Poesias

quarta-feira, 31 de março de 2021

CARINHOSO - PARTE II - CAPÍTULO 3

No dia seguinte, logo cedo, Ludmila estava de pé.
Lúcio também acordara cedo.
Sem jeito, atravessou o corredor.
Ludmila, ao vê-lo passar, convidou-o para tomar um café.
Lúcio recusou.
A fazendeira então, intimou-o.
Disse que saco vazio não parava em pé, e que deveria comer algo, ou não agüentaria trabalhar o dia inteiro. Ludmila respondeu que o dia seria cheio, e que ele teria muito o que fazer.
Lúcio então sentou-se e comeu.
Mais tarde, ao fazer menção de ir trabalhar, Ludmila disse que conversaria com um dos colonos e que ele teria um pouso certo.
Lúcio agradeceu.
Com isto, a mulher perguntou-lhe se não possuía família, se não gostaria de trazer os parentes para viverem junto dele.
Lúcio respondeu que não.
Agradeceu a gentileza, mas agradeceu, dizendo que não era necessário.
Nisto, levantou-se da mesa, colocou seu chapéu e se dirigiu as cocheiras.
Ludmila recomendou-lhe que se encaminhasse para lá.
Nisto o moço passou a trabalhar.
Deu banho nos cavalos, alimentou os animais.
Quando o moço comentou que pousara na sede da fazenda, os empregados ficaram curiosos.
Julgaram que Lúcio gozava de prestígio junto à Ludmila.
Na boca de pessoas maldosas, virou insinuação de algo mais.
Afinal de contas a mulher era jovem, e Lúcio não era desprezível.
Durante o dia, Ludmila chamou alguns colonos em sua casa e perguntou-lhes se haveria problema em hospedar um moço que havia acabado de chegar, e estava começando a trabalhar na fazenda.
Alguns homens relutaram em oferecer hospedagem a Lúcio.
Diziam ter filhas moças em casa, e que isto poderia não ser visto com bons olhos.
Nisto, Ludmila se voltou aos que haviam se calado.
Alguns concordaram em oferecer estada para o moço por algum tempo.
A fazendeira agradeceu.
Com isto, após algumas conversas, ficou ajustado que Lúcio ficaria algum tempo na casa de Valdomiro.
Mais tarde, ao término do expediente, o moço se encaminhou com seus pertences para a casa do colono.
Lá, foi apresentado aos familiares do homem.
Como não havia cama para ele, Lúcio armou uma rede na varanda da casa e se abrigou da chuva.
Depois de jantar a comida de Leocádia, o moço deitou na rede e ficou contemplando a noite.
O céu estava estrelado como na noite anterior.
Valdomiro, percebendo que o moço estava acomodado, despediu-se.
Alegou que precisaria se levantar muito cedo no dia seguinte.
Lúcio desejou-lhe uma boa noite.
Cruzou os braços abaixo da cabeça e ficou contemplando a noite.
Até que cansado, adormeceu.
Lúcio era sempre útil.
Quando precisavam de alguém com habilidade para cuidar dos animais mais ariscos, o chamavam.
Houve um tempo em que precisaram de braços na lavoura e lá foi ele cuidar das plantações.
Em dado momento, teve uma festividade na vila.
Conforme o costume, era organizada uma festividade anual em homenagem aos santos de junho.
A região inteira se mobilizava para a comemoração.
Havia mastro com a bandeira do santo, bandeirolas coloridas enfeitando toda a vila.
Na festa havia cantadores, violeiros.
Comidas, barracas.
A igreja angariava fundos para obras de benemerência.
Havia missa, e depois começava a festa.
Muitos aproveitavam para dançar, flertar com as moças.
Ludmila também participava da festa.
Mas depois da viuvez, raramente dançava.
Certa vez, Emerson convidou-a para dançar, mas Ludmila gentilmente recusou.
Lúcio também compareceu.
Para ajudar na festa, ofereceu uma montaria.
O padre, ao receber o objeto, resolveu leiloá-lo.
O objeto foi a atração da festa.
Todos os fazendeiros da região, ofereceram lances.
Por fim, quem arrematou o produto, foi o capataz de Ludmila, o Emerson.
O homem foi aplaudido por todos pela aquisição feita.
Todos comeram, se divertiram.
Conhecidos se cumprimentaram e comentaram as novidades.
Adultos subiram no pau de sebo, mas somente um ganhou o prêmio.
Um chapéu todo branco.
As crianças ficaram alvoroçadas com as prendas e os jogos.
A certa altura da cantoria, alguns casais começaram a se formar.
Pessoas começaram a dançar.
Lúcio, que havia conversado com alguns colonos, ao perceber Ludmila conversando com conhecidos, pediu licença aos presentes, e perguntou-lhe se poderia convidá-la para uma dança.
Surpresa, Ludmila perguntou-lhe se não gostaria de dançar com uma das moças solteiras da região.
Lúcio respondeu que todas as moças eram muito encantadoras, mas que ela não havia respondido sua pergunta.
Ludmila retrucou perguntando se estava sendo intimada.
Lúcio respondeu que sim, era uma intimação, e brincando, alegou que não aceitava recusas.
Ludmila aproximou-se. Segurou a mão estendida do moço.
Lúcio a conduziu.
Dançaram.
Sob olhares curiosos, invejosos, aprovadores e desaprovadores.
Jurema, ao observar a patroa com o peão, comentou com uma colega, que eles juntos faziam um bonito par.
Foi o bastante para ser censurada.
Muitos diziam que ela era viúva e que deveria guardar luto.
Quando Jurema ouvia estas palavras, ria muito.
Dizia que Dona Ludmila era muito jovem para se enterrar na vida como muitos queriam.
A mulher dizia que Ludmila não tivera sequer a oportunidade de ter filhos com o falecido marido.
Recordou-se que Ludmila guardou luto por muito pouco tempo, o que ocasionou a reprovação de muitos. Todos consideravam que ela deveria se vestir sempre de preto dali para frente.
Ludmila porém, poucos dias após o falecimento do marido, foi tomando pé da situação da fazenda.
Para muitos que achavam que a mulher venderia tudo e se mudaria dali, mas Ludmila surpreendeu ao começar a vestir calças, botas, chapéu.
Muitos diziam que ela estava se portando como homem e envergonhando as mulheres.
Pais de família argumentavam que ela era um péssimo exemplo para suas filhas.
Ludmila por sua vez, sempre que ouvia este tipo de comentário, dava de ombros, dizia:
- O que esperavam que eu fizesse? Que bancasse a coitadinha para ser enganada pelo primeiro pilantra que aparecesse, e vendesse minhas terras a preço de banana? Pois que fiquem esperando, não gosto de agradar as pessoas, prefiro ser feliz. E não vou jogar fora o legado de Antenor. Este foi o maior tesouro que ele deixou pra mim, depois de partir. Não posso fazer pouco disto. E tenho dito.
Jurema a admirava.
Considerava-a uma mulher de fibra.
Não gostava de ouvir as pessoas falando mal de sua patroa.
Por isto, ao ouvir o comentário preconceituoso de que a patroa deveria guardar luto eterno, comentou que ela não era mais casada, e que não havia impedimento para que viesse a se casar novamente.
Jurema estava noiva de um colono da fazenda.
Seu casamento se realizaria em poucos meses.
Quando Ludmila soube do fato, presenteou a criada com toalhas de linho, roupas de cama, e um jogo de porcelana.
Com efeito, em que pesem os detratores, havia quem reconhecida o valor da mulher.
Emerson admirava a coragem de uma mulher criada na cidade, que assumiu as rédeas de uma atividade tão bruta quanto a vida na fazenda. Argumentava que ela era uma mulher dos livros, de gestos e feições delicadas.
No começo, a considerou delicada demais para assumir a função de dona das terras e fazendeira.
Mas Ludmila surpreendeu. Era determinada e tinha fibra.
Tanto que conseguiu comprar a parte da fazenda pertencente aos filhos de Antenor, e manter a propriedade com as dimensões originais.
Muitos na fazenda gostavam dela, em que pese seu jeito enérgico.
Ludmila apesar de inflexível em alguns pontos, era gentil e amistosa com todos.
Sempre cumprimentava a todos, mesmo quando não conhecia a pessoa de nome.
Freqüentemente os colonos acorriam para pedir auxílio.
Ludmila nunca se recusou em atender os funcionários.
Quando não podia auxiliá-los, explicava-se e procurava uma solução alternativa.
Já chegou a levar colono doente em seu carro para a cidade mais próxima, em busca de atendimento médico.
Lúcio admirava estas qualidades na patroa.
Razão pela qual enquanto conduzia a mulher, comentava que todos os observavam, admirados de um peão ter a ousadia de convidar a própria patroa para dançar.
Ludmila redargüiu dizendo que era bobagem. Argumentou que não fazia distinção entre as pessoas.
Lúcio, ao perceber que a dança estava terminando, perguntou-lhe se poderiam continuar dançando.
A mulher perguntou-lhe se não gostaria de dançar com outra pessoa.
Lúcio respondeu que gostava de conversar com ela e argumentou que não havia demonstrado toda a sua habilidade como dançarino.
Ludmila sorrindo, concordou.
Dançaram juntos algumas músicas.
A certa altura, Ludmila comentou que as moças não estavam gostando muito de vê-los dançando juntos. Comentou que elas estavam enciumadas do monopólio.
Lúcio achou graça. Argumentou que tudo bem, a deixaria livre de sua presença incomoda.
Ludmila agradeceu as danças. Disse-lhe que dançava muito bem.
O moço realizando um gestual cerimonioso, inclinou-se tirando o chapéu e lhe disse:
- Sempre as ordens!
Nisto, se afastou olhando-a nos olhos.
Ao término das danças, Ludmila percebeu alguns cochichos e comentários do tipo:
- Mas ela é viúva!
- Isto não está certo!
Diante disto, a mulher começou a rir.
Permaneceu na festa por mais algum tempo, sendo convidada a dançar por alguns fazendeiros.
Mais tarde a moça retornou a fazenda dirigindo seu carro.
Adentrou a sede da propriedade.
Sentou-se em um sofá que havia na varanda e ficou contemplando a noite.
Pensou que no dia seguinte o sol brilharia novamente naquelas matas, e com isto, se iniciaria um novo dia com coisas novas, novos desafios.
Sorriu.
Recordou-se de Antenor.
Dos momentos alegres.
Da viagem que fizeram juntos para a capital.
Ludmila lhe mostrou a imponente cidade.
Antenor intimidado, tinha medo de subir nas escadas rolantes. Dizia que iria cair daquele troço.
Com efeito, ao levar o marido ao cinema, o homem achou que as personagens iriam sair da tela e invadir a sala de cinema.
Na fazenda não havia televisor.
Ludmila por sua vez, comentou que quando morava na cidade, gostava de assistir alguns seriados. Dizia-se apaixonada pela série “Vigilante Rodoviário”, “Alô Doçura”. Animada, comentou que adorava o ator Jonh Herbert, e que quando era mais nova, assistiu muitas chanchadas pela tevê.
Antenor contudo, não gostava do aparelho.
Dizia que não entendia como uma pessoa que estava a quilômetros de distância dele, poderia também estar na televisão. Achava uma invenção esquisitíssima.
Com efeito, quando visitava algum conhecido na vila, ao ver o aparelho ligado, comentava que assistir televisão era perda de tempo.
Ludmila achava graça no comportamento ressabiado do marido.
Com efeito, ao viver na fazenda, teve que se desfazer dos hábitos televisivos.
Ao se mudar para a vila, não via tevê.
A moça comentou com o marido certa vez, que seu pai era engenheiro e que conseguiu comprar um aparelho a prestação.
Antenor por sua vez ressalvou que o aparelho era caro, e que nem todos tinham acesso a ele.
Ludmila se entretinha com o rádio de válvulas que havia na sede da fazenda.
As pilhas imensas, quando davam mostras de estarem no fim, eram aquecidas e novamente colocadas no imenso rádio de madeira que havia na sala.
Ludmila ouvia muita moda de viola, guaranhas, música de raiz.
Comentou que adorava as músicas da dupla Tonico e Tinoco.
Antenor sorria dizendo que também eram seus favoritos.
A mulher se ocupava em bordar, preparar as refeições, receber as visitas do marido, em ajudar a lavar e passar as roupas.
Usava um ferro pesado a carvão, o qual tinha que ser utilizado com muito cuidado, ou então, ao invés de passar as roupas, as deixava coberta das cinzas do carvão.
Para ficarem brancas, as roupas, depois de lavadas, eram estendidas na grama para quarar.
Antenor elogiava o cuidado da esposa com os afazeres domésticos.
Ludmila recordava-se com carinho de sua relação com o marido.
Sorrindo, a mulher se recordou da festa, dos momentos divertidos que passara ao lado dos amigos e dos conhecidos. Das danças, da conversa que tivera com Lúcio.
O moço por sua vez, durante a festa, dançou com Jurema, e outras duas senhoras.
As moças ficaram contrariadas quando o belo rapaz moreno dançou com Jurema e as senhoras.
Aborrecidas, comentavam que ele deveria dançar com mulheres mais jovens e desimpedidas, e não com mulheres comprometidas.
O noivo de Jurema, por sua vez, estava de viagem.
Lúcio, percebendo que a moça estava sozinha e ensaiando passos na cadeira em que estava sentada, convidou-a para dançar.
Com isto, o jovem ganhou fama de esnobe.
Lúcio contudo, não se importava com isto.
Ao voltar para casa a cavalo, ficou a contemplar o céu.
Recordou-se do dia em que ceou na casa da patroa.
Em dado momento, chegou a apear do cavalo para contemplar a noite.
Após algum tempo, retomou a cavalgada.
Ao chegar em casa de Valdomiro, armou sua rede e deitou-se.
Permaneceu durante alguns minutos contemplando a paisagem, a noite estrelada, a lua cheia, as flores, as árvores.
O silêncio da noite.
Dormiu.
Sonhando, sorriu.
Quando despertou, percebeu que Valdomiro o observava.
Curioso, o homem comentou que ele devia estar sonhando com alguma coisa muito boa para sorrir daquela maneira.
Lúcio, constrangido, comentou que não era nada.
Valdomiro comentou com ironia:
- Sei, sei! Faz de conta que eu acredito.
Nisto Lúcio sentou-se na rede.
Passou a mão no cabelo.
Valdomiro entregou-lhe uma xícara esmaltada com café.
O moço tomou a bebida.
Em seguida, a esposa de Valdomiro trouxe num prato um pedaço de bolo e frutas.
Comeu.
Nisto, encaminhou-se para o interior da casa, lavou o rosto e as mãos em uma bacia.
Penteou os cabelos.
Trocou de roupa.
Como era dia de domingo, o moço pediu licença a todos.
Passeou a cavalo pela fazenda.
Em dado momento, resolveu descansar em frente a um riacho.
Sentou-se a sombra de uma árvore. Começou a pescar.
Horas depois, voltou para casa.
Ofereceu os peixes que havia pescado a Leocádia.
A mulher agradeceu o oferecimento.
Comentou que iria prepará-los para o almoço.
Com isto, a família almoçou peixes preparados por Leocádia e suas filhas.
Refeição preparada num fogão a lenha.
Nisto, enquanto as mulheres preparavam a comida, Lúcio, Valdomiro e os filhos conversavam sobre a festa.
Os rapazes comentaram animados sobre a beleza das moças que estavam no lugar.
Os três moços – filhos de Valdomiro – , já tinham suas pretendentes e haviam dançado com elas durante a festa.
Estavam deveras animados.
Mais tarde, o moço foi jogar bola com os colonos.
No dia seguinte, voltou a trabalhar.
Ludmila percorreu a fazenda, acompanhou o trabalho dos colonos na plantação, no ensacamento dos grãos de café. Na separação. Na colheita.
Acompanhou o trabalho dos peões no dia seguinte.
Lúcio ao vê-la, cumprimentou-a.
Ludmila perguntou a um dos colonos, o que achava do trabalho de Lúcio.
Valdomiro respondeu que o moço era uma das pessoas mais competentes com quem trabalhou. Pau pra toda obra, executava qualquer trabalho. Acrescentando, mencionou que o rapaz era um bom moço, e um ótimo partido.
Ludmila fingiu não ouvir as últimas palavras do homem.
Apenas agradeceu e se afastou.

Continuou cavalgando.
 
Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

CARINHOSO - PARTE II - CAPÍTULO 2

Com o tempo, Glauco e Lopes perceberam que Ludmila não tinha interesse em ludibriá-los.
No jantar, chegaram a comentar que quando o pai enviou um telegrama informando que iria se casar, pensaram que se tratava de uma oportunista.
Ludmila riu.
Nisto os irmãos ficaram constrangidos.
Pediram desculpas pelas palavras.
Ludmila respondeu que não havia problema.
Comentou que muita gente na vila, pensava da mesma forma.
Com efeito, cerca de três anos depois, a moça havia quitado as parcelas do contrato firmado, e se tornara dona de todas as terras.
Não tivera filhos com Antenor.
Certo dia, Glauco e Lopes lhe perguntaram sobre isto.
Ludmila respondeu melancólica que viveram juntos por pouco tempo, e que os filhos não vieram.
Após adquirir a propriedade das terras, Ludmila perdeu o contato com os moços.
Passou a saber de suas vidas, através de notícias esparsas.
Descobriu que haviam se casado, e investido o dinheiro das terras em atividades comerciais.
Quando soube destas noticias, Ludmila desejou que fossem verdadeiras.
Comentou com seu capataz, que desejava sorte aos filhos de Antenor.
Ludmila gostava da vida na fazenda. Gostava de lidar como os animais, percorrer as plantações, ver as criações.
Gostava de ficar observando o riacho nos fundos da casa sede.
Conversava muito com o administrador da fazenda.
Fazia questão de dirigir o caminhão que levava parte da produção até a venda da vila.
Quanto ao restante da produção, os próprios compradores se encarregavam de buscar as mercadorias na fazenda.
Por lá, havia terreiros de café, locais para armazenagem das mercadorias.
Os colonos moravam em casas na fazenda.
As crianças continuavam a ter aulas na escola da fazenda.
Ludmila aproveitava para conversar com os colonos, saber de seus problemas.
Na fazenda havia uma venda, onde faziam suas despesas.

Emerson, gostava de sair para pescar aos domingos.
Ludmila aproveitava para freqüentar a missa na igreja da vila.
Conforme o tempo passava, todos especulavam se a jovem e bela mulher, se casaria novamente.
A jovem fazendeira cuidava da propriedade.
Possuía detratores e admiradores.
Cuidava da contabilidade da fazenda juntamente com o administrador, Emerson.
Também gostava de passear a cavalo pela fazenda.
Quando apeava do cavalo, geralmente a beira de um riacho, sentava-se perto de uma árvore, e ficava a pensar na vida.
Na convivência com Antenor, seus tempos de professora.
Certa vez, entretida em pensamentos, começou a jogar pequenas pedrinhas no rio.
Estava tão absorta em seus pensamentos, que não percebeu a aproximação de um estranho, que vendo-a tão entretida na tarefa, começou a jogar pedrinhas também.
Distraída, Ludmila não percebeu a aproximação e o barulho das pedrinhas.
Com o olhar perdido, a mulher estava longe dali.
Seus olhos eram tristes.
Em dado momento, o estranho a ficou observando.
Ao dar-se conta de que havia deixado de jogar pedrinhas no rio, o moço retomou sua tarefa.
Ludmila por sua vez, recostou-se na árvore.
Ficou a observar o firmamento, as nuvens, o sol que brilhava intensamente.
Quando se apercebeu que havia um estranho jogando pedrinhas no riacho, assustou-se.
Num átimo levantou-se e perguntou o que ele estava fazendo ali.
Sem graça, o moço parou de jogar pedras.
Levantou-se, pediu desculpas e perguntou se ela era a fazendeira, proprietária da fazenda.
Ludmila ressabiada, perguntou por que ele queria saber.
Comentou que ele era um estranho naquelas paragens.
Nisto o moço respondeu que se chamava Lúcio, e que estava a procura de emprego. Desta forma, reiterou a pergunta inicial.
Ludmila respondeu que sim, era a fazendeira.
Intrigada, perguntou se alguém o havia visto ultrapassar a porteira, e se havia conversado com algum empregado da fazenda.
Lúcio sorrindo respondeu que não havia conversado com ninguém, e havia sido informado na vila próxima, que estavam precisando de mão de obra na região.
Ludmila argumentou que não era costume, as pessoas chegarem a fazenda sem nenhuma referência, e sem terem sido convidadas.
Ao ouvir isto, Lúcio pediu desculpas.
Disse que precisava muito de trabalho, e que não estava em condições de aguardar o surgimento de uma proposta de emprego. Mencionou que vinha de longe, e que aceitava qualquer tipo de trabalho.
Ludmila respondeu que não poderia garantir que haveria acomodação para ele.
Lúcio respondeu-lhe que se ajeitaria em qualquer lugar. Falou-lhe que ela não precisava se incomodar.
Ludmila montou então em seu cavalo.
Recomendou ao moço que a acompanhasse.
Lúcio montou um eqüino e acompanhou-a.
A fazendeira levou-a até o pasto, onde estavam os animais.
Disse que se mostrasse habilidade em cuidar dos animais, poderia trabalhar ali.
Nisto a mulher chamou dois peões.
Pediu aos empregados que explicassem o trabalho ao moço.
Lúcio agradeceu.
Ludmila respondeu dizendo que se trabalhasse bem, poderia ficar com o emprego.
Olhando-o nos olhos, disse-lhe que se decidisse ficar, que fosse contatá-la no final do dia, para se definir onde ficaria.
Lúcio concordou.
Nisto a mulher se afastou.
Retornou a sede da fazenda.
Sentou-se em sua sala.
Chamou uma das empregadas da casa.
Perguntou se estava tudo em ordem.
A criada respondeu que as roupas estavam lavadas, passadas a ferro e engomadas.
Ludmila dirigiu-se a cozinha.
Era um lugar amplo, com forno a lenha, muitas panelas.
De vez em quando a fazendeira gostava de cuidar das refeições.
Passava horas entretida em fazer arroz, feijão, preparar um carne.
Recordava-se do tempo em que era casada com Antenor, e se ocupava desta tarefa.
Lembrava-se que o marido gostava de sua comida, elogiava seu tempero.
Rememorava as festas da igreja na vila, em que providenciava frangos assados.
Por conta disto, ficava dias na cozinha, junto as empregadas da fazenda, limpando frangos, e assando-os.
Estas ocasiões eram momentos de confraternização.
As mulheres contavam as novidades de casa, falavam do trabalho dos maridos, dos filhos.
Riam muito.
Quando era chegada a festa, Ludmila usava seus melhores trajes e seguia orgulhosa de carro, ao lado do marido.
Antenor era feliz ao lado da jovem e prendada esposa.
Ludmila relembrou-se dos bordados que fizera, a casa estava repleta de toalhas bordadas por ela.
Antenor dizia que era uma feiticeira. Em tudo o que colocava as mãos, deixava perfeito e lindo.
A mulher recordou do baile na vila em que dançou junto com o marido.
Enquanto mexia na panela com feijão, os olhos da jovem encheram-se d'água.
Jurema, ao vê-la absorta, chamou-lhe a atenção.
Perguntou-lhe se estava tudo bem.
Ludmila, enxugando os olhos, disse que estava tudo bem.
Nisto, continuou mexendo a panela.
Mais tarde, após uma tarde exaustiva de trabalho, onde teve até que segurar um touro bravo, Lúcio se dirigiu a sede da fazenda, a procura de Ludmila.
Jurema foi quem recebeu o moço.
Espantou-se quando o homem perguntou de Ludmila.
Dizia ter um assunto importante para falar com ela.
Curiosa, a mulher perguntou do que se tratava.
Lúcio respondeu que era um assunto particular.
Nisto, tirou seu chapéu, e brincando, disse que as pessoas ali, eram bastante desconfiadas.
Desta feita, comentou que a própria Ludmila pediu para que fosse até lá.
Com isto, Jurema pediu licença ao moço. Não sem antes o olhar de alto a baixo.
Dentro da casa, passou a chamar a patroa.
Ludmila, que estava na cozinha preparando o jantar, assustou-se com os gritos da serviçal.
Havia se esquecido do que havia combinado com o moço. Razão pela qual espantou-se quando soube que Lúcio estava a sua procura.
A mulher precisou de algum tempo para se recordar do combinado.
Depois de alguns minutos, a mulher dirigiu-se a varanda da sede.
Lúcio a aguardava segurando o chapéu nas mãos.
Ludmila perguntou se havia sobrevivido ao primeiro dia de trabalho.
O homem riu.
Ludmila comentou que precisava pensar onde ele passaria a noite.
Disse que havia se esquecido deste detalhe.
Motivo pelo qual não sabia onde ele poderia pousar.
Lúcio respondeu se havia celeiro na fazenda.
Ludmila respondeu que sim.
Lúcio então disse que poderia dormir por lá. Contou que iria reviver a vida dos antigos tropeiros.
Ao ouvir isto, a mulher perguntou-lhe se ele tinha conhecimento sobre a história dos tropeiros.
Lúcio respondeu que sim. Mencionou ser neto de tropeiros.
Ludmila achou interessante.
Percebendo que não havia convidado o moço para entrar, chamou-o para adentrar a casa grande.
Ao entrar na construção, passaram pela varanda, e Ludmila conduziu-o até a sala.
Quando o moço sentou-se, perguntou-lhe se gostaria de beber algo.
Lúcio agradeceu, mas disse que ela não precisava se incomodar.
Ludmila respondeu que havia uma boa aguardente guardada em sua cozinha, e que se ele quisesse, poderiam experimentar.
Nisto, pediu a Jurema que trouxesse a bebida e dois pequenos copos.
Jurema abriu a garrafa e encheu os copos.
Espantado, Lúcio perguntou se ela beberia a aguardente.
A mulher respondeu que sim.
Disse que de vez em quando gostava de beber algo mais forte.
Com isto, sorveu a bebida em um só gole.
Lúcio ficou perplexo.
Ludmila, ao ver que o moço não sorvera a bebida, perguntou-lhe se não iria beber.
Perguntou-lhe se não gostava de aguardente. Sugeriu um licor.
Sorrindo, o moço virou o copo.
Elogiou a bebida.
Comentou que nunca imaginaria que uma mulher delicada seria capaz de beber algo tão forte.
Ludmila contou adorava uma aguardente. Relatou que ajudava a aquecer a alma.
Lúcio concordou. Disse que ajudava a dormir e a sonhar com um dia melhor.
Ludmila relatou que não poderia deixar que pousasse no celeiro, posto que aquele era lugar de pouso para animais.
Lúcio comentou que entendia, mas argumentou que precisava se abrigar da chuva.
Ludmila levantou-se então. Observou pela janela. Viu um céu cheio de estrelas e uma lua cheia.
Comentou que não parecia que iria chover. Argumentou que o céu estava limpo.
Lúcio aproximou-se e também viu o céu pela janela.
Brincando, respondeu que preferia não se arriscar.
Ludmila resolveu sentar-se novamente no sofá.
Comentou que ele iria dormir em um dos quartos de hospedes. Perguntou-se estava com fome.
Lúcio respondeu que estava faminto.
O moço curioso com a imponência da construção, perguntou se era uma construção colonial.
Ludmila respondeu que era uma casa antiga, pertencente a família há quase cem anos. Contou que fora o avô de Antenor quem construíra o palacete, decorando com móveis de madeira de lei, como jacarandá, lustres importados, esculturas.
Lúcio perguntou como alguém que vivia na roça poderia ter tanto gosto para construir algo tão bonito.
Ludmila disse que na roça não havia só gente sem estudo. Pessoas saíam do campo para estudar, se instruíam e voltavam para dividir o que aprendera com os outros.
Lúcio respondeu que não tivera oportunidade de ir além do primário.
Comentou que gostaria de ter estudado mais, mas que seus pais não tinham condições de mantê-lo estudando em um colégio interno.
Ludmila falou que todos deveriam ter oportunidade de estudar pelo menos até o primário, mas que seria bom que todos pudessem estudar mais tempo. Adquirir uma profissão.
Ao ouvir isto, Lúcio relatou que tinha uma profissão. Não tinha um diploma, mas trabalhava no campo.
Ludmila, relatou que quando disse aquelas palavras, queria dizer adquirir conhecimentos técnicos. Ressaltou que o trabalho no campo também exigia conhecimento, e que uma forma de multiplicá-lo, seria profissionalizá-lo.
Ao término da explicação, percebendo o ar de interrogação do moço, respondeu que havia cursos de agronomia.
Lúcio redargüiu dizendo que havia entendido o que ela queria dizer. Ressaltou porém que era xucro demais para fazer uma faculdade. Dizia que não queria abandonar a vida no campo.
Ludmila comentou que de fato, poucos lugares ofereciam o curso.
Com isto, perguntou se Lúcio de fato, era neto de tropeiros.
Lúcio respondeu que sim.
Comentou que seu avô possuía uma capa impermeável, a qual usava em suas tropeadas juntamente com outros companheiros. Cavalgavam longas distâncias, rasgando o Brasil. Dormiam em qualquer pouso. Muitas vezes até ao relento. Protegiam-se da chuva com a aludida capa, que não deixava a água penetrar o corpo.
Levavam embornais com comidas e faziam as próprias refeições.
Aqueciam-se ao redor de fogueiras. Conversavam, contavam causos.
Tangiam bois, os quais levavam para os seus compradores.
Viviam em viagens que duravam meses.
Lúcio comentou que adorava as histórias das viagens, os perigos pelos quais passavam, as fazendas que visitavam, as pessoas que conheciam.
Lúcio comentou que seu avô conheceu a esposa, em uma de suas muitas viagens pelo Brasil afora.
O moço contou que a moça era filha de um dos colonos de uma das fazendas onde costumava pousar durante suas viagens.
Conheceram-se em uma festa promovida no vilarejo.
O homem pediu licença ao pai da moça e a convidou para dançar.
Bandeirinhas coloridas enfeitavam os céus da fazenda.
Uma fogueira complementava o cenário.
Um dos colonos tocava uma viola.
Algumas pessoas dançavam.
Com o tempo, o moço aproveitou para se encontrar com a jovem.
Daí para o casamento foi um passo.
Depois do casamento, o avô levou a esposa para longe dali.
O homem continuou as tropeadas.
O filho, seguiu os seus passos.
Com o tempo, a necessidade de grandes deslocamentos diminuiu, e a vida de tropeiros igualmente diminuiu de importância.
Desta forma, Lúcio relatou que não pode seguir a tradição da família.
Nisto o moço comentou que não iria abandonar a vida na roça, gostava do campo e não abandonaria aquelas matas, os rios e toda aquela natureza, por nada neste mundo.
Ludmila sorriu para ele, comentou que entendia toda aquela devoção.
Contou que até se casar, nunca vivera no campo, mas que ao precisar se adaptar a aquele modo de vida, percebeu que aquilo era a essência da felicidade. Revelou que se tivesse que voltar a viver na cidade, não seria mais a mesma coisa.
Lúcio rindo, disse que ela estava bem adaptada àquela vida.
Depois de alguns minutos, Jurema avisou que o jantar seria servido logo.
Ludmila agradeceu.
Com isto, alguns minutos depois, Ludmila e Lúcio se encaminharam para a sala de jantar.
Quando o moço se deparou com a imponência do lugar, ficou intimidado.
Logo perguntou se iria jantar no local.
Ludmila perguntou se havia algum problema.
Lúcio respondeu que poderia perfeitamente jantar com os outros empregados.
Ao ouvir isto, a mulher disse:
- Deixe de cerimônias. Sente-se logo que iremos jantar. Aposto que nunca comeste algo tão saboroso.
Lúcio tentou argumentar.
No que Ludmila respondeu:
- Sente-se aí! Ande, não se faça de rogado. Eu não sou de cerimônia.
Lúcio sentou-se a mesa.
Ludmila percebendo o constrangimento do moço, chamou Jurema para ocupar a mesa.
A serviçal ao ouvir o convite, não entendeu de inicio.
Tanto que pediu perdão, argumentou que não entendeu as palavras de Ludmila.
No que a fazendeira reiterou o pedido:
- Ande mulher! Sente-se, vamos jantar.
Jurema atendeu a solicitação.
E assim o trio jantou.
Comeram arroz, feijão, salada, carne.
Rindo, Lúcio comentou que fazia tempo que não comia carne.
Ao término do jantar, disse que a comida estava muito boa, e que fazia tempo em que não comia tão bem. Alegou que carne era um artigo de luxo na mesa de muitos trabalhadores, que só comiam algo assim, de vez em quando.
Ao término da ceia, Ludmila e Lúcio se encaminharam para a sala.
A fazendeira passou a se ocupar de um bordado.
Fato este que causou espanto em Lúcio.
O moço comentou que Ludmila era surpreendente.
A mulher riu.
Ludmila respondeu que não nasceu fazendeira.
Nisto a mulher ligou o rádio.
Ouviram modas de violas, canções de raiz.
Mais tarde se recolheram.
Jurema arrumou o quarto de hospedes para Lúcio.
O moço ficou em um quarto grande, espaçoso.
Ao se ver cercado de tanto luxo, Lúcio estranhou.
Demorou para pegar no sono.
Não estava acostumado com aquele modo de vida.
Ludmila por sua vez, recolheu-se para seu quarto.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

CARINHOSO - PARTE II - CAPÍTULO 1

Paralelo a isto, Ludmila administrava com mão de ferro, a fazenda que herdara do marido, recentemente falecido.
Casou-se cedo, com um homem mais velho.
Desde então, passou a viver na referida fazenda, cuidando dos afazeres domésticos.
Lavava as roupas dela e do marido, as toalhas, em um riacho existente nos fundos da casa sede.
Deixava as roupas ao sol para quarar.
Realizava o trabalho acompanhada de duas empregadas. Duas mocinhas que batiam as peças na pedra.
Enquanto trabalhavam, cantavam.
Ludmila também lavava algumas roupas.
Andava a cavalo, sendo uma exímia amazona.
Todos os funcionários da fazenda a respeitavam.
O capataz, braço direito de Antenor, chamava-a de Dona Ludmila.
Sutil, sempre que Antenor tinha alguma dificuldade, algum impasse, oferecia um conselho.
Normalista, fora professora, antes de se casar.
Durante algum tempo, o dinheiro, o ordenado ganho nas atividades docentes, auxiliaram na mantença do casal, nas despesas mais urgentes, já que Antenor estava com todo o seu dinheiro imobilizado na fazenda. Comprara reses, animais, e insumos para a fazenda.
Antenor tinha plantações, um belo cafezal, frutas e gado.
Nos primeiros anos de casada, Ludmila lecionou para as crianças na fazenda.
Rigorosa, exigia uma caligrafia caprichada e dedicação aos estudos.
Ensinava a tabuada, as primeiras letras, noções de civismo, os hinos pátrios, noções de história, ciência, geografia.
E apesar do ar severo, as crianças a adoravam.
Os empregados, os camponeses, todos eram gratos a dedicação da mulher.
Quando Ludmila deixou de lecionar, todos lamentaram.
Antenor, com o passar do tempo, decidiu contratar alguém de fora para ensinar as crianças.
Argumentava que a mulher era mais útil dentro de casa.
Primeiramente, a jovem lecionava na escola da vila perto dali.
Deste trabalho saía seu ordenado, e foi saindo da escola, após um dia de trabalho, que Antenor viu a moça, com cadernos e livros debaixo do braço.
Percebendo o fardo que a jovem carregava, ofereceu-se para ajudá-la.
Ludmila, que estava cheia de livros e cadernos para corrigir, agradeceu o oferecimento.
O homem, fazendeiro do lugar, perguntou-lhe o nome.
- Ludmila. – respondeu.
- Nome interessante! Gosto do som. – disse o homem.
A jovem comentou que nunca havia ouvido que seu nome era interessante. Alegou que era comum ouvir que tinha um nome esquisito, ou de onde haviam inventado aquele nome.
Antenor, ao ouvir as palavras da moça, caiu na risada.
Apresentou-se. Disse que morava em uma fazenda da região.
Com isto, perguntou se fazia muito tempo que estava ali, se era professora há muito tempo.
Ludmila respondeu que se formara a pouco tempo, e que estava lecionando na vila há cerca de dois meses.
Enquanto conversavam, caminhavam.
Quando finalmente chegaram na hospedaria, a moça disse-lhe que estava instalada ali.
Agradeceu a gentileza e adentrou as dependências do estabelecimento.
Antenor acenou se despedindo.
Retornou a fazenda depois de entregar algumas sacas de café e outros víveres na venda da vila.
Na Casa da Lavoura da região, adquiriu sementes para realizar novas plantações.
Frequentemente o homem se dirigia a vila para a venda parte de sua produção.
O excedente, vendia em outra cidade.
Com isto, tempos depois, lá estava Antenor novamente na porta da escola.
Ajudou novamente a jovem a carregar os materiais.
A dona da hospedaria, ao perceber que o fazendeiro estava interessado na moça, recomendou-lhe que tomasse cuidado com os galanteios de Antenor.
Curiosa, Ludmila perguntou:
- Por que deveria tomar cuidado?
Rindo, a mulher respondeu:
- Este homem é terrível! Foi com estes modos gentis e cavalheirescos que ele conquistou sua primeira esposa.
Ao ouvir isto, a moça perguntou se ele era casado.
No que a mulher respondeu que não.
Era viúvo. Fora casado há muito tempo com uma mulher. Com ela teve filhos, todos moços e morando na capital.
Dolores comentou que fazia muito tempo que ele estava só. Indiscreta, comentou que o homem estava abrindo seu coração para viver um novo amor.
Ao ouvir isto, Ludmila caiu na risada.
Dizia:
- Que bobagem!
O tempo porém, demonstraria o contrário.
Com o decorrer dos meses, as conversas esporádicas passaram a ser freqüentes.
Como a jovem não possuía família na região, Dolores se incumbiu de auxiliar a moça a preparar um enxoval.
Ajudou-a a bordar peças.
Antenor presenteou-a com peças de linho.
Dizia para quem quisesse ouvir, que Ludmila teria sempre do bom e do melhor.
Para o casamento, o homem mandou abater um boi e a festa durou dois dias.
Pediu a mão da moça para a dona da pensão.
Ludmila contudo, conviveu pouco tempo com os filhos do fazendeiro.
Com o casamento, o homem realizou a partilha de todos os seus bens.
Seus filhos receberam parte das terras.
Contudo, como viviam na cidade, não tiveram interesse em tomar posse das terras.
Com isto, Antenor continuou a cuidar das terras.
De fato, Ludmila continuou a lecionar na escola da vila.
Antenor a levava e buscava todos os dias em uma caminhonete.
Dolores apreciava a cena de longe.
Admirava a dedicação de Antenor a Ludmila.
Quando o homem faleceu, todos na vila foram até a fazenda acompanhar o velório.
Antenor era muito querido na região.
Seus filhos, ao tomarem conhecimento da morte do pai, através do um telegrama, se dirigiram a fazenda.
Glaucio e Lopes, ao conhecerem a madrasta, não foram nem um pouco amistosos.
Disseram-lhe que ela não tinha direito a nada, e que vieram buscar o que lhes era de direito.
Ludmila, fragilizada pela morte do companheiro, respondeu-lhes que aquele não era o momento para se falar de herança.
Os rapazes tentaram argumentar, mas Ludmila irritada, disse que exigia respeito no que tocante a memória de Antenor. Alegou que estavam em um funeral, e que deveriam guardar luto. Depois poderiam conversar, discutir se preciso fosse. Mas aquele momento era sagrado.
Glaucio e Lopes tiveram que se calar.
Envergonhados, perceberam que todos olhavam para eles.
Empregados da fazenda, conhecidos, amigos de Antenor. Todos os fitavam com ar de reprovação.
Durante o velório, foram providenciadas flores.
Ludmila cuidou do corpo do marido.
Antenor faleceu em virtude de um ataque cardíaco.
Estava em cima de um cavalo.
Foi trazido para a sede por empregados da fazenda.
Na sala da fazenda, carpideiras choravam e entoavam canções, homenageando o morto.
Todos estava pesarosos.
Comentários sobre as virtudes do falecido, vinham de todos os recantos.
Todos davam condolências a jovem viúva.
Mais tarde, saiu um cortejo da fazenda.
O corpo foi enterrado no cemitério da propriedade.
Um padre fez algumas orações.
Ludmila jogou flores no caixão.
No dia seguinte ao enterro, Glauco e Lopes indagaram a respeito da herança.
Ludmila, com toda a segurança, disse que antes de se casarem, Antenor providenciou a partilha de parte dos bens, e que eles nunca se interessaram em cuidar do próprio patrimônio.
Ao ouvir isto, os moços tencionaram discutir, mas Ludmila argumentou que as terras continuavam lá. Mencionou que Antenor, mesmo decepcionado com o pouco caso dos filhos, continuou a cuidar das terras, como se ainda lhe pertencesse. Alegou que todos os rendimentos das terras foram repassados a eles, e que Antenor somente ficava com o valor necessário para se recompor das despesas.
Glauco comentou que ele não fizera mais do que a obrigação.
Ludmila irritou-se ao ouvir isto. Disse que ele não tinha obrigação alguma de cuidar de algo que não mais lhe pertencia. Comentou que estava surpresa com a falta de coragem e de iniciativa deles.
Nisto, argumentou que havia contatado o advogado de confiança do marido, e que ele lhe informara que a primeira partilha se tratava do patrimônio concernente a mãe deles. A meação.
Mencionou também que em razão da idade de Antenor, menos de sessenta anos, não havia necessidade de nenhuma providência legal com relação a outra metade da herança.
Ludmila comentou que Antenor falhara em não partilhar os bens, logo que a esposa falecera.
Lopes respondeu-lhe que era menor quando sua mãe faleceu.
Ludmila falou então, que eles não precisavam se preocupar. Relatou que o causídico estava cuidando da legítima.
Como os moços tivessem um ar interrogativo, a mulher explicou que se tratava da parte que lhes competia na herança.
Lopes e Glauco indagaram Ludmila, perguntaram como poderiam ter certeza de que todas as providências necessárias estavam sendo tomadas.
Ludmila respondeu que eles também poderiam constituir um advogado e ingressar com uma ação judicial, caso tivessem interesse.
Foi o bastante para a dupla calar-se.
Nisto, tempos depois, as terras foram novamente divididas.
Ludmila contatou-os.
Exigiu que comparecessem a fazenda.
Quando os rapazes chegaram, Ludmila chamou-os para uma conversa.
Havia contatado seu advogado de confiança.
Na frente do causídico, a mulher respondeu-lhes que providenciaria a demarcação de sua parte nas terras, e que, ao contrário do marido, não continuaria a cuidar das terras deles. Argumentou que necessitava de uma contrapartida, já que eles possuíam a maior parte do latifúndio original.
Ao ouvir isto, Lopes e Glauco protestaram. Argumentaram que não sabiam administrar uma fazenda. Não sabiam o que fazer com as terras.
A mulher, ao ouvir as palavras dos moços, comentou que já era hora deles aprenderem a cuidar de suas terras.
Glauco, tentando negociar, sugeriu que ela comprasse as terras deles.
Comentou que com dinheiro sabia lidar, mas com terras não.
Ludmila respondeu que não tinha dinheiro suficiente para adquirir três quartos, do que fora a fazenda original.
Lopes chegou a propor um parcelamento.
Ludmila poderia continuar cuidando das terras, como se fora uma meação.
Parte do investimento ficaria com eles, e outra parte ficaria com ela, para se recompor das despesas e para juntar dinheiro para comprar a parte deles.
Ludmila, ao tomar conhecimento da proposta, não a julgou interessante. Argumentou que estava se inteirando dos negócios do marido. Mencionou que fazia poucos meses que estava administrando a fazenda. Não sabia se conseguiria juntar dinheiro suficiente para tanto.
Glauco respondeu-lhe que durante todo aquele tempo, ela estava dando continuidade ao trabalho de Antenor, e que não tinha senões a fazer. Comentou que confiava em sua competência, e que tudo daria certo.
Curiosa, Ludmila perguntou em quanto tempo, e quantas parcelas precisariam serem pagas.
Com isto, foi firmado um contrato de venda e compra, com clausulas estipulando as condições da venda, os encargos de Ludmila.
Mais tarde, após assinarem o contrato, os moços pediram para caminhar pela fazenda.
Ludmila autorizou-os. Disse-lhes que eram donos de boa parte daquelas terras.
E assim, calçando botas, os rapazes passearam pelas cocheiras, viram cavalos, bovinos.
Cavalgaram.
Recordaram-se da infância ao lado de Antenor e Melissa.
Glauco e Lopes, avistaram a escola onde aprenderam as primeiras letras.
Neste momento, se depararam com Ludmila, que ao vê-los, apeou do cavalo.
Perguntou-lhes se estavam se recordando do passado.
Os moços disseram que estudaram na escola da fazenda.
Ludmila respondeu que já lecionou naquela escola.
Os jovens ao ouvirem a palavra da mulher, ficaram surpresos.
Ludmila respondeu-lhe que fora normalista, e que chegou a exercer a função. Comentou que foi como professora que Antenor a conheceu, e que seu dinheiro como professora primária, pagou muitas despesas domésticas.
Lopes argumentou que nunca imaginou que ela pudesse ter sido uma professorinha.
Glauco completou dizendo que quem a via percorrendo as terras a cavalo, não imaginava que ela poderia ter uma formação tão citadina. Comentou que ela parecia ter nascido daquela terra.
Ludmila falou que aprendeu a gostar daquela terra.
Conversou com os moços. Respondeu que fora muito feliz ao lado de Antenor, vivendo como uma autentica dona de casa.
Porém, com sua morte, precisava cuidar da fazenda.
Incumbida da função de administradora dos interesses dos moços, mais tarde, Ludmila mostrou as terras dos moços, explicou-lhe sobre as culturas que estavam sendo realizadas no local, os animais que estavam sendo criados.
Glauco e Lopes, se impressionaram com o cuidado da moça.
Ludmila providenciou instalações independentes.
Tudo funcionava de forma independente.
A mulher argumentou que tomou este cuidado, no caso dos moços resolverem tomar a frente administração das terras. Mencionou que apenas não havia casa, mas que caso tivessem interesse, isto poderia ser providenciado. Relatou apenas, que não poderia garantir instalações de luxo. Mas que teriam uma casa segura.
A propósito, a sede da fazenda é uma construção colonial, com móveis antigos. Erguida com muito luxo e requinte.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

CARINHOSO - PARTE I - CAPÍTULO XVIII

Felipe ao tomar conhecimento disto, comentou que Leila devia estar bastante aborrecida com a imposição.
Osvaldo comentou então que poderiam conversar a sós.
Porém, mesmo à distância, ficaria de olho neles.
O moço agradeceu o voto de confiança.
Com isto, aproximou-se da moça, que não fez questão de cumprimentá-lo.
Felipe aproximou-se dela, e segurou suas mãos. Pediu-lhe para que olhasse para ele.
Leila não fazia questão de atendê-lo.
Permaneceu indiferente olhando para os móveis, a parede da sala. Menos para ele.
Impaciente, Felipe segurou seu rosto.
Leila assustou-se com o gesto brusco.
Nervoso, Felipe comentou que ela estava sendo caprichosa e que não tinha o direito de maltratá-lo daquela maneira.
Leila irritada, exigiu que ela a soltasse.
Felipe porém não a atendeu.
Disse que somente a soltaria quando ela lhe dissesse com todas as letras, que não gostava dele, e que ele poderia sumir de sua vida, pois não se importava.
Leila relutou em repetir aquelas palavras. Argumentou que ele estava pedindo para ser humilhado.
Felipe no entanto, insistiu.
Irene ao ver a cena, tencionou intervir, mas Osvaldo aconselhou-a a não ir até a sala.
Comentou sorridente que algo lhe dizia que eles acabariam por se entender.
Irene comentou que Felipe estava sendo bruto com sua filha.
Osvaldo retrucou que bruto não, apenas enérgico.
Leila então, mirando-o, ao notar que Felipe não desistiria, disse-lhe que não interessada em casamento, ainda mais com ele, depois de tudo o que ele fizera. Comentou que se ele mentira para ela uma vez, quem garante que tal fato não ocorreria outras vezes?
Felipe olhando-a nos olhos, prometeu que não.
Disse-lhe que estava arrependido, e que estava interessado em construir o relacionamento deles em bases sólidas.
Nisto, percebendo a mágoa da moça, Felipe relatou que contou aos pais sobre seu interesse em casar-se e que eles estavam interessados em conhecê-la.
Leila desviou os olhos dele.
Nisto, soltando a moça, Felipe argumentou que ela não respondera suas perguntas.
Leila respondeu que não sabia o que dizer.
Felipe então segurou novamente seu rosto.
Disse que só desistiria dela se tivesse certeza absoluta de que ela não tinha interesse em casar-se com ele. Com isto, insistiu para que ela dissesse que não gostava dele.
Leila afastando suas mãos, disse para que a deixasse em paz.
Nervoso, Felipe aproximou-se dela e falou-lhe que se ela não gostava dele poderia dizer-lhe.
Argumentou que agüentaria sofrer mais uma decepção. Relatou que não seria a primeira vez que passaria por aquilo. Falou apenas, que seria a primeira vez que ouviria um não de alguém de quem tinha muita estima, muito afeto.
Ao ouvir isto, Leila perguntou-lhe por que estava insistindo tanto nisto. Mencionou que com o dinheiro que possuía, poderia ter qualquer mulher que quisesse.
Felipe respondeu-lhe que qualquer mulher, poderia ser realmente isto, uma mulher qualquer. Até mesmo uma interesseira, uma golpista, alguém somente interessada em seu dinheiro.
Leila indagou se fora por isto que ele omitira que era rico.
Nervoso, Felipe respondeu que estava cansado de explicar que tudo fora resultado de uma série de mal entendidos, e que nunca tivera a intenção de enganá-la. Argumentou que nunca lhe passou pela cabeça que ela era uma interesseira.
Sorrindo, o moço comentou que gostou dela desde o início.
Teimoso, Felipe comentou que se ela relutava tanto em dizer-lhe o que estava pedindo era por que não o desgostava, e assim sendo, não havia motivo para não se casar com ele.
Leila, ao ouvir isto, enervou-se.
Argumentou que ele não estava em condições de realizar pré-julgamentos.
Nervosa, gritou que não gostava dele.
Tal fato chocou Felipe, que magoado, pediu para que ela continuasse.
Nisto, Leila respondeu com os olhos cheios de água e quase gaguejando, que não queria se casar com ele, que ele não significava nada para ela.
Em seguida, começou a chorar.
Felipe ao perceber isto, abraçou-a.
Começou a chorar também.
Nervoso, começou a pedir-lhe desculpas. Disse que nunca lhe esconderia nada.
Comentou que se ela queria fazer a tão sonhada faculdade, poderia fazê-la, não se oporia.
Irene, ao presenciar a cena, sorriu cúmplice para o marido.
Curiosa, perguntou-lhe como sabia que eles se entenderiam.
Osvaldo respondeu que não sabia. Apenas tinha uma forte crença de que tudo daria certo.
Dias mais tarde, a família da moça foi convidada para conhecer a casa do moço.
Irene, Osvaldo e Leila usaram suas melhores roupas.
Encantaram-se com a imponência do palacete da família Oliveira.
Ao entrarem na casa, foram recepcionados pelo mordomo, que os convidou para adentrarem a casa e se instalarem na grande sala.
Solícito, o homem perguntou se gostariam de beber algo.
Osvaldo agradeceu, mas respondeu que não.
Perguntou onde estavam os donos da casa.
O mordomo respondeu que logo eles desceriam para conversar com eles.
Com efeito, primeiro apareceu Fábio que cumprimentou a todos.
O homem encantou-se com a beleza da noiva do filho.
Disse a moça que compreendia por que Felipe havia se encantado tanto com ela.
Leila agradeceu o elogio.
A seguir, eis que surge Fátima, que também elogiou a moça, e o bom gosto em se vestir. Recomendou que todos se sentisse à vontade, pois estavam em casa.
Com isto, Fátima ofereceu um licor aos convidados.
Uma criada serviu a todos.
Por último, Felipe se apresentou aos convidados.
Pedindo licença a todos, pediu para sentar-se ao lado de Leila.
Osvaldo e Irene, concordaram.
Brincando, Fábio comentou que ele precisava formalizar o pedido, já que pedira Leila em casamento, de uma forma pouco usual.
Felipe então, segurando a mão direita da moça, sorriu ao perceber que ela sustentava o solitário com o qual a havia presenteado durante o jantar no Rio de Janeiro.
Mais tarde, Felipe reiterou o pedido de casamento aos pais da moça, os quais concordaram com a proposta.
Leila por sua vez, e pela primeira vez, respondeu que sim. Aceitava casar-se com ele.
O aceite foi aplaudido por todos.
Para o jantar, Fátima mandou preparar uma refeição simples.
Irene, ao perceber a simplicidade da ceia, agradeceu a atenção da anfitriã. Disse que de fato, não sabia utilizar aquela enorme quantidade de talheres.
Sorrindo Fátima respondeu que aprender era uma questão de tempo.
Simpática, comentou que não nascera rica, e que ao receber a herança do filho, precisou aprender. Relatou que para isto, foi assessorada por parentes e profissionais.
Irene ficou perplexa. Tanto que perguntou:
- Você já foi pobre como nós?
- Nós já fomos pobres, sim. Hoje temos dinheiro em virtude de uma herança de Felipe. Mas o dinheiro já foi contado em nossas vidas. Já tivemos nossas dificuldades, as quais não foram poucas. Dificuldades de todo o trabalhador brasileiro. A senhora deve saber disso!
Irene, ao tomar conhecimento disto, ficou encantada. Comentou que desde o início percebera que ela não era uma mulher arrogante.
Osvaldo perguntou a Fábio se ele já trabalhara em fábrica.
O homem respondeu que sim.
Ao término do jantar, Felipe pode ficar um pouco a sós com Leila.
Passearam pelo jardim da mansão.
Leila comentou durante o passeio, que os pais dele eram muito simpáticos.
Felipe concordou.
Relatou que eles foram pobres, e que ele só soube o que era ter dinheiro, depois dos dez anos de idade. Daí em diante passou a estudar em internatos, e até no exterior. Precisava ser preparado para administrar a fortuna que herdara. Formou-se em direito, e quando finalmente terminou os estudos, tinha um grupo empresarial para administrar.
Comentou que as empresas foram montadas por seu tio Epaminondas, e que seu pai também tinha seu comércio, seus negócios, independentes da fortuna dele.
Felipe comentou que através de um empréstimo de parte de seu patrimônio, seu pai conseguiu amealhar patrimônio. Foi tão bem sucedido no empreendimento que conseguiu devolver o dinheiro emprestado, e hoje não precisa da ajuda financeira de ninguém para sustentar um bom padrão de vida.
Leila ficou impressionada com o relato.
Felipe mostrou-lhe uma bonita fonte que havia no jardim.
Comentou que se tratava de uma bela mansão onde passara alguns bons momentos de sua vida. Contou que em criança, brincou muito em meio àquelas plantas. Que foi muito feliz ali.
Felipe e Leila, caminharam de mãos dadas.
Quando retornaram a sala, Irene e Osvaldo chamaram a moça.
Comentaram que a visita se alongara e que precisavam voltar para casa.
Osvaldo argumentou que precisaria trabalhar no dia seguinte, e que precisava acordar cedo.
Fátima e Fábio lamentaram a despedida, mas compreendendo o fato, despediram-se da família.
Fábio comentou que precisavam se encontrar mais vezes.
Osvaldo concordou. Mencionou que ocasião para isto, não faltaria.
Felipe despediu-se de todos.
Quanto a Leila, pediu para ficar um pouco a sós.
E assim, afastando-se um pouco de todos, conduziu a moça a entrada da casa e abraçou-a.
Olhando-a nos olhos disse que ficaria com saudades.
Leila riu.
Despediram-se.
Dois meses depois, Felipe e Leila casaram-se.
Epaminondas foi o padrinho do casal, acompanhado de sua esposa.
Colegas de Felipe, amigos das famílias, colegas de trabalho de Leila, todos compareceram ao casamento.
A imprensa fotografou o casal.
A foto do casamento ilustrou a coluna social de um dos jornais da capital.
Leila fez a almejada faculdade.
Tornou-se braço direito do marido, no Grupo Oliveira.
Para desespero de Fábio e Osvaldo que achavam que ela deveria ficar na casa montada para o casal, administrando o lar, e cuidando dos filhos que viriam.
E os filhos vieram.
Dois.
O tempo passou e Felipe continuou trabalhando a frente da empresa.
Todos os anos, no dia onze de agosto, se encontrava com os colegas da faculdade.
Reuniam-se para confraternizarem.
Contavam anedotas. Falavam dos tempos de faculdade, do tempo em que Felipe freqüentou o teatro com bastante freqüência, de seu interesse pela carreira artística.
Todos riam.
Com o tempo, começaram as ausências.
Colegas que faleceram.
Todos lamentavam as ausências.
Os mais chegados se entristeciam.
Mas a vida prosseguia.
O Felipe ainda permaneceu por muitos anos, cuidando da empresa.
Até passar a administração dos negócios para os filhos.
Trabalhou por mais de quarenta anos na empresa.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

CARINHOSO - PARTE I - CAPÍTULO XVII

Felipe, estava decidido a se entender com Leila.
Atendeu telefonemas, visitou a tecelagem, participou de uma reunião.
Estava interessado em realizar anúncios de seu comércio nos muros da cidade. Pensou até em utilizar a televisão e o rádio.
Mais tarde, foi até a residência da moça.
Irene estranhou quando a filha se apresentou na sala toda arrumada para se encontrar com o rapaz.
Nas últimas semanas Leila estava mais recolhida, e somente saía com seus colegas.
Em razão disto, Irene chegou a pensar que o casal havia rompido.
Chegou a conversar com a filha sobre o assunto, mas Leila a todo o momento desconversava.
Leila despediu-se dos pais.
Irene recomendou-lhe então, que não voltasse tarde. Relatou que ela estava muito estranha.
Leila respondeu que estava tudo bem.
Irene pediu para que tivesse cuidado. Argumentou que a reputação de uma moça era tudo.
Com isto, pediu para que o marido a acompanhasse até a porta.
Felipe saiu do carro.
Dirigiu-se até a entrada da casa, cumprimentou o homem, e pedindo licença, conduziu Leila até o carro, fechando a porta do veículo para ela.
Felipe dirigiu até o aeroporto.
Leila, ao perceber isto, perguntou-lhe para onde estava indo.
Sorrindo, o moço respondeu que a estava levando para jantar em um dos melhores restaurantes que ele conhecia.
A moça indagou do por quê da escolha.
Felipe respondeu-lhe que quando ela pusesse os pés no restaurante, entenderia.
Nisto, o casal adentrou o aeroporto.
Felipe, munido de duas passagens, recomendou-lhe que o seguisse.
Com isto, o casal voou para o Rio de Janeiro.
Não sem alguns protestos e questionamentos de Leila, que não estava compreendendo o que estava acontecendo.
A moça respondeu que não iria viajar com ele, que não tinha bagagem, e que tudo aquilo era muito estranho.
Felipe segurando suas mãos, dizia-lhe a todo o momento para que não preocupasse. Respondeu que não a estava seqüestrando.
Assustada, Leila perguntou-lhe se não poderiam conversar em São Paulo.
Felipe disse-lhe que precisava lhe mostrar um lugar que considerava muito especial. Visando acalmá-la, disse-lhe que poderia contatar seus pais, quando lá chegasse.
Com isto, rumaram em direção a cidade maravilhosa.
Quando chegaram na cidade, Felipe e Leila saíram de táxi do aeroporto.
Seguiram pelas ruas da cidade.
Avistaram algumas praias, e alguns cartões postais da cidade.
Leila ficou encantada com a beleza da cidade.
Ao perceber o deslumbramento da moça, Felipe comentou que a cidade a noite era esplendorosa, mas que o melhor da cidade era observá-la de dia.
Quando chegaram no restaurante, Leila ficou impressionada com a imponência da construção.
Felipe respondeu-lhe que muita gente ilustre já havia freqüentado o lugar.
Leila pode observar fotografias de alguns artistas no local.
Assim, que adentraram o restaurante, foram recepcionados por um garçom que os conduziu a uma mesa centralizada do lugar.
Acomodados, Felipe perguntou a Leila se gostaria de telefonar para os pais.
A moça respondeu que mais tarde ligaria.
Comentou que se dissesse que estava em um restaurante no Rio de Janeiro, ninguém acreditaria. Ressalvou que nem ela mesma estava acreditando no que estava acontecendo.
Nisto, Felipe abriu sua maleta e sacou um presente.
Quando Leila viu o pacote, percebeu que se tratava do perfume que o moço havia comprado naquela tarde.
Felipe respondeu-lhe que aquele perfume era para ela.
Leila por sua vez, fez menção de recusar.
No que Felipe retrucou dizendo que não aceitaria nenhuma recusa.
Argumentou que não estava querendo comprá-la. Só estava sendo ser gentil com uma pessoa especial para ele.
Aproveitando o ensejo, comentou que quando fingira ser um simples motorista particular, não o fizera com a intenção deliberada de enganá-la.
Repetiu que ficou temeroso em contar a verdade, e ela pensar que ele estava brincando. Comentou que desde que a vira pela primeira vez, notou que ela era uma pessoa especial, e não queria correr o risco de ficar sem sua presença.
Por fim, comentou que ela não era uma pessoa fácil, e que seria muito difícil fazê-la se convencer de que era um empresário.
Ao ouvir estas palavras Leila respondeu:
- Ah, que bom! Agora a culpa por sua covardia é minha!
Felipe entendeu o ponto de vista da moça.
Disse-lhe que ela não era culpada de seus gestos impensados.
Indagou porém, que de fato seria difícil de acreditar que a pessoa que está ao seu lado é abonada. Em seguida, comentou que já foi enganado por uma moça, que fingira ser uma doce criatura, mas que só estava interessada em seu dinheiro. Quase as lágrimas, comentou que fora sim um covarde, e que teve medo de que ela pudesse ser uma interesseira.
Magoada, Leila respondeu:
- Poxa vida! Que bom conceito você tem das mulheres!
Nisto, o moço segurou novamente as mãos da moça. Pediu-lhe desculpas.
Olhando-a nos olhos, assegurou que estava disposto a desfazer o equívoco. Disse que se ela aceitasse ficar com ele, começariam um relacionamento em um novo patamar.
Nisto, o moço sacou um novo presente de sua maleta.
Tratava-se de uma caixa menor, toda forrada.
Presente o qual o moço aproximou de Leila e pediu-lhe para que abrisse.
A moça meio sem jeito, abriu a caixinha.
Dentro havia um anel com um exuberante brilhante.
Animado, Felipe respondeu-lhe que passara parte do dia do escolhendo o mimo em seu escritório. Comentou que chamou o joalheiro pessoalmente em seu escritório para poder fazer a escolha do melhor presente para ela.
Leila olhava para a jóia reluzente.
Em dado momento, fechou a caixa e empurrou o presente em direção a Felipe.
Ao notar o gesto, o moço ficou deveras desapontado.
Leila respondeu-lhe que não poderia ficar com o presente.
Felipe por sua vez, arrastou a caixinha novamente em direção a moça.
Leila continuava relutando.
O moço então, segurou a caixa, abriu-a, e segurando a mão direita da jovem, colocou o anel em seu dedo.
- Lindo! Não? - falou o moço.
Leila continuava insistindo em não aceitar o presente.
Felipe, ao ouvir novamente a moça dizer-lhe que não poderia aceitar o presente, disse:
- Espere um pouco. Eu ainda não acabei de dizer o que tinha para falar. - começou o moço - Eu sei que não estamos nos entendendo, mas eu quero que saiba que te estimo muito, e que se estou tentando fazer com que entenda meus motivos, não é por que queira posar de bom moço... Estou nervoso... O que eu quero dizer é ... você aceitaria se casar comigo?
Leila ao se ver com um anel de brilhantes no dedo e uma proposta de casamento, ficou sem palavras.
Nervoso, Felipe instou-a a dizer algo. Comentou que precisava de uma resposta.
Leila respondeu que não sabia o que dizer.
Felipe insistiu para que dissesse sim ou não, para que não perdurasse aquele silêncio constrangedor.
Tentando provocá-la, comentou que ele havia deixado sua covardia de lado.
Leila respondeu-lhe que não estava sendo covarde.
Felipe brincando, sugeriu jantarem.
Depois da refeição ela poderia apresentar sua resposta.
Ao ouvir falar em jantar, Leila comentou que já devia ser muito tarde.
Com isto, pediu ao moço que a levasse de volta para casa.
Felipe porém, se recusou. Argumentou que não sairia dali enquanto não degustasse um lauto jantar. Recomendou a moça que fizesse o mesmo.
Nervosa, Leila comentou que seus pais deviam estar preocupados com sua demora.
Felipe, num gesto cavalheiresco, comentou que ele a levaria de volta para casa, e que ao lá chegar, conversaria com seus pais, e explicaria o que acontecera. Ressaltou que não iria lhe causar problemas.
Apreensiva, Leila respondeu-lhe que já estava encrencada.
Nisto, cearam.
Felipe escolheu os pratos.
Nervosa, Leila comentou que não sabia quais talheres deveriam ser utilizados.
Felipe explicou-lhe.
Beberam vinho.
Ao término da refeição, Felipe cobrou-lhe uma resposta.
Leila respondeu-lhe que não poderia se casar com ele.
- Por que não? – indagou o moço.
Leila explicou-lhe que ele não confiara nela e que confiança é a base de toda e qualquer relação.
Felipe respondeu que sim, confiava nela, ou não lhe contaria tudo o que se passava em seu coração.
Nervoso, pediu-lhe que segurasse suas mãos.
Contou-lhe que entenderia se ela não quisesse se casar com ele, mas que para isto, teria que usar argumentos mais fortes.
Irritada, Leila respondeu que não se sentia preparada para se casar.
Felipe, olhando-a nos olhos, disse que entendia sua confusão.
Nisto, aproximou-se da moça, e falou-lhe que aquele gesto dissiparia toda a confusão.
Felipe pediu a jovem para que se levantasse.
Leila mecanicamente, atendeu ao pedido.
Com isto, Felipe segurou-a nos braços e beijou-a.
Ao término do beijo, Leila olhou nos olhos de Felipe e perguntou um tanto sem jeito:
- Por que você fez isso?
- Por que tive vontade. – respondeu de pronto o moço.
Leila por sua vez, vendo que ainda estava nos braços de Felipe, procurou se desvencilhar dele.
O moço, percebendo a inquietude da jovem, soltou-a.
Leila por sua vez, pediu para irem embora.
Nisto a dupla seguiu de táxi até o aeroporto, e de avião, retornou para São Paulo.
Leila, exausta, dormiu durante o vôo e Felipe carregou-a nos braços até o carro, o qual estava estacionado no aeroporto.
Lá, acomodou a moça no banco da frente.
Nisto, o rapaz guiou o veículo até a casa de Leila.
Ao lá chegar, o moço acordou a jovem. Disse-lhe que ela estava em casa.
Sonolenta, Leila foi conduzida por Felipe até a porta da casa.
Irene recebeu a filha.
Irritada, perguntou:
- Isto, são horas?
Felipe procurou se desculpar. Argumentou que ao lado de Leila as horas não passam, voam.
Nisto a mulher recomendou que ambos entrassem na residência.
Felipe explicou que havia levado a moça para jantar em um restaurante no Rio de Janeiro.
Os pais de Leila não acreditaram muito na história.
Felipe então explicou que trabalhava no Grupo Oliveira, ocasião em que apresentou um cartão da empresa. Disse que estava disposto a se casar com Leila, mas que a moça estava um tanto quanto relutante em aceitar a proposta.
Osvaldo respondeu que naquelas circunstâncias, não cabia relutância.
Leila sonolenta, respondeu que não queria casar.
Osvaldo retrucou, dizendo que ela estava sim, em idade de se casar.
Leila ao ouvir estas palavras, ficou aborrecida.
O homem então, disse-lhe que Felipe havia feito uma proposta correta e que ela não tinha motivos para recusar. Afinal de contas, se não possuía interesse em casar-se com o rapaz, porque acompanhá-lo em um jantar, ainda mais em um lugar tão distante?
Leila não teve como argumentar.
Felipe explicou aos pais da moça, que Leila só descobriu que ele tinha posses recentemente, devido um equívoco. Comentou que não fizera um papel bonito ao não lhe contar a verdade.
Osvaldo e Irene, ao ouvirem as palavras do moço, perceberam que a filha não contara tudo o que estava acontecendo.
Surpresa, Irene disse-lhe que ele não fora correto com sua filha.
Leila tentava ouvir a tudo, fazendo um grande esforço para se manter acordada.
A certa altura, já acomodada no sofá, adormeceu.
Quando Irene percebeu e fez menção de acordá-la, Felipe pediu para que não o fizesse. Argumentou que a viagem fora longa e que ela precisava dormir um pouco para poder trabalhar naquele dia, que estava apenas começando.
Ao ouvir isto, Osvaldo perguntou se era realmente necessário que ela continuasse trabalhando.
Felipe respondeu-lhe que se a proibisse de continuar trabalhando, Leila iria se rebelar.
Comentou que se estava difícil convencê-la a casar-se com ele sem impor condições, e que se caso o fizesse, ela não o aceitaria. Argumentou que não precisava entrar em guerra com a moça. Sorrindo disse que tudo se acomodaria com o tempo.
Osvaldo concordou.
Comentou impressionado que ele era muito maduro para a pouca idade que tinha.
Felipe explicou-lhe que vinha se aconselhando com seu tio. Este sim, um homem deveras experiente.
Osvaldo então, mesmo a revelia da filha, concedeu sua mão em casamento.
Ao tomar ciência da concordância dos pais da moça, no tocante ao casamento, Felipe indagou se isto não seria um problema, caso ela resistisse a idéia.
Osvaldo comentou que num primeiro momento ela certamente se oporia, espernearia. Mas que depois, acabaria concordando.
Fazendo uso das palavras de Felipe, argumentou que com o tempo, tudo se ajeitaria, e que alguém que havia promovido um encontro como aquele, não teria grandes dificuldades para tanto.
Irene, num sorriso cúmplice, comentou que conversaria bastante com sua filha.
Felipe respondeu que conversaria com seus pais.
Mencionou que eles tinham conhecimento de que ele tinha interesse em alguém, mas que não detalhou o que estava acontecendo.
Nisto, Osvaldo levou a filha para o quarto.
Ao retornar, Felipe cumprimentou o casal e se despediu.
Feliz, o moço rumou para casa.
Naquele dia, o jovem acordou algumas horas mais tarde e se dirigiu para o trabalho.
Mais tarde, conversou com os pais a respeito de Leila.
Contou sobre o início do relacionamento, da mentira que pregara na moça. Comentou que estava tentando se redimir diante de Leila, mas que o perdão estava difícil de ser alcançado.
Fátima, ao tomar conhecimento da história, censurou o filho. Argumentou que ele não fora correto com a moça.
Ao ouvir isto, Felipe começou a rir. Comentou que a mãe da moça lhe disse as mesmas palavras.
Fátima retrucou dizendo que não sem razão.
Nisto, o moço continuou relatando que tinha o apoio dos pais da moça.
Por fim, Fátima comentou que se a jovem estava tão ofendida, era por que de fato, não estava interessada no dinheiro dele. Relatou que Leila era uma moça de valor.
Confessou que gostaria de conhecê-la.
Sorrindo, Felipe respondeu-lhe que sim, ela era encantadora. Trabalhadora, determinada.
Fábio parabenizou o filho.
Felipe comentou que havia pedido a mão da moça em casamento, e que contava com a cumplicidade dos pais de Leila para convencê-la a casar-se com ele.
Comentou cheio de esperança, que seria apenas uma questão de tempo, para que voltassem a se entender.
Fátima comentou que faria orações para que tudo desse certo.
A seguir, abraçou o filho.
Quando Felipe se dirigiu a casa de Leila, encontrou-a amuada.
Osvaldo e Irene comentaram que ela estava ciente de que haviam concordado com o pedido de casamento, e que não cabia a ela questionar.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.


terça-feira, 30 de março de 2021

CARINHOSO - PARTE I - CAPÍTULO XVI

Com isto, passou o dia ocupado.
Ao fim das seis horas, pegou o telefone.
Não teve coragem de discar o teclado.
Titubeou por várias vezes. A falta de coragem o fez desistir.
No dia seguinte, a cena se repetiu.
Felipe não teve coragem para telefonar para a moça.
Leila começou a estranhar a ausência de Felipe.
Decidiu se dirigir a casa de Epaminondas.
Nisto, quando Epaminondas soube que a moça estava na ala dos empregados, contatou Felipe.
O moço, ao tomar conhecimento do fato, se encaminhou apressadamente para a casa do tio.
Quando chegou no local, a moça o aguardava.
Leila estava confusa.
Ao ver Felipe usando um terno sofisticado, e o modo como Epaminondas o recebera, se recordou das últimas conversas com ele.
Leila trêmula, começou a balbuciar algumas palavras.
Falou-lhe que ele não era motorista.
Felipe respondeu com os olhos mirando o chão da sala, que não.
Decepcionada, Leila perguntou-lhe por que o havia enganado.
Felipe ainda olhando para o chão, respondeu que não a havia enganado.
Argumentou que tudo não passava de um equívoco. Relatou que tentou lhe contar a verdade, mas que não teve coragem. Disse que temia sua reprovação.
Leila respondeu que não esperava isto da parte dele. Mencionou que contou para ele coisas que poucas pessoas próximas a ela tinham conhecimento.
Disse que ao comentar sobre seu projeto de fazer um curso superior, suscitou muita reprovação em sua família e que por esta razão, comentava o assunto com poucas pessoas. Contou que confiou nele, mas que a recíproca não fora verdadeira.
Felipe tentou se desculpar, mas Leila respondeu-lhe não aceitava suas desculpas.
Nervosa, perguntou qual era o tamanho da mentira.
Felipe ficou paralisado.
Irritada, Leila perguntou-lhe se era casado.
Felipe surpreso respondeu que não.
Tentando organizar as palavras, reiterou que não era casado.
Argumentou que morava na casa dos pais, os quais não sabiam de nada.
Leila entendeu o por quê do moço não apresentá-la a sua família.
Felipe respondeu que não podia apresentá-la antes de contar a verdade a todos.
Mencionou que trabalhava nas Empresas Oliveira.
Epaminondas contou que ele não era o dono das empresas.
Leila perguntou quem era.
Felipe continuava olhando para o chão.
A certa altura, Leila gritou com ele.
Disse para ele olhar para ela.
Chorando, a moça comentou:
- Você deve ter se divertido muito as minhas custas! Divertiu-se enganando uma tonta. Parabéns!
Nisto, empurrou-o e saiu da casa.
Epaminondas tentou retê-la, sem êxito.
Leila se dirigiu para a cozinha e pediu para ir embora.
O homem ofereceu uma carona a moça, que ao ver o motorista da casa, ficou ainda mais aborrecida.
Leila disse que poderia perfeitamente voltar para a casa sozinha.
Nisto, a moça caminhou pelas ruas do bairro.
Epaminondas, ao voltar para a sala, encontrou o sobrinho transtornado.
Felipe estava sentado no sofá, com as mãos no rosto.
Chorava compulsivamente.
Epaminondas ao presenciar a cena, aproximou-se do sobrinho.
Disse-lhe que não devia ter demorado tanto tempo para contar a verdade a moça.
Tentando consolá-lo, argumentou que se Leila realmente gostasse dele, acabaria entendendo o que havia acontecido e o desculpando.
Isto porém, levaria tempo e ele deveria ter muita paciência e aguardar o desfecho daquela história.
Aflito, Felipe tencionou ir ao encontro da moça.
Mencionou que tentaria lhe dizer que tudo não havia passado de um equívoco.
Epaminondas aconselhou-o a aguardar um pouco.
Mencionou que ele estava alterado e que Leila estava muito nervosa.
Muito provavelmente aquela conversa não fluiria e o desentendimento se agravaria.
Desesperado, Felipe perguntou:
- Então tio, o que eu faço?
Epaminondas recomendou que se afastasse um pouco da moça. Que a deixasse se acalmar.
Felipe respondeu que não poderia deixá-la sem uma explicação.
Epaminondas argumentou que a aludida explicação, viria no tempo necessário.
Nisto, o homem abraçou o sobrinho, e recomendou-lhe coragem.
Leila por sua vez, voltou a pé para casa.
No caminho, chorou copiosamente.
A cada passo dado, se recordou dos momentos ao lado de Felipe. A aparente simplicidade do moço.
As lembranças a deixavam mais entristecida.
Com isto, ao chegar em sua casa, trancou-se em seu quarto. Não queria falar com ninguém.
Deitou-se em sua cama, exausta.
Relembrou-se da difícil conversa que tivera com Felipe.
Encostando o rosto no travesseiro, tornou a chorar.
Lacrimosa, chegou a dizer que não devia confiar em ninguém.
Irene, ao notar a entrada brusca da filha em casa, bateu na porta do quarto da moça.
Enquanto batia, chamava-a. Preocupada, indagou o que estava acontecendo.
Leila porém, não respondeu.
Colocou o travesseiro por cima da cabeça.
Chorava.
Irene a certa altura, percebendo que a filha não abriria a porta, disse com voz suave que esperaria ela se acalmar, e que depois conversariam.
Dito isto, afastou-se.
No dia seguinte, Leila acordou.
Dormira com a roupa que vestira no dia anterior.
Num átimo de segundos, levantou-se da cama.
Tomou um banho e vestiu uma roupa limpa.
Saiu de casa sem fazer barulho.
Levantou-se antes que todos da casa despertassem.
Não queria ter que explicar o que havia acontecido.
Precisava ficar sozinha.
Não sentia vontade de conversar, de ouvir ninguém.
Durante o dia, ocupou-se de seu trabalho.
Leila atendeu clientes.
Seus colegas, perceberam uma alteração em sua fisionomia logo que a moça adentrou a loja de perfumes.
Contudo, ao ser indagada sobre este fato, Leila respondeu que não dormira bem, que estava um pouco cansada.
Todos acreditaram na explicação.
Felipe por sua vez, se encaminhou para o escritório da empresa.
Ocupou-se de telefonemas, assinatura de documentos, ditou correspondências para a secretária. Ao final da tarde, participou de uma reunião.
Enquanto se manteve ocupado, o moço tentou não se recordar do que havia ocorrido no dia anterior.
A lembrança contudo, persistia.
Durante o dia, o moço teve ímpetos de ligar para a moça, mas se recordou que ela devia estar estudando àquela hora.
Ademais, depois de tudo o que havia acontecido, dificilmente ela o atenderia, pensou.
Nisto, ao recordar-se dos conselhos de Epaminondas, desistiu. Decidiu esperar um pouco para conversar com a moça.
Certo dia, depois de muita insistência de seus amigos, Felipe saiu para jantar fora.
Leila igualmente convidada por colegas de trabalho, resolveu espairecer um pouco.
A semana fora difícil para ela.
Leila tentou fugir da conversa com Dona Irene, mas não obteve êxito.
A mulher, era persistente.
Aguardou Leila retornar do trabalho para obter explicações.
Queria por que queria saber o que estava acontecendo.
A moça por sua vez, tentou dizer que levara uma bronca do chefe, e que por isto chegara atordoada.
Irene não parecia convencida disto.
Razão pela qual perguntou se realmente era só uma bronca.
Leila assentiu com a cabeça.
Preocupada, Irene perguntou-lhe por que seu chefe a havia advertido.
Leila suspirando, respondeu que havia sugerido a uma cliente adquirir um outro perfume. Argumentou que embora a mesma não tivesse muito interessada na aquisição, insistiu tanto que acabou convencendo a mulher a adquirir o produto.
Disse que muito embora tenha feito uma boa venda, seu patrão interpretou a insistência como inconveniência. Razão pela qual a advertiu. Disse que aquele estabelecimento não tinha por hábito fazer os vendedores empurrarem mercadorias aos clientes. Com isto, recomendou-lhe que tivesse cuidado, posto que aquela conduta não poderia se repetir.
Leila respondeu que não o faria mais.
Irene compreendeu os argumentos da filha, mas argumentou que seu chefe estava apenas orientando-a a não exagerar na insistência, pois com ela, poderia afastar a clientela.
Preocupada, perguntou-lhe se havia o risco de ser demitida.
Leila respondeu desanimada, que não sabia.
Irene então, procurou confortá-la.
Disse que aquilo fora uma bobagem, e que ela estava há anos na loja, sempre atendendo a todos bem. Argumentou que não seria uma pequena bobagem que não a faria ser despedida.
Nisto, a semana transcorreu e Leila permanecia com um olhar de pesar.
Todos perceberam o ar entristecido da moça, que com o passar dos dias, não conseguia esconder sua tristeza.
Porém, a todo o momento, quando era indagada por este fato, a jovem respondia que estava tudo bem.
Desta forma, tentando fazer com se distraísse, seus colegas a chamaram para acompanhá-los em um restaurante. Poderiam jantar juntos.
Leila relutou um pouco em aceitar o convite.
Mas, diante da insistência dos amigos, acabou saindo para jantar.
Qual não foi a surpresa da moça, quando ao chegar no restaurante e se deparar com Felipe, reunido com amigos, conversando?
Ao se deparar com a cena, Leila insistiu para que fossem a outro lugar.
Mercedes por sua vez, não concordou.
Disse que gostava muito do lugar e que não havia motivos para sair dali.
Leila por sua vez, pediu licença aos amigos e se encaminhou para o toilete.
Felipe, ao vê-la, pediu licença aos amigos e se encaminhou a mesa onde se sentaram os amigos da moça.
Ao perceber seu afastamento, acorreu em sua direção.
Ao alcançá-la, segurou seu braço. Disse que precisavam conversar.
Leila por sua vez, tentou se desvencilhar do moço.
Felipe respondeu-lhe que iria lhe explicar o que havia acontecido, não importasse o quanto ela esperneasse.
A moça, sem alternativa, concordou em ouvi-lo.
Pediu-lhe para que soltasse seu braço.
Felipe atendeu.
Nisto, caminharam juntos para fora do restaurante.
Mercedes ao ver Felipe segurando o braço da colega, comentou que conhecia o rapaz de algum lugar.
Preocupados, dois colegas da moça, e um amigo de Felipe, se encaminharam para fora do restaurante.
Ao ver Felipe ao lado de Leila, perguntaram se estava tudo bem.
Felipe tomou a iniciativa de dizer que eles precisavam conversar.
Os colegas da moça, ao ouvirem as palavras do rapaz, perguntaram a Leila se estava tudo bem.
- Sim, está tudo bem! Obrigada. – respondeu a moça.
Com isto, se afastaram.
Felipe, enchendo-se de coragem, começou a dizer que não havia contado toda a verdade, por haver percebido que ela não acreditaria em suas palavras.
Leila permanecia indiferente.
Felipe por sua vez, continuava tentando se explicar.
Dizia que não tivera a intenção deliberada de enganá-la, mas que as circunstâncias propiciaram a confusão.
Ao ouvir isto, Leila respondeu que ele teve tempo mais do que suficiente para desfazer o engano. Coisa que ele não o fizera.
Felipe desculpou-se. Argumentou que deveria ter contado tudo desde o início, mesmo correndo o risco de que ela não acreditasse.
Olhando-a nos olhos, disse que muito embora tenha mentido, nunca tivera a intenção de iludi-la, e que estava muito arrependido.
Leila perguntou-lhe por que tinha tanto interesse em se explicar.
Felipe respondeu que ela era uma pequena muito especial. Diferente de todas as garotas que ele conhecia. Comentou que ela era muito importante para ele.
Ao ouvir isto, a moça ficou intrigada.
Felipe então, aproximou-se da jovem.
Leila tentou se afastar.
O moço pediu para que ela não o evitasse.
Com os olhos suplicantes, o moço segurou suas mãos. Pediu-lhe desculpas. Disse que fora fraco, mas que aquela atitude leviana, não se repetiria mais.
Com os olhos cheios d’água, disse que todos os dias se recordava dos momentos que passaram juntos. Argumentou tudo era muito especial para ser desperdiçado.
Pediu a moça para que o desculpasse.
Fitou Leila.
A jovem ficou sem palavras.
O moço insistiu.
Pediu-lhe para que dissesse alguma coisa.
Leila gaguejando, respondeu que não sabia o que dizer.
Felipe, decepcionado, respondeu que entendia. Alegou que não poderia esperar que ela o desculpasse imediatamente.
Leila respondeu que precisava ir.
Felipe respondeu que compreendia.
Soltou suas mãos.
Nervosa, a moça saiu apressadamente.
Felipe ficou decepcionado.
Leila, aflita, comentou com os colegas, que não estava sentindo se bem, e que precisaria voltar para casa.
Seus colegas, percebendo a angustia da jovem, resolveram pagar a conta e sair do restaurante.
Antunes pediu para cancelar o pedido.
Nisto, saíram todos juntos.
Com efeito, os colegas e amigos de Felipe, passaram a estranhar a ausência do moço.
Tanto que passaram a procurá-lo.
Quando Felipe adentrou novamente o restaurante, encontrou a mesa onde Leila se reunira com os amigos, vazia.
Chateado, pediu desculpas aos amigos.
Disse que não estava em condições de comemoração, que precisava ficar só.
Seus amigos tentaram convencê-lo a ficar.
Felipe porém, argumentou que não queria estragar a noite de ninguém.
Com isto, desculpou-se novamente e afastou-se.
E assim, em que pese os protestos dos amigos, o moço saiu do restaurante.
Seguiu de carro até a sede da empresa.
Adentrou o escritório onde trabalhava.
Sentou-se em sua cadeira. Recostou-se.
Ficou pensando.
Leila por sua vez, decidiu voltar para casa.
Chateada, pediu desculpas aos colegas.
Argumentando que não estava muito animada para confraternizar, pediu para ficar só.
Antunes e seus colegas tentaram demovê-la da idéia, mas Leila estava irredutível.
Argumentou que não gostaria de estragar a noite de ninguém, e que já havia causado bastantes transtornos.
Com isto, só restou a todos concordarem,
Antunes conduziu a moça até sua casa.
Leila agradeceu a carona.
Despediu-se do colega.
Antunes por sua vez, seguiu dali para o restaurante onde iria se encontrar com os amigos.
No dia seguinte, Felipe, tomado de uma resolução, se encaminhou para o estabelecimento onde a moça trabalhava.
Ao adentrar o local, fingiu ser um freguês em busca de um perfume.
Leila ao vê-lo, ficou deveras aborrecida.
Tanto que chegou a pedir a uma colega que o atendesse.
Como todas as moças estivessem ocupadas, restou a ela, a árdua tarefa.
E assim, respirando fundo, se encaminhou até o corredor onde o rapaz estava e perguntou-lhe se desejava algo.
Felipe respondeu-lhe sorrindo, que desejava uma fragrância marcante, mas ao mesmo tempo suave, em que fosse possível por meio de aromas, eternizar um sentimento.
Leila não compreendeu as palavras do rapaz. Tanto que pediu-lhe para se explicar.
Argumentou que não era tão ilustrada para compreender com tanta clareza, uma metáfora tão elaborada.
Felipe então, desfazendo o sorriso do rosto, respondeu que ela não precisava dizer aquilo. Respondeu que só estava tentando ser agradável.
Leila perguntou-lhe se gostaria de adquirir um perfume.
Felipe respondeu que sim. Comentou que quando adquiriu perfumes naquela loja, sua sorte mudou. Completou dizendo que gostaria de fazer as pazes com sua sorte.
Leila então, passou a fazer-lhe algumas sugestões.
Felipe por sua vez, respondeu que o perfume era um presente para alguém muito especial.
Ao ouvir isto, Leila ficou irritada.
Perguntou a ele, o que estava querendo com toda aquela conversa.
Felipe respondeu que só gostaria de conversar. Afirmou que não sairia dali enquanto ela não o ouvisse.
Leila retrucou dizendo que estava em seu local de trabalho.
Felipe ressalvou que entendia perfeitamente, que não poderiam conversar sobre um assunto tão pessoal ali.
Razão pela qual agendou um encontro ainda aquela noite. Disse que iria buscá-la na porta de casa, e que se ela não aparecesse, bateria a noite inteira na porta da casa.
Leila por sua vez, respondeu que concordava em se encontrar com ele.
Argumentou porém, que aquela seria a última vez em que se veriam.
Ao ouvir isto, Felipe respondeu:
- Isto é o que veremos.
Leila voltou-lhe as costas.
Ao vê-la se afastando, Felipe chamou-a.
Perguntou-lhe se não estava se esquecendo de nada.
Nisto, mostrou-lhe um vidro de perfume.
Enquanto pagava o perfume, Felipe disse que a propósito daquela compra, a primeira vez que pisara os pés naquela loja, adquirira perfumes para sua mãe. Comentou que ela adorou as fragrâncias.
Leila ouviu as palavras.
A seguir, o rapaz saiu da loja com um pequeno embrulho.
Dirigiu feliz até seu escritório.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

CARINHOSO - PARTE I - CAPÍTULO XV

O homem então, comentou que a moça certamente não era uma interesseira, e que não havia motivos para tantas reservas. Argumentando que se ela gostava dele de verdade entenderia o que ocorrera, relatou que talvez num primeiro momento, ela ficasse decepcionada, mas que depois, acabaria compreendendo seus motivos.
Felipe não parecia convencido disto.
Mencionou que a moça tinha interesse em freqüentar uma faculdade.
Epaminondas achou interessante.
Felipe então, pediu auxílio ao parente.
Insistiu para que ele o ajudasse a encobrir a mentira por algum tempo.
Perguntou-lhe aflito se não poderia fingir ser seu motorista.
Epaminondas considerou toda a idéia um completo absurdo.
Felipe insistindo, comentou que ele poderia fazer ás vezes de empresário do Grupo Oliveira.
O homem continuou resistindo a idéia.
Felipe argumentou então, que ele não precisaria aparecer na empresa se não quisesse. Apenas precisava combinar com os empregados da casa e com sua família, a história.
Para todos os efeitos, Felipe era o motorista particular dele.
Epaminondas, ao ouvir toda a conversa, bem que tentou se recusar em ajudá-lo na idéia, mas acabou sendo convencido, por olhares suplicantes, e muitos por favor.
Mesmo contrariado, acabou concordando em auxiliar o rapaz.
Para isto no entanto, impôs algumas condições.
Epaminondas respondeu que a farsa não poderia durar muito tempo.
Felipe concordou. Argumentou que a mentirinha duraria menos tempo, do que ele imaginava.
Ocorre que inicialmente uma história mentirosa, a situação ganhou proporções maiores.
Para convencer a moça de que era motorista particular, Felipe passou a usar o uniforme do motorista de Epaminondas, e a dirigir para o tio.
Isto por que, certo dia, ao passar em frente ao imóvel do abastado parente de Felipe, Leila resolveu pedir licença e entrar.
Lá descobriu que Felipe não se encontrava, e que havia outro motorista na casa.
Leila chegou a pensar que o moço estava desempregado.
Uma das empregadas da casa, ciente da combinação de Felipe com o patrão, comentou que Felipe estava de licença, e que a pessoa que atendia como motorista particular, estava ocupando a função provisoriamente.
Leila ficou um tanto quanto desconfiada, mas como a empregada fora convincente, a moça acabou se convencendo da história.
Quem achava a história da farsa incrivelmente engraçada, eram os filhos de Epaminondas.
Ao conhecerem Leila, ficaram encantados com a beleza da moça.
Casados e com filhos, comentaram que entendiam por que o jovem primo havia se interessado pela moça.
Felipe por sua vez, conseguiu sustentar a história por algum tempo.
Conhecidos da moça, chegaram a ver Felipe lavando o carro da família.
Neste ínterim, a jovem apresentara o moço aos pais, a vizinhança, aos colegas de trabalho.
Leila por sua vez, conhecia todos os empregados de Epaminondas.
Contudo, não havia sido apresentada aos pais do moço.
Tal fato a deixava deveras incomodada.
Certo dia, ao andar pelas ruas de São Paulo, avistou alguém com o perfil de Felipe, muito bem vestido, e dirigindo um belo carro.
Ao mexer em seus pertences, Leila recordou-se do cartão que o moço lhe apresentou. Lembrou-se de ter sido informada ao ligar para o referido número, que a secretaria se referiria ao moço como senhor Felipe.
Curiosa, resolveu realizar uma ligação para o referido número.
Foi novamente atendida pela secretaria que lhe confirmou o fato de que Felipe era o motorista da empresa.
Leila então perguntou o nome do dono da empresa.
No que a secretaria, já devidamente instruída por Felipe, respondeu que era o senhor Epaminondas.
Leila por sua vez, agradeceu e desligou o telefone.
Contudo, em que pese a confirmação das informações, algo não soava bem.
Afinal de contas, se Felipe era apenas um motorista, como poderia ter um cartão da empresa e com o telefone da presidência?
Ao questionar isto com uma colega, ela acreditou que esta regalia se devia ao fato do moço prestar serviços ao dono da empresa.
Leila não ficou muito convencida disto.
Considerava estranho o fato.
Com isto, ao comentar o que vira com Felipe, o mesmo ficou apreensivo.
A moça percebeu.
Felipe por sua vez, tentando disfarçar o constrangimento, argumentou que se tivesse posses, não precisaria trabalhar de motorista para uma família. Alegou que ela se confundira vendo alguém parecido com ele.
Leila resolveu então mudar de assunto.
Saíram para dar uma volta.
Caminharam pelas ruas do centro da cidade.
Ruas amplas, muita área verde. Uma São Paulo de sonhos.
Juntos, foram ao cinema.
Assistiram ao um filme de Rita Hayworth.
Na saída do local, um conhecido de Felipe o reconheceu.
Animado, aproximou-se e perguntou-lhe do trabalho:
- Felipe! Há quanto tempo! Continua trabalhando como homem de negócios? Como vão as empresas?
O moço tentou se afastar do conhecido, sem êxito.
Leila ouvira as palavras do colega de Felipe.
Felipe cumprimentou então o rapaz, e argumentou que sua vida ia caminhando.
Pedindo licença a Leila, puxou o colega para um canto do estabelecimento e insistiu para que ele dissesse que o havia confundido com outra pessoa.
Olívio não entendeu nada.
Felipe pediu-lhe desculpas. Disse que a moça que o acompanhava, nem sequer sonhava que ele pudesse ser dono de uma empresa.
O moço ao ouvir isto, pediu desculpas. Argumentou porém, que por sua reação, Leila não acreditaria na história de engano. Mencionou que estava evidente que se conheciam.
Tentando ajudar, sugeriu dizer que havia um colega em comum, o qual havia prosperado, e que o havia convidado para ser seu sócio. Com isto, entrara com o trabalho, mas no momento de receber os dividendos, fora passado para trás. Daí a necessidade de continuar a trabalhar com motorista.
Felipe respondeu que sua sugestão era mais apropriada.
Com isto, o moço apresentou o colega.
Leila, visivelmente desconfiada, perguntou de onde eles se conheciam.
Felipe então contou-lhe a história que havia combinado com o colega.
A moça continuava desconfiada.
Felipe então, mencionou que havia feito um curso superior, mas que estava tendo trabalho para atuar na área.
Razão pela qual trabalhava como motorista particular.
Ao ouvir a história do moço, Leila sentiu um pouco de pena.
Argumentou que não sabia que ele havia se formado. Relatou que pouco conhecia de sua vida.
Felipe respondeu que se sentia envergonhado por não conseguir emprego em sua área de formação.
Mencionou que havia se formado em direito.
Ao ouvir isto, Leila perguntou se poderia informar seu nome para algum colega.
Relatou que tentaria ajudá-lo a encontrar trabalho.
Felipe agradeceu.
Por fim, o colega se afastou. Pediu desculpas pelo incômodo.
Nisto, caminhando pela capital paulistana, Leila comentou que pouco sabia dele.
Felipe respondeu um tanto sem jeito, que não tinha muito para contar, e que ela sabia o que era necessário.
Em dado momento ele pediu para que ela sempre fosse esforçada e que tentasse entender que ninguém era perfeito.
Leila ficou intrigada.
Ao tentar perguntar-lhe o que queria dizer com aquelas palavras, Felipe a interrompeu dizendo que precisavam voltar para casa, ou ficaria muito tarde.
Leila tentou fazer uma pergunta, mas o moço interrompeu-a dizendo que somente responderia perguntas no dia seguinte.
Ao ver a noite a se espraiar pela cidade, respondeu que apostava que chegariam em casa rapidamente.
Leila perguntou-lhe como poderia ter tanta certeza.
Felipe respondeu brincando que possuía poderes mágicos, e que faria surgir um ônibus na próxima esquina.
Nisto, chamou a moça para fazer uma pequena corrida.
Com efeito, ao lá chegarem, se depararam com um ônibus.
Leila respondeu que ele era impossível.
Desta forma, o casal chegou rapidamente em casa.
No dia seguinte, a pedido de Felipe, Epaminondas passou pelas empresas.
O moço precisava manter a farsa.
Razão pela qual passou parte da manhã em seu escritório e logo após, se encaminhou para a casa de Epaminondas.
Lá se ocupou em lavar o carro da família.
Nisto, quando Leila o viu, se convenceu de que ele realmente trabalhava ali.
Mesmo assim, perguntou-lhe por que ficara tão estranho.
Felipe respondeu que só estava preocupado com o futuro.
Mencionou que ela, sendo tão esforçada, vendo um fracassado ao seu lado, poderia perfeitamente se cansar dele e preferir alguém em uma condição social melhor.
Foi o suficiente para a moça se aborrecer e dizer-lhe que não estava interessada em homens endinheirados. Argumentou que sua dificuldade em arrumar trabalho na área era momentânea.
Felipe desculpou-se então com a moça.
Leila, esboçando um sorriso, respondeu-lhe que estava desculpado.
Se abraçaram.
Leila ao sair da mansão, ficou pensando qual seria a melhor forma para ajudar o moço.
Conversando na loja em que trabalhava, dias depois, descobriu que alguns colegas conheciam escritórios de advocacia, e que poderiam indicá-lo para trabalhar na área.
Um deles por sua vez, estranhou a dificuldade do rapaz.
Mencionou que o rapaz parecia esforçado, pelos relatos da moça, não justificando-se a dificuldade em arrumar trabalho.
Semanas depois, o moço recebeu uma proposta de emprego.
Quando soube o nome do empregador, Felipe ficou desesperado.
Isto por que, o moço fora seu colega de trabalho, e caso se apresentasse em seu escritório, sua farsa seria descoberta.
Preocupado, pediu um conselho ao tio, que recomendou-lhe contar toda a verdade a Leila.
Felipe respondeu que ainda não era o momento.
Diante disto, resolveu contatar o tal colega e contar o que estava acontecendo.
O moço achou graça quando Felipe contou que estava metido em uma grande confusão. Relatou que estava namorando uma moça e que ela acreditava que ele era bacharel em direito, mas que estava trabalhando como motorista, por não conseguir trabalho na área jurídica.
Clóvis argumentou que ele estava todo enrolado, e que a mentira não se sustentaria por muito tempo.
Felipe respondeu que não pretendia manter a mentira por muito tempo, mas não poderia revelar a verdade naquele momento. Argumentou que ela não entenderia.
Clóvis respondeu que ele estava encrencado. Contudo, tentando auxiliar o amigo, prometeu atendê-lo. Comentou que para todos os efeitos ele se encaminhava para uma entrevista. No entanto, ante as circunstancias, seria ridículo contratá-lo.
Felipe concordou e agradeceu o auxílio.
E assim, conforme o combinado, na data agendada, compareceu para a falsa entrevista.
Durante cerca de meia hora, ele e Clóvis ficaram conversando sobre os tempos da faculdade, a época em que passou a freqüentar os teatros.
Felipe contou-lhe que estava gostando de uma garota muito especial e que precisava desfazer a confusão em que havia se envolvido.
Clóvis aconselhou-a a não demorar para contar a verdade, posto que se ela descobrisse a verdade sozinha, seria muito pior.
Felipe respondeu que não demoraria.
Nisto, retornou para a empresa.
No final da tarde, ao se encontrar com Leila, a moça perguntou-lhe como havia se saído na entrevista.
Felipe respondeu-lhe que estava aguardando uma resposta para os próximos dias, mas sentia que havia se saído muito bem.
Com isto, perguntou a moça, o que ela faria caso descobrisse que poderia ganhar muito dinheiro.
Leila ficou intrigada.
Felipe insistiu. Perguntou-lhe o que faria caso aparecesse um homem muito rico em sua vida.
Leila respondeu que não estava entendendo.
Felipe indagou se ela não gostaria de viver uma vida confortável, com abundância.
Leila retrucou dizendo que sua vida era muito boa. Alegou que não precisava de muita coisa, não havendo necessidade de arrumar um marido rico.
Silenciou por alguns instantes.
Após, completou dizendo que não fazia questão de um riquinho metido a besta, e que ninguém a compraria com dinheiro.
Ao ouvir estas palavras, Felipe engoliu em seco.
Preocupado, respondeu que nem todos os ricos eram arrogantes e prepotentes. Afinal existem pessoas boas, em quaisquer lugares.
Leila concordou. Mas intrigada, indagou o porquê de todas aquelas perguntas.
Felipe respondeu que era apenas curiosidade.
Leila por sua vez, percebendo a expressão preocupada do moço, perguntou-lhe se estava tudo bem.
Como Felipe insistisse que tudo estava bem, Leila perguntou-lhe se havia algo que gostaria de dizer.
Constrangido, o moço respondeu que não.
Leila insistiu:
- Você tem certeza?
Felipe respondeu gaguejando:
- Não.
- Você está estranho!
Felipe então, percebendo o ar intrigado da moça, respondeu que eram preocupações com a entrevista, com seu emprego, mas que tudo acabaria bem. Argumentou que não queria tocar no assunto.
Leila concordou.
O moço então, convidou-a para um passeio nos arredores.
Leila concordou.
Felipe disse-lhe que gostava muito dela, e que com o tempo ela descobriria coisas a seu respeito, que a fariam se surpreender.
Abraçando-a, pediu desculpas por qualquer coisa.
Leila não sabia o que dizer.
Felipe pediu para que ela o abraçasse.
Mais tarde, o moço a deixou na porta de sua casa.
Ao entrar em casa, a moça ficou a pensar nas palavras ditas pelo rapaz.
Intrigada, perguntava-se o que estaria se passando com ele.
Angustiado Felipe pediu conselhos ao tio-avô.
Perguntou-lhe como fazia para contar a verdade a moça.
Epaminondas aconselhou-o a não prolongar a mentira. Recomendou-lhe que na próxima vez que se vissem, contasse tudo.
Felipe concordou.
Argumentou que não agüentava mais viver aquela vida dupla, e que se sentia sendo desleal com a moça, ao esconder-lhe a verdade.
Chegou a dizer que devia ter desfeito o equivoco desde o começo.
Epaminondas, colocando as mãos em seu ombro, respondeu-lhe que nunca era tarde para tanto.
Com isto, Felipe despediu-se do tio, e encaminhou-se para a empresa.
Passaria o dia trabalhando em seu escritório.

Luciana Celestino dos Santos
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