Laura agradeceu. 
Com isso, foi encontrar as duas e dizer que o passeio já estava acertado.
Cora e Suzana, ao tomarem conhecimento da aquiescência de Maria Lúcia, ficaram muito contentes.
Assim, foi só uma questão de tempo para o passeio. 
Caminhando pelas principais ruas de São Paulo, as quatro moças se divertiram muito. Passeando pela Rua Augusta, visitaram uma das ruas mais chiques da cidade na época. Aproveitando o passeio, as moças fazer uma visitinha a mãe que possuía um salão no local. Além disso, observando vitrines e entrando em lojas, as moças fizeram algumas compras. Depois, famintas que estavam, resolveram parar em um restaurante e almoçar.
Depois, de almoçarem e colocarem as conversas em dia, a moças voltaram a caminhar pelas ruas da cidade.
A certa altura, depois de muito caminhar, Marilu, sentindo-se cansada, pediu para as amigas darem uma pausa. Foi então, que as moças, próximas da Praça da República, resolveram atender o pedido da amiga. Marilu, apreciando a beleza do local, sentou-se e ficou apreciando a natureza que a cercava.
Nisso, Maurício, que por acaso também passava pelo local, ao vê-la sentada, absorta em pensamentos e junto a três garotas, resolveu tomar coragem e se aproximar. 
Sem saber direito o que diria a ela, cumprimentou-a bem como suas amigas.
Maria Lúcia então, perguntou-lhe como ele estava. 
Maurício respondeu: 
-- Estou bem. Melhor agora que eu encontrei pessoas tão gentis.
Cora e Suzana sorriram. 
Maria Lúcia por sua vez, dizendo que ele estava exagerando comentou que ele também era muito educado.
Maurício agradeceu o elogio e dizendo que estava muito contente por tê-la encontrado aquela hora, timidamente comentou que ficou sabendo que ela estudou um ano na Inglaterra.
A moça assentiu com a cabeça.
Maurício, ainda um pouco sem jeito, resolveu perguntar a ela, se havia gostado da viagem. 
Marilu respondeu que adorou conhecer um outro país. Além disso, teve a rara oportunidade de visitar cidades da Europa que ela nem imaginava que um dia iria conhecer. Dizendo-se fascinada por aquele continente Marilu disse que se pudesse, passaria horas e horas falando a respeito de suas incursões pela Europa, bem como sobre sua estada na Inglaterra.
Maurício então, percebendo um certo constrangimento da moça, fez questão de dizer que estava deveras interessado em seu relato.
Maria Lúcia por sua vez, comentando que tinha muito a dizer, respondeu-lhe que poderia lhe contar sobre a viagem qualquer dia desses.
Maurício, ao ouvir a resposta da moça, ficou um pouco desapontado.
Marilu no entanto, percebendo o interesse do rapaz por sua viagem, prometeu a ele, que quando se encontrassem novamente e tivessem a oportunidade para conversarem mais, contaria suas peripécias na Europa. Em seguida, desculpando-se comentou que precisava ir. 
Maurício ao ouvir isso, despediu-se da moça.
Marilu também se despediu.
Nisso as garotas dizendo tchau, também aproveitaram para se despedir. 
Em seguida, as quatro moças pegaram suas sacolas e voltaram para suas casas.
A noite, depois de um extenuante dia de trabalho, Rose foi até o quarto das garotas ver o resultado do esperado passeio das duas. 
A mulher ao ver a profusão de roupas e alguns sapatos, ficou encantada. Realmente tudo era de muito bom gosto. Curiosa, Rose foi logo perguntando as filhas, onde elas haviam comprado peças tão bonitas.
As duas responderam que compraram as roupas em várias lojas da cidade.
Rose então, percebendo que algumas peças foram compradas no Mappin, comentou que assim que tivesse um tempo livre, faria o mesmo que as filhas.
Nisso a família foi jantar. Maria Lúcia e Laura, não se cansavam de falar sobre a tarde agradabilíssima que tiveram. Rose por sua vez, quando foi perguntada pelo marido, sobre como havia sido seu dia de trabalho, comentou que corrido como sempre, mas muito bom. Paulo também falou sobre seu trabalho.
Quem via a família conversando animadamente sobre assuntos os mais variados possíveis, nem sequer podia imaginar que há pouco tempo atrás, nem tudo eram flores na vida desta família.
Realmente, estava tudo calmo. 
Laura, cuidadosa, por algum tempo, deixou seus amigos suspeitos. Cautelosa, não queria por tudo a perder. Por esta razão, resolveu ao menos por algum tempo, fazer o que seus pais queriam.
Assim, seria apenas uma questão de tempo, para voltar a aprontar.
Nisso, Marilu em conversas com as amigas da escola, percebendo a aproximação de Maurício, continuou a falar.
O rapaz, tentando se aproximar, foi logo perguntando se ela podia lhe dar um pouco de sua atenção.
Marilu, ao ouvir o pedido, pediu licença as amigas e foi ter uma breve conversa com ele. Maurício então, dizendo que queria conhecer os detalhes de sua viagem, comentou que precisavam falar a sós.
Marilu ao ouvir isso, ficou espantada. 
Maurício explicando-se, comentou que só queria conversar. Dizendo que ela era muito requisitada em sua escola, pediu a ela que marcasse um dia para conversarem.
Maria Lúcia, relutante, diante dos apelos do rapaz acabou concordando. 
Assim, depois de muita insistência, a moça combinou que se encontrariam. Dali a poucos dias, os dois se encontrariam em um cinema.
O rapaz, satisfeito, agradeceu a moça e retirou-se.
Marilu então, ao voltar a falar com as amigas, percebeu que as mesmas, depois de verem o rapaz se aproximando passaram fazer perguntas a respeito do mesmo. Curiosas, queriam saber seu nome, se era namorado dela, etc.
 A moça ao perceber isso, incomodada com tantas perguntas resolveu ir até a sala de aula. Cansada de tantas perguntas, já havia se aborrecido quando Cora e Suzana, que depois de verem o rapaz se aproximar e conversar com ela, não pararam de inquiri-la a respeito dele.
Marilu era muito gentil, mas não gostava quando as pessoas começavam a fazer perguntas pessoais. Por isso mesmo, sempre que a conversa tomava esse rumo, ela fazia questão de desconversar e procurando fugir do fogo cruzado, ficava sozinha.
Cora e Suzana, percebendo isso, pararam de fazer perguntas. Mas desconfiadas de que Maurício estava interessada na moça, as duas não paravam de especular. 
Laura, como quem não queria nada, não perdia a oportunidade de ouvir as duas falando sobre isso. Curiosa para saber mais detalhes, deixava as duas falarem sobre o assunto. Isso por que, assim que descobrisse um pouco fraco da irmã, sabia que poderia usá-lo em seu favor.
Contudo, não seria nada fácil descobrir o havia entre os dois. 
Toda vez que Laura tentava sondar a irmã a este respeito, ouvia como resposta que não havia nada demais. 
No entanto, depois de muito ser inquirida sobre o assunto, Marilu irritada, respondeu que ninguém tinha nada com isso.
Laura, ao ouvir a resposta da irmã, começou a desconfiar da mesma.
Nisso Maurício, ansioso por poder falar com Maria Lúcia sem a interferência de suas amigas, finalmente pôde realizar seu intento. 
Gentil, o rapaz combinou o encontro a tarde. Vestido com um terno ele aguardou Maria Lúcia que usava um tailler. Na matinê, os dois estavam elegantemente trajados. Como exigência da época, para se entrar nos cinemas as pessoas precisavam usar trajes sociais. Por isso mesmo necessário se fazia pôr-se elegante.
Durante a sessão, os dois se deslumbraram. Hollywood, a fábrica de sonhos americana, sabia como ninguém fazer grandes filmes. Marilu, encantada com a fita, ao sair do cinema, não se cansou de comentar sobre a beleza do filme. 
Maurício, encantado com a moça, deixava-a falar.
Porém a certa altura, a moça, sem ter o que dizer, calou-se.
O rapaz, dizendo então que estava curioso para saber como havia sido sua viagem, pediu para que ela lhe contasse detalhes do passeio.
A moça começou a contar-lhe então, como fora a viagem.
Depois que saíram do cinema, o rapaz, fazendo questão de prolongar o passeio, convidou-a para ir com ele até uma lanchonete. 
Marilu tentou recusar, mas Maurício, dizendo que ficaria muito aborrecido se ela declinasse o convite, acabou convencendo-a a acompanhá-lo.
E assim foi. Lá, pedindo um sanduíche e um milk-shake para cada um, o rapaz sugeriu que ela contasse como fora sua estada no Velho Continente.
Marilu então começou a contar. Dizendo que escolhera a Inglaterra para estudar em razão do fato de saber inglês, comentou que aquela foi a porta de entrada para conhecer muitos outros países. Alegando que conhecera muita coisa na Europa, contou em detalhes tudo o que viu.
Maurício, empolgado com o relato, praticamente só ouvia o que a moça tinha a dizer. Educadamente, nas poucas vezes em que interrompeu a conversa só o fez para elogiar a moça. Dizendo que a Europa era fascinante, comentou que ela fora muito corajosa em fazer todos esses passeios.
Por sua vez, Maria Lúcia agradecia os elogios feitos e continuava a falar sobre a viagem.
Quando o garçom trouxe o lanche, Maurício e agradeceu e convidando-a a comer, deixou que ela fizesse uma pequena pausa em sua narrativa. E assim, os dois se deliciaram com a comida.
Depois, Maria Lúcia continuou a falar sobre o passeio. Maurício atento, parecia sorver suas palavras. E a moça, animada, continuou conversando. Ao final de algum tempo, percebendo que o rapaz nada dizia, ela perguntou:
-- E você, não diz nada?
Maurício respondeu então:
-- Não. Diante de um relato tão fascinante, eu não tenho nada para acrescentar. Quer dizer, exceto quanto a um ponto: Eu estou morrendo de inveja. Maria Lúcia, você viajou praticamente o mundo inteiro. O mais surpreendente é que você bem nova. Geralmente quem tem essas histórias para contar são as pessoas mais velhas. Isso é fascinante. Você sabe viver a vida intensamente.
Marilu sorriu.
Maurício então continuou:
-- Eu sei que fui bastante impertinente em te interpelar daquela maneira. Mas se eu não tivesse feito isso, certamente não teria tido o privilégio de ouvir histórias tão fascinantes.
Marilu, ao ouvir elogio agradeceu. No entanto, uma coisa a intrigava. Se estudavam no mesmo colégio, como ele nunca conseguia se aproximar dela?
Maurício então respondeu:
-- É por que você é muito solicitada. Mesmo assim eu percebi quando a senhorita deixou cair sua luva. E foi assim que comecei a me aproximar.
Marilu entendeu então.
Maurício, comentando então, que não entendia o sistema anterior, no qual moças e rapazes tinham que estudar separados, criticou a este. 
Maria Lúcia, dizendo que não sabia o que dizer a este respeito, já que sempre estudara em colégio de moças, comentou que estava se acostumando com os sistema misto.
Maurício, percebendo que o assunto estava ficando polêmico demais, resolveu contar amenidades. Dizendo que conhecia muito pouco da Europa, comentou com Maria Lúcia que um dia ainda faria uma longa viagem para conhecer todo aquele continente.
A moça ao ouvir as palavras do rapaz, comentou que deveria mesmo fazê-lo. Ver ‘in loco’ tudo era ensinado em sala de aula era bem melhor do que simplesmente ouvir dizer que tudo aquilo existia.
Maurício concordou.
E assim, os dois ficaram longamente conversando.
Desta forma Marilu pôde finalmente perceber que o rapaz era uma ótima pessoa.
A certa altura, Maurício ao perguntar as horas para o garçom, o mesmo lhe respondeu. 
Marilu então, percebendo o adiantado da hora, comentou que precisava voltar para casa.
Maurício, percebendo a aflição da moça, prometeu acompanhá-la. 
Marilu, tentou recusar a oferta, mas o rapaz, dizendo que era muito tarde para ela sair por aí, andando sozinha, fez questão de acompanhá-la até sua casa.
Laura, que vinha bisbilhotando a vida da irmã, ao olhar pela janela, percebeu que um rapaz a acompanhava. Da janela ela viu quando os dois se despediram pouco antes de Marilu se aproximar de casa.
Quando Marilu entrou em casa, Rose a esperava na sala. Dizendo que a filha havia se demorado, perguntou se havia encontrado com alguma de suas amigas da escola.
A moça, surpresa foi logo respondendo que sim. 
Laura porém, sabia que isto não era verdade. Isso por que, se a moça tinha vindo acompanhada por um rapaz era por que tinha passado a tarde inteira com ele. Ao chegar a esta conclusão, Laura percebeu que tinha um trunfo nas mãos. Com ele poderia forçar Maria Lúcia a ajudá-la a sair de casa.  
Dessa forma, Laura, tentando encontrar uma maneira de dizer a irmã o que sabia, ficou a sondá-la por muito tempo. Aguardando a oportunidade certa para dizer o que sabia, esperou Marilu cair em contradição para falar que a havia visto chegar em casa com um rapaz.
Com isso, dias depois... 
Assim que Maria Lúcia acabou de conversar com a mãe –  como sempre fazia –, foi até seu quarto. Para seu espanto, Laura a esperava.
Marilu surpresa com a presença da moça em seu quarto, perguntou logo:
-- O que você está fazendo aí?
-- Nada demais. Só estava esperando você chegar. – respondeu ela, ávida para que Marilu revelasse o nome do estranho com quem estava saindo.
Laura, apesar de curiosa, tentava não demonstrar seu interesse no assunto. Por isso, como quem não queria nada, a moça começou a perguntar a Marilu sobre os passeios que vinha fazendo ultimamente.
Marilu, dizendo que fazia caminhadas com as amigas, comentou que não havia sido nada demais.
Laura porém, não ficou satisfeita. Insinuando que ela parecia estar se divertido muito, insistiu em perguntar com quem ela estava saindo.
Marilu contudo, não respondeu o que Laura gostaria de ouvir.
Contudo, com o passar dos dias, incomodada com as perguntas de Laura, Marilu acabou deixando escapar que ela e Maurício conversaram muito sobre sua viagem.
Laura por sua vez, cansada de fingir que não sabia de nada, revelou a irmã que a viu chegando com um estranho em casa, certo dia. 
Marilu ao ouvir isso tentou se fazer de desentendida, mas não deu certo. 
Laura irritada, respondeu que não agüentava mais tanta dissimulação. Além disso, ameaçou contar a mãe delas o que havia visto.
Marilu ao perceber a intenção da irmã, ficou espantada com sua atitude. Dizendo que não esperava uma atitude dessas dela, deixou bem claro que estava profundamente decepcionada.
Laura porém, não se importou nem um pouco com a atitude da irmã. Comentando que o que ela pensava a seu respeito não lhe interessava nem um pouco, exigiu que Marilu a ajudasse a convencer Rose de que ela podia sair de casa a hora que quisesse. Além disso, Rose não precisava ficar vigiando-a, já que a moça havia se comportado muito bem nos últimos tempos.
Marilu, ao ouvir o pedido de Laura, comentou que não poderia atendê-lo. 
Laura, irritada com o comportamento relutante da irmã, ameaçou novamente contar a Rose o que havia visto.
Maria Lúcia aborrecida, ao ver-se sendo chantageada pela irmã, disse em tom irritado:
-- Não me amole!
Em seguida, arrastou Laura para fora do quarto.
A garota irritada, ao ver-se sendo empurrada, respondeu:
-- Não empurra.
Maria Lúcia no entanto, continuou empurrando-a até tirá-la de seu quarto. Ao deixá-la para fora, fechou a porta e trancou-se.
Laura sentindo-se desrespeitada pela irmã, prometeu que contaria tudo a sua mãe. Gritando na frente da porta do quarto de Marilu, a moça acabou chamando a atenção de  seus pais, que ao ouvirem os berros, foram até o segundo andar da residência para saber o que estava acontecendo.
Laura, ao perceber a aproximação, tratou logo de ir para seu quarto e se esconder. Precavida, deitou-se na cama e fingindo dormir, esperou sua mãe entrar no quarto.  
Rose e Paulo, preocupados, foram primeiramente até o quarto de Marilu. Ao chegarem em frente ao mesmo bateram na porta.
Contudo, Marilu não os atendeu.
Em razão disso, o casal foi até o quarto da filha mais nova.
Para espanto de Rose, Laura estava dormindo.

Luciana Celestino dos Santos 
É permitida a reprodução, desde que citada a fonte.