Poesias

quinta-feira, 6 de maio de 2021

AMARGAS LEMBRANÇAS - CAPÍTULO 9

No dia seguinte, aproveitando a linda manha de sol, Gabriela aproveitou para fazer um passeio à cavalo, pelo lugar. Foi neste passeio que conheceu Otávio, que pareceu-lhe muito simpático.
Dizendo que gostaria que ela lhe apresentasse o hotel, fez de tudo para ganhar sua amizade.
Quem não gostou nem um pouco do sujeito, foi seu avô Orlando.
Flávio também.
Aliás, desde que Flávio conquistara a amizade de seu avô, vivia muito próximo a ele.
Quem não gostava disto era Gabriela que achava ser o rapaz quem influenciava seu avô contra Otávio.
Flávio, sempre que ouvia estes comentários da moça, respondia que Orlando era bem grandinho para se deixar influenciar por alguém. Que o mais provável, seria ele ser influenciado pelo avô da moça do que o contrário.
Tais palavras eram o suficiente para deixar Gabriela irritada.

A irritação da moça só passou quando sua tia Lúcia retornou da França.
Lúcia ao voltar para o Brasil, passou alguns dias em São Paulo, planejando primeiramente visitar seus pais Etevaldo e Júlia e após, passar uma temporada no Hotel Fazenda de Orlando.
Dito e feito. Lúcia passou alguns dias na casa de seus pais de criação, juntamente com seu filho Paul e Jean.
Etevaldo e Júlia ficaram felicíssimos com a visita. Afinal de contas, fazia anos que não viam a filha, o genro e o neto.
Alguns dias depois, sob os protestos de Etevaldo e Júlia, Lúcia partiu.
Iria encontrar-se com Orlando.

Quando a família finalmente chegou ao Hotel Fazenda, Orlando não cabia em si de contente.
Feliz, mandou preparar dois dos melhores quartos do hotel para que a família ficasse bem instalada.
Gabriela que adorava Lúcia, assim que teve oportunidade, perguntou-lhe sobre como era o dia-a-dia da família na França.
Lúcia respondeu-lhe que a cidade era uma festa. De tempos em tempos, Paris se modifica: são novos eventos, novas exposições, etc.
Quanto ao trabalho, continuava trabalhando com moda. Mas em razão da idade, estava trabalhando em outros segmentos da moda.
Jean e Paul aproveitavam estes momentos em que ambas ficavam conversando, para passearem pelos arredores do hotel.
O lugar, como já foi dito antes, é bastante aprazível. Com muitas áreas verdes para serem percorridas, jardins, gramados, etc.
O Hotel Aquarela era um lugar como poucos.

A grande distância dali, estava Hélio, um rico empresário no setor de exportações, em seu trabalho.
Casado com Ofélia tinha um filho de 16 anos, chamado Pedro.

Com efeito, mesmo passados longos anos desde a última vez que vira Lúcia, o homem continuava acompanhando seus passos.
Por haver se tornado uma modelo de sucesso, era constante sua presença em capas de revistas. Também se comentava muito sobre sua vida nas colunas sociais.
Quando Hélio soube que Lúcia arrumara um namorado e como ele se casou, vindo em seguida a ter um filho, ficou furioso.
Sua reação inclusive, provocou ciúmes em sua mulher, a qual não se conformava com a obcessão de seu marido por Lúcia.
Quando a mulher engravidou de seu primeiro filho, Hélio então se descontrolou.
Dizendo que Lúcia não podia fazer isto com ele, prometeu para si mesmo que iria se vingar. Jurando a si mesmo que tornaria a vê-la, prometeu que os dois voltariam a ficar juntos.
Com efeito, o tempo passou e Hélio continuava obcecado por Lúcia.
Colecionava todas as revistas em que ela aparecia (fosse na capa ou em alguma matéria), recortes de jornal.
Quem não gostava nada disso era Ofélia, que ameaçava o tempo inteiro jogar toda aquela porcariada fora.
Hélio por sua vez, sempre que ouvia tais palavras, respondia dizendo:
-- Não se atreva a mexer neste material!
Ofélia porém continuava a insistir em destruir aquela papelada.
Hélio retrucava dizendo, que se ela continuasse insistindo naquela idéia, o que Ofélia veria, seriam papéis queimando de um lado, e ele saindo de outro, para nunca mais voltar.
Ofélia, ao ouvir tais ameaças, desistia da idéia.

Com isto Hélio, continuou alimentando sua obcessão por Lúcia.
Quando soube que a mulher retornara ao Brasil para uma estada com sua família no Hotel Fazenda de seu pai biológico, Hélio se armou de esperança.
Dizia a si mesmo:
-- Este é o momento!
Isto por que, em todas as suas vindas para o Brasil, Lúcia fazia visitas rápidas a seus pais. Visitas as quais, só eram divulgadas quando ela estava de volta a França.
Mas Hélio não desistia de seu intento.
Em dados momentos, chegou até a cogitar viajar até Paris para localizá-la.
Uma vez quase chegou a ir a cidade, mas um sócio, relatando que tinha preferência em viajar para lá, acabou afastando seu projeto de ir até o local.

Agora porém, era diferente. Lúcia estava por perto.
Diante disto, Hélio começou a realizar contatos.
Estava disposto a colocar seus planos em prática.
Nisto, alguns dias após a chegada de Lúcia, Hélio arrumou suas malas e rumou para o Hotel Aquarela.
Precavido, registrou-se com um nome falso.
Com isto, passou a espiar Lúcia.

Em dado momento, a mulher, percebendo a presença de um estranho a observá-la na piscina, correu em disparada em direção a seu quarto. Assustada, trancou-se.
Não fosse a insistência de seu marido Jean, e ela teria permanecido reclusa em seu quarto.
Assustada, comentou que teve uma sensação muito ruim ao se sentir observada. Chorando, comentou que não queria mais ter aquela sensação.
Jean então consolou-a.
Mais tarde, Lúcia saiu do quarto, foi passear com o marido e com o filho.
Após, arrumou-se e foi jantar com Orlando, Gabriela, Jean e Paul.

Hélio discretamente, os observava à distância.
Estava pronto para colocar seu plano em prática.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

AMARGAS LEMBRANÇAS - CAPÍTULO 8

Gabriela, intrigada com os sonhos que vinha tendo, comentou o novo sonho que tivera com o avô.
Mencionando que parecia estar assistindo um filme, comentou que a história que sonhara tinha começo, meio e fim.
Orlando só ouvia.

Ao término do relato da neta, Orlando comentou que Lúcia também já havia sonhado com com um assassinato.
Gabriela aproveitando o gancho, insistiu para que o avô revelasse o que havia ocorrido com Lúcia.
Orlando, incomodado com a insistência de Gabriela, comentou que aquela era uma história muito triste.
Gabriela comentou que já havia percebido um ar de melancolia nos olhos da tia.
Mas Orlando estava reticente em relatar a neta o acontecido com sua filha, Lúcia.

Gabriela porém, desconfiada, relatou que já ouvira comentários de sua mãe, a respeito do que teria ocorrido a tia.
Orlando, surpreso com as palavras da neta, perguntou a ela, o que Margarida dissera a respeito de Lúcia.
Gabriela então relata que sua mãe comentara com seu pai Cássio, que não se podia esperar nenhuma atitude nobre de Lúcia, tendo em visto o que havia acontecido entre ela e Hélio, de quem tivera um filho.
Orlando ficou chocado.
Como Margarida podia saber do ocorrido? E mais! Como tivera a leviandade de comentar isto com Gabriela?
Gabriela então confessou que Margarida não sabia que ela estava ouvindo.
Orlando, percebendo que não podia mais esconder de Gabriela o que havia acontecido a Lúcia, resolveu contar o ocorrido.

Orlando então revelou que a quase vinte anos, Lúcia fora assediada por este tal Hélio, que a raptou.
Aproveitando-se do fato que Lúcia costumava andar sozinha pelos arredores da cidade onde então morava, o rapaz resolveu segui-la.
Certo dia, aproveitou para se aproximar da moça.
Lúcia, que não queria conversa com Hélio, tentou se afastar. Em vão.
Mais forte, Hélio empurrou Lúcia para um matagal, onde mesmo diante dos gritos desesperados da moça, rasgou sua roupa e deitou sobre ela.
Lúcia tentou se defender do agressor, mas Hélio, percebendo a resistência da moça, a estapeou.
Minutos depois, levantou-se, se recompôs e saiu dali apressado.
Lúcia ficou deitada, chorando.
Minutos depois, desorientada, levantou-se e ficou vagando pela região, até ser encontrada por uma senhora que cuidou dela, até ela se restabelecer do ocorrido.
Esmeralda acolheu Lúcia em sua casa e auxiliou-a. Emprestou uma roupa ela vestir, deu banho, abrigo.
Envergonhada, a moça precisava encontrar coragem para voltar para casa.

Nisto Etevaldo e Júlia ficaram desesperados. Preocupados com o sumiço de Lúcia, procuraram a moça por toda a cidade.
A certa altura, chamaram a polícia.
Mas Lúcia não foi encontrada pela polícia.
Etevaldo e Júlia só voltaram a ter notícias de Lúcia, quando dias depois, a moça retornou para casa.
Abatida, a moça não queria revelar o que havia acontecido.
Seus pais ficaram deveras preocupados. Percebendo que algo de muito grave havia acontecido, tentaram fazer com que Lúcia revelasse o que havia acontecido.
Todavia, sempre que era questionada a respeito, a moça só conseguia chorar.

Com o tempo, Lúcia retornou ao colégio.
Sempre que passava pelo pátio do colégio, era observada por algumas garotas e rapazes.
Hélio, feliz da vida, comentou com alguns colegas que havia conseguido passar uma noite com Lúcia.
Empolgados, alguns garotos a partir daí, começaram a convidar a moça para passear de carro com eles.
Um deles chegou até a comentar que não sabia por que ela recusava tantos convites para passear, já que havia passado a noite com Hélio.
Ao ouvir isto, Lúcia, ficou arrasada.
Retornando do colégio, a moça chegou a pedir aos pais, para mudar de escola.
Etevaldo e Júlia, desconfiados do pedido de Lúcia, começaram a perguntar se alguém no colégio a estava incomodando.
Lúcia respondeu que não.
Mas ambos estavam desconfiados.
Certo dia, resolveram conversar com Cássio e Bruna, amigos de Lúcia, para quem pediram para que contassem o que estava acontecendo.
Preocupados, os dois revelaram que também não sabiam de nada.
Mas desconfiados de que poderia haver o dedo de Hélio em toda aquela história, prometeram que ficariam de olho em Lúcia.

Isto porém não foi o bastante.
A certa altura, depois de um longo tempo sem se aproximar da moça, Hélio aproveitou um momento de distração de Lúcia, para arrastá-la até seu carro e sumir com ela.
Ao perceberem o sumiço da moça, Cássio e Bruna, foram imediatamente ao encontro dos pais dela e relataram que havia mais de quarenta minutos que estavam procurando-a.
Etevaldo e Júlia perceberam que então que só poderia ser alguém do colégio que estava fazendo isto.

Nisto, Hélio carregou Lúcia desacordada para uma cabana. Lá amarrou a moça a uma cama.
Quando despertou, ao observar o lugar em que estava, Lúcia tentou gritar. Em vão.
Estava amordaçada.
Quando Hélio percebeu que Lúcia estava acordada, foi logo lhe dizendo que ela estava em sua nova casa, e que ali eles passariam a viver juntos.
Foi começo de seu martírio.
Freqüentemente era abusada por Hélio, e quanto a isto, nada podia fazer.
Humilhada, Lúcia só pensava em morrer.
Certa vez, aproveitando-se de uma distração de Hélio, a moça aproveitou para pegar uma faca que estava perto de sua cama.
Estava tentando se desamarrar das cordas que a mantinham presa.
Enquanto tentava se desvencilhar das cordas, notou a aproximação de Hélio. Percebendo isto, Lúcia mirou a faca contra o próprio peito.
Não fosse o rapaz tomar a faca de suas mãos, e a moça teria se matado.
Lúcia chorando, disse para que ele a deixasse morrer.
Hélio respondeu que ela não podia morrer.

Com o tempo, o rapaz passou a soltá-la. Deixava Lúcia percorrer a casa.
Abatida, a esta altura, a moça já estava grávida.

Um dia, Hélio deixou Lúcia caminhar pelos arredores desamarrada.
Foi neste dia, que Lúcia conseguiu fugir de Hélio.
Isto por que, a polícia finalmente encontrou-a.
A moça, enfraquecida e debilitada, por pouco não conseguiu escapar de Hélio.
Aproveitando-se do fato de estar livre, correu.
Hélio, ao perceber que Lúcia tentava fugir, começou a gritar.
Em dado momento, a moça caiu ao chão.
O rapaz percebendo isto, correu ao encontro da moça.
Sentindo um forte mal estar, Lúcia foi pega por Hélio.
Percebendo uma movimentação próxima, Hélio tentou fugir com Lúcia. Carregou-a em seus braços.
Contudo, percebendo que não daria tempo para se esconder com Lúcia no matagal, deixou-a sentada num banco e fugiu.
Não sem antes dizer que voltaria para buscá-la.
Quando os policiais encontraram Lúcia, a moça estava sentindo muitas dores.
Foi logo encaminhada para um hospital.
Lá deu a luz prematuramente a um filho, o qual, segundo lhe foi informado, nasceu morto.

Etevaldo e Júlia, ao tomarem conhecimento de que Lúcia estava grávida, perceberam que o primeiro sumiço da moça fora por causa de Hélio.
Em apuros, o rapaz fugiu do estado.
Lúcia, sem condições de continuar freqüentando o mesmo colégio, terminou seus estudos em casa.
Encerrando o colegial, Lúcia poderia sair da cidade.
Deprimida, não agüentava mais encarar os olhares, ora de piedade, ora de reprovação.
Com isto, após terminar os estudos, partiu com seus pais para São Paulo.
Lá foi descoberta por Nelson, enquanto caminhava pelas ruas da cidade.
Foi então que sua vida começou a mudar.

Gabriela ouviu a todo o relato atenta. Agora compreendida o ar de pesar de sua tia, e o quanto seu avô ficava incomodado e indignado com a história.
Dizendo que nunca sentira ódio de ninguém, Orlando comentou que sentia ganas de matar Hélio.
Revoltado comentou que cedo ou tarde o encontraria para acertar suas contas com ele.
Gabriela tremeu quando o avô proferiu estas palavras.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

AMARGAS LEMBRANÇAS - CAPÍTULO 7

Dias depois, Gabriela teve um sonho ainda mais estranho.
Em plena década de 40, a moça viu uma mulher confabulando com dois homens de fardas verdes. Chamava-se Clotilde.
Arthur, um antigo admirador, estava em seu encalço.
Ao vê-la conversando com os dois homens, esperou a oportunidade para se aproximar.

Quando a moça terminou a conversa, Arthur esperou os dois homens se afastarem para se aproximar de Clotilde.
Surpresa ao se ver diante de Arthur, perguntou-lhe o que estava fazendo ali.
Arthur respondeu-lhe que ali quem fazia as perguntas era ele.
Clotilde tentou inventar uma desculpa para se afastar. Em vão.
Arthur não estava disposto a perdê-la de vista.
Estava furioso por haver sido enganado por ela.
Clotilde havia descoberto um segredo de sua fábrica e revelado aos integralistas.
Quando o homem descobriu que havia sido enganado, começou a caçá-la.
Procurou-a em vários lugares até encontrá-la.
Satisfeito com o encontro, revelou que foi difícil encontrá-la, mas que a espera valeu a pena.
Nervoso porém, começou a discutir com Clotilde, que respondia com evasivas as suas perguntas.
A certa altura, exaltado, acabou chamando a atenção de autoridades policiais que passavam no local.
Resultado, acabaram detidos.
Contudo, por se tratar de um rico empresário e de uma espiã que prestara relevantes serviços para o país, não ficaram muito tempo detidos.
Nisto, Clotilde, evitando confrontos, pediu para ser libertada primeiro. Não queria se encontrar com Arthur, o qual estava furioso com ela.
Queria livrar-se de sua presença incômoda.
Dito e feito.
Foi libertada antes, para desgosto de Arthur, o qual tivera tanto trabalho para encontrá-la.

Mas não demorou para que ele novamente a encontrasse em uma boate, disfarçada de cantora.
Possuidora de dotes vocais, Arthur ficou impressionado com sua voz. Também causou admiração a transformação pela qual a moça havia passado.
Nem parecia a mesma mulher que ele conhecera, a qual trabalhara como secretária em sua fábrica.
Assim, foi questão de dias para que Arthur descobrisse onde a moça estava escondida.
Interessado em passar a limpo a revelação de segredos industriais que muito o prejudicaram, Arthur estava disposto a se vingar de Clotilde. Estava disposto a prejudicá-la também.

A vingança foi apenas questão de tempo para ser colocada em prática.
Isto por que, acompanhando os passos de Clotilde à distância, descobriu que ela continuava a trabalhar com espiã.
Certa vez, ao perceber que Arthur a observava, Clotilde dirigiu-se até sua mesa.
Incomodada com sua presença, comentou que seu plano já havia sido descoberto e que já havia revelado seu segredo industrial. De formas que não havia mais nada a ser feito.
Arthur não acreditou em suas palavras. Dizendo que ela estava blefando, comentou que estava esperando de camarote sua queda.
Percebendo que Arthur estava obcecado com suas idéias de vingança, Clotilde resolveu sair de circulação.

Foi se refugiar na fazenda de Bernardo.
Arthur porém, acabou por descobrir onde a moça estava.
Quando a viu de braços dados com Bernardo, não conseguiu acreditar. Tanto que chegou a alertar o fazendeiro de que tudo aquilo não passava de um golpe.
Bernardo porém, não acreditou nas palavras do industrial.
Clotilde não havia falado de seu passado, muito embora Bernardo desconfiasse de que havia algo de estranho em sua vida.
A maneira como havia chegado até aquela fazenda... Dormindo no celeiro, fazendo esforço para não ser vista, reconhecida. Sem vontade de ir até a cidade. Abatida...
Clotilde ao ver que Arthur havia descoberto seu paradeiro, comentou com Bernardo que precisava partir.
O fazendeiro porém, não a deixou partir. Dizendo que ela tinha dizer-lhe o que estava acontecendo, afirmou que não a deixaria sair da fazenda.
Determinado, Bernardo expulsou Arthur da fazenda.
Furioso, o homem prometeu se vingar.

Sem alternativa, Clotilde revelou seu passado. Dizendo ser muito pobre, mas muito bonita, revelou que recebeu muitas propostas para se tornar amante de empresários. Contudo, como não tinha interesse em se vender, recusava a todas as propostas.
A certa altura, intimidada por um homem que a vivia cercando, se viu em grande dificuldade. Não fosse a ajuda de um soldado que passava, ela estaria perdida.
O homem, que na verdade não era um soldado, comentou que sabia de suas dificuldades e de onde poderia ganhar dinheiro, sem precisar se vender.
Desconfiada, Clotilde inicialmente rechaçou a proposta.
O homem porém, insistiu. Passou-lhe um endereço.
Por muito tempo relutou. A curiosidade porém era maior. Sem emprego, precisando de dinheiro, acabou concordando em ir até o local.
Aos poucos foi descobrindo que tratava de uma agência de espionagem.
Seu primeiro trabalho foi descobrir os segredos industriais de um empresário.
Clotilde revelou então, que estava arrependida de seu trabalho. Comentando que era preferível ter ficado na miséria, relatou que não valeu a pena ganhar dinheiro com isto.
Desde que Arthur descobrira ter sido enganado, não tinha paz.
Não bastasse isto, estava sendo obrigada a realizar outros trabalhos como espiã. Precisava fugir.
Bernardo, tocado com a história, prometeu ajudá-la.
E auxiliou-a.

Não sem muita dificuldade.
Arthur seguia todos os seus passos.
Quando soube que o fazendeiro pretendia vender sua propriedade, ficou ainda mais intrigado.
Tanto que comentou:
-- Bernardo, esta mulher está te enganando. Clotilde é muito esperta! Se é que este é realmente seu nome.
Bernardo porém, não dava ouvidos ao industrial. Dizia que Clotilde não estava mais em sua fazenda.
A certa altura, tentando se livrar de Arthur, comentou que estava vendendo as terras por que havia descoberto um negócio muito mais promissor, do que plantações de café.
Mas Arthur permanecia desconfiado.
Por pouco não estragou os planos do fazendeiro.
Isto por que, no momento em que Bernardo finalmente conseguiu vender sua propriedade, Arthur apareceu inesperadamente em sua fazenda. Pretendia vasculhar toda a propriedade.
Obcecado, ameaçou chamar a polícia.
Bernardo porém, tinha prestígio na região e Arthur ao surgir na delegacia da cidade, pedindo autorização para realizar uma varredura na fazenda, acabou sendo ignorado pelo policial.
Um policial porém, aceitando suborno, comentou que conhecia a fazenda e que poderia ajudá-lo a descobrir onde Clotilde estava.

Nisto, Bernardo, combinado com Clotilde, ajustou que a meia-noite a moça pegaria suas malas e partiria de carro. No dia seguinte quem partiria seria ele.
Quando Clotilde saiu de seu esconderijo, Arthur e o policial partiram imediatamente em seu encalço.
Não fosse a intervenção do fazendeiro, e a moça teria sido pega.
Prevenido, Bernardo contratou um guarda-costas.
Com isto, conseguiu surpreender Arthur e o policial.
Surpreso com a presença do policial, mandou amarrá-los.

Percebendo que seu plano havia descoberto, Bernardo tratou de pegar suas malas e partiu com Clotilde.
Arthur e o policial só foram descobertos horas depois.
Quando finalmente foram soltos, Clotilde e Bernardo já haviam pego o trem e partido.
Arthur ficou furioso. Prometeu que ainda iria descobrir onde os dois estavam.
Contudo, quanto mais passava o tempo, ficava mais difícil de localizá-los.
Ora ouvia boatos de que estavam na Argentina, nos Estados Unidos. Quando a guerra findou-se, ouviu comentários de que Clotilde e Bernardo foram vistos juntos na França, Alemanha e outros países da Europa.
Encontrá-los novamente, Arthur nunca mais os encontrou.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

AMARGAS LEMBRANÇAS - CAPÍTULO 6

Com efeito, nos dias que se seguiram, Gabriela começou a ter um sonho estranho.
Em seu sonho, estava na década de 20, com mais duas amigas. Praticavam natação em um clube da cidade. Também participavam de competições.
Laura, Taís e Fernanda, eram grandes amigas.
Participavam juntas de competições de natação. Grandes esportistas, eram admiradas por todos os que cultuavam o esporte.
Filhas de famílias abastadas, viviam aparecendo nas colunas sociais.
Animadas e unidas, pareciam estar sempre felizes.
Compareciam em festas da boa sociedade paulistana.

No entanto, o que parecia uma eterna felicidade, apresentou um trágico desfecho.
Em um certo dia, estando em casa de Laura, as amigas Taís e Fernanda, presenciaram uma grave discussão, de Ismael, com um homem estranho.
Ismael, irmão de Laura, estava sempre envolvido em confusões.
Taís e Fernanda, ao passarem próximas ao escritório onde Ismael conversava, ouviram disparos de arma de fogo.
Apavoradas, ao ouvirem os disparos, começaram a gritar.
Laura, ao ouvir os tiros e os gritos, tratou de acorrer ao local de onde partira os sons.
Quando se aproximava do escritório, percebeu que Ismael saiu do escritório armado.
Ao avistar Taís e Fernanda assustadas, Ismael apontou a arma contra ambas.
Nervoso, só conseguia dizer que elas haviam estragado tudo.
Acreditando que estava sozinho em casa, pensou que poderia dar cabo no homem, sem despertar suspeitas.
Não fosse o grito de Laura, tentando impedir Ismael de atirar em suas amigas, e elas teriam sido mortas naquele momento.
Atordoado ao ser interrompido, começou a disparar tiros na direção de Laura, que tentou inutilmente fugir do irmão.
Taís e Fernanda também tentaram fugir de Ismael, mas a única pessoa que conseguiu escapar de sua fúria, foi Fernanda.

Nisto ao perceber que estava encurralado, suicidou-se.

Fernanda, a única sobrevivente da mansão, nunca mais se recuperou da tragédia. Após o ocorrido passou a sofrer de transtornos mentais. Nunca mais foi a mesma.

Em seguida, atordoada com o desfecho trágico de seu sonho, Gabriela começou a sonhar que era uma camponesa e que corria em meio a uma plantação.
Em seguida estava em um celeiro.

Histórias sem ligação. Gabriela não conseguia compreender tão estranhos sonhos.

Intrigada, contou ao avô Orlando os sonhos.
Quando ouviu o relato da neta, comentou que já conhecia a história de um assassinato famoso, ocorrido na década de 20, que possuía as mesmas características da história que Gabriela lhe contara.
Impressionada, Gabriela pediu ao avô que contasse mais detalhes a respeito da história.

Orlando comentou então, que tratava-se de uma família muito influente na sociedade paulistana.
Muito conhecidas, as três amigas despertavam o interesse em muitos rapazes, os quais ficaram encantados com seus prodígios na água.
Isto por que, além de participarem de competições de natação, Fernanda, Tais e Laura praticavam nado sincronizado. Eram exímias nadadoras.
Orgulhos dos pais, as três eram muito unidas. Participavam constantemente de recepções, e eram freqüentemente homenageadas.
Ninguém poderia imaginar que aquela sólida amizade, terminaria em tragédia.

Orlando, percebendo a curiosidade nos olhos da neta, comentou que mais tarde se descobriu que Ismael estava envolvido com dívidas e drogas, e que o homem que o interpelara no escritório, era um de seus inúmeros cobradores.
Ameaçado de morte por seus inimigos, já fugira inúmeras vezes de São Paulo.
Todavia, sempre que dinheiro acabava, voltava para casa dos pais, onde vivia discutindo com o pai, que não aceitava as atitudes irresponsáveis do filho.
Contudo, com a intervenção da mãe, o rapaz sempre conseguia voltar a mansão.
Até a fatídica noite em que tudo terminou em tragédia.
Arrasados com a perda dos dois filhos, a família vendeu a mansão, e todas as outras propriedades que possuíam em São Paulo, e sairam do Brasil.
O paradeiro dos pais de Laura e Ismael era incerto.
Quanto ao pais de Taís e Fernanda, os mesmos se afastaram durante algum tempo da cidade, retomando suas atividades algum tempo depois.

Gabriela ficou impressionada com a história.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

AMARGAS LEMBRANÇAS - CAPÍTULO 5

Eunice percebendo a desconfiança da mãe, passou a disfarçar seu interesse na vida de peão.
Preocupada com o conformismo de Eunice, Carmela não se cansava de dizer a Felício que permanecesse atento a moça, pois a mesma estava muito estranha.
O estancieiro porém, não dava crédito as palavras da esposa.

Desta forma, foi apenas questão de tempo, para que Eunice se despedisse daquela vida, de sinhazinha, para se tornar uma grande tropeira.
Interessada nesta vida, Eunice sempre que podia perguntava a Queirós como era o dia-a-dia de um tropeiro. Dizendo-se saudosa de Tomé, comentava que gostava de ouvir as histórias dos peões.
Queirós, preocupado com o interesse da sinhazinha, comentava que se Felício os pegasse conversando, ainda mais sobre a vida de tropeiro, ambos estariam seriamente encrencados.
Eunice então, procurando disfarçar, comentava que estava apenas interessada em histórias.
O homem começou então a contar as histórias.
Com isto foi apenas questão de tempo para Eunice colocar seu plano em prática.
Fugir de casa para vivenciar uma nova vida, cheia de aventuras e desafios.

Aproveitando um momento de distração de Felício, Eunice que já havia conseguido algumas roupas de peão, tratou de vestir-se, e aproveitando a escuridão da noite, ganhou o mundo.
Quando Felício deu por falta da filha, Eunice já estava muito distante da fazenda.

O estancieiro porém, não se deu por vencido. Dizendo que traria a filha de volta, nem que fosse arrastada pelos cabelos, prometeu que desta vez Eunice seria severamente castigada.
Carmela ao perceber a gravidade do tom de voz de Felício, tentou mais uma vez interceder pela filha. Em vão.
Felício estava firme e resoluto.
Eunice pagaria caro por aquela ousadia.

A moça, porém, ciente de que seria procurada, procurou evitar os arredores da fazenda do pai. Procurando ganhar tempo, cavalgou a noite inteira até se distanciar da fazenda.
A certa altura, exausta, procurou pouso em uma fazenda para descansar um pouco e arrumar um pouco de comida.
Não ficou no lugar mais do que algumas horas.
Precisando ficar cada vez mais longe da fazenda de Felício, Eunice, agora travestida de Enrique, procurou se afastar o mais que pôde da vida de sinhá.

Felício por sua vez, não conseguiu pôr as mãos em Eunice.

A certa altura, percebendo que Felício não mais procurava por ela, empregou-se na fazenda de Cornélio – estancieiro amigo de Tomé.
Lá se tornou amiga de Porfírio, com quem participou de grandes viagens. Tropeiros e amigos, negociavam animais da fazenda do estancieiro em São Paulo.
Para tanto, atravessavam grandes distâncias, enfrentavam frio, chuva, dormiam ao relento, em celeiros, apeavam de seus cavalos e conseguiam algumas vezes, pouso em fazendas.
Ousados e valorosos, enfrentaram ataques de índios, rios bravios e até tentativas de assalto nas estradas.
Era uma vida de aventuras.
Com o tempo, Enrique se tornou um grande tropeiro.
Corajoso, chegou a enfrentar bandidos armados, sozinho.

Em dado momento porém, cansada de esconder sua identidade, Eunice revelou ao fazendeiro que Enrique era apenas um disfarce.
Quando a identidade de Eunice foi revelada, Cornélio por um momento, pensou em despedir a moça.
Ressentido com a morte de Tomé, custava a crer que ela poderia estar querendo vingar a morte do tropeiro.
Porfírio porém, conhecendo um pouco Eunice, comentou que acreditava na sinceridade dela. Surpreso com a revelação, comentou que nunca desconfiou de nada, mas que sabia sentir quando uma pessoa estava tentando enganá-lo.
Ao ouvir tais palavras, Cornélio riu:
-- Realmente ninguém consegue enganá-lo!
Nervoso, o peão respondeu que o engano não fora pelo fato da moça ter lhe escondido a identidade. Percebendo que a moça sempre demonstrara carregar consigo um segredo, relatou que mesmo percebendo isto, notava que a intenção dela era boa.
-- Não me pergunte como sabia disto, mas sabia. – respondeu.
Cornélio, recordou-se que Porfírio lhe recomendara a contratação de Enrique.
Em dado momento relatou ao patrão que o moço carregava consigo um segredo, mas que era uma pessoa de confiança.
Acreditando no juízo de valor do peão, o fazendeiro decidiu contratar o misterioso rapaz.

Nisto, em questão de tempo, Felício descobriu que o valoroso tropeiro era uma mulher.
Raivoso, comentou que aquilo era o fim do mundo. Dizendo que não poderia aceitar tal despautério, chegou a dirigir-se a propriedade de Cornélio, onde exigiu que o fazendeiro despedisse o peão.
Cornélio porém, revoltado com a arrogância do fazendeiro, comentou que não só manteria a tropeira trabalhando para ele, como também a ajudaria a comprar uma propriedade nos arredores.
Foi o suficiente para deixar Felício furioso.
O arrogante fazendeiro não podia crer na ousadia de Cornélio.
Mas não podia fazer nada contra Eunice.
Furioso, ao chegar em sua propriedade, Felício bradou aos quatro ventos que jamais aceitaria tamanho absurdo.
Carmela mais uma vez, tentou em vão acalmar o marido. Em vão.

Quando o homem rude descobriu que a mulher tropeira era Eunice, sua filha, ficou ainda mais furioso.

Desta forma, foi questão de tempo para que todos tomassem conhecimento de que a tropeira era Eunice, a qual estava de volta.
Enriqueceu, adquiriu propriedades.
Certa vez, enquanto preparava-se para banhar-se nas águas de um rio, foi abordada por dois estranhos, que sabedores da história, tentaram se aproveitar da situação.
Eunice porém, percebendo a aproximação dos estranhos, apontou sua arma na direção da pedra em que ambos estavam escondidos, colocando-os para correr.
Esta história correu toda a região.
Cabe mencionar que mesmo após se tornar proprietária de terras na região, Eunice continuou a exercitar suas atividades de tropeira.
Desta forma, angariou a admiração de todos na região.
Nesta época Queirós, Porfírio e um peão chamado Dionísio, se tornaram suas auxiliares na tarefa de administrar sua fazenda.

Neste mesmo período, chamou a região um policial, chamado Pedro, que investigou a morte de Tomé.

Felício, ao tomar conhecimento de que haviam retomado as investigações sobre a morte de Tomé, ameaçou o delegado.
Mas Pedro não se deixava intimidar. Disposto a levar o caso até as últimas conseqüências, despertou a admiração de Eunice.
A moça prometeu então, auxiliá-lo nas investigações.
Ao ouvi isto, Pedro indagou-lhe como poderia fazê-lo.
Eunice respondeu que tinha sérias desconfianças de quem teria sido o mandante do assassinato.
Assim, foi apenas questão de tempo, para que se descobrisse que Felício fora o mandante do assassinato de Tomé.

Eunice, ao tomar conhecimento de que o estancieiro tencionava fugir da região para não ser condenado, atirou em sua direção, ferindo o cavalo que o transportava.
Ferido, o animal caiu, derrubando o fazendeiro.
Auxiliada por Dionísio e Porfírio, levou o homem até a delegacia, onde o mesmo foi preso, e posteriormente, condenado a forca.
Eunice, como parte de sua vingança, presenciou a morte de pai.
Enfim, o perverso homem estava pagando por suas maldades.
Mas a moça não estava feliz.
O enforcamento de Felício não traria de volta Tomé.
Com o passar do tempo, passou a se perguntar se havia agido certo ao denunciar o estancieiro, e se empenhar tanto em condená-lo.
Isto por que, ao ver o desespero de sua mãe Carmela, Eunice sentiu-se de certa forma, responsável por seu sofrimento.
Visando ampará-la, ao receber a recusa da mãe em morar com ela, prometeu que ela ficaria com a fazenda onde ela vivera ao lado do marido, já que seu desejo era continuar na propriedade.
Com isto, Eunice conseguiu diminuir um pouco o sofrimento da mãe.

Anos depois, Eunice casou-se com Pedro, e sua história serviu de estímulo para que Catarina, viúva e com três filhos pequenos para criar, decidisse se aventurar e tornar-se tropeira.
Admirada com a força de Eunice, a jovem mulher bateu a porta de Eunice para se oferecer para trabalhar com ela.
Eunice aceitou a oferta e em questão de tempo, Catarina se tornou uma grande tropeira.
Conseguindo desta forma, manter sua fazenda e criar seus filhos.
Eunice também teve seus filhos, mas nunca abandonou seu trabalho como tropeira.
Morreu velhinha, velhinha.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

AMARGAS LEMBRANÇAS - CAPÍTULO 4

Esta história começa num distante Rio Grande do Sul.
Ao iniciar a história sobre a origem da família, Orlando comentou que desde criança sempre brincou muito em carroças e carros de boi, viveu em fazenda. Daí as características de seu hotel.
Fascinado, relatou conhecia a história da família a partir Eunice, a qual após a morte de seu amado tropeiro Tomé, resolveu abandonar sua família e toda uma vida de conforto para se tornar tropeira.
Valente, se defendia de homens perigosos. Enfrentava-os de igual para igual.
Não tinha medo de ninguém. Corajosa, era mais valente do que muitos homens.
Primeiramente trabalhou na tropa de Porfírio, um rico estancieiro da região.
Após, com o suor de seu trabalho, amealhou seu próprio rebanho, adquiriu propriedades, e tornou-se ela própria, líder de sua própria tropa.
Enfrentou seu pai, e conseguiu que o mesmo fosse condenado à forca pela morte de Tomé.
Solidária, enfrentou seu pai, e conseguiu que Dona Lucélia não ficasse na miséria, já que sobrevivia com os ganhos do filho tropeiro.
Mulher corajosa que ajudou Eunice quando esta adoeceu, mesmo após tomar conhecimento de que Tomé havia sido assassinado pelo pai da moça.

Lucélia, mesmo sabendo que fora o pai da moça, coronel Felício quem mandou matar seu filho Tomé, cuidou com todo o desvelo da moça. Preparou emplastros, cataplasmas, beberagens, enfim, tudo que estava ao seu alcance para salvar a vida da moça.
Após meses de convalescença, finalmente Eunice restabeleceu-se da doença que a acometera.
Mas diferente de antes, quando então acatava todas as ordens de seu rigoroso pai, a moça começou a enfrentá-lo. Desafiando-o, insinuava constantemente que ele poderia ser o responsável pelo assassinato de Tomé.

Tomé fora morto em uma emboscada, quando retornava de uma longa tropeada. Fora transportar juntamente com outros companheiros, muares para São Paulo.
Em viagens que demoravam meses.
Estes valorosos homens enfrentavam índios, longas caminhadas, chuvas, frio entre outras dificuldades. Não tinham pouso certo. Mas tinham a viola por companheira.
Novidades para contar, uma grossa capa para se protegerem das intempéries, e o céu como pouso.
Em muitas dessas viagens dormiam ao relento, e quando se punham de pé, podiam ver o orvalho da manhã.

Em seus encontros furtivos com Eunice, Tomé adorava contar suas peripécias em suas viagens.
Os dois se conheceram quando Cornélio, outro estancieiro da região, propôs um grande negócio a Felício. Disposto a realizar uma grande compra, cogitou adquirir alguns animais de Felício.
Felício por sua vez, não se fez de rogado. Vendeu alguns de seus melhores animais para o fazendeiro.
Para fechar o negócio, convidou o fazendeiro e seu acompanhante para almoçarem na casa grande.
Lá Tomé conheceu Eunice, que num primeiro momento, não ficou nem um pouco impressionada com o tropeiro de modos rudes.

Mais tarde, quando pôde então conhecê-lo melhor, descobriu que o moço era alfabetizado, posto que lhe enviava cartas muito bem escritas.
Sim, Tomé era galante. Enviava cartas para Eunice. Tão bem escritas que a moça chegou a duvidar que fosse ele mesmo que estivesse escrito estas mensagens.
Em uma delas, Tomé relatava o primeiro encontro de ambos, quando Eunice passeava sozinha pelo belo jardim da fazenda, e ele aproveitando a distração de Cornélio e Felício, aproveitou para se aproximar dela.
Eunice que não esperava por um gesto tão ousado, admirada com a beleza da rosa encarnada que acabara de colher, deixou a flor cair.
Tomé, percebendo que a assustara, recolheu flor. Desculpando-se, comentou que era uma bela flor a que colhera, mas que não deveria tê-la tirada do lugar onde estava.
Eunice não gostou nem um pouco do comentário do rapaz.
Tanto que retirou-se do jardim.
Tomé então, retornou ao local onde os dois estancieiros conversavam.
Entretidos na venda, nem se aperceberam que Tomé se afastara deles e fora conversar com Eunice.
Abusado, era a palavra que Eunice poderia usar descrevê-lo.
Na missiva o tropeiro, pedia para que ela marcasse uma data, que ele arrumaria um jeito de ir ao seu encontro.
Como não houve uma resposta imediata para o pedido, o peão enviou inúmeras cartas para a moça, a qual não respondia a nenhuma delas.

A certa altura, cansado de esperar uma decisão da moça, o peão adentrou sorrateiramente a fazenda, e jogando uma pedra na janela da moça, despertou-a.
Eunice, surpresa com a atitude tresloucada do peão, comentou que ele era muito imprudente e que não deveria invadir propriedade alheia. Se o pegassem, estaria perdido.
Tomé por sua vez, respondeu que não se importava com o perigo.
Eunice, percebendo que o peão não desistiria, concordou em se encontrar com ele, dali a alguns dias.

Foi assim, que o relacionamento entre ambos começou.

Eunice, ao conhecê-lo melhor, percebeu que o rapaz possuía algum estudo.
Dizendo que Cornélio lhe possibilitara conhecer o universo da escrita, Tomé revelou que o fazendeiro fora um pai para ele, quando sua mãe ficou sozinha no mundo com um filho pequeno para criar.

Eunice passou então, a respeitar o rapaz.
Disse-lhe que também aprendera a ler.
Comentou que não fosse à insistência de sua mãe Carmela, Felício não a teria deixado aprender a ler e a escrever. Isto porque, o fazendeiro achava que a leitura não era para mulheres, as quais, segundo ele, poderiam ter idéias inapropriadas.
Carmela, então com toda a paciência, acabou o convencendo que entretida com leituras, Eunice teria menos tempos de pensar bobagens.
Além do mais, ela orientaria a leitura da moça.
E assim, Eunice aprendeu a ler.

Agora, após a morte de Tomé, Eunice, já restabelecida, sempre procurava Queirós. Sondando-o, procurava saber como era o dia-a-dia de um tropeiro.
De acordo com o que Tomé lhe dissera em vida, tratava-se de uma vida de dificuldades.
Mas Eunice queria por que queria, saber mais detalhes.
Interessada, despertou suspeitas.
Até por que, começou a enfrentar seu pai.
Fazendo insinuações, a certa altura, Eunice conseguiu tirá-lo do sério.
Não fosse a intervenção de Carmela, e teria levado uma surra de cinto.
Felício porém, ouvindo os apelos da mulher, colocou a moça de castigo, trancando-a em seu quarto.
Eunice ficou três dias a pão e água.
Só não ficou mais tempo de castigo em razão da intervenção de sua mãe.

Mas não demorou muito para que a moça enfrentasse novamente o pai.
Felício, irritado, prometeu em breve arrumaria um pretendente, com quem ela pudesse se casar.
Eunice dizendo que preferia a vida religiosa, comentou que não estava disposta a se casar com ninguém.
Felício, furioso, respondeu que a escolha não cabia a ela, e que se casaria com ele escolhesse e a hora que ele bem entendesse.
Eunice retrucou dizendo que não se casaria com ninguém. Ressaltou que ninguém a obrigaria a fazer o que não queria.
Foi o bastante para levar um soco, que a derrubou no chão, e ser arrastada até seu quarto. Ao lá chegar, Felício a derrubou em sua cama. Dizendo que ela estava novamente de castigo, respondeu que ela só sairia dali se concordasse em noivar.
Revoltada com a atitude de Felício, Eunice tentou resistir à imposição paterna, mas não conseguiu agüentar mais do que alguns dias.

Carmela ao perceber a gravidade da situação, tentou intervir.
Mas era inútil, Felício não retrocederia um milímetro. Estava irredutível.

Por conta de sua atitude, Eunice levou uma bronca de Carmela quando esta conseguiu se desvencilhar de Felício, e levar um pouco de comida para a filha.
Disse-lhe:
-- Vosmecê é muito imprudente! Onde já se viu falar com vosso pai daquele jeito? Tanto que eu te falei para não enfrentá-lo!
Mas Eunice era teimosa demais para aceitar os conselhos de sua mãe.
Tanto que continuou resistindo.
A certa altura, no entanto, exausta, acabou concordando com a imposição de seu pai.

Sem alternativa, aceitou a corte de Duarte, que visitava a moça com certa freqüência, sob os olhares vigilantes de sua mãe, Carmela.
Estudante do curso de direito, comentou que o Brasil precisava de uma instituição de ensino superior. Comentava que estudava em Portugal.
Eunice não se impressionava nem um pouco com esta conversa.
Ao aceitar a corte de Duarte, só estava ganhando tempo para finalmente colocar seu plano em prática.
Carmela ao perceber a resignação da filha, comentou que ela estava muito conformada.
Desconfiada, passou a vigiar a filha.

Com efeito, quando olhou para o relógio Orlando notou que já era madrugada. Percebendo que havia se estendido em seu relato, comentou que já era tarde e continuaria a contar a história de seus ancestrais depois.

Luciana Celestino dos Santos
É permitida a reprodução, desde que citada a autoria.

AMARGAS LEMBRANÇAS - CAPÍTULO 3

Retornando ao projeto de viagem de Gabriela.
A moça, após finalizar os preparativos da viagem, pegou o metrô, depois o trem.
Por fim, pegou um ônibus, onde desceu próxima a cidade onde está situado o hotel de seu avô, que já a aguardava.
De lá ambos foram de carro até o hotel do Seu Orlando.
Seu Orlando, como costuma ser chamado por seus funcionários, é dono de uma vasta propriedade na região metropolitana de São Paulo.
Hotel de alto padrão, lá costumam ficar hospedados, empresários, socialites, e pessoas de renome na sociedade.
Mas muito mais interessada em descansar por alguns dias em uma paisagem bucólica, do que ficar lado a lado com pessoas influentes, Gabriela queria apenas aproveitar o passeio.
Nisso, seu avô, homem ativo que é, foi dirigindo o carro e contando as novidades.
Disse que adquiriu novos cavalos, que possuía agora algumas charretes, e plantara mais algumas mudas de árvore. Também informou que comprou mais um terreno, pois pretende ampliar as instalações de seu hotel, e oferecer mais serviços aos seus clientes.
Animada Gabriela se admirou da disposição de seu avô em querer sempre progredir, e melhorar ainda mais o serviço do hotel, que ela já considerava excelente.
Mas Seu Orlando é perfeccionista.
-- Tudo o que eu fizer, ainda será pouco diante de toda esta concorrência.
-- Concorrência, vô! Não há tantos hotéis com o padrão de qualidade do Hotel Aquarela.
Mas Seu Orlando, costumava contestar estas afirmações dizendo que se queria prosperar no que fosse deveria estar sempre atento. Até por que, segundo o velho ditado: O segredo do sucesso é a eterna vigilância.
Por conta disso acompanhava atento aos balanços contábeis realizados, o trabalho dos funcionários, pedia sugestões e elogiava sempre um trabalho bem feito. Por este motivo era bastante querido por seu corpo de funcionários.

Nisto, Gabriela aprecia a paisagem.
O trajeto até o hotel demora cerca de meia-hora.
Durante o trajeto, se depara o verde da paisagem, as árvores, as flores, os animais. Tudo bem diferente do dia-a-dia de sua cidade turbulenta e barulhenta.
Pensando nisso, lembrou-se de quantas saudades sentia, quando estava longe daquela paisagem querida, sua velha conhecida.
Seu Orlando ao perceber isso, perguntou:
-- Pensando na morte da bezerra?
-- Não vô! Só estou pensando na saudade que vou sentir, quando tiver que ir embora deste lugar.
-- Ora Gabriela! Deixe disso, nem bem chegou e já está pensando em ir embora? Ora, não se preocupe com isso! As férias são longas!
Gabriela então concordou.

Nisso, ao chegar, Gabriela se depara com a entrada imponente do hotel, e com a sempre presente gentileza dos funcionários.
Logo na entrada do hotel, qual não foi sua surpresa ao notar que muitas das mudas plantadas por seu avô nas férias passadas, já estavam grandes, viçosas e produzindo lindas e coloridas flores. Violetas, azáleas, rosas, margaridas, gérberas, entre tantas outras.
Uma beleza!
Pareciam dar boas vindas a nova hóspede do hotel.
Sim, por que adentrar o hotel era um espetáculo à parte. Enquanto seguia em direção ao paraíso, Gabriela podia, admirar os campos de golfe, os jardins, o pomar repleto de frutas e flores, as árvores frondosas, um pequeno lago ao longe, o som do trote de alguns cavalos.
Animado, seu Orlando leva a neta até as cocheiras para mostrar os novos animais recém-adquiridos.
Gabriela elogiou a beleza dos animais.
Orgulhoso da aquisição, Orlando informou que adquiriu os animais, em um leilão, no interior do estado.
Nesta oportunidade, também aproveitou para mostrar a neta, as charretes. Uma mais bonita que a outra.
Ao notar a admiração de sua neta, comentou que eram muito antigas.
Gabriela então, ficou ainda mais admirada.
Seu Orlando, percebendo isto, prometeu que mais tarde a levaria para fazer um passeio de charrete.

Com isto, depois de cumprimentar alguns funcionários, os dois voltaram para o carro. E assim, prosseguiram no caminho de flores, árvores belíssimas, campos verdejantes.
A certa altura, aproximaram-se de um dos inúmeros lagos do hotel.
Gabriela pediu então para descer do carro. Queria molhar os pés na água.
Seu Orlando concordou.
Gabriela então caminhou por entre gramíneas e flores, tirou sua bota de cano curto, as meias, e mergulhou os pés na água fria.
Feliz por estar de volta àquele lugar tão bonito, brincou de jogar água para cima.

Depois de alguns minutos, seu avô chamou-a.
Era tarde. Precisava levar as malas da neta para o quarto e providenciar o almoço, já que era 11:30.
Gabriela então, calçou novamente as botas e entrou novamente dentro do carro.
Assim, depois de algum tempo, dirigiram-se a recepção do hotel.
Como já estava tudo combinado, Gabriela só precisou preencher uma ficha, que os funcionários do hotel se encarregariam de levar as malas para seu quarto.
Quando, minutos depois, se instalou no amplo e luxuoso quarto, Gabriela se estirou na cama de casal com colchão de mola, e disse:
-- É essa vida que eu queria ter!
Minutos depois, um funcionário, devidamente uniformizado, trouxe sua bagagem.
Gabriela agradeceu.
Abriu o frigobar e bebeu um pouco de água.
Após, saiu do quarto, indo encontrar-se com seu avô que a esperava para o almoço.

Como seu Orlando sabia que a neta gostava de lagosta, mandou preparar um prato desta fina iguaria, especialmente para ela.
Gabriela, ao ver a suculenta lagosta em seu prato, ficou felicíssima.
-- Obrigada, vô! Só o senhor mesmo para me proporcionar momentos tão maravilhosos assim!
Disse isto e abraçou seu avô.
Nisto, começaram a comer.
E muito embora não fosse costume de Gabriela comer lagosta, comeu-a com a maior destreza.
Isto por que, em férias anteriores, seu avô aproveitando as mesas dos quartos, pediu para que o chefe de uma das cozinhas do hotel, providenciasse um prato à base de lagostas, para ser levado para o quarto onde sua neta estava hospedada. Lá mesmo, ensinou como comer o crustáceo que tanto pedia para experimentar.
Não foi difícil.
Com um pouco de treino Gabriela se tornou uma experta em lagostas, e frutos do mar.
De tão educada, alguns hospedes, quando descobriam que se tratava da neta do Seu Orlando, tratavam logo de cumprimentá-lo.
Diziam:
-- Que boa educação o senhor proporciona para sua neta! Não são todos os jovens que possuem uma postura tão elegante à mesa.
Orlando, que sabia da boa vontade da neta, agradecia os elogios e dizia que Gabriela iria longe.
Todos concordavam.

Animado com a visita da neta, Orlando brindou o almoço com um bom vinho branco.
Como sobremesa, foram servidas mouse de maracujá e sorvete quente.
Gabriela regalou-se com as sobremesas.

Mais tarde, Orlando propôs fazer uma cavalgada.
Gabriela concordou.
No passeio apreciou as flores, a moça encantou-se com a flor roxa do maracujá, com os lírios, os beija-flores, as árvores, com o trotar elegante dos cavalos.
Animada, caminhou até um outro lago existente no hotel, onde viu de longe uma cachoeira.
Acompanhada pelo avô, cavalgou por quase duas horas. Queria matar as saudades daquele que era um lugar tão querido para ela.
Para Gabriela, o hotel de seu avô, era um lugar de lembranças felizes, de festas, realizadas no imponente salão de festas do hotel.
Era o lugar ideal para cantorias, modas de violas, serestas.
Lembrou-se dos bailes de carnaval, que aconteceram no local, das festas juninas, e até de um casamento!
Sim, um lindo casamento de um filho de um político da região, ocorrido no local.
O luxuoso casamento, com direito a lagosta com prato principal, foi o acontecimento do ano.
A noiva, vestida com um luxuoso vestido branco, bordado com cristais delicados, luvas brancas e o cabelo praticamente todo solto, estava belíssima.
O noivo também estava impecável.
A festa, com uma pequena orquestra de músicos – contratados da Orquestra Sinfônica do município, tocou até de madrugada.
O coreto da praça principal do hotel, foi todo ornamentado com flores da estação.
A igreja do hotel foi o cenário da cerimônia, e o coreto, o local de onde a noiva jogou seu buquê.
Na festa, estava toda a imprensa, não só da cidade, mas de toda a região.

Margarida, quando ouviu os comentários da filha, sobre a referida festa de casamento, achou tudo de um provincianismo absurdo.
Decepcionada com a atitude da mãe, Gabriela comentou que nunca mais contaria para ela, detalhes de suas estadas no hotel.
Margarida então retrucou dizendo que este era o resultado da convivência com Orlando, o qual adorava jogar a filha contra a mãe.
Gabriela ao ouvir isto, ficou chocada.
Isto por que, seu avô, mesmo não simpatizando com Margarida, nunca fez qualquer comentário desabonador a este respeito.
Enfim, Margarida era uma pessoa, difícil de se lidar.

Mas voltando ao passeio.
Gabriela, enquanto cavalgava, comentava com seu avô sobre estas lembranças, e de como estava difícil conversar com sua mãe, nos últimos tempos.
Desejosa de cursar história, a moça não sabia como convencer sua mãe que o curso de direito não era a solução para ela.
Sim, Margarida era uma pessoa difícil. Acostumada a interferir sempre na vida de Gabriela, acabava por se distanciar da filha.
Seu Orlando, que não concordava com a atitude da nora, tentou inúmeras vezes, intervir a favor da neta.
Tentando convencer Margarida, dizia que a vocação da neta era para a área de história.
Margarida retrucava então, dizendo que se Gabriela gostava tanto de história era por conta das influências dele, que não se cansava de contar histórias fantasiosas e imaginosas sobre o passado da família.
Orlando ao ouvir estas palavras duras e levianas, retrucou dizendo que nunca mentira para sua neta.
Com isto, se nota que sempre que tentava ajudar Gabriela, era repelido por Margarida, a qual dizia saber o que era melhor para a filha.
Aliás, incomodada com a interferência de Orlando, Margarida sempre procurava colocar obstáculos na aproximação dos dois.
Gabriela porém, não aceitava a intromissão de sua mãe. Enfrentava-a. Por isso sempre visitava seu avô nas férias.
Desta forma, Orlando, ao perceber a angústia de Gabriela, prometeu que faria o possível para convencer Margarida a mudar de idéia, muito embora soubesse que seria praticamente impossível fazê-la mudar de atitude.
Gabriela concordou.
Nisso, voltaram para o hotel.

Gabriela mesmo acostumada com o lugar, sempre se admirava da imponência do empreendimento de seu avô. Os três prédios – em estilo neoclássico – que compunham o hotel, eram divididos em três setores. O primeiro, era o setor social, sendo que no prédio principal está a recepção, duas lanchonetes, um barzinho, três restaurantes, sala de computadores, lojas, três salas e cerca de cinqüenta suítes, além de um átrio, e uma entrada com pedriscos e flores.
Nos outros dois prédios, estão as outras oitenta suítes, mais duas salas e um outro barzinho – em cada um.

Entre os prédios de estilo neo-clássico, estão as piscinas e a uma churrasqueira.

Próximo dali estão os três Centros de Convenções do hotel e o clube, com piscina coberta, quadra poliesportiva, academia de ginástica com três ambientes e banheiros, sauna, spa – com duas salas de massagens e templo de meditação, salão de jogos – bar, um salão de dança, átrio, teatro, cinema e dois salões de festa.
Tem também a igreja do hotel, imponente.
Logo a praça principal com o coreto. Ao redor do hotel havia ainda mais duas praças, e um parque para as crianças brincarem.

Gabriela percebeu algumas mudanças.
Orlando comentou então, que no chafariz da praça principal, resolveu colocar alguns objetos para atrair os pássaros. Gostava da algazarra dos pardais. Fazia se lembrar de seu tempo de garoto, quando morava em um sítio, e seu pai era um colono.

Mais ao fundo, em outro prédio neoclássico, estava seu escritório e a administração do hotel.
Ao longo do passeio, Gabriela avistou as duas quadras de tênis, a quadra de vôlei, de basquete e a de futebol – sempre bastante utilizadas.

Seu Orlando pegou um carrinho e conduziu a neta até um dos dois campos de golfe do hotel.
Mais tarde levou a neta novamente para as cocheiras e conduziu-a num passeio de charrete, até os lagos e pastagens do hotel.
Juntos, os dois passearam por algumas trilhas que haviam no lugar.
Acomodada na charrete, Gabriela comentou com seu avô se sentia como uma viajante no tempo.
Seu Orlando, ao ouvir o comentário da neta, relatou que já utilizou muito este tipo de transporte quando era garoto. Dizendo que automóvel era artigo raro em seu tempo de criança, revelou que trazer as charretes para o hotel foi o capricho de um velho desejoso de se reencontrar com suas origens.
Gabriela ficou comovida com o relato.
Enfim, mal podia acreditar que estava em férias nos domínios do avô.

No passeio, os dois se aproximaram de alguns chalés.
Estas instalações com sala, cozinha, banheiro e quarto.
Pequeninas, mas aconchegantes construções neo-coloniais.
Feliz, seu Orlando comentou que o hotel estava dando muito lucro.
Por esta razão se animou a comprar mais um terreno, pois pretende expandir o hotel.

Mais tarde, os dois se dirigiram a uma das lanchonetes e comeram um suculento lanche, com suco de laranja e batatas fritas.
Orlando parecia uma criança ao lado da neta.
Nem mesmo quando tratava os funcionários com gentileza, conseguia ser tão descontraído.

Mais tarde, Gabriela colocou um biquíni e foi aproveitar o cair da tarde, para mergulhar na piscina aquecida e coberta do hotel.
Animada, brincou nas águas quentes durante longas horas.
Nadou, mergulhou, brincou com as crianças que estavam no local...
Enfim, se divertiu a valer.
Quando marcou dezenove horas, seu Orlando, apareceu no clube para chamá-la. Era hora de se arrumar para o jantar.

Gabriela dirigiu-se então a seu quarto, tomou um banho de ducha, colocou um belo vestido frente única estampado, arrumou os cabelos compridos e foi de braços dados com seu avô, até um dos restaurantes do hotel.
No jantar foi servida uma saborosa paella.
Gabriela adorou o repasto.
Novamente tomou vinho, e como sobremesa uma torta de chocolate.
Mais tarde, os dois foram vistos dançando no salão de danças.
Juntos riscaram o salão dançando ao som de uma orquestra ao vivo, que tocou clássicos americanos, bem como alguns chorinhos.
Gabriela que adora música antiga, adorou!
Os hóspedes do hotel, ao verem um casal com uma diferença tão grande de idade, admiraram-se.
Mais tarde, ao descobrirem que se tratava do dono do hotel e sua neta, refizeram-se do espanto, e chegaram até a cumprimentar Gabriela.

Nisso, horas depois, ao voltar para seu quarto, felicíssima, Gabriela agradeceu pelo passeio.
Exausta, colocou uma camisola e foi dormir no colchão de molas macio, do hotel.
Também, cobriu-se com o edredom de malha e dormiu.

No dia seguinte, levantou-se da cama, tomou um banho rápido, vestiu-se e, novamente acompanhada de seu avô, foi tomar o café da manhã.
Quanta fartura!
Pães, das mais variadas formas, recheios e sabores.
Doces e salgados, quentes ou frios.
Frios, de toda espécie: salames, queijos, presuntos, biscoitinhos, iogurtes, leite, sucos, tortas, ovos mexidos, etc.
Um deleite para o paladar.
Gabriela mal sabia por onde começar.
Foi quando seu avô disse:
-- Experimente um pouco de tudo.
Ávida, até sonhos experimentou.
Uma conhecida hóspede ao avistar o dono do hotel, comentou:
-- É impossível manter a linha com tantas gostosuras!
Orlando concordou.

Após, o café da manhã, Gabriela fez uma caminhada.
Desta vez sozinha, pegou um cavalo e foi até a cachoeira.
Lá mergulhou, banhou-se e brincou nas águas até as 11:30.
Depois, voltou ao hotel, trocou-se e foi visitar o avô, no prédio da administração.
Como era de se esperar, ao lá chegar, conhecida que era de todos, foi fartamente cumprimentada.
Atento com trabalho, Orlando mal percebeu a entrada da neta.
Gabriela então, esperou ser notada.
Quando percebeu, Orlando comentou:
-- Ah! sua matreira! Pensou que eu não iria percebê-la?
Gabriela sorriu e começou que já era quase hora do almoço.
Orlando ao olhar no relógio, concordou.
Mas dizendo que tinha que terminar de analisar um relatório, perguntou se ela poderia esperá-lo.
Gabriela concordou em esperá-lo.
E assim, cerca de quarenta minutos depois, os dois saíram juntos para almoçar.
Neste almoço, ao contrário das refeições anteriores, os dois almoçaram num restaurante de comida self-service.
Com mais variedade e com comida igualmente deliciosa a do restaurante à la carte, do dia anterior.
Diante da variada do cardápio, Gabriela comeu arroz, peixes, carnes, frutos do mar, salmão, verduras, legumes, batatas, enfim, tudo o que tinha direito.
Comeu tanto, que precisou dispensar a sobremesa, igualmente variada. Eram pavês, bolos, tortas, mouses, sorvetes, docinhos e pudins.
Orlando, ao ver que Gabriela não havia pego nenhuma sobremesa, insistiu:
-- Coma meu bem! Coma mais um bocadinho! Você está tão magrinha!
Mais Gabriela estava satisfeita.

Em seguida, despedindo-se do avô, voltou para o quarto.
Lá ficou assistindo os canais a cabo, na televisão do quarto.
Afinal de contas, precisava também, manter-se informada sobre o que estava acontecendo fora dos muros do hotel.
Mais tarde foi aproveitar a piscina do hotel.
Como ainda era dia claro e o sol estava convidativo, Gabriela preferiu banhar-se numa das piscinas ao lado dos prédios.
Deslumbrada, enquanto nadava, mergulhava, enfim, se esbaldava, podia se admirar com a bela paisagem que se descortinava ante seus olhos.
A certa altura, sentou-se numas das cadeiras próximas a piscina e pediu um suco de laranja.
Nisso, verificando que precisava passar novamente o filtro solar, abriu o frasco que estava dentro de uma bolsinha de palha que trazia consigo e começou a espalhar o produto pelo corpo.
Enquanto se ocupava em proteger-se do sol, um senhor de cerca de trinta e poucos anos, que passava por ali, decidiu mergulhar na piscina.
Resolvido, retirou a bermuda, a regata, e caiu na piscina, espalhando água para todos os lados.
Gabriela que estava passando filtro solar perto da piscina, ficou toda molhada.
O homem, ao perceber que a havia molhado, pediu rapidamente desculpas e começou a nadar.
Gabriela ficou perplexa. Irritada, continuou aplicando o produto no corpo.
Quando finalmente o garçom trouxe o suco de laranja, que ela havia pedido, comentou:
-- Não é por nada não. Mas que sujeito idiota!
Gabriela riu.
-- Deixa pra lá! Tem gente que é espírito de porco mesmo! O importante é não estragar seu dia por conta disso. – insistiu o garçom.
-- Tem toda a razão! ... Quer saber de uma coisa? Vou tomar um lanche que eu estou morrendo de fome. – comentou Gabriela.
Nisso, pegou a taça com suco de laranja, bebeu-o e, despedindo-se do garçom, comentou que mais tarde voltaria para aproveitar mais um pouco a piscina.
Quando caminhava em direção ao prédio principal, foi interrompida por seu avô.
Orlando, trajando camisa florida; bermuda e chinelos de couro, buscava Gabriela para tomar um regalado lanche da tarde com ele.
Num dos Centros de Convenções do hotel, fora montada uma enorme mesa, repleta de iguarias.
Havia sucos variados, com laranja, acerola, uva, maracujá, caju.
Doces de coco, brigadeiro, biscoitinhos finos, chocolates, entre outros.
Salgadinhos variados, coxinhas, rissoles, mini-kibes, e até mini-lanches, mini-cachorros quentes, etc.
Obviamente, além deles, ali estavam inúmeros convidados de Orlando.
Eram empresários, comerciantes, enfim, pessoas ligadas ao ramo de turismo e hotelaria que estavam conhecendo um pouco da hospitalidade do anfitrião.
É, Seu Orlando não costuma brincar em serviço.
Disposto a divulgar melhor o hotel, costumava dizer que aquele era o empreendimento maior de sua vida. A realização de um sonho.
Esperto, enquanto agradava a neta, não perdia a oportunidade de realizar um ótimo negócio.
Enfim, estava feliz.

Nisso, o estranho que havia molhado Gabriela chamou o garçom e pediu um suco de uva.
Antunes, um tanto incomodado com o sujeito, depois de algum tempo, levou o suco para o homem.
Flávio, que estava morrendo de sede, agradeceu e começou a beber.
Percebendo que o garçom o encarava, depois de terminar de beber o suco de uva, resolveu se aproximar. Incomodado com a atitude do rapaz, perguntou se havia algum problema.
Constrangido, o rapaz respondeu que não.
Flávio porém insistindo, comentou que não gostava quando as pessoas olhavam torto para ele. Ainda mais uma pessoa que nem sequer conhecia.
Irritado, Antunes respondeu então, que ele era muito folgado.
-- Folgado, por que, posso saber? – perguntou o homem irritado.
-- Folgado e sem educação! Onde já se viu entrar na piscina daquele jeito! Você sabia que molhou a moça?
-- Mas eu pedi desculpas. Não viu?
-- Não vi e nem quero saber disso. Acontece que ...
Nisso, apareceu um outro garçom que, percebendo a discussão, chamou Antunes para ajudá-lo.
Flávio então, percebendo a intervenção do funcionário, retirou-se.

Antunes notou então, que levaria uma severa bronca por haver discutido com um hóspede do hotel.
Mesmo assim, tentou argumentar demonstrando que tinha razão em discutir com o homem.
Aléssio porém, comentou:
-- Não interessa quem tinha ou não tinha razão. Você não é pago para discutir com os hóspedes. Mais uma dessas e você não trabalha mais aqui, sabia? Nunca ouviu que o freguês tem sempre razão? Aqui no hotel não é diferente. E tem mais, vai se preparando por que isto certamente vai chegar aos ouvidos de Seu Orlando e aí, meu caro, as coisas não vão ficar nada boas para você. Pode escrever o que eu digo! A sua batata está assando!
Antunes tremeu na base.

Gabriela, então se esbaldou com os comes e bebes.
Enquanto se deliciava com a variedade de quitutes, alguns empresários foram conversar com a moça. Queriam saber o achava do lugar.
Gabriela comentou que adorava passar as férias ali, longe dos problemas e dos aborrecimentos. Também adorava a companhia de seu avô.

Depois do regalado repasto, Gabriela foi dar um passeio a pé pelo hotel.
Ainda com seu biquíni, teve o desprazer de encontrar o sujeito que a molhara, pelo caminho.
Ao perceber que o mesmo vinha a seu encontro, Gabriela deu meia-volta e caminhou em direção a seu quarto.
Aborrecida, entrou no chuveiro, tomou um banho e trocou de roupa.
Vestiu uma calça jeans, uma blusa branca e calçou uma bota preta de cano curto.
Foi então que abriu a porta do quarto e dirigiu-se a varanda. A tarde estava linda!
Encantada, ficou a admirar o pôr-do-sol, com suas cores amareladas, laranjas. Até o escurecer completo.
Gabriela só deixou de lado sua contemplação, quando ouviu uma cantoria.
Curiosa, saiu do quarto e foi ao encontro da música.
Com isso, na entrada do prédio principal, estava seu avô e um grupo de violeiros, cantando músicas tradicionais do cancioneiro popular brasileiro.
Gabriela, que já havia presenciado algumas dessas manifestações culturais no hotel de seu avô, parou mais uma vez para ouvir.
Nisso, conforme a música se espalhava pelo ambiente, mais e mais pessoas paravam para ouvir.
Animados, os violeiros cantaram “Luar do Sertão”, modinhas de violas, músicas de roda, etc.
As pessoas, encantadas, não paravam de aplaudir.
Flávio, que passeava pelo hotel, estacou diante da entrada do hotel, ao ouvir a cantoria.
Gabriela, distraída, não percebeu.
Orlando, feliz da vida, voltava no tempo.
Animado com aquele reencontro com o passado, comentou com a neta que sua família era original do sul do Brasil. Que já morara em um sítio, sendo filho de colonos.
Todavia, muito embora seu pai tenha fixado residência, seus ancestrais, gostavam de longas viagens. Viagens essas em que negociavam a venda de animais. Eram tropeiros.
Interessada na história, Gabriela pediu ao avô, que depois do jantar contasse a história da origem da família.
Orlando, contente por haver despertado o interesse da neta, prometeu que o faria.
Nisso a cantoria continuou.

Mais tarde, Gabriela e Orlando se dirigiram a um dos restaurantes do hotel e se deliciaram mais uma vez, com a variedade de pratos.
Havia arroz branco, à grega, ao forno, risotos, macarrão com molho branco, molho de tomate, massas variadas, carnes, frango, peixes, caldos.
Além é claro das inúmeras sobremesas: pudins, tortas, bolos, biscoitinhos, docinhos, petit gateau, etc.
Gabriela comeu regaladamente.
A noite estava alegre, e todos brindaram a bela lua.
Quanto aos cantadores, os mesmos ficaram hospedados em alguns dos quartos do hotel.
Flávio, que ficara observando Gabriela durante a apresentação dos cantadores, resolveu se aproximar.
A moça ao perceber isto, tentou chamar o avô para uma caminhada.
Como o sistema de iluminação do hotel era bom, não haveria problema nenhum em os dois caminharem por lá à noite.
Orlando porém distraído que estava, não percebeu a intenção da neta.
Foi o bastante para o estranho se aproximar.
Dizendo que precisava pedir desculpas a Gabriela, comentou com Orlando, que havia sido advertido por um funcionário sobre seu mal comportamento.
Orlando então, tentando compreender o que se passava, pediu explicações.
Flávio apresentou-se então, e comentando que havia jogado água sem querer na moça, pediu novamente desculpas.
Orlando, impressionado com a atitude do rapaz, convidou-o para um café.

Nisto, diante do convite, lá estava o rapaz cumprimentando Orlando.
Com isto, lá se foram os três para o restaurante tomar um café antes de dormirem. Como havia apresentação de cantores, o restaurante ficava aberto até mais tarde.

Gabriela porém, não estava nem um pouco satisfeita com o encontro. Contrariada, fez menção de que pretendia voltar para seu quarto, mas Orlando pediu para que a neta permanecesse na mesa.
Sem alternativa, Gabriela permaneceu sentada à mesa.
E assim, Orlando e Flávio começaram a conversar.
De um lado, Orlando contando sobre todo o trabalho que tivera há mais de vinte anos para erguer o hotel, e de outro Flávio, comentando que era professor universitário e pesquisador.
Curioso Orlando perguntou:
-- Professor de quê?
-- De história.
Encantado, Orlando comentou que adorava história. Segundo ele, conhecer a origem das civilizações, a história dos povos, era uma forma de descobrir de onde viemos.
Flávio comentou então, que história, não é apenas uma descoberta do passado, mas também uma forma de se planejar o futuro.
Orlando, percebendo que a neta estava muito calada, insistiu para que a mesma dissesse alguma coisa, mas Gabriela desanimada, só sabia dizer que estava com sono.

Mais tarde, a sós com a neta, Orlando chamou-lhe a atenção.
Dizendo que ela não havia sido educada com o moço, comentou que ele não a havia molhado de propósito.
Gabriela, visando evitar conflitos, concordou com o avô.
Mas interessada que estava na história dos tropeiros, pediu para que seu avô contasse sobre o passado da família.
Orlando espantou-se:
-- Mas você não estava com sono?
Gabriela respondeu então, que só queria que aquele sujeito fosse embora.
-- Você quando quer, é igualzinha a sua mãe! – comentou Orlando.
No entanto, resolveu contar a história de seus ancestrais para a neta.

Luciana Celestino dos Santos
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